Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3315/04
Nº Convencional: JTRC
Relator: SOUSA PINTO
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO - CONDUÇÃO SOB O EFEITO DE ÁLCOOL
DIREITO DE REGRESSO DA SEGURADORA
ÓNUS DA PROVA
Data do Acordão: 04/05/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE COIMBRA - 1º JUÍZO CÍVEL
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTº 19º, AL. C), DO DL Nº 522/85 .
Sumário: I – Para a procedência do pedido de direito de regresso contra o condutor, por ter agido sob a influência do álcool, previsto no artº 19º, al. c), do DL nº 522/85, de 31/12, não basta que a seguradora prove que o condutor circulava sob os efeitos do álcool, antes se torna necessário que comprove que a alcoolémia do condutor tenha estado na base, pelo menos parcialmente, da verificação do acidente .
II – Um grau de taxa de álcool no sangue de 1,41g/l, detectado no condutor de um veículo interveniente num acidente de trânsito, constitui pressuposto para a verificação do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p.p. no artº 292º do C.P., crime este que tem na sua génese o reconhecimento da existência de estudos científicos que comprovam que a condução com uma TAS igual ou superior a 1,2 g/l implica um risco acrescido na circulação rodoviária .

III – Não podendo funcionar qualquer presunção decorrente de um condutor ser portador de uma TAS igual ou superior a 1,2 g/l, o que é certo é que o aplicador do direito também não pode ser indiferente à referida realidade científica, pelo que tal verificação será mais um elemento a considerar no caminho mental que o juiz tem de percorrer até chegar a uma qualquer conclusão sobre um dado facto .

Decisão Texto Integral: Acordam neste Tribunal da Relação de Coimbra,

I – RELATÓRIO

A Autora, A...., intentou contra o Réu, B..., acção com processo sumário, alegando que no dia 29/02/2000, na Rua Padre António Vieira, em Coimbra, ocorreu um acidente em que foram intervenientes os veículos 10-74-NA, 08-04-LR, 40-43-MS e VB-11- 75; o veículo NA era conduzido pelo Réu e encontrava-se seguro na Autora; o Réu circulava na referida artéria e, ao descrever uma curva à direita, saiu da sua hemi-faixa de rodagem, invadiu a hemi- -faixa esquerda e foi embater com a frente na traseira do veículo LR; com a força do embate o veículo foi projectado para a frente e embateu com a frente na traseira do MS que, por sua vez, foi projectado para a frente, embatendo com a frente na traseira do VB; no momento do acidente, o Réu conduzia com a taxa de alcoolémia de 1,41 g/l, tendo sido esse facto que determinou o acidente; em consequência desse embate, a Autora pagou a quantia de 1.026.500$00 à proprietária do veículo LR e pagou a quantia de 211.026$00 para reparação do veículo MS; a Autora suportou despesas administrativas com a elaboração, tramitação e conclusão do processo de sinistro, no montante de 250,00 €.
Com estes fundamentos, pediu que o Réu fosse condenado a pagar-lhe a quantia de 6.422,75 € acrescida de juros, à taxa legal, a partir da citação.

O Réu contestou, alegando que o acidente não ocorreu devido ao facto de ter ingerido bebidas alcoólicas; com efeito, alegou que atendendo às características da via e condições de circulação, conduzia com excesso de velocidade – a cerca de 50 Km/hora; o piso encontrava-se molhado; dentro da curva estava um veículo parado e no exterior desse veículo, estavam uma ou duas pessoas; foi ao tentar desviar-se desse obstáculo que o Réu perdeu o controlo do veículo o que, associado ao facto de os pneus estarem muito gastos e ao facto de o piso se encontrar molhado, causou a derrapagem que antecedeu a colisão; nas circunstâncias em que ocorreu o acidente, nenhuma outra pessoa conseguiria evitar a derrapagem e o embate.
Com estes fundamentos, concluiu pela improcedência da acção.

Procedeu-se à realização do julgamento com observância de todo o formalismo legal.

Respondeu-se à matéria de facto que constava da base instrutória, não tendo a mesma sofrido qualquer reclamação.

Foi proferida sentença, a qual julgou a acção parcialmente provada e procedente, tendo condenado o Réu a pagar à Autora a quantia de 6.172,75€, acrescida de juros, à taxa legal, desde a data da citação até integral pagamento.

Inconformado com tal decisão veio o Réu recorrer da mesma, tendo apresentado as suas alegações, nas quais expôs as seguintes conclusões:

I - O Tribunal a quo deu como provado que o recorrente conduzia o veículo em que circulava com os sentidos entorpecidos e com limitações nos reflexos em virtude da taxa de alcoolémia que apresentava.
II - e que estes mesmos factos contribuíram decisivamente para a eclosão do acidente.
III - A limitação dos reflexos do Réu e o nexo causal entre o álcool e o acidente foram considerados como provados através do recurso exclusivo a meras presunções judiciais.
IV - É do conhecimento geral que os aludidos efeitos do álcool variam substancialmente de indivíduo para indivíduo.
V - Assim como é do conhecimento geral que diariamente se produzem acidentes como o relatado nos presentes autos sem qualquer intervenção do álcool.
VI - A decisão do tribunal de 1.ª instância quanto à matéria de facto carece de fundamentação probatória suficiente para dar como adquiridos factos, que na dúvida, deveriam ter sido considerados como não provados.
VII - O tribunal a quo serviu-se de factos desconhecidos (a limitação dos sentidos e reflexos do Réu) para retirar deles uma ilação quanto à existência de um outro facto também ele desconhecido (a existência de um nexo causal entre a taxa de álcool e o acidente).
VIII - Deve ter-se como inadmissível, por violação do normativo previsto no artigo 349° do Código Civil, a presunção judicial extraída pela 1.ª instância a partir de certos factos anteriormente dados como provados também através do recurso a uma presunção judicial.
IX - O Ac. do STJ n° 6/2002 uniformizou a jurisprudência quanto à necessidade de prova do supra referido nexo causal nos seguintes termos: «A alínea c) do artigo 19.º do Decreto-Lei n.° 522/85, de 31 de Dezembro, exige para a procedência do direito de regresso contra o condutor por ter agido sob influência do álcool o ónus da prova pela seguradora do nexo de causalidade adequada entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente.»
X - O tribunal de 1.ª instância, por julgar o ónus da prova particularmente pesado para a autora, deu artificialmente como provado o nexo causal entre o álcool e o acidente, quando na realidade considera, embora por motivos óbvios não o diga expressamente, que a prova desse mesmo nexo causal é dispensável.
XI — Da decisão recorrida resulta uma interpretação das normas dos arts. 8°, n.° 2 e 349° do Código Civil; art. 516° do CPC e 19.°, al. c) do Decreto-Lei n.° 522/85, de 31 de Dezembro, que viola os princípios constitucionais da confiança, da proporcionalidade da proibição do excesso e do dever de fundamentar as decisões.
XII - O julgador não pode decidir contra as regras do ónus da prova por puras convicções pessoais metamorfoseadas em presunções judiciais, sempre que e só porque o ónus da prova de determinados factos seja considerado demasiado difícil.
XIII - Deverá ser declarada inconstitucional a norma do art. 349° do Código Civil, quando interpretada de modo a permitir a criação de presunções judiciais que tenham como ponto de partida factos exclusivamente obtidos através do recurso a uma outra presunção judicial.
XIV - Pelo acima exposto, a sentença recorrida violou frontalmente, ou defraudou subtilmente, as seguintes disposições legais: art. 8°, n.° 2 e art.º 349.° do Código Civil; art. 516° e art. 668°, n.° 1, al. b) do CPC; art. 19.°, al. c) do Decreto-Lei n.° 522/85, de 31 de Dezembro; art. 2°; art. 18°, n° 2; art. 20°, n° 4 e art. 205°, n.° 1, da Constituição da República Portuguesa;
XV — A sentença recorrida desrespeitou a jurisprudência uniformizada pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n° 6/2002 publicado em 18/07/2002.
XVI — Termos em que deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue completamente improcedente a pretensão da Autora, por não provada, nos termos consignados nestas conclusões.

A recorrida apresentou, por sua vez, contra-alegações, nas quais exibiu as seguintes conclusões:

1. Ficou provado que:
O R. apresentava uma taxa de 1,41 g/l, saiu da sua hemi-faixa de rodagem, foi embater numa fila de veículos que se encontravam estacionados.
2. Com efeito, o R. embateu com a frente do veículo que conduzia na traseira de outro veículo, este foi projectado para a frente e foi embater com a frente na traseira de outro, e por sua vez este foi ainda embater com a frente na traseira de outro.
3. O acidente ocorreu pelas 04,15 h.
4. Em sede de nexo causal por muito dúbia e complexa que possa parecer, uma coisa é certa: a al. c) do Dec.-Lei n.º 522/85, de 31/12, não pode ficar esvaziada de conteúdo útil.
5. É demonstrativo que o percurso feito pelo R. - de não contornar a curva e seguir em frente, a uma hora “morta” da manhã - é caracterizado pela irregularidade reveladora de um completo alheamento do R. ao que se passava na via.
6. Na verdade, da forma como o acidente ocorreu é possível extrair - com base nas regras da experiência - que o embate ficou a dever-se ao facto do R. se encontrar incapacitado para conduzir, situação provocada pela excessiva taxa de álcool que apresentava.
7. Acrescenta-se, ser do conhecimento geral, o facto de que um grau de alcoolémia diminui as capacidades de resposta do condutor, sendo certo que do modo como ocorreu o acidente resulta que as capacidades de resposta do R. eram, no caso concreto, essenciais para evitar o acidente.
8. E neste sentido a prova foi livremente apreciada pelo Tribunal, tendo, no caso concreto, a Mma Juíza “a quo” tomado em consideração o facto da altíssima taxa de álcool do R., o facto de o veículo conduzido pelo R. ter levado uma série de carros à frente, quando os mesmos até estavam estacionados a uma hora da manhã (04.15 h) em que não havia trânsito.
9. E, foi convicção do Tribunal “a quo” ter o R. agido sob a influência do álcool, ou seja, ter havido nexo de causalidade entre o álcool e o acidente, a qual está correctamente fundamentada, tendo em conta a motivação dos factos provados.
10. Deste modo, não foi violada a legislação indicada nas doutas alegações da Apelação.

II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO;
Questões a apreciar:

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir as questões suscitadas pelo apelante, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das alegações, nos termos dos artigos 660º, nº 2, 664º, 684º, nºs 3 e 4 e 690º, nº 1, todos do Código de Processo Civil (CPC).

Vejamos as questões que o recorrente suscitou e que importará apreciar:

1 – Impugnação da matéria de facto.
2 - Presunções judiciais, fraude à lei, inconstitucionalidade e desrespeito material pela jurisprudência uniformizadora.
3 – Nulidade da sentença (art.º 668.º, n.º 1, al. b), do CPC).

III – FUNDAMENTOS

1. De facto

Na primeira instância deram-se como provados os seguintes factos:
1 - Por via de fusão com a Sociedade Portuguesa de Seguros, SA, a Portugal Previdente – Companhia de Seguros, S.A. passou a adoptar a firma A.... – al. A) da matéria assente.
2 - A responsabilidade civil emergente da circulação do veículo 10-44-NA estava transferida para a Autora por contrato de seguro titulado pela apólice nº 316.924 – al. D) da matéria assente.
3 - No dia 29/02/00, pelas 04,15 horas, na R. Padre António Vieira, em Coimbra, ocorreu um acidente de viação com os veículos ligeiros de passageiros com as matrículas 10-74-NA, 08-04-LR, 40-43-MS e VB-11-75 – al. B) da matéria assente.
4 - O veículo 10-44-NA era conduzido pelo Réu – al. C) da matéria assente.
5 - O R. circulava na referida artéria no sentido Avª Sá da Bandeira / Couraça dos Apóstolos – al. E) da matéria assente.
6 - Ao descrever uma curva à direita em frente da Associação Académica, saiu da sua hemi-faixa de rodagem; invadiu a hemi- -faixa da esquerda, atento o sentido de marcha que levava e foi embater numa fila de veículos que se encontravam estacionados – als. F), G) e H) da matéria assente.
7 - Assim, embateu com a frente na traseira do veículo 08-04-LR – al. I) da matéria assente.
8 - Com a força do embate, o 08-04-LR foi projectado para a frente e embateu com a frente na traseira do 40-43-MS – al. J) da matéria assente.
9 - Ainda a violência do embate levou o 40-43-MS a embater com a frente na traseira do VB-11-75 – al. L) da matéria assente.
10 - No momento do acidente o R. encontrava-se alcoolizado, apresentando uma taxa de alcoolémia de 1,41 g/l – resposta ao quesito 1º.
11 - Devido a esse facto, o Réu conduzia o veículo com os sentidos entorpecidos e com limitações nos reflexos – respostas aos quesitos 3º e 4º.
12 - Os factos mencionados nas respostas aos quesitos anteriores contribuíram para a eclosão do embate – resposta ao quesito 5º.
13 - Em consequência do acidente, o veículo 08-04-LR sofreu danos no valor de 1.478.324$00, tendo a A. acordado com a sua proprietária pagar-lhe o valor de 1.026.500$00, ficando esta com os salvados – als. M) e N) da matéria assente.
14 - A Autora pagou a quantia referida na alínea anterior em 2 de Maio de 2000 – al. O) da matéria assente.
15 - A reparação do 40-43-MS foi orçada em 211.026$00; quantia essa que a Autora pagou em 29 de Março de 2000 – als. P) e Q) da matéria assente.
16 - A Autora suportou despesas com a elaboração, tramitação e conclusão do respectivo processo de sinistro no montante de 250,00 € - al. R) da matéria assente.

2. De direito

Tendo presente as questões supra enunciadas como relevantes para a decisão do presente recurso, comecemos por apreciar a primeira aí indicada:

1 – Impugnação da matéria de facto

Sustenta o apelante que a decisão de facto deverá ser alterada, no que concerne às respostas que foram dadas aos quesitos 3.º, 4.º e 5.º, da base instrutória, na medida em que o Tribunal a quo deu-os como provados, sustentado em presunções judiciais, as quais revelam-se abusivas, no entender do recorrente, pois que nenhum outro elemento de prova – designadamente documental ou testemunhal – terá reforçado ou, no mínimo, indiciado a verificação positiva de tal factualidade.

Antes de nos debruçarmos sobre a questão em concreto, vejamos o enquadramento legal relativo à apreciação em segunda instância da matéria de facto dada como provada na primeira.

O art.º 712.º do CPC, refere nas três alíneas do seu n.º 1, quais as situações em que o Tribunal da Relação pode alterar a decisão de facto estabelecida na 1.ª instância, indicando-se por seu turno no n.º 1 do art.º 690.º-A, do mesmo diploma legal, quais os procedimentos que o(a) recorrente deve assumir para que tal reapreciação possa verificar-se.

Assim, deverá o(a) recorrente especificar “quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados” (al. a), do n.º 1 desse último dispositivo), bem como “quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida” (al. b) do mesmo normativo).

Ainda no tocante às situações que permitem a modificabilidade da decisão de facto, haverá que ter presente a posição dominantemente aceite na jurisprudência que aponta no sentido de tal reapreciação não poder subverter o princípio da livre apreciação das provas consagrado no art.º 655.º do CPC.

Como muito bem é salientado no Acórdão da Relação do Porto de 19/9/2000, in CJ, Ano XXV, T. 4, págs. 186 “…o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1.ª instância sobre a matéria de facto deve restringir-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova disponíveis e aquela decisão, nos concretos pontos questionados”.

Este é aliás o sentido que o legislador pretendeu dar à possibilidade do duplo grau de jurisdição, em sede de matéria de facto, pois que expressamente refere no preâmbulo do diploma que possibilitou a documentação da prova (Dec.-Lei n.º 39/95, de 15/12) que “…a garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência – visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente sempre terá o ónus de apontar claramente e fundamentar na sua minuta de recurso”.

Tendo presentes estes princípios orientadores, vejamos agora se o apelante deu cumprimento aos procedimentos legalmente exigíveis que lhe possibilitam o recurso sobre a decisão de facto e, em caso afirmativo, se lhe assiste razão.

Sob o ponto de vista formal, há que concluir que o apelante cumpriu os pressupostos bastantes para que possa ser apreciada a sua questão de reapreciação da matéria de facto julgada na 1.ª instância.

Com efeito, o recorrente entende que as respostas dadas aos quesitos 3.º, 4.º e 5.º, deveriam ser em sentido negativo (não provados), contrariando assim o teor das respostas dadas (provados), sendo que invoca para tal desiderato a necessidade de se valorar diferentemente do que se fez, todos os elementos de prova constante dos autos, considerando ainda que a “matéria de facto carece de fundamentação probatória objectiva suficiente para dar como adquiridos factos que, na dúvida, deveriam ter sido considerados como não provados”.

Por outras palavras, entende que não existiam elementos bastantes para que a Senhora Juíza do Tribunal a quo, recorrendo a presunções judiciais, desse como provados tais quesitos.

Para aquilatarmos da razão ou não do recorrente, interessará previamente situarmos a problemática em questão.

Encontramo-nos perante uma acção em que uma seguradora (apelada) vem exercer o seu direito de regresso perante um seu segurado (apelante), na sequência do pagamento de uma indemnização que efectuou a terceiros, por via de um acidente de viação em que o seu segurado foi interveniente.

O pedido formulado pela seguradora alicerça-se, sob o ponto de vista legal, no disposto no art.º 19.º do Dec.-Lei n.º 522/85, de 31/12.

Reza assim o art.º 19.º alínea c) (a que ao caso interessa), de tal diploma: “satisfeita a indemnização, a seguradora apenas tem direito de regresso:
“c) Contra o condutor, se este não estiver legalmente habilitado ou tiver agido sobre a influência do álcool, estupefacientes ou outras drogas ou produtos tóxicos, ou quando haja abandonado o sinistrado”.

Tal preceito deu origem a interpretações diferentes, gerando alguma controvérsia doutrinal e jurisprudencial, sendo certo porém que hoje não se justifica dissertar sobre a melhor interpretação a dar a essa alínea, no que concerne à necessidade ou não de nexo de causalidade entre o álcool e o acidente causado pelo condutor, bem como à respectiva repartição do ónus da prova, pois que entretanto foi proferido acórdão uniformizador de jurisprudência Acórdão do STJ n.º 6/2002, de 28 de Maio de 2002, in DR I-A, de 18/7/2002 no seguinte sentido: ”a alínea c) do art.º 19.º do Decreto-Lei n.º 522/85, de 31 de Dezembro, exige para a procedência do direito de regresso contra o condutor por ter agido sob a influência do álcool o ónus da prova pela seguradora do nexo de causalidade adequada entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente”.

Para a procedência de tal pedido não basta que a seguradora prove que o condutor circulava sob os efeitos do álcool, antes se torna necessário que comprove que a alcoolémia do condutor tenha estado na base (pelo menos parcelarmente) da verificação do acidente.

Aqui chegados, vejamos o que ocorreu no âmbito deste nosso processo, na 1.ª instância.

A Senhora Juíza deu como provados os quesitos 1.º a 5.º, sendo que quanto aos 2.º a 5.º, o fez através do recurso a presunções judiciais, tendo referido expressamente na fundamentação a tais respostas que as testemunhas inquiridas, pouco adiantaram em concreto, com excepção duma delas que confirmou o teor de alcoolémia do segurado, ora recorrente.

Veja-se o teor da fundamentação das respostas à matéria de facto: “Apenas foram inquiridas duas testemunhas: José Monteiro (agente que elaborou a participação) e Maria de Lourdes Brito Monteiro.
“A 2.ª testemunha nada declarou de concreto, sendo certo que não presenciou o acidente.
“A 1.ª testemunha limita-se a confirmar o que consta da participação, sendo certo que também não presenciou o acidente.
“Perante o teor da participação e o depoimento desta testemunha, é certo que o Réu, no momento do acidente, apresentava uma taxa de alcoolemia de 1,41g/l.”
“Daí a resposta ao quesito 1.º.
“É um facto que a Autora tem o ónus de provar o nexo de causalidade entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente.
“É certo, todavia, que a prova absoluta desse facto é muito difícil ou mesmo impossível pelo que só o recurso a presunções naturais ou judiciais poderá, em conjugação com as demais circunstâncias do acidente, tornar possível a prova desse facto.
“No caso sub judice, o único facto que resultou do depoimento da testemunha inquirida foi o facto do Réu conduzir com uma taxa de alcoolémia de 1,41g/l.
“É um facto notório e resulta das regras da experiência e senso comum que uma tal taxa de alcoolemia entorpece os sentidos e determina limitações nos reflexos do condutor (embora tais limitações possam variar, em grau, de pessoa para pessoa).
“De acordo com as mesmas regras de experiência e senso comum, afigura-se-me ser de concluir que, dadas as circunstâncias em que ocorreu o acidente, só aquele facto pode explicar o embate.
“Com efeito, e como resulta da matéria de facto já assente, o Réu, ao descrever uma curva à direita, saiu da sua hemi-faixa de rodagem e foi embater numa fila de veículos que se encontravam estacionados.
“Ou seja, para a eclosão do embate, não concorreu qualquer movimento dos veículos embatidos que, como se referiu, se encontravam estacionados.
“Note-se, por outro lado, que o embate terá assumido alguma violência já que o embate num dos veículos determinou a projecção deste para a frente e consequente embate noutro veículo que, por sua vez, foi igualmente projectado para a frente embatendo num outro que se encontrava estacionado.
“Ora, se o Réu circulava a 50km/hora – como alega – apenas a limitação ou quase inexistência de reflexos poderá ter determinado aquele embate já que, aparentemente, o Réu não terá sequer travado o veículo (pois se o fizesse o embate não teria assumido as proporções que assumiu). Ainda que o piso estivesse molhado e ainda que existisse um veículo parado –conforme alega o Réu – qualquer pessoa em circunstâncias normais e à velocidade de 50km/hora teria imobilizado o veículo, ou pelo menos, teria travado e não ocorreria o embate com aquelas proporções.
“O embate – nas circunstâncias em que ocorreu – poderia ainda encontrar explicação na velocidade excessiva e muito superior a 50km/hora que o Réu imprimia ao veículo e que não lhe permitiu o seu controlo e imobilização e imobilização. Mas, se assim foi, seguramente que a influência do álcool também não terá sido alheia a esse facto.
“Dadas as circunstâncias em que ocorreu o embate, não é razoável - de acordo com as regras de experiência – supor que a condução sob a influência do álcool foi totalmente indiferente para a verificação do embate, sendo certo que nenhuma explicação plausível foi apresentada. Com efeito, a explicação apresentada pelo Réu (caso se tivesse provado) não seria suficiente já que, ainda que os factos que alegou tivessem ocorrido, afigura-se-me que, à velocidade de 50km/hora, o Réu, se não estivesse sob o efeito do álcool, teria imobilizado ou, pelo menos reduzido a velocidade do veículo (accionando os órgãos de travagem) por forma a evitar o embate, ou, pelo menos, a minorar as suas consequências.
“Afigura-se-me, pois, ser de concluir que o Réu tinha os sentidos entorpecidos e limitações nos reflexos e que esse facto contribuiu para o embate (se é que não foi a sua causa exclusiva).
“Daí as respostas aos quesitos 2.º a 5.º.
“Os demais factos não resultaram da prova produzida. Daí a resposta negativa aos demais quesitos.”

Como se vê, a Senhora Juíza do Tribunal a quo recorreu a presunções judiciais para dar como provados os factos integrantes dos quesitos 2.º a 5.º (ou melhor, 3.º a 5.º, pois que no 2.º, deu-se por “provado apenas o que consta das respostas aos quesitos 3.º e 4.º”).

Na definição legal, presunções judiciais, são as ilações que o julgador tira de um facto conhecido (facto base da presunção) para afirmar um facto desconhecido (facto presumido) (art.º 349.º do C.C.), segundo as regras de experiência da vida, da normalidade, dos conhecimentos das várias disciplinas científicas, ou da lógica.

As presunções judiciais, também designadas materiais, de facto ou de experiência, não são, em rigor, como refere Vaz Serra, Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 108.º, pág. 352 verdadeiros meios de prova, mas antes meios lógicos ou mentais ou operações firmadas nas regras da experiência. Na acepção de Antunes Varela Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 123, pág. 58, nota 2, trata-se duma “operação de elaboração das provas alcançadas por outros meios”, reconduzindo-se por essa forma a simples “prova da primeira aparência”, baseada em juízos de probabilidade Vd. Acórdão do S.T.J. de 25/01/05, in www.dgsi.pt.

No caso, os factos certos de que o julgador partiu (de acordo com a fundamentação apresentada) foi a circunstância do condutor Réu (ora apelante) apresentar uma TAS de 1,41g/l, e de o mesmo ter descrito uma curva à direita, saindo da sua hemi-faixa de rodagem, indo embater numa fila de veículos que se encontravam estacionados na hemi-faixa de rodagem da esquerda, tendo-se verificado o denominado efeito “carambola” entre o seu veículo e três outros.

Perguntar-se-á: será admissível ou, no mínimo, aceitável, retirar a ilação que a Senhora Juíza do Tribunal a quo retirou de tais factos para dar como provados os quesitos 3.º a 5.º?

A resposta, quanto a nós, será positiva.

Desde logo há que ter presente o grau elevado da taxa de álcool detectada no sangue do ora recorrente - 1,41g/l – a qual constitui pressuposto para a verificação do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. no art.º 292.º do Código Penal (poderá integrar tal crime quem conduzir veículo com uma TAS igual ou superior a 1,2g/l). Trata-se de um crime de perigo abstracto, que teve na génese da sua criação o reconhecimento da existência de estudos científicos que comprovavam que a condução com uma TAS igual ou superior a 1,2g/l, implicava um risco acrescido na circulação rodoviária, daí que o legislador não faça depender a verificação do crime da existência dum qualquer resultado danoso e se baste pela existência da TAS.

Ora o valor elevado de tal TAS não pode ser escamoteado, sendo certo que não se trata de fazer “funcionar” presunções judiciais automáticas como alguma doutrina advoga Vide Prof. Sinde Monteiro, na Anotação que fez ao Acórdão Unificador n.º 6/2002, nos Cadernos de Direito Privado, n.º 2, Abril/Junho de 2003, pág. 52 . Segundo estes, perante situações em que os condutores apresentam TAS superiores às legalmente admissíveis, designadamente iguais ou superiores a 1,2g/l (por serem as que estão na origem da punição criminal – art.º 292.º do Código Penal), justificar-se-ia uma inversão do ónus da prova, dada a altíssima probabilidade de a condução ser influenciada pelo excesso de álcool.

Com efeito, não podendo nem devendo funcionar automaticamente tal presunção, o que é certo é que o aplicador do direito, não pode também ser indiferente à realidade científica que, no caso, considera que uma TAS igual ou superior a 1,2g/l afecta a condução de veículos. Será pois mais um elemento a considerar (quiçá de grande importância) no caminho mental que o juiz tem de percorrer até chegar à conclusão que lhe permite afirmar que determinado facto estará ou não provado.

A experiência de vida, por outro lado, também aponta inequivocamente para que se considere que um acidente ocorrido às 04,15h, em que o condutor Réu (ora apelante) apresentava uma TAS de 1,41g/l, e em que o mesmo após ter descrito uma curva à direita, saiu da sua hemi-faixa de rodagem, indo embater numa fila de veículos que se encontravam estacionados na hemi-faixa de rodagem da esquerda, tendo-se verificado o denominado efeito “carambola” entre o seu veículo e três outros, terá ficado a dever-se, pelo menos em parte, ao facto de ter ingerido álcool em excesso.

Se a estes factos aduzirmos ainda a circunstância do próprio recorrente não ter conseguido apresentar qualquer outra possível causa para a verificação do acidente (e note-se que com isto não pretendemos dizer que o ónus da prova relativo ao nexo de causalidade adequada entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente lhe incumbia a si, antes sim que deveria apresentar versão que pudesse afastar os pressupostos em que assentou a presunção judicial que levou a que se considerassem provados alguns dos factos alegados), mais reforçada fica a posição da Senhora Juíza ao ter recorrido às presunções judiciais para dar como provados os factos que o recorrente ora pretende ver alterados.

Acresce ainda que o recorrente, nas suas doutas alegações não logrou demonstrar a existência de qualquer factualidade que por qualquer forma pudesse abalar os pressupostos em que assentaram as presunções judiciais que levaram à resposta positiva dos quesitos em causa.

Há também que ter presente que “Ao Tribunal de segunda jurisdição compete apurar a razoabilidade da convicção probatória de primeiro grau dessa mesma jurisdição face aos elementos que lhe são apresentados nos autos e, assim, não vai o Tribunal de segunda jurisdição à procura de uma nova convicção expressa pelo Tribunal mas à procura de saber se a convicção expressa pelo Tribunal a quo tem suporte razoável naquilo que a gravação da prova (com os demais elementos dos autos) pode exibir perante si (Ac. da R.C. de 5/07/2000 e de 3/10/2000, procs. N.ºs 2815/99 e 3425/99, ambos da 2.ª Secção – www.come.to/trc.pt)

Por tudo o que se deixa dito, entendemos pois que a valoração que foi feita pela Senhora Juíza à matéria de facto constante dos autos foi adequada, encontrando-se suficientemente fundamentada, nada tendo sido acrescentado pelo recorrente que pudesse levar-nos a alterá-la, nem sendo caso de, oficiosamente, este Tribunal o fazer.

Assim sendo, entende-se não assistir razão ao recorrente quanto a esta questão e, nessa medida, não deve a matéria de facto sofrer qualquer alteração.

2 – Presunções judiciais, fraude à lei, inconstitucionalidade e desrespeito material pela jurisprudência uniformizadora

Contrariamente ao que é afirmado pelo apelante, a utilização pelo julgador de presunções judiciais em casos como o presente, em que através delas se obtém a prova do nexo de causalidade adequada entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente, não constitui fraude à lei nem desrespeito material pela jurisprudência uniformizadora.

Com efeito, a lei não impede a utilização das presunções judiciais para comprovar o nexo de causalidade adequada supra descrito, nem tão pouco o Acórdão Unificador de Jurisprudência n.º 6/2002, afasta a possibilidade de tal meio de prova. A este propósito diz-se no acórdão do STJ de 15/06/2004 In www.dgsi.pt:

“Dos passos transcritos resulta à evidência que a Relação se serviu de presunções simples ou judiciais, cuja força probatória é idêntica à da prova por testemunhas, para dar como provado o nexo de causalidade entre a condução por parte do recorrente sob o efeito do álcool e o acidente.
“Ora, segundo orientação pacífica deste Tribunal, o problema do nexo de causalidade, na sua vertente naturalística (determinação em concreto do nexo causal entre o facto e o dano) envolve somente matéria de facto, pelo que
escapa ao controle do tribunal de revista, em razão do que dispõe o art.º 722º, nº 2, do CPC.
“Por outro lado, o Supremo Tribunal não conhece de presunções judiciais, justamente porque estas são simples meios de prova (art.ºs 349.º e 351.º do CC), não lhe cabendo, de igual modo, enquanto tribunal de revista, censurar o uso que a Relação delas faça no apuramento dos factos relevantes da causa. Só não será assim nas duas hipóteses previstas na parte final do citado art.º 722.º, n.º 2, nenhuma das quais, porém, ocorre na situação ajuizada.
“Com efeito, não há nenhuma disposição legal expressa que exija certa espécie de prova, diferente da presunção judicial, para fixar a existência do facto em análise (nexo causal), nem a lei proíbe que as instâncias concluam pela sua verificação a partir do mencionado meio probatório.”

Concluímos pois pela legalidade do meio de prova empregue, o qual não contraria em nada a jurisprudência uniformizadora do citado acórdão n.º 6/2002.

Refere ainda o apelante não ser admissível, por violação do art.º 349.º do CC, a presunção judicial extraída a partir de certos factos anteriormente dados como provados também através do recurso a uma presunção judicial.

Salvo o devido respeito, parece-nos que também aqui não assiste razão ao recorrente, desde logo porque não se regista uma situação em que a resposta ao quesito esteja na sua totalidade dependente de facto dado por provado através do recurso a presunção judicial. Com efeito, a resposta ao quesito que traduz o nexo de causalidade adequada entre a TAS e o acidente (resposta ao quesito 5.º) engloba também a resposta que foi dada ao quesito 1.º (“No momento do acidente o R. encontrava-se alcoolizado, apresentando uma taxa de alcoolémia de 1,41g/l”), a qual teve na sua base o resultado do teste de alcoolémia que foi realizado ao réu após o acidente.

Por outro lado, tal resposta ao quesito 5.º, mais não representa do que uma constatação de senso e experiência comuns, constituindo mero facto instrumental para suportar a necessidade de comprovar o nexo de causalidade adequada entre a ingestão do álcool e o acidente, situação que não sofre qualquer limitação de ordem legal para, parcelarmente, poder ser levada a efeito através do recurso a uma presunção simples. Em sentido idêntico se pronunciou o Acórdão do STJ de 18/11/2004 In www.dgsi.pt.

Pelo que deixamos exposto, não se vislumbra pois que por qualquer forma se tenha desrespeitado o disposto no artgs. 8.º, n.º 2 e 349.º do CC e 516.º do CPC.

No que concerne à pedida declaração de inconstitucionalidade da norma do art.º 349.º do CC, “quando interpretada de modo a permitir a criação de presunções que tenham como ponto de partida factos exclusivamente obtidos através de recurso a uma outra presunção judicial” (Conclusão XIII), sempre se dirá que tal questão fica prejudicada na sua apreciação, pois que como já se referiu o facto que foi dado como provado (resposta ao quesito 5.º), não teve na sua base exclusivamente um outro facto obtido através de presunção judicial. Assim, não se verificando um dos pressupostos que condicionava o indicado pedido, deixa de ter sentido a apreciação dessa questão.

Por tudo o que fica dito, há pois que concluir que também nesta questão não assiste qualquer razão ao recorrente.

3 – Nulidade da sentença (art.º 668.º, n.º 1, al. b), do CPC).

Refere finalmente o apelante que a sentença “violou frontalmente ou defraudou subtilmente, as seguintes disposições legais: … art.º 668.º, n.º 1, al. b), do CPC”.

A terminologia empregue (na medida em que nos encontramos face a um preceito que consagra as causas de nulidade da sentença) não é a correcta, pois que o preceito em causa não é susceptível de ser violado, sendo certo por outro lado que tão pouco foram invocados factos que consubstanciem a causa de nulidade da sentença que o preceito indicado prevê.

Estabelece-se na alínea b), do n.º 1, do art.º 668.º do CPC, ser nula a sentença: “Quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”.

Como vem sendo uniformemente entendido, apenas a falta absoluta de fundamentação, de facto ou de direito, constitui tal nulidade (Cfr. Alberto dos Reis, C.P.C. Anotado, pág. 140 e Acs. do STJ de 24.05.83, no BMJ 327º-663, de 04.11.93, na C.J.-STJ, 1993, 3º, 101; 19/03/2002, in “Revista Nº 537/02-2ª sec., Sumários, 03/02”; Ac. RC de 16/5/2000 in “www.dgsi.pt/jtrc”; e Acórdão da Relação do Porto de 15.05.2001, in www.dgsi.pt/jtrp, proc. nº 0120468).

Assim, quando tal falta de fundamentação seja apenas deficiente, incompleta ou até errada, poderá levar a que a mesma possa ser revogada ou alterada em recurso, mas nunca poderá determinar a sua nulidade.

Não se pode confundir a motivação da sentença (art.º 659.º do CPC) com a fundamentação a que se reporta o art.º 653.º, n.º 2, do mesmo diploma legal. Esta destrinça encontra-se bem explanada no douto Acórdão desta Relação de 11/01/2005 In, www.dgsi.pt: “Aquela (art.º 659.º), desdobra-se em fundamentação de facto e fundamentação de direito. Esta última (art.º 653.º), tem a ver com falta de motivação da prova, ou seja, a falta de análise critica das provas e bem assim da especificação dos fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador, e que, a verificar-se, não consubstancia a nulidade prevista no citado art.º 688.º, ou seja, não conduz à nulidade da sentença ou à anulação do julgamento mas levando tão somente a que o Tribunal da Relação, a requerimento da parte, faça remeter os autos à 1ª instância afim de aí ser suprida tal deficiência omissíva (cfr. artº 712, nº 4, do CPC, e nesse sentido vidé ainda, por todos, Ac. RC de 2/3/99, in “www.dgsi.pt/jtrc”; Ac do STJ de 10/1/2002, in “Rev . nº 2705/01, 2ª sec., Sumários 1/2002”; Ac do STJ de 10/1/2002, in “Rev . nº 3294/01, 7ª sec., Sumários 1/2002”, Lopes do Rego in “Comentários ao Código de Processo Civil, Liv. Almedina, pág. 434” e Lebre de Freitas in “Código de Processo Civil Anotado, 2º Vol., Coimbra Editora, pág. 628”).”

Tendo presentes estes pressupostos, e o que resulta expresso da decisão recorrida, sempre se dirá que não se vislumbra em que medida é que a sentença proferida no Tribunal a quo terá incorrido na nulidade apontada, pois que foi apresentada fundamentação de facto e de direito.

Daqui se conclui pois que também esta questão apresentada pelo apelante não terá vencimento.

IV - DECISÃO

Assim, face a tudo o que se deixa dito, acorda-se em negar provimento ao recurso e, consequentemente, mantém-se a sentença recorrida.



Coimbra,