Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2798/05
Nº Convencional: JTRC
Relator: MONTEIRO CASIMIRO
Descritores: COBRANÇA COERCIVA DE CRÉDITO
EXCEPÇÃO DE NÃO CUMPRIMENTO DO CONTRATO
INCUMPRIMENTO PARCIAL
INCUMPRIMENTO DEFEITUOSO
Data do Acordão: 12/06/2005
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE ALVAIÁZERE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA PARCIALMENTE
Legislação Nacional: ARTº 428º DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: A excepção de não cumprimento do contrato (exceptio non adimpleti contractus) prevista no artº 428º do Código Civil opera mesmo no caso de incumprimento parcial e de cumprimento defeituoso – a chamada exceptio non rite adimpleti contractus -, havendo que ter em conta, no entanto, o princípio da boa fé.
Daí resulta a exigência de uma apreciação da gravidade da falta, que não pode mostrar-se de pouca importância para a outra parte, bem como a adequação ou proporcionalidade entre a ofensa do direito do excipiente e o exercício da excepção.
Decisão Texto Integral:

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

A..., intentou, em 16/01/2004, pelo Tribunal da comarca de Alvaiázere, processo de injunção contra B..., pedindo a condenação deste no pagamento da quantia de 8.269,50 €, que lhe deve, em consequência de serviços de transportes prestados, acrescida de juros de mora vencidos no montante de 248,08 €, e de taxa de justiça paga no valor de 89,00 €.
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O requerido deduziu oposição, pugnando pela improcedência da acção, invocando as excepções de não cumprimento do contrato e compensação.
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A requerente respondeu à oposição, concluindo como pedido no requerimento de injunção.
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Foi proferido despacho saneador, no qual foi relegado para a decisão final o conhecimento da excepção de compensação, e organizada a matéria de facto considerada assente e a que constitui a base instrutória, sem reclamações.

Teve depois lugar o julgamento com gravação da prova e, decidida a matéria de facto controvertida, sem reclamações, foi proferida a sentença, que julgou a acção parcialmente procedente, condenando o réu a pagar à autora a quantia de 7.730,00 euros.
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Na 1ª instância foi dada como provada a seguinte matéria de facto:


1º - A autora é uma sociedade comercial que se dedica ao comércio, manutenção e reparação de veículos automóveis, suas peças e acessórios, bem como serviços de reboque (al. A) dos Factos Assentes).
2º - O réu, por seu turno, dedica-se à actividade de transportes (al. B).
3º - Autora e réu acordaram em aquela efectuar para este um transporte por estrada entre Luxemburgo e Portugal (Al. C).
4º - O réu entregou à autora a quantia de 2.500 €. (al. D).
5º - A autora acordou transportar ao réu os veículos e objectos discriminados na factura nº 3780 (ressalvando-se que o veículo mencionado como tendo a matrícula OJ-3310, tem a matrícula QJ-3310), datada de 16/10/2003, factura esta no valor de 10.769,50 € com IVA incluído, cujo teor se dá por integralmente reproduzido (resposta ao quesito 1º da Base Instrutória).
6º - A autora enviou ao réu e este recebeu a referida factura (qº 2º).
7º - O transporte acordado em 5º foi feito por estrada entre Luxemburgo e Portugal (qº 3º).
8º - O acordo referido em 5º incluía a mudança para o nosso país dos veículos automóveis, motos e demais bens móveis constantes da declaração de expedição internacional (CMR) nº 12914745 A (qº 4º).
9º - O acordo referido em 5º incluía ainda o transporte na viagem de ida de outros veículos, cfr. declaração de expedição internacional (CMR) nº 1291474 (qº 5º).
10º - Parte do transporte foi efectuado em 27/07/2003 (qº 6º).
11º - O acordo referido em 5º implicou um segundo transporte entre Portugal e Luxemburgo, por estrada, com um veículo de mercadorias de matrícula 16-01-OH (qº 7º).
12º - Tal transporte incluía a mudança para o nosso país dos veículos automóveis e demais bens móveis constantes da declaração de expedição internacional (CMR) nº 1291477, cfr. doc. de fls. 18, cujo teor se dá aqui por reproduzido (qº 8º).
13º - Durante o transporte o réu emprestou 70 € ao motorista e empregado da autora (qº. 9º).
14º - Os automóveis do primeiro e segundo transporte, mudados do Luxemburgo para Portugal, pertenciam a clientes do réu, ali emigrantes (qº. 12º).
15º - À chegada a Portugal, o BMW de matrícula QJ-3310 apresentava riscos na pintura (qº 14º).
16º - Os danos referidos em 15º ocorreram após o carregamento de Luxemburgo para Portugal (qº 17º).
17º - Foi a autora que providenciou e executou a carga e descarga dos referidos veículos (qº 18º).
18º - A autora entrou em contacto directamente com um dos proprietários, o Sr. Jorge Manuel Lopes Quelhas, em reparar-lhe o BMW de matrícula QJ-3310 (qº 21º).
19º - Reparação essa que foi efectuada pela autora (qº 22º).
20º - Em 07/10/2003, a autora enviou ao réu a carta constante de fls. 19, cujo teor se dá por reproduzido (qº 23º).
21º - O réu respondeu por carta registada datada de 16/10/2003, conforme consta de fls. 20, cujo conteúdo se dá por reproduzido (qº 24º).

Importa, ainda, ao abrigo do disposto no nº 3 do artº 659º do Código de Processo Civil, tomar em consideração mais os seguintes factos, admitidos por confissão:
22º - Para o transporte referido na al. C) dos Factos Assentes foi ajustado, entre a autora e o réu, o preço de, pelo menos, 4.500,00 € (2.500,00 € + 2.000,00 €).
23º - Está em dívida, pelo réu, a importância de, pelo menos, 1.380,00 €.
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Inconformado com a sentença, interpôs o réu recurso de apelação, rematando a sua alegação com 26 conclusões que, devido à sua extensão, se dão aqui por reproduzidas.
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A autora contra-alegou, defendendo a improcedência do recurso.

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Colhidos os legais vistos, cumpre apreciar e decidir.
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Como é sabido, o objecto do recurso está delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo o Tribunal da Relação conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo razões de direito ou a não ser que aquelas sejam de conhecimento oficioso (cfr. artºs 664º, 684º, nº 3, e 690º, nº 1, do Código de Processo Civil).

Começa o recorrente por impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto, pondo em causa as respostas dadas aos quesitos 1º, 3º, 7º, 11º, 13º, 16º e 26º da Base Instrutória., fundando-se, para tal, nos depoimentos das testemunhas inquiridas na audiência.
Ora, tendo havido gravação da prova em audiência, pode, no regime vigente, o recorrente impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto, desde que se mostrem cumpridos os ónus impostos pelo artº 690º-A do Código de Processo Civil, o que no presente caso se verifica.
Pode, assim, esta Relação alterar tal decisão, reapreciando as provas em que assentou a parte impugnada, sem prejuízo de oficiosamente se atender a quaisquer outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão – artº 712º, nºs 1, al. a) e 2, do Cód. Proc. Civil.
No entanto, a linha dominante de orientação vai no sentido de a intervenção do tribunal da relação assumir uma feição meramente residual, no sentido de que tal função correctora só terá lugar se se vier a verificar – naturalmente apenas em casos limite – uma situação em que se afigura nada plausível, face ao conjunto da produção da prova, a formação da convicção do julgador, continuando, pois, a prevalecer a primacial regra da livre apreciação das provas, tal como vem sendo enunciada no artº 655º do Cód. Proc. Civil.
Isso mesmo se colhe do preâmbulo do Decreto-Lei nº 39/95, de 15 de Fevereiro, onde se refere que o duplo grau de jurisdição “nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência – visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente terá sempre o ónus de apontar claramente (…)”.
Tendo em conta tais factores, e uma vez que foram cumpridos os ónus impostos pelo aludido artº 690º-A (na sua actual redacção, após as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 183/2000, de 10 de Agosto), vejamos se, e em que medida, a pretensão do recorrente merece acolhimento.

Entende o recorrente que o tribunal a quo não poderia ter dado como provado que o preço pelo transporte em causa, foi de 10.769,50 € com IVA incluído, por na factura constar esse valor, conforme ressalta da resposta ao quesito 1º, quando a mesma foi impugnada e não existiu qualquer outra prova segura, já que nenhuma das testemunhas que a autora ofereceu – Armando Silva, André Abreu, José Mendes e Isabel Mendes - declarou ter assistido ao negócio que foi celebrado entre as partes e nenhuma conseguiu afirmar ou concretizar qual o montante do preço que foi realmente estipulado.
No quesito 1º pergunta-se se a autora acordou efectuar um serviço de transportes ao réu dos veículos e objectos discriminados na factura nº 3780, datada de 16.10.2003, no valor de 10.769,50 € com IVA incluído, quais sejam (segue-se a lista desse veículos e objectos).
A resposta foi, como se recorda, a seguinte:
“A autora acordou transportar ao réu os veículos e objectos discriminados na factura nº 3780 (ressalvando-se que o veículo mencionado como tendo a matrícula OJ-3310, tem a matrícula QJ-3310), datada de 16/10/2003, factura esta no valor de 10.769,50 € com IVA incluído, cujo teor se dá por integralmente reproduzido”.
Ouvidas as testemunhas indicadas à matéria de facto desse quesito 1º (Armando Manuel Ferreira da Silva, André Alexandre Marques Abreu e José Antunes Mendes), verifica-se que nenhuma delas tem qualquer conhecimento do preço acordado entre a autora e o réu, quer por unidade, quer global, para o transporte dos veículos e objectos discriminados na factura nº 3780.
Portanto, a única coisa que pode dar-se por provada em relação ao quesito 1º é que a autora acordou transportar para o réu os veículos e objectos discriminados nessa factura, mas já não os preços por unidade e o valor global dessa mesma factura.

Mas, da resposta a esse quesito não pode retirar-se mais do que isso, pois aí se diz apenas que a factura é no valor de 10.769,50 €, e não que tenha sido esse o valor contratado para o transporte.
Perguntava-se se o serviço de transportes contratado dos veículos e objectos discriminados na factura nº 3780 era no valor de 10.769,50 € e respondeu-se que o serviço de transportes contratado foi o dos veículos e objectos discriminados na factura nº 3780 e que esta é no valor de 10.769,50 €.
Ora, que o valor dessa factura é desse valor ninguém (nem o réu) contesta. O que o réu contesta é que esse valor, e o valor por unidade dela constante, corresponda ao preço acordado entre as partes.

Conclui-se, assim, que a resposta a esse quesito não tem que ser modificada, pois da mesma não resulta o preço acordado entre a autora e o réu para o aludido serviço de transportes, mas somente que a factura é desse valor – valor esse que já deveria ter ficado a constar dos Factos Assentes, uma vez que o réu não negou, na contestação, que tivesse recebido a factura em causa, mas apenas o valor por unidade e global dela constantes.

Sendo assim, e porque dessa resposta não pode concluir-se que o preço tenha sido fixado por unidade, não existe contradição entre a resposta negativa ao quesito 26º - onde se pergunta se entre a autora e o réu foi acordado um preço por unidade – e o quesito 1º, como pretende o recorrente.

Mas, se não se provou que o preço do transporte foi o do valor da aludida factura, também, não se provou que o preço tenha sido o de 2.500 € para o 1º transporte e o de 2.000 € para o 2º transporte, como pretende o recorrente.
Com efeito, alega o recorrente que esses foram os preços globais acordados para tais transportes e que, portanto, a resposta aos quesitos 3º e 7º, que integram essa matéria, devem ser alterados, dando-se como assente o preço de 2500 € + 2000 €.
A pretensão do recorrente não pode obter acolhimento, visto que não se fez qualquer prova quanto a esse aspecto, pois a testemunha invocada pelo recorrente para esse efeito – Mafalda Sofia Melo Correia – não demonstrou ter conhecimento directo desses preços, mas apenas por lhe ter sido comunicado pelo réu, seu marido, não tendo assistido ao acordo firmado entre ele e a autora.
Mantêm-se, portanto, as respostas de “não provado” dadas aos quesitos 3º e 7º.

Pretende o recorrente que seja alterada a matéria de facto de modo a dar-se resposta positiva aos factos 13º e 16º da Base Instrutória, com base nos depoimentos as testemunhas Jorge Manuel Lopes Quelhas, Fernando Agostinho Ferreira Coelho e Luís Filipe Pimentel Carvalho.
Esses quesitos têm a seguinte redacção:
13º - À chegada a Portugal, o BMW de matrícula P 1160 apresentava a capota rasgada, riscos na pintura e o pára-choques da frente arrancado ?
16º - O BMW de matrícula P 1873 tinha o pára-choques partido, o guarda-lamas amolgado e a pintura riscada ?
Tais quesitos tiveram respostas de “não provado”.
E são de manter, pois, como bem se diz na fundamentação da matéria de facto, essas testemunhas (Fernando Agostinho Ferreira Coelho e Luís Filipe Pimentel Carvalho, já que o Jorge Manuel Lopes Quelhas nada sabe acerca dos danos nesses veículos) denotaram um conhecimento exíguo dos factos, depuseram de forma pouco esclarecedora, com incongruências entre os vários depoimentos.
Com efeito, disseram que não assistiram à descarga dos veículos, mas sim os respectivos pais, mas estes não depuseram como testemunhas, ficando a dúvida sobre a existência de danos e, no caso afirmativo, se os mesmos foram provocados durante a viagem, na descarga ou posteriormente.

Finalmente, afirma o recorrente que deve ser alterada a resposta ao quesito 11º, considerando-se haver extinção por pagamento parcial no valor de 500 €, com base no depoimento da testemunha Mafalda Sofia Melo Correia.
Nesse quesito pergunta-se se “o réu entregou ainda ao filho do gerente da autora a quantia de 500.00 € à conta do preço deste último transporte.
Tal quesito teve a resposta de “não provado”.
E é de manter, pois não logrou o réu fazer prova desse pagamento.


Com efeito, o filho do gerente da autora, André Alexandre Marques Abreu, ouvido como testemunha na audiência, negou ter recebido aquela importância, e a testemunha Mafalda Sofia Melo Correia, esposa do réu, não convenceu da veracidade do seu depoimento, afirmando que entregou a aludida quantia em dinheiro, em mão, não tendo sido passado qualquer papel, por confiar nas pessoas e que pagou em dinheiro porque não tinha cheques.

Improcede, assim, o recurso na totalidade no que diz respeito à alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto dada como provada na 1ª instância, havendo apenas que ressalvar o entendimento atrás exposto sobre a resposta ao quesito 1º no que diz respeito ao preço por unidade e global da factura nº 3780.
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Quanto ao mérito, alega o recorrente que não poderia ser condenado a pagar qualquer preço que esteja em falta à autora, pois que nos termos do disposto nos artºs 428º e 798º do Código Civil, assiste-lhe o direito de recusar o pagamento do serviço de transporte prestado enquanto a autora não assumir a responsabilidade pela reparação dos veículos danificados no transporte que executou e a correspondente obrigação de indemnizar (exceptio non rite adimpleti contractus – que foi invocada). É que, em contrario do que se decidiu na sentença, mesmo que se dessem como provados apenas danos num dos veículos, tal não pode legitimar só a recusa de pagamento do preço do transporte desse veículo.
O réu invocou na contestação a aludida excepção.
Na sentença recorrida considerou-se que o réu logrou provar matéria relevante, no que concerne a cumprimento defeituoso, apenas quanto a um dos veículos transportados, decidindo-se que haveria apenas que retirar do valor da factura apresentada ao réu, o montante correspondente ao transporte desse veículo, na quantia de 450 €, mais IVA.

O artº 428º do Código Civil (diploma a que pertencerão os restantes normativos citados sem menção de proveniência) estabelece que nos contratos bilaterais, se não houver prazos diferentes para o cumprimento das prestações, cada um dos contraentes tem a faculdade de recusar a sua prestação enquanto o outro não efectuar a que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo.

Trata-se de uma faculdade atribuída a qualquer das partes, denominada excepção de não cumprimento do contrato (exceptio non adimpleti contractus), que traduz num dos traços fundamentais do regime dos contratos bilaterais, que constitui um simples corolário do pensamento básico do sinalagma funcional.
Segundo o Prof. Almeida Costa (Direito das Obrigações, 7ª ed., pág. 310), o instituto opera mesmo no caso de incumprimento parcial ou de cumprimento defeituoso – a chamada exceptio non rite adimpleti contractus -, tendo-se em conta, todavia, o princípio da boa fé (artº 762º, nº 2). Daí resulta a exigência de uma apreciação da gravidade da falta, que não pode mostrar-se insignificante, bem como se impõe a regra da adequação ou proporcionalidade entre a ofensa do direito do excipiente e o exercício da excepção.
Também segundo o ensinamento do Prof. Antunes Varela (Das Obrigações em Geral, I, 9ª ed., pág. 410), no direito comum admitia-se a exceptio (non rite adimpleti contractus), quando a outra parte tivesse cumprido, mas defeituosamente. Na falta de disposição específica, o problema terá que ser resolvido, nas hipóteses desse tipo, sem nunca se perder de vista o princípio básico da boa fé (artº 762º, nº 2). De igual modo, se o não cumprimento parcial da prestação pouca ou praticamente nenhuma importância tiver para a outra parte, não poderá esta usar da exceptio, sob pena de estar infringindo o princípio da boa fé.

No presente caso, o réu apenas logrou provar matéria relevante, no que toca a cumprimento defeituoso, quanto a um dos veículos transportados – o BMW QJ – 3310, que, à chegada a Portugal, apresentava riscos na pintura.
Na sentença recorrida entendeu-se que, havendo, quanto ao transporte desse veículo, um cumprimento defeituoso, haveria que retirar do valor da factura apresentada ao réu, o montante correspondente ao transporte desse mesmo veículo, ou seja 450 €, acrescido de IVA.
Discordamos dessa solução, visto estarmos perante dois tipos de situações, que não têm que levar obrigatoriamente a essa espécie de compensação: uma coisa é o preço do transporte, que o réu tem que pagar à autora, cujo montante ignoramos, e outra, diferente, é a relativa aos danos no aludido veículo, que cabe à autora ressarcir, mas cujo montante é também desconhecido neste momento.


O desconto efectuado na sentença carece, portanto, de apoio legal, sendo certo, de qualquer forma, que tal efectivação já não tinha qualquer justificação, uma vez que a autora entrou em contacto com o proprietário desse veículo, tendo efectuado a reparação do mesmo, como resulta da matéria de facto dada como provada (v. respostas aos quesitos 21º e 22º da Base Instrutória).
Não obstante ter havido cumprimento defeituoso da autora nos termos atrás referidos, não aproveita ao réu a exceptio non rite adimpleti contractus, tendo em conta o valor insignificante dos danos sofridos pelo veículo QJ – 3310, e que os mesmos foram reparados pela autora, não se justificando, portanto, a falta de pagamento por parte do réu, do montante ainda em dívida, com fundamento no referido cumprimento defeituoso da autora.
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Como vimos, provou-se que a autora acordou transportar ao réu os veículos e objectos discriminados na factura nº 3780 (qº 1º da B.I.), mas não se apurou qual o preço entre eles estabelecido para tal transporte.
Por isso, vai o réu condenado a pagar à autora, a esse título, a importância que vier a ser liquidada, ao abrigo do disposto no nº 2 do artº 661º do Código de processo Civil, assim, se revogando a sentença recorrida nessa parte, bem como na parte em que procedeu ao desconto do valor do transporte do veículo QJ – 3310, pelos motivos atrás expostos.
O valor liquidado não poderá exceder o do pedido nem ser inferior ao de 1.380 €, admitido pelo réu como estando em dívida.
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Pelo exposto, acorda-se nesta Relação em dar parcial provimento ao recurso, revogando a sentença recorrida na parte em que condenou o réu a pagar à autora a quantia de 7.734 €, relegando-se para liquidação a importância a pagar pelo réu, que não poderá exceder o montante de 8.606,58 €, nem ser inferior a 1.380,00 €.

Custas na proporção de vencido, pagando-as provisoriamente, na proporção de metade, até à liquidação.