Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1247/05
Nº Convencional: JTRC
Relator: MONTEIRO CASIMIRO
Descritores: CASA DA MORADA DE FAMÍLIA
REVOGAÇÃO DA DECISÃO
FILHO QUE ATINGE A MAIORIDADE
Data do Acordão: 05/31/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA FIGUEIRA DA FOZ
Texto Integral: S
Meio Processual: AGRAVO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTº 1793º, Nº 1 E 2, DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: I – O artº 1793º, nº 1, do Código Civil, ao referir como um dos factores de atribuição da casa de morada de família o interesse dos filhos do casal, diz respeito aos filhos menores, por serem estes que, normalmente, estão na dependência dos pais, necessitando da protecção e apoio destes.

II – A circunstância, no entanto, de o filho atingir a maioridade, só por si, não é motivo de resolução do arrendamento da casa de morada de família, nos termos do disposto no nº 2 daquele normativo, se ele continua a viver com a mãe (ou o pai), em favor de quem o arrendamento fora constituído, já que a maioridade pode não significar autonomia, podendo o filho continuar na dependência económica dos pais e, portanto, a necessitar de viver com eles.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

A... veio, em 11/04/2003, requerer a alteração da decisão proferida em 28 de Abril de 1997, no âmbito da acção de divórcio que correu termos no Tribunal Judicial da Figueira da Foz sob o nº 339/94, que atribuiu a casa de morada de família à requerida B..., na sequência do divórcio que pôs termo à sociedade conjugal constituída por ambos.
Tal decisão atribuiu a casa de morada de família à requerida, B..., fixando o valor da renda de 15.000$00 a pagar pela requerida ao ora requerente A....
O requerente alegou, em síntese, que é o proprietário exclusivo, porque bem próprio, da casa onde reside a requerida com o seu filho; o filho de ambos é maior, e aufere rendimentos próprios; o requerente vive em condições precárias num anexo da referida casa que foi construído para ser uma oficina, o requerente não tem bens que lhe permitam adquirir ou arrendar uma casa para habitação própria, encontra-se aposentado por invalidez; por sua vez a requerida tem uma casa sita no lugar de Azenha, concelho de Soure, que dista 4 km da actual morada, que lhe adveio por herança; trabalha no Posto Clínico de Calvino, faz limpezas na farmácia de Calvino e na escola primária do Sobral, auferindo rendimentos dessa actividade; tem automóvel próprio que lhe permite efectuar as deslocações.
Termina, pedindo que seja revogada a decisão que atribuiu a casa de morada de família à requerida, restituindo-se a mesma ao requerente, seu legítimo proprietário.
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A requerida contestou, alegando, como questão prévia, a ilegitimidade do requerente na medida em que, na sua óptica, o bem, não sendo demonstrada a propriedade exclusiva, careceria de legitimidade, e impugnou, vindo dizer, em súmula, que o requerente não é o único dono e legítimo proprietário do prédio onde reside, já que é um bem comum do casal; a requerida aufere a título de salário a quantia mensal de € 487,22, não possui qualquer casa de habitação sita na Azenha, sendo que tal casa é parte da herança indivisa de seus pais; por sua vez o requerente é uma pessoa de posses económicas, auferindo uma pensão do Luxemburgo; é agricultor de onde retira subsídios na ordem dos € 7.500,00 anuais, dos 11 prédios rústicos de que é proprietário; tem dois veículos automóveis; as condições em que vive devem-se unicamente à sua vontade, pois tem meios para viver em melhores condições; é possuidor de uma casa de habitação sita na localidade de Torneira, que dista aproximadamente 2 km de Atouguia, concluindo assim, pela manutenção da decisão que lhe atribui a casa de morada de família.
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Inquiridas as testemunhas arroladas pelas partes, foi proferida sentença, que indeferiu a requerida alteração da atribuição da casa de morada de família.
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Na 1ª instância foi dado como provado o seguinte:
1 - Requerente e requerida foram casados até à data da sentença que decretou o divórcio entre eles (3-05-1995, fls. 64 do autos de processo nº 399/94 apensados).
2 - Requerida e requerente são pais de C..., e nos termos da regulação do exercício do poder paternal, o filho, à data, ficou entregue à guarda da Requerida.
3 - A requerida trabalha como auxiliar de apoio e vigilância no Posto Clínico de Calvino, freguesia de Borda do Campo, auferindo o rendimento de € 487,22.
4 - Além da actividade supra descrita, a requerida faz diariamente, em part time, limpezas na farmácia de Calvino diariamente e na escola primária do Sobral, não tendo sido possível apurar as quantias que daí advêm, sendo que as mesmas são remuneradas.
5 - Nessas deslocações usa o veículo Seat Marbella de matrícula 55-12-BA, que se encontra registado a favor de Aldina Maria das Neves Rodrigues.
6 - A requerida tem a disponibilidade absoluta e em exclusivo do veículo.
7 - Os locais onde exerce a actividade profissional situam-se todos naquelas redondezas.
8 - A requerida vive na casa de morada de família com o filho de ambos, que não obstante ser maior, trabalhar e obter rendimentos do trabalho numa fábrica em Pombal, continua na companhia da mãe que lhe lava a roupa, confecciona as refeições e trata dos restantes afazeres da casa.
9 - Por acordo feito em vida do seu pai, a requerida, conjuntamente com o seu irmão fizeram a atribuição dos bens que pertenciam aos seus pais.
10 - Dos lotes de tal acordo ficou para a requerida uma casa sita na Azenha, concelho de Soure, da qual tem a chave, paga a luz e tem a utilização exclusiva.
11 - A casa é de um piso só composta por dois quartos, uma sala e cozinha, sendo que as divisões são de pequenas dimensões.
12 - A casa em causa não tem casa de banho, não tem água canalizada nem esgotos.
13 - Até ao presente a escritura de partilhas não foi realizada, por vontade da requerida.
14 - Da referida herança fazem parte vários prédios rústicos de onde a requerida já tirou proveito exclusivo pela venda de árvores.
15 - Na zona onde reside não existem casas para tomar de arrendamento, pois o hábito é que cada um constrói a casa para sua habitação.
16 - O local onde reside facilita a acumulação de empregos.
17 - O requerente encontra-se aposentado por invalidez, auferindo uma pensão de € 176,50.
18 - O requerente tem como “hobbie” a caça, deslocando-se e com os encargos inerentes, nomeadamente com custos de licenças e renovações das mesmas.
19 - O requerente ajuda o filho a agricultar os 11 prédios rústicos, produzindo arroz e milho, recebendo o preço de venda dos produtos, sendo que os subsídios agrícolas são recebidos pelo filho em nome de quem se encontram os referidos pedidos.
20 - Por herança de José Maria Rato e mulher Olinda Rodrigues foi atribuída à mãe do requerente, de entre outros bens, uma casa de habitação sita à Torneira, com boas condições de habitabilidade, e nessa casa o requerente tem permanecido.
21 - Tal casa dista de Atouguia aproximadamente 2 km.
22 - O requerente é proprietário de dois veículos automóveis, uma carrinha de caixa aberta marca Bedford com a matrícula JH-99-86 e um Peugeot 206 de matrícula 09-89-OT.
23 - A carrinha de caixa aberta é usada pelo requerente na agricultura e o ligeiro nas suas deslocações para outros fins.
24 - O requerente encontra-se a residir num anexo da casa de morada de família, que foi construído com a finalidade de ser usado como oficina.
25 - O anexo é composto por um compartimento amplo onde o mesmo colocou uma cama e um armário para roupa, sendo o chão em cimento, o tecto é de fibrocimento e sem isolamento.
26 - Na zona onde dorme o requerente encontram-se armazenados produtos químicos usados na agricultura, detergentes tóxicos, materiais metálicos de serralheiro e com iluminação deficiente.
27 - É nesta zona que o requerente faz algumas refeições.
28 - O requerente nos anos de 2003 e de 2004 foi de férias para Cuba e para o Brasil.
29 - O requerente aufere outros rendimentos que não foi possível apurar de fontes que não foi possível apurar, pois a vida que leva não é compatível com os rendimentos provenientes da sua pensão de invalidez.
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Inconformado com a decisão, interpôs o requerente recurso de agravo, rematando a sua alegação com as seguintes conclusões:
a) A sentença recorrida nos seus fundamentos extravasa em muito o que lhe foi dado conhecer pelos depoimentos das testemunhas.
b) Dá como provados factos que qualquer das testemunhas ouvidas proferiu em audiência de discussão e julgamento conforme acima referido.
c) Os fundamentos apurados em audiência estão em manifesta oposição com a decisão violando, assim o acima citado preceito legal.
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A requerida contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso e manutenção da sentença recorrida.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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Como é sabido, o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo o Tribunal da Relação conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo razões de direito ou a não ser que aquelas sejam de conhecimento oficioso (cfr. artºs 664º, 684º, nº 3, e 690º, nº 1, do Código de Processo Civil – diploma a que pertencerão os restantes normativos citados sem menção de proveniência).
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Questão prévia.
O recorrente juntou um documento destinado a provar, segundo ele, que ajuda seu filho C... numa pequena lavra de cereais e arroz em virtude do qual durante o ano de 2004 recebeu o subsídio de 550,67 € e não dos 7.500 € anuais que a sentença dá como provados.
Invoca, como razão para a junção do documento em sede de recurso, a superveniência do mesmo documento, na medida em que no dia do julgamento não se encontrava disponível.
A junção de documentos na fase de recurso reveste carácter excepcional, só devendo ser admitida nos apertados limites dos artºs 524º e 706º.
O artº 524º dispõe que, no caso de recurso, só são admitidos so documentos cuja apresentação não tenha sido possível até ao encerramento da discussão (nº 1); os documentos destinados a provar factos posteriores aos articulados ou cuja apresentação se tenha tornado necessária por virtude de ocorrência posterior, podem ser oferecidos em qualquer estado do processo (nº 2).
As partes podem ainda juntar documentos às alegações no caso de apenas se tornar necessário em virtude do julgamento proferido em 1ª instância (artº 706º).
De qualquer modo, a admissão de documentos está sempre condicionada pelo interesse que os mesmos revistam para a decisão do recurso (cfr. artº 543º. nº 1, ex vi artº 706º, nº 3).
Ora, no presente caso a junção é extemporânea, visto que o documento poderia ter sido junto na 1ª instância, uma vez que a requerente já referia na sua contestação (artº 20º) que o requerente é agricultor, cultivando entre outros milho e arroz, donde retira, com os subsídios, mais de 7.500 € anuais. O requerente já poderia, pois, ter apresentado há muito tempo o documento em questão para contra-prova da afirmação feita pela requerida.
O documento não pode, assim, ser admitido, pelo que terá que ser desentranhado dos autos e restituído ao recorrente e este condenado nas custas a que deu causa, de acordo com o disposto nos artºs 543º, nº 1 e 706º, nº 3.
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Questão de fundo.
Começa o recorrente por alegar que a sentença recorrida nos seus fundamentos extravasa em muito o que lhe foi dado conhecer pelos depoimentos das testemunhas.
Embora se refira aos fundamentos da sentença, resulta da alegação do recurso que o recorrente quer mesmo é impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto.
A confusão do recorrente resulta do facto de não se ter dado cumprimento ao disposto no nº 5 do artº 304º, tendo a decisão proferida sobre a matéria de facto integrado a própria sentença.
O recorrente pode impugnar a matéria de facto, visto que os depoimentos das testemunhas foram reduzidos a escrito.
Insurge-se o recorrente contra o facto de se ter dado como provado que «o requerente nos anos de 2003 e 2004 foi de férias para Cuba e para o Brasil», com base nos depoimentos das testemunhas Otília Henriques Rodrigues Carriço e Maria Odete Braveiro Carvalho, que revelaram não ter conhecimento directo dos factos.
Analisados os depoimentos das aludidas testemunhas, verifica-se, efectivamente, que as mesmas nada sabem sobre tais factos, dizendo a primeira que “ouviu comentar que o requerente teria ido de férias para o Brasil” e a segunda que “ouviu dizer que o requerente terá ido de férias ao Brasil e a Cuba”.
Com tais depoimentos – que revelam um desconhecimento completo dos factos - não é realmente possível dar esses factos como provados.
O mesmo se diga dos factos dados como provados, segundo os quais «Por herança de José Maria Rato e mulher Olinda Rodrigues foi atribuída à mãe do requerente, de entre outros bens, uma casa de habitação sita à Torneira, com boas condições de habitabilidade, e nessa casa o requerente tem permanecido», que se estribaram nos depoimentos das aludidas testemunhas, que revelaram, também, pouco ou nada saber sobre os mesmos.
Com efeito, declarou a Otília que um casal deixou de herança à mãe do A... vários prédios, de entre eles uma casa sita em Torneira, freguesia do Louriçal, e que presume que os bens tenham sido atribuídos ao requerente e ao irmão pois são estes que trabalham no campo e fazem as colheitas, acabando por ficar com os proventos que daí advêm, sem no entanto saber se é a mãe dos mesmos que lhos doa, se o fazem por direito próprio.
No que respeita à testemunha Maria Odete, diz que, quanto à casa da Torneira, confirma o declarado pela testemunha anterior (Otília Carriço), acrescentando que conhece a casa e a mesma tem água canalizada, energia eléctrica, casas de banho, bem como que se encontra em bom estado de conservação.
Com tais depoimentos não era possível dar como provados os factos em questão, nomeadamente que o requerente tem permanecido nessa casa da Torneira.
Altera-se, por isso, a matéria de facto, considerando como não provados os factos atrás referidos, que correspondem aos factos elencados sob os nºs 20 e 28.
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Alega, depois, o recorrente que os fundamentos apurados em audiência de discussão e julgamento estão em manifesta oposição com a decisão violando, assim, o preceito do artº 668º, nº 1, al. c), do Código de Processo Civil.
Este normativo dispõe que a sentença é nula quando os fundamentos estão em oposição com a decisão.
Tal nulidade ocorre quando a fundamentação de decisão aponte num sentido e esta siga caminho oposto ou, pelo menos, diferente, isto é, quando os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente, não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto, como seria o caso, por exemplo, de os fundamentos apontarem no sentido da procedência do pedido e, depois, julgar-se este improcedente, ou vice-versa [cfr., entre outros, os Acs. do S.T.J. de 09/12/1993, de 26/04/1995, de 13/02/1997, de 22/01/1998 e de 04/05/1999, in, respectivamente, BMJ 432º-342, CJ, Ano III, T2-57, BMJ 464º-525, 473º-427 e Agravo nº 324/99, 1ª Secção (Bol. nº 31, Maio/99), e Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, IV, pág. 141].
Só existe, pois, tal nulidade quando existe um vício real no raciocínio do julgador. Este retira das premissas (fundamentos) uma conclusão (decisão) diversa do que a que a lógica impõe.
Ora, isso não acontece no presente caso, uma vez que o Sr. Juiz, considerando que, conforme resultou provado, o requerente e a requerida se encontram em situação análoga, no sentido de qualquer deles não ter condições para, de imediato, ou com alguma brevidade, obter casa em condições de satisfazer o agregado familiar, mas que, tendo o filho do requerente e da requerida a sua vida localizada no lugar de Atouguia, vivendo com a mãe, não poderá por facto imputável aos pais ser prejudicado na sua vida, pois, a mudança de residência do mesmo para a casa da mãe sita em Azenha, iria acarretar uma situação da habitação próxima da que o requerente tem mas que na sua óptica não é adequada, retirou a conclusão apropriada, julgando o incidente improcedente.
A decisão surge, assim, como consequência lógica dos fundamentos, pelo que, não ocorrendo a oposição entre estes e aquela, não se verifica a invocada nulidade.
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Importa agora ver se a alteração da matéria de facto nos termos atrás referidos (eliminação dos factos nºs 20 e 28) implica a alteração da decisão proferida na sentença.
Antes de mais importa ver quais os factores que levaram à atribuição da casa de morada de família à ora requerida B... na sentença de 28/04/1997, no processo a que os presentes autos se encontram apensos, e se tais factores se alteraram, entretanto, de modo a permitirem a revogação de tal decisão.
Aí se decidiu o seguinte: “A requerente (ora requerida) tem a seu cargo o filho menor do casal, de 14 anos e o menor nasceu e cresceu naquela casa e ali tem os seus amigos. Não existem por perto casas para arrendar e a requerente não tem bens que lhe permitam comprar um terreno e construir uma casa, nem o montante do seu vencimento lhe permite o recurso ao crédito bancário. O requerido (ora requerente) foi considerado único culpado na acção de divórcio. Facilmente se conclui deste conjunto de factos que a atribuição da casa de morada é uma necessidade premente da requerente, por forma a permitir a saudável e equilibrada educação de seu filho”.
O requerente veio requerer a revogação desta decisão, alegando, essencialmente, que o filho hoje é maior e já tem emprego efectivo numa fábrica de componentes de automóveis sediada em Pombal, que a requerida é proprietária de uma casa de habitação sita no lugar de Azenha, que dista da casa do casal cerca de 4 km e que a mesma se encontra desabitada, e que o requerente vive numa oficina instalada no anexo da casa de morada de família, num grande estado de degradação física e sem salubridade.
Na sentença proferida sobre o presente incidente decidiu-se indeferir o mesmo, em virtude de, não obstante o requerente e a requerida se encontrarem em situação análoga, no sentido de qualquer deles não ter condições para, de imediato ou com alguma brevidade, obter casa em condições de satisfazer o agregado familiar, o filho de ambos ter a sua vida localizada no lugar de Atouguia, vivendo com a mãe, não podendo, por facto imputável aos pais, ser prejudicado na sua vida, pois a mudança de residência do mesmo para a casa da mãe sita em Azenha, que não tem condições de habitabilidade, iria acarretar uma situação de habitação próxima da que o requerente tem mas que, na sua óptica, não é adequada.
Tendo em conta os factores que foram tomados em consideração para a atribuição da casa de morada de família, e atrás enunciados, verificamos que se mantém a situação de necessidade da ora requerida, visto que continua a não ter casa com condições de habitabilidade, já que a casa que possui em Azenha é de um piso só, composta por dois quartos, uma sala e uma cozinha, sendo todas as divisões de pequenas dimensões, não tendo casa de banho, água canalizada nem esgotos.
É certo que, com a realização de algumas obras (construção de um quarto de banho, canalização e esgotos), poderia tornar a casa minimamente habitável.
Não se provou, no entanto, que tenha possibilidades económicas para levar a efeito tais obras, e os rendimentos provenientes do trabalho (cfr. nºs 3 e 4 da matéria dada como provada) não lhe devem permitir amealhar dinheiro mensalmente para tal fim.
Por outro lado, é verdade que o filho do casal já atingiu a maioridade.
E o artº 1793º, nº 1, do Código Civil, ao referir como um do factores de atribuição da casa de morada da família o interesse dos filhos do casal, diz respeito aos filhos menores, por serem estes que, normalmente, estão na dependência dos pais, necessitando da protecção e apoio destes (cfr. artºs 1877º a 1880º do C.C., e Prof. Leite Campos, Lições de Direito de Família e das Sucessões, 2ª ed., pág. 308).
A circunstância, no entanto, de o filho atingir a maioridade, só por si, não é motivo de resolução do arrendamento da casa de morada de família, nos termos do disposto no nº 2 do artº 1793º, se ele continua a viver com a mãe (ou o pai), em favor de quem o arrendamento fora constituído (cfr. Prof.s Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira, Curso de Direito de família, I, 3ª ed., pág. 722).
Com efeito, a maioridade pode não significar autonomia, podendo o filho continuar na dependência económica dos pais e, portanto, a necessitar de viver com eles. E isto é assim mesmo que o filho esteja a trabalhar, visto que o exercício de uma actividade remunerada pode não ser suficiente para ele passar a viver autonomamente.

No presente caso, deu-se como provado que a requerida vive na casa de morada da família com o filho de ambos, que não obstante ser maior, trabalhar e obter rendimentos do trabalho numa fábrica de Pombal, continua na companhia da mãe, que lhe lava a roupa, confecciona as refeições e trata dos restantes afazeres da casa (nº 8).
Competia ao requerente provar (artº 342º, nº 2, do Código Civil) que o filho, ao atingir a maioridade, passou a dispor de autonomia financeira para se bastar a si próprio, deixando de ter necessidade de viver com a mãe na casa de morada da família, justificando a alteração dessa circunstância a caducidade do arrendamento.
Como vimos não logrou ele atingir tal prova, pelo que é de concluir que se mantém este factor, relevante (o interesse do filho) que esteve na origem da atribuição da casa de morada de família e, consequentemente, a premência da necessidade da casa de que falam aqueles autores (Ob. cit., pág. 726).
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Pelo exposto, acorda-se nesta Relação em negar provimento ao recurso, mantendo a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente.