Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
793/17.6PBCLD.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MARIA PILAR DE OLIVEIRA
Descritores: ALCOOLÍMETRO QUANTITATIVO;
VERIFICAÇÃO PERIÓDICA
Data do Acordão: 10/24/2018
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: VISEU (JUÍZO LOCAL CRIMINAL DE CALDAS DA RAINHA)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS. 1.º, 2.º, 4.º E 14.º DO REGULAMENTO DE FISCALIZAÇÃO DA CONDUÇÃO SOB INFLUÊNCIA DO ÁLCOOL OU DE SUBSTÂNCIAS PSICOTRÓPICAS, ANEXO À LEI N.º 18/2007, DE 17-05; ARTS. 152.º, AL. A), E 153.º DO CE; ARTS. 1.º E 4.º DO DL N.º 291/90, DE 20-09; PORTARIA N.º 1556/2007, DE 10-12
Sumário:
I – Os alcoolímetros quantitativos estão sujeitos a uma verificação periódica anual, ou seja, a realizar todos os anos civis.
II – Cada verificação periódica é válida até ao dia 31 de Dezembro do ano seguinte ao da sua efectivação.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra:

I. Relatório
No processo sumário 793/17.6PBCLD.C1 da Comarca de Leiria, Juízo Local Criminal de Caldas da Rainha, após realização da audiência de julgamento, foi proferida sentença em 18 de Janeiro de 2018, condenado o arguido A., como autor de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos artigos 292º, nº 1 e 69º, nº 1, alínea a) do Código Penal:
- Na pena principal de 60 dias de multa à taxa diária de oito euros, no montante de 480 euros;
- Na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de sete meses.

Inconformado com esta decisão dela recorreu o arguido A., rematando a correspondente motivação com as seguintes conclusões:
1-Entende o recorrente, com o devido respeito, que a sentença padece dos vícios do artigo 410º, nº2, alíneas a) e c), do CPP, isto porque face à prova produzida em audiência e a existente nos autos, nomeadamente o talão de controlo e auto de notícia, não poderia o Tribunal “a quo” dar como provado que o arguido ao ser submetido ao exame de pesquisa de álcool pelo método de ar expirado, acusou uma TAS de 2,024g/l.
2-O Tribunal “a quo”, considerou que o arguido confessou integralmente e sem reservas, os factos pelos quais vinha acusado, tendo dispensado qualquer outra prova.
3-Tendo a convicção do Tribunal, sido alicerçada, exclusivamente na confissão, a qual considerou ter sido efectuada de forma livre e espontânea.
4-No entanto, tal confissão só poderá relevar relativamente às quantidades, qualidades e circunstâncias em que o arguido ingeriu bebidas alcoólicas, uma vez que são os únicos factos de que pode ter conhecimento directo.
5-Já quanto à taxa de alcoolemia atribuída a mesma resulta, não do conhecimento do arguido, mas antes de um exame feito por uma máquina que acusa um dado resultado, não podendo a confissão do arguido abranger tal resultado.
6-Do resultado do exame faz prova o teor do talão de controlo, junto aos autos, do qual resulta que o exame de pesquisa de álcool no sangue que foi efectuado ao arguido, o foi através do aparelho DRAGER, modelo 7110MKIIIP.
7-O referido aparelho está regularmente aprovado para efeitos de fiscalização do estado de condução sob influência do álcool.
8-A questão que se coloca no presente recurso prende-se com o saber qual o valor probatório a conceder ao resultado de um controlo realizado com aparelho que, apesar de regularmente aprovado, ultrapassou o prazo de validade, sem ter sido objecto da competente verificação ou controle de medição.
9- Do talão de controle não consta qualquer data da última verificação, sendo que do Auto de Noticia consta que o aparelho utilizado no controlo efectuado ao arguido foi verificado pelo IPQ em 2016-05-05, tendo o arguido sido submetido ao controlo de pesquisa de álcool no sangue em 2017-12-30.
10- Em matéria de alcoolímetros regula a Portaria nº 1556/2007, de 10 de Dezembro, a qual estipula que “a verificação periódica é anual, salvo indicação em contrário no despacho de aprovação de modelo”, cfr. artigo 7º, nº2.
11- E estatuí o artigo 4º, nº5, do DL nº 291/90, de 20 de Setembro, que a verificação periódica é válida até 31 de Dezembro do ano seguinte ao da sua realização, salvo regulamentação em contrário.
12- Neste conspecto, há que interpretar adequadamente a norma prevista no artº 7ª, nº2 da Portaria nº 1556/2007, tendo sempre presente o estatuído no nº5 do artº 4º do Dec-Lei nº 291/90, de 20 de Setembro.
13- Com efeito, da leitura do regime geral do controlo metrológico depreende-se que aí se permite que a verificação periódica dos aparelhos permaneça com validade até ao dia 31 de Dezembro do ano seguinte àquele em que foi realizada a última verificação. Contudo, em tal regime não se vislumbra uma qualquer referência a um limite a que a verificação dos aparelhos esteja sujeita, seja mensal, semestral ou anual.
14-Ao invés, o regime especial consagrado no Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros prevê que a operação de verificação periódica dos instrumentos de medição nele regulados deve obedecer a uma certa temporalidade, designadamente, estabelece que os aparelhos têm obrigatoriamente de ser objecto de controlo metrológico com uma periodicidade anual, isto, a não ser que outra coisa resulte do despacho que tenha aprovado o modelo do aparelho, o que não sucede.
15-Temos que o nº2 do artº 7º da Portaria nº 1556/2007, de 10 de Dezembro, estabelece um regime especial em relação ao regime geral consagrado no nº5, do artº 4º do Dec-Lei nº 291/90, regulamentando-o especificadamente e prevalecendo sobre ele.
16-Resulta, assim, evidente que a verificação periódica dos alcoolímetros tem de ser realizada no prazo de um ano a contar da data da última verificação.
17- Neste sentido Acordão da Relação de Coimbra, de 25/03/2009, processo nº 141/08.6GTGRD.C1, publicado em www.dgsi.pt “(…) nos termos da portaria nº 1556/2007, de 10 de Dezembro, os aparelhos de medição de TAS são submetidos a verificação periódica anual. Cremos que o legislador terá fixado em 1 ano a verificação periódica destes aparelhos, por entender ser esse o limite máximo a partir do qual os aparelhos necessitam de ser submetidos a nova inspecção para determinar a sua fiabilidade enquanto meio de aquisição de prova.”
18-No caso dos autos, tendo o aparelho utilizado para pesquisa de álcool no sangue sido submetido a verificação periódica em 2016/05/05, à data do controlo efectuado ao arguido, a 2017/12/30, já há muito se encontrava ultrapassado o prazo de um ano prescrito no nº2 do artº 7º da aludida portaria.
19-Pelo que, tal facto põe em causa o estado e a fiabilidade do aparelho na concreta data a que se reportam os factos imputados ao arguido, não podendo valer como meio de prova um controle efectuado com um aparelho que ultrapassou o prazo de validade.
20-Com efeito, se a verificação periódica visa garantir a fiabilidade de um determinado aparelho de medição, no presente caso o alcoolímetro, é de por em causa tal fiabilidade quando o mesmo é utilizado em controlos ocorridos em momento posterior ao prazo máximo estabelecido para renovação da necessária verificação periódica.
21-Pelo que, em nosso entender, com o devido respeito, não pode ser valorada positivamente a prova obtida mediante a utilização de um aparelho de medição que ultrapassou o respectivo prazo de validade.
18/2007
23-Inexiste, assim, prova do facto, o que impõe o não preenchimento dos elementos típicos do crime e da existência deste, o que implica a absolvição do arguido.
24-A prova produzida impunha solução diametralmente oposta à alcançada pelo Tribunal.
25-A douta sentença, enferma, pois, do vícios do artigo 410º, nº2, alíneas a) e c) 26-Ao decidir como decidiu o Tribunal “a quo” violou o disposto nos artigos 292º, nº1 do Código Penal, 340º, nº1 e 2 e 410º, nº2, alíneas a) e c) do Código de Processo Penal.
Termos em que, em face do exposto, deve ser concedido provimento ao recurso, ora interposto, e em consequência, ser o arguido absolvido do crime de condução de veículo em estado de embriaguez.
Vossas Excelências, porém, farão como for de justiça!

O recurso foi objecto de despacho de admissão.

O Ministério Público respondeu ao recurso, concluindo que:
- Não subsiste qualquer dúvida que o aparelho utilizado estava devidamente aprovado e verificado, pelo que o resultado dele obtido é perfeitamente válido e juridicamente relevante.
- Ora, tendo o arguido sido fiscalizado antes de 31.12.2017, o resultado obtido pelo aparelho é válido e é-lhe imputável.
- Nestes termos, afigura-se-nos que o Tribunal a quo apreciou devidamente a prova produzida e a sentença proferida não nos merece qualquer reparo.
- Termos em que, negando provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida, farão V. Exas. Justiça!

Nesta Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento.
Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2 do Código de Processo Penal, não ocorreu resposta.
Efectuado o exame preliminar e corridos os vistos teve lugar conferência, cumprindo apreciar e decidir.
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II. Fundamentos da Decisão Recorrida
A sentença recorrida contém os seguintes fundamentos de facto:
Factos Provados:
No dia 30/12/2017, pelas 22:06h, o arguido conduziu o veículo automóvel ligeiro, Seat, … com a matricula … na Rua … em ….
Sujeito a exame de pesquisa de álcool pelo método de ar expirado, através do aparelho Drager Alcotest 7110MKIII P o arguido acusou uma TAS de 2,024 g/l.
O Arguido agiu deliberada, livre e conscientemente, sabendo que a sua conduta era proibida e punidas e sabendo que não podia conduzir veículo automóvel na via pública após a ingestão de bebidas alcoólicas.
Naquele dia o arguido havia estado no … em … a comemorar a vitória do jogo do … na Taça de Portugal.
O arguido tem como habilitações literárias a licenciatura de engenharia do ambiente, encontrando-se a frequentar o 1º ano do mestrado de estudos de ambiente e sustentabilidade no ISCTE em Lisboa.
Durante a semana mora em Lisboa numa casa que partilha com dois colegas, sendo as suas despesas pessoais e de estudos suportadas integralmente pelos seus progenitores, residentes na ….
O Arguido confessou os factos de forma integral e sem reservas, demonstrando arrependimento.
O arguido foi condenado por sentença de 20.8.2012, transitada em julgado em 1.10.2012, pela autoria em 19.8.2012 de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 89 dias de multa à taxa diária de 10 euros e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de cinco meses, penas extintas pelo cumprimento.

Não resultaram provados outros factos com interesse para a decisão da causa.

Motivação:
Para a decisão da matéria de facto foram decisivas as declarações do arguido que confessou integralmente e sem reservas os factos de que vem acusado e bem assim o tero do auto de notícia de fls. 2 e 3 e do documento junto a fls. 4 relativo ao exame de pesquisa de álcool do sangue efectuado através de aparelho certificado de modelo indicado.
Ainda do certificado de registo criminal junto aos autos a fls. 14 a 16.
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III. Apreciação do Recurso
A documentação dos actos da audiência determina que este Tribunal possa conhecer de facto e de direito como resulta do disposto nos artigos 363º e 427º do Código de Processo Penal. Mas, o objecto do recurso delimita-se através das conclusões extraídas pelo recorrente e formuladas na motivação (cfr. artigos 403º, nº 1 e 412º, nº 1 e nº 2 do Código de Processo Penal) sempre sem embargo dos poderes de conhecimento oficioso.
Ora, vistas as conclusões do recurso interposto, a questão que reclama solução restringe-se se a sentença recorrida padece dos vícios de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e de erro notório na apreciação da prova por ter considerado provada a condução sob efeito do álcool com base em resultado de aparelho não sujeito a verificação no prazo legal.

Apreciando:
Entende o recorrente que o aparelho utilizado para medição da taxa de álcool no sangue encontrava-se fora das condições legais porque tendo sido verificado em 5.5.2016, em 30.12.2017, quando foi usado para determinar a taxa de álcool no sangue do arguido, havia decorrido mais de um ano. Parte, portanto, do pressuposto de que não pode decorrer mais de um ano entre verificações.
Entende que tal vicia a sentença de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e de erro notório na apreciação da prova e que não deve ser considerado provado que o arguido conduzia sob o efeito do álcool com a sua consequente absolvição posto que o meio de prova utilizado é inválido.

Vejamos.
O que se verifica é que o recorrente impugna os pontos da matéria de facto provada constante dos parágrafos 2º e 3º, pretendo que os mesmos sejam considerados não provados, alicerçando a sua tese argumentativa na alegada circunstância de o aparelho utilizado na determinação do valor de álcool no sangue (marca Drager Alcotest, modelo 7110 MKIII) não ter sido objecto de verificação periódica obrigatória, sendo que, na data do exame efectuado nos autos, já havia decorrido mais de 1 ano sobre a data da última verificação.
Não estão em causa os vícios invocados, porque, ademais, o texto da decisão recorrida os não revela, sendo essa a forma legal do seu reconhecimento nos termos que constam do corpo do nº 2 do artigo 410º do Código de Processo Penal.
Mas, esquecendo o erro quanto ao fundamento de recurso invocado, formal e sem implicação na apreciação da substância da pretensão, vejamos se lhe assiste razão.
Assim, os factos a ter em consideração e documentados nos autos são que o aparelho foi verificado em 5.5.2016 (cfr. certificado de verificação de fls. 13) e foi utilizado para detecção da presença de álcool no sangue do arguido em 30.12.2017
Estatui o art. 152.º, n.º 1, al. a) do Código da Estrada (versão do DL n.º 44/2005, de 23-02):
«1 - Devem submeter-se às provas estabelecidas para a detecção dos estados de influenciado pelo álcool ou por substâncias psicotrópicas:
a) Os condutores;
b) (...)».
E preceituam os artigos 1.º, 2.º e 4.º do Regulamento de fiscalização da condução sob influência do álcool ou de substâncias psicotrópicas, anexo à Lei n.º 18/2007, de 17 de Maio:

Artigo 1º

«1 - A presença de álcool no sangue pode ser indiciada por meio de teste no ar expirado, efectuado em analisador qualitativo.
2 - A quantificação da taxa de álcool no sangue é feita por meio de teste no ar expirado, efectuado em analisador quantitativo, ou por análise de sangue.
3 - A análise de sangue é efectuada quando não for possível realizar o teste em analisador quantitativo».
Artigo 2º

«1 - Quanto o teste realizado em analisador qualitativo indicie a presença de álcool no sangue, o examinando é submetido a novo teste, a realizar em analisador quantitativo (...).
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, o agente de autoridade acompanha o examinando ao local em que o teste possa ser efectuado, assegurando o seu transporte, quando necessário.
(...)».
Artigo 4º

«1 - Quando, após três tentativas sucessivas, o examinando não conseguir expelir ar em quantidade suficiente para a realização do teste em analisador quantitativo, ou quando as condições físicas em que se encontra não lhe permitam a realização de teste, é realizada análise de sangue.
(…)».
A análise conjugada destes normativos permite extrair que a detecção qualitativa de álcool no sangue pode fazer-se com recurso ao teste de ar expirado, com utilização de aparelho aprovado para o efeito. Quanto qualitativamente indiciada a presença de álcool no sangue, o examinando é submetido a novo teste, este destinado a determinar o valor daquela substância no sangue.

Em conformidade com o preceituado no artigo 153.º do Código da Estrada, estabelece o artigo 14.º, n.º 1, do mencionado Regulamento: «nos testes quantitativos do álcool no ar expirado só devem ser utilizados analisadores que obedeçam às características fixadas em regulamentação e cuja utilização seja aprovada por despacho do presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária».
Em face do disposto no n.º 2 da mesma norma, tal aprovação é precedida de homologação de modelo pelo IPQ, nos termos do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros.
O regime legal do controlo metrológico dos métodos e instrumentos de medição envolvidos em «operações comerciais, fiscais ou salariais, ou utilizados nos domínios da segurança, da saúde ou da economia de energia, bem como das quantidades dos produtos pré-embalados e, ainda, dos bancos de ensaio e demais meios de medição abrangidos no artigo 6.º», está previsto no Decreto-Lei nº 291/90 de 20 de Setembro.
De acordo com o preceituado neste diploma, os alcoolímetros quantitativos dever ser sujeitos às seguintes operações de controlo: aprovação de modelo”, “primeira verificação”, “verificação periódica” e “verificação extraordinária” (artigo 1º, nº 3).
O caso em apreço levanta a questão da “verificação periódica”, que consiste, nos termos do artigo 4º, nº 1, no «conjunto de operações destinadas a constatar se os instrumentos de medição mantêm a qualidade metrológica dentro das tolerâncias admissíveis relativamente ao modelo respectivo (…)» e que nos termos do nº 5 do mesmo artigo « é válida até 31 de Dezembro do ano seguinte ao da sua realização, salvo regulamentação específica em contrário».
No que concerne aos alcoolímetros quantitativos ou analisadores quantitativos, o controle metrológico é da competência do Instituto Português da Qualidade, I.P. - IPQ (artigo 5º, nº 1) e compreende as operações de aprovação de modelo, primeira verificação, verificação periódica e verificação extraordinária (artigo 5º, nº 2), sendo que, em conformidade com o artigo 7.º, n.º 2, «a verificação periódica é anual, salvo indicação em contrário no despacho de aprovação do modelo».
Remetemos agora para a fundamentação constante do Acórdão desta Relação de Coimbra de 13.12.2011 (processo n.º 89/11.7GCGRD.C1, in www.dgsi.pt) do seguinte teor:
«O Dec. Lei n.º 291/90, de 20 de Setembro, como já tivemos oportunidade de referir, estabelece o regime de controlo metrológico dos métodos e instrumentos de medição em Portugal. Por isso, o seu universo de aplicação, quanto aos instrumentos de medição, é muitíssimo mais vasto do que o campo específico dos analisadores quantitativos, razão pela qual nenhum sentido faria que um diploma legal com tal amplitude, estabelecesse a frequência temporal da verificação periódica especificamente aplicável a cada grupo de aparelhos abrangido pelo seu vasto campo de aplicação. Daí que se tenha limitado a fixar o termo do período de validade de cada verificação periódica, fazendo-o coincidir com o último dia do ano seguinte ao da sua realização (art. 4.º, n.º 5).
Já o RCMA, como aliás, seria expectável, estabeleceu a frequência temporal da verificação periódica para os únicos aparelhos abrangidos pelo seu campo de aplicação, os analisadores quantitativos (art. 7.º, n.º 2), sem fixar, por outro lado, qualquer prazo de validade da mesma [o que bem se compreende, pois o diploma regulamentado já o havia fixado]. Ou seja, enquanto o Dec. Lei n.º 291/90, de 20 de Setembro fixou o termo do período de validade de cada verificação periódica, relativamente a todos os aparelhos de medição, o RCMA fixou apenas a frequência temporal da verificação periódica dos alcoolímetros quantitativos, o que vale dizer que não existe sequer intersecção parcial entre o âmbito de previsão das duas normas referidas.
Daí que, o art. 7.º, n.º 2 do RCMA, não constitua uma regulamentação específica em contrário, relativamente ao art. 4.º, n.º 5, do Dec. Lei n.º 291/90, de 20 de Setembro. E por isso, quando no art. 7.º, n.º 2, do RCMA se lê que a verificação periódica é anual, o sentido a extrair da frase, tendo em conta a presunção do art. 9.º, n.º 3 do C. Civil, é o de que a verificação periódica tem lugar todos os anos ou seja, que os alcoolímetros a ela têm que ser submetidos, pelo menos uma vez, em cada ano civil. Com efeito, pretender ler na norma, como faz o recorrente, que entre as sucessivas verificações periódicas do mesmo alcoolímetro não pode decorrer mais de um ano ou seja, não podem decorrer mais de 365 dias contados dia a dia, é dar-lhe, ressalvado sempre o devido respeito, interpretação que ela, manifestamente, não comporta pois não tem na letra da lei um mínimo de correspondência verbal. Desta forma, no que aos alcoolímetros quantitativos respeita, podemos fixar as seguintes regras:
- Estão sujeitos a uma verificação periódica anual, isto é, a realizar todos os anos civis (art. 7.º, n.º 2, do RCMA, aprovado pela Portaria 1556/2007, de 10 de Dezembro):
- Cada verificação periódica é válida até ao dia 31 de Dezembro do ano seguinte ao da sua realização (art. 4.º, n.º 5, do Dec. Lei n.º 291/90, de 20 de Setembro)».
Perante esta argumentação que prima, segundo entendemos, por ser clara e convincente, resta-nos subscrevê-la integralmente.
Aliás, Acórdão parcialmente transcrito reflecte a jurisprudência constante desta Relação também plasmada nos Acórdãos proferidos nos processos 396/10.6GAPMS.C1 de 3.7.2012, 135/11.4GCPMS.C1 de 26.9.2012 e 196/10.3PTLRA.C1 de 30.1.2013, todos publicados no mesmo sítio.
Ainda se citam no mesmo sentido os Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 27.04.2011 (proc. nº 242/10.0GAALJ.P1), 25.05.2011 (proc. nº 182/10.3GAALJ.P1) de 14.12.2011 (proc. nº 63/10.0GASBR.P1) e de 18.01.2012 (proc. n.º 273/10.0GAAL.J.P1), todos publicados no mesmo sítio.
Assim, tendo o alcoolímetro quantitativo, Drager 7110 MK III utilizado no caso sido submetido a verificação periódica em 5 de Maio de 2016, quando aquele exame teve lugar, em 30 de Dezembro de 2017, estava em curso o período de validade da verificação, que apenas terminaria em 31 de Dezembro de 2017.
Logo, a valoração pelo tribunal a quo do resultado do exame não se reconduziu a valoração de prova proibida, podendo e devendo, ao invés, a prova nele consubstanciada ser valorada, como sucedeu.
Assim, a pretensão do recorrente, de ser absolvido do crime de condução em estado de embriaguez que lhe foi imputado, assente apenas na alteração da matéria de facto provada que não pode ter acolhimento não pode proceder.
Com efeito, mantendo-se os pressupostos de facto que determinaram a condenação do arguido pela prática daquele ilícito penal, improcede o recurso.
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IV. Decisão
Nestes termos e com tais fundamentos, acordam em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido, mantendo a sentença recorrida.
Pelo seu decaimento em recurso condena-se o recorrente em custas, fixando a taxa de justiça devida em três UC (cfr. artigo 513º, nº 1 do Código de Processo Penal).
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Coimbra, 24 de Outubro de 2018
(Texto elaborado e revisto pela relatora)

Maria Pilar de Oliveira (relatora)

José Eduardo Martins (adjunto)