Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | DR. JOÃO TRINDADE | ||
Descritores: | RECURSO SUBORDINADO INDEMNIZAÇÃO POR DANOS FUTUROS NO CASO DE O LESADO TER UM CONTRATO DE TRABALHO DE DURAÇÃO LIMITADA | ||
![]() | ![]() | ||
Data do Acordão: | 05/05/2004 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | FIGUEIRA DA FOZ | ||
Texto Integral: | S | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
Legislação Nacional: | ARTºS 404º, 2 E 411º, Nº 3 DO CPP,567º DO CC | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário: | I - O recurso subordinado terá que obedecer às regras do processo penal em que está inserido pelo que o requerimento de interposição é sempre motivado, sob pena de não admissão, salvo os casos da parte final do nº 3 do artº 411º do C. P. P. II - No caso do lesado ter um contrato de trabalho de duração limitada não afasta a existência de um dano futuro para além do limite contratual. III - Para cálculo da indemnização respectiva o salário mínimo tem que se considerar como um ponto de partida e nunca como um limite máximo inultrapassável.
| ||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Criminal desta Relação:
Imputando-lhe a prática de factos susceptíveis de integrar um crime de ofensa à integridade física por negligência previsto e punido pelo artigo 148.º,n.º1 do Código Penal, em concurso real, com um crime de omissão de auxílio previsto e punido pelo art.º 200.º,n.º2 do Código Penal, e com uma contra-ordenação ao disposto no art.º 38.º do Código da Estrada.
O lesado FF deduziu pedido de indemnização cível contra a demandada GG. pelos factos e fundamentos constantes de fls. 64 a 69, que aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais, no qual concluem que esta seja condenada a pagar-lhe a quantia de €241.650, referente aos danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes da conduta do arguido.
Efectuado o julgamento foi proferida sentença na qual se decidiu I – Absolver o arguido da contra-ordenação ao art.º 38.º do Código da Estrada. II - Condenar o arguido BB como autor material de um crime de omissão de auxílio previsto e punido pelo art.º 200.º,n.º2 do Código Penal, em concurso real com um crime de ofensa à integridade física por negligência, previsto e punido pelo art.º 148.º,n.º1 do Código Penal, na pena de 150 dias de multa à razão diária de € 5, no montante total de € 750 (setecentos e cinquenta euros), a que corresponde a pena subsidiária de 100 dias de prisão. III- Relativamente ao pedido cível Condenar a demandada GG. a pagar a FF a quantia de 9.000 euros (nove mil euros) a título de danos não patrimoniais, e 46.683.84 euros (quarenta e seis mil seiscentos e oitenta e três euros e oitenta e quatro cêntimos) a título de danos patrimoniais, o que perfaz no total 55.683,84 (cinquenta e cinco mil seiscentos e oitenta e três euros e oitenta e quatro cêntimos), a que acrescem a tais danos os juros legais desde a notificação para contestar o pedido de indemnização civil quanto aos danos patrimoniais e desde a data desta decisão quanto aos danos não patrimoniais.
#
Inconformada, recorreu a demandada GG concluindo a sua motivação do seguinte modo:
O Ofendido/demandante interpôs recurso subordinado concluindo como se segue:
Respondeu a demandada /seguradora pugnando pela rejeição do recurso subordinado ou,se assim não se entender, deverá ser negado provimento ao recurso, concluindo: 1-A recorrida Tranquilidade foi notificada , nos termos do artº 229º- A do CPC , das alegações do recorrente Vítor , no âmbito do recurso subordinado por este interposto. 2-Sucede porém, que estamos no âmbito do processo penal. O que quer dizer que a motivação do recurso tem que ser instruída com o respectivo requerimento. 3-A demandada cível Tranquilidade interpôs requerimento de recurso com a respectiva motivação em 31-10-2003. 4-O recurso subordinado interposto pelo demandante cível Vítor teria que estar acompanhado das respectivas alegações. 5- A demandante cível tranquilidade foi agora notificada , pelo Ilustre mandatário do demandante cível Vítor, dessas mesmas alegações. 6-A ser assim , as alegações agora apresentadas pelo demandante cível Vítor são extemporâneas. 7-A ser assim, devem as aliás doutras alegações de recurso do demandante cível Vítor ser mandadas desentranhar dos autos e devolvidas a este. 8-A douta sentença se encontra bem fundamentada e não necessita ser defendida . 9-Por isso , não carece de ser alterada. 10-Excepto no que tange à indemnização pela IPP, posta em crise pela demandada cível Tranquilidade em sede de recurso. 11- Quanto ao “pedido” formulado pelo demandante cível Vítor a título de perda do veículo, apoiado num documento agora junto, apenas se dirá que, como aliás é evidente , tal pedido é extemporaníssimo e não deve ser admitido. 12- Só faltava agora que a equidade servisse para suprir falhas processuais das partes . Pois é precisamente isso que aqui quer o demandante cível Vítor. 13- Não o foi , não houve ampliação de pedido nem articulado superveniente. 14- Não o foi, não houve ampliação de pedido nem articulado superveniente. 15- Não pode o tribunal “ ad quem” conhecer do pedido a título de perda do veículo. Deve ,pois, o documento junto ser mandado desentranhar dos autos e devolvido ao demandado cível Vítor. 16- A douta sentença recorrida não violou qualquer regra ou princípio geral de direito, pelo que deve ser mantida (excepto no que tange à indemnização pela IPP, posta em crise pela demandada tranquilidade).
O ofendido/recorrente subordinado responde e entendendo que está no domínio exclusivo do processo civil não tem razão de ser a questão prévia levantada pela demandada seguradora.
Nesta Relação o Exmo. Procurador –Geral Adjunto apôs o seu visto.
#
Colhidos os vistos legais e efectuada a audiência/conferência há que decidir : O âmbito dos recursos afere-se e delimita-se através das conclusões formuladas na respectiva motivação conforme jurisprudência constante e pacífica desta Relação,bem como dos demais tribunais superiores, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso.
As questões a resolver são as seguintes:
Factos dados como provados: 1 – No dia 8 de Julho de 2000, cerca das 0 horas e 15 minutos, na IC-1, em Lavos, Figueira da Foz, no sentido Leiria-Figueira da Foz, seguia o arguido conduzindo o veículo ligeiro de passageiros de matrícula 74-38-FE, no sentido Figueira da Foz-Leiria. 2 – Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar o ofendido FF conduzia o veículo ligeiro de passageiros de matrícula 54-05-PC, no sentido Figueira da Foz-Leiria. 3 – Ao chegar ao Km 128,7, o arguido iniciou uma ultrapassagem a um camião que seguia à sua frente, no mesmo sentido de marcha, isto sem previamente, se assegurar que a faixa de rodagem estava livre na largura e extensão necessárias a tal manobra, e que não haveria perigo de colidir com os veículos que circulavam em sentido contrário ao seu. 4 – Quando tentava ultrapassar o camião, e circulando na faixa de rodagem destinada aos veículos que circulavam em sentido contrário, e porque aí se aproximavam veículos, nomeadamente o do ofendido, não conseguiu retomar a sua faixa de rodagem, e foi embater na parte lateral esquerda do veículo conduzido pelo ofendido. O ofendido ainda tentou desviar-se do arguido, encostando-se o mais possível ao lado direito da estrada, não tendo, contudo, conseguido evitar o embate. 5 – Não foi possível apurar a velocidade a que seguiam os veículos envolvidos no embate. Este ocorreu numa recta com boa visibilidade, na hemi-faixa de rodagem destinada aos veículos que seguiam no sentido Figueira da Foz-Leiria, sendo que a faixa de rodagem no local tem cerca de 7,20 metros de largura. 6 – Em consequência do embate a que o arguido deu causa o veículo do ofendido saiu da estrada e foi embater numas árvores ali existentes, do lado direito, atento o seu sentido de marcha. 7 – Em consequência do supra mencionado embate o ofendido sofreu as lesões melhor descritas e analisadas nos exames médicos e elementos clínicos de fls.6, 27, 28, 30, 31, 36, 42, 44, 45 e 50, aqui dados por reproduzidos para todos os efeitos legais, e que foram determinantes de 564 dias de doença, todos com incapacidade para o trabalho. 8 – Após o acidente, o arguido veio a imobilizar o veículo na berma do lado direito atento o seu sentido de marcha, tendo estilhaços de vidro na cara. 9 – Depois de ocorrer o embate, ficou pelo menos 10/15 minutos junto ao seu carro, não tendo indagado do estado de saúde do condutor do veículo 54-05-PC, nem feito qualquer diligência para que fosse socorrido. 9 – Só após se deslocou ao local onde se encontrava o carro do ofendido, já tendo sido chamada a ambulância pela testemunha Maria Graziela Alves. 10 – O arguido posteriormente foi visitar o ofendido ao hospital. 11 – Agiu o arguido de forma livre, iniciando uma manobra de ultrapassagem sem cuidar de se assegurar de que podia fazê-lo com segurança, nomeadamente para os outros condutores, o que não representou, não tendo previsto como possível, no entanto, que da sua conduta viesse a resultar o embate no veículo conduzido por Vítor Santos, bem como as lesões por este sofridas, embora devesse tê-lo previsto se tivesse usado do cuidado e atenção impostas pelas circunstâncias, violando assim os deveres de cuidado e precaução. 12 – Por outro lado, o arguido representou que o condutor do veículo 54-05-PC corria por força do embate ocorrido, perigo de lesão grave da sua integridade física, tendo permanecido junto do seu carro pelo menos durante 10/15 minutos, conformando perante essa situação de perigo, omitindo assim um dever de solidariedade que sobre si impendia. 13 – Tinha perfeita consciência de que a sua conduta era proibida e punida por lei penal. 14 – O arguido Paulo Tomé havia transferido, por contrato de seguro inteiramente válido e em vigor à data do acidente, titulado pela apólice n.º99-0166205 a responsabilidade civil em relação a terceiros para a demandada GG.. 15 – O ofendido tinha à altura do acidente 57 anos de idade (nascido em 12.3.1943) era um técnico de electrotécnica, especialista tanto em alta como em baixa tensão, tendo feito a sua carreira e especialização profissional no estrangeiro – razão pela qual trabalhava como independente e não estava sujeito a descontos para a Previdência Portuguesa. 16 – Encontrava-se, desde Maio de 2000, por um período de 6 meses, a trabalhar para a Firma Fozmel-Montagens eléctricas, metálicas, Construção civil e representações, Lda, com sede na Avenida 12 de Julho, 113, na Gala, freguesia de S.Pedro, deste concelho que, 17 – tendo arrematado uma empreitada por 6 meses, o destacara para chefe-encarregado de uma montagem de equipamento eléctrico na fábrica de papel da Celbi. 18 – pagando-lhe o vencimento mensal líquido, então, de 360.000$00. 19 – o certo é que, por virtude do acidente, perdeu aquele emprego. 20 – Despendeu 980 euros em médicos, medicamentos e tratamentos de recuperação, nomeadamente na clínica Diagnóstico. 21 – Apossou-se do lesado o pânico – verdadeiro terror – quando viu o veículo seguro na requerida a avançar para ele como um bólide a curta distância na iminência de um choque frontal – o que fez antever a morte quase como resultado quase inultrapassável. 22 – Sofreu lesões gravíssimas, algumas das quais irrecuperadas e irrecuperáveis, conforme tudo consta a fls. 6, 27, 28, 30, 31, 36, 42, 44, 45 e 50 – que aqui se dão por reproduzidas para todos os efeitos legais. 23 – Em exame de 2.12.99 foi verificado em presença dos relatórios dos exames progressos, que sofrera traumatismo crâneo-encefálico frontal esquerdo, com perda de consciência, dores de cabeça, irritabilidade e visão dupla no olhar lateral para a esquerda, apresentava afundamento ligeiro na zona frontal esquerda, iniciou ansiedade, irritabilidade, vertigens e agravou dificuldades da memória; foi medicado com ansiólitico, antidepressivo, psicoanoléptico e antivertiginoso. 24 – Veio a melhorar moderadamente das queixas, tornando-se a diplopia só ocasional, mantém, sem melhoras, as perturbações de memória e as vertigens com desencadeante posicional, sendo neste momento a ansiedade e as cefaleias menos marcadas. 25 – Podendo trabalhar a 50%. 26 – Trata-se de síndrome cerebral pós-traumático, que dado o tempo de evolução (2 anos), não é previsível melhorar, segundo a tabela nacional de incapacidades foi atribuído 17%. 27 – O lesado sofreu dores, angústias terríveis com a sua diminuição e quase cegueira, o afastamento de um lugar de elite dentro da sua actividade profissional, privações do nível a que – e os seus – estavam habituados como resultante dos proventos do seu trabalho qualificado. 29 – O arguido é operador de processo, aufere 1000 euros mensais. 30 – Tem um apartamento do qual paga a prestação de 350 euros por mês, mais água, luz e condomínio. 31 – Paga 175 euros por mês da prestação do carro. 32 – Tem o 12.º ano de escolaridade. 31 – Por hábito é um condutor normal e cumpridor. 33 – Não tem antecedentes criminais. Não se provou que: - o arguido iniciou uma ultrapassagem a vários camiões que seguiam à sua frente; - O veículo do ofendido deixou no local um rasto de travagem com cerca de 70 metros com início no limite, do lado direito, da hemi-faixa de rodagem em que seguia e termo fora da faixa de rodagem entre as árvores em que o ofendido embateu e o marco que assiná-la o Km 128,7; - que o arguido continuou a sua marcha, abandonando o local; - que a perca do emprego do lesado e remuneração certa referida tenha sido até à data de hoje. - que o lesado em virtude do estado físico e da incapacidade com que ficou e com a situação de depauperamento económico, autêntico esgotamento, a que chegou, viu-se obrigado a vender, sob pressão, uma casita de que era proprietário na Figueira da Foz por 25.000 euros. - O lesado despendeu 1250 euros em médicos, medicamentos e tratamentos de recuperação, nomeadamente na clínica Diagnóstico. - O lesado tem e terá que se limitar a umas “carocas” ocasionais, onde conseguirá angariar entre 500 a 600 euros mensais. Indicação probatória O Tribunal, num juízo crítico da prova produzida, formou a sua convicção quanto aos factos dados como provados com base nos seguintes elementos: Quanto aos factos dados como provados nas declarações do arguido quanto à existência do acidente; No depoimento das testemunhas FF, ofendido, no que respeita à forma como ocorreu o acidente; José António Santos, que vinha num carro a cerca de 150 metros atrás do carro onde seguia o arguido, que descreveu a forma como o acidente terá ocorrido, não tendo o arguido concluído a ultrapassagem do camião e não tendo voltado a ver o mesmo apesar da testemunha ter ido para a mata ver o carro do ofendido; Maria Graziela Carriço Alves, anterior esposa do ofendido, que vinha atrás do ofendido num veículo, e que descreveu a forma como o acidente ocorreu, junto à berma da hemi-faixa onde seguia o ofendido, e que parou o carro, indo junto ao carro do ofendido e chamado a ambulância, e que se apercebeu que o arguido apareceu junto do ofendido somente depois de algum tempo; Gilberto Neto, que vinha atrás do arguido, e que o terá visto com pedaços de vidro na cara; Célio dos Santos, amigo do arguido, que se encontrava na Figueira da Foz, quando o mesmo lhe telefonou que havia tido um acidente, tendo-se este deslocado ao local (demorado entre 10/15 minutos) para ir ter com o arguido que se encontrava junto do seu carro, e só depois foram ter com o ofendido; Carlos Rodrigues e João Carlos Maligno que passaram num autocarro e viram o carro do arguido parado na berma ao lado direito. Quanto ao pedido cível: Justino Ferreira e Manuel Domingos Gonçalves por conhecerem o lesado e saberem que na altura do acidente que o mesmo prestava serviços para a Fozmel, Lda, Isidro Rocha, Gerente da Fozmel, Lda, que por ser seu patrão no momento do acidente, demonstrou quanto o lesado ganhava, o prazo (6 meses) pelo qual tinha feito uma empreitada, a relação laboral existente entre o lesado e a empresa, quando o mesmo iniciara funções e o facto de o ter contratado para essa empreitada. Nos documentos de fls.6, 27, 28, 36, 42, 44, 45, 50, 70, 71, 72, 144, documento médico de 19.9.03, declaração diagnosticum e CRC. Quanto aos factos dados como não provados não foi feita prova segura, consistente ou convincente da verificação dos mesmos, por forma, a que pela positiva pudessem ser dados como assentes. Quanto aos factos não provados do pedido cível não se considerou o depoimento da testemunha Maria Graziela Carriço, por nesta parte se revelar interessado, parcial e não isento. No mais, não foi feita prova convincente para dar os mesmos como provados.
#
A- Recurso subordinado – admissibilidade Diz a demandada seguradora que estamos no âmbito do processo penal o que quer dizer que a motivação do recurso tem que ser instruída com o respectivo requerimento. Vejamos: O demandante cível em 18 de Novembro de 2003, a fls. 219, apresentou requerimento no qual interpõe recurso subordinado . Este recurso foi admitido em 3 de Dezembro de 2003. Em 6 de Janeiro de 2004, fls. 231, apresentou a respectiva motivação. Estabelece o artº 404º, nº 2 do CPP que o recurso subordinado é interposto no prazo de 15 dias contado a partir da notificação do despacho que tiver admitido o recurso da parte contrária. Por sua vez o nº 3 do artº 411º do CPP estabelece que o requerimento de interposição do recurso (sem fazer qualquer distinção entre principal e subordinado) é sempre motivado, sob pena de não admissão do recurso.
Logo afigura-se-nos que o recurso subordinado terá que obedecer ás regras do processo em que está inserido ,neste caso, no âmbito do processo penal. E não poderia deixar de ser de outro modo já que o recurso subordinado está dependente do prosseguimento de um recurso independente e principal interposto por uma das partes civis, e não faria sentido que o principal estivesse sujeito à lei adjectiva penal e o subordinado à civil. Aliás diremos que a uniformização foi a intenção do legislador já que diversamente do que sucedia com o Código de Processo Penal anterior, que silenciava a possibilidade de recurso subordinado, ocasionando o recurso ás regras de processo civil, o referido artº 404º veio disciplinar no processo penal o recurso subordinado. E não se argumente que o recurso só abrange a questão civil. Na verdade a indemnização de perdas e danos emergentes de crime é regulada pela lei civil quantitativamente e nos seus pressupostos, porém processualmente é regulada pela lei processual penal. Neste sentido o Ac. do STJ de 30-11-1993 processo 44603/3 : Em processo penal , só é possível interpor recurso subordinado relativamente à matéria cível exercida conjuntamente e apenas no caso de uma das partes cíveis ter interposto recurso principal, não sendo possível socorrermo-nos das normas do CPC. Deste modo não se admite o recurso subordinado , não obstante ter sido admitido pelo Tribunal a quo. (artº 414º, nº 3 do CPP)
#
B- Quantum indemnizatório – Lucros cessantes Insurge-se a demandada/recorrente no que respeita ao montante indemnizatório fixado a título de lucros cessantes já que apenas se provou que o ofendido/demandante tinha um contrato de 3 meses a auferir 1800 € mensais. Considerando uma quantia de 1800.00 € mensais X 12 ( que não se provou que perdurasse para além dos seis meses de contrato), a idade do recorrido Vítor , 57 anos , a IPP de 15% , o limite de trabalho aos 65 anos e uma taxa de juro de 4% , originam um capital de 24.663. 20 €. Não se pode aceitar que o cálculo da IPP tenha por base o rendimento mensal de 1500.00 €. Quando muito , só poderá ser utilizado para o seu cálculo um rendimento mensal equivalente ao salário mínimo nacional , ou seja 350.00 €. Quantia esta , que se considera indispensável a uma subsistência com o mínimo de dignidade e conforto. Decidindo: Os nossos tribunais vêm utilizando para a determinação da indemnização por estes danos diversos critérios e métodos.( -Dano Corporal em Acidentes de Viação, Dr. Joaquim Dinis, Col. Jur. 1997-Ano V- Tomo II,pags. 11 e segs., Ac. do STJ de 11-11-97,Col. Jur. Acs. do STJ ,III-132) Um destes métodos consiste em fixar a indemnização através de capital cujo rendimento seja susceptível de garantir prestações periódicas correspondentes à perda de ganho concretamente ocorrida, tendo em atenção as taxas de juro praticadas pelas instituições bancárias. Outro dos métodos utilizados é em tudo idêntico ao apontado apenas se distinguindo pela taxa de juros com que joga . Em vez de se aplicar a taxa de juro praticada pelas instituições bancárias ,opta-se por uma taxa de juros fixa e inalterável. Finalmente, é usual também fixar a indemnização, calculando-se na base dos salários ou rendimentos que o lesado ou vítima auferia à data do evento (actualizados) jogando em seguida com o índice de longevidade e procedendo depois a uma redução, em termos de equidade, por forma a evitar a cumulação do montante apurado com os juros futuros da respectiva capitalização. A nosso ver, é apesar de tudo este último método o que melhor acautela e defende os interesses dos lesados, sendo igualmente o menos injusto, uma vez que não joga com a taxa de juro, a qual conforme é sabido, é muito volátil. Ora, a aplicação de uma taxa de juros fixa, qualquer que ela seja, ou a aplicação da taxa de juro paga pelas instituições bancárias, aquando da decisão a proferir, conduz necessariamente a grandes injustiças face á apontada volatilidade das mesmas. Na nossa perspectiva qualquer critério que seja utilizado terá de ser sempre temperado com uma boa dose de equidade. Na verdade o cálculo destes danos é sempre uma operação delicada, de solução difícil, porque obriga a ter em conta a situação hipotética em que o lesado estaria se não houvesse sofrido a lesão, o que implica uma previsão ,pouco segura, sobre dados verificáveis no futuro. E por isso é que tais danos se devem calcular segundo critérios de verosimilhança ou de probabilidade, de acordo com o que, no caso concreto, poderá vir a acontecer, seguindo as coisas o seu curso normal e , se mesmo assim, não pode apurar-se o seu valor exacto, deverá o tribunal julgar segundo a equidade.( - Vaz Serra, RLJ 112º, 329 e 114º, 287 e segs; P. de Lima e A. Varela, ob. cit 584; Dario Martins de Almeida, Manual de acidentes de Viação, 114.) Nesse julgamento de equidade não podem deixar de entrar circunstâncias, tais como : a expectativa de duração devida da vítima, a sua expectativa de progressão na carreira profissional ( se for caso disso), e a flutuação do valor da moeda.( - Ac. do STJ 15-12-98, Col. Acs. STJ III-156,Ac. desta Relação de 7-12-99,no processo n.º 2382/99,) Por esse motivo, e na impossibilidade de recorrermos à “indemnização em renda”, prevista pelo art.º 567º , do CC, face ao pedido concretamente formulado, entendemos ser de optar pelo critério que parte dos salários ou rendimentos auferidos pelo lesado ou pela vítima à data do evento danoso, jogando em seguida com o índice de longevidade e procedendo depois a uma redução, em termos de equidade, por forma a evitar a cumulação do montante apurado com os juros futuros da respectiva capitalização.( - Ac. desta Relação proferido no Recurso n.º 920/97) Passemos, pois , ao cálculo do quantitativo indemnizatório tendo em atenção a opção feita, como ponto de partida e base de fixação, mas nunca descurando os princípios e critérios que presidem à equidade.( - Acs. do STJ 11-11-97, Col Jur. Acs. do STJ, III-132, STJ 18-3-97,Col. Acs. do STJ II- 24.) sendo certo que o recurso à equidade não significa o puro arbítrio mas o apelo a “todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de critérios ponderação das realidades da vida.” ( A. Varela Das Obrigações ...I, 599) , ou seja, a justiça do caso concreto, sem se esquecer ainda, até por uma questão de justiça relativa, os critérios geralmente adoptados na jurisprudência. Como dado inquestionável temos, tão só, a percentagem da perda da capacidade de ganho, tendo sido fixada uma capacidade de 17%,embora só possa trabalhar a 50%. A objecção levantada pela recorrente /seguradora em relação à sentença recorrida prende-se com o facto do ofendido apenas ter um contrato de três meses a auferir 1800 € mensais e tal não ter sido tido em conta, já que não ficou provado quer relativamente ao rendimento que teria antes desse meio ano de contrato, quer quanto ao rendimento que viesse a ter após esse meio ano de contrato. Contudo aceita que para o cálculo da indemnização se parta de um rendimento mensal equivalente ao salário mínimo nacional. Esta assunção está de acordo com a orientação jurisprudencial dominante de que a circunstância do lesado não exercer qualquer profissão à data do acidente, não afasta a existência de um dano patrimonial futuro indemnizável.( - Entre outros Ac. do STJ 5-7-68 BMJ 179,159, comentado por Vaz Serra, in Rev. Leg. Jur. 102º, pag. 296 e segs,Acs. desta Relação de 17-3-92,in C.J. ,2, 45 e de 4-4-95 , CJ II,23. Ver também A. Varela Das Obrigações em Geral, Vol. I, 7ª ed. pag. 910) Concordaríamos com esta posição da recorrente se estivéssemos perante um trabalhador indiferenciado. Obviamente que o salário mínimo tem que se considerar como um ponto de partida e nunca como um limite máximo inultrapassável, por isso mesmo é que é considerado salário mínimo. Não podemos olvidar assim no entanto a realidade social e profissional que é o caso em apreço e que ficou demonstrada. Estamos perante um técnico de electrotécnica, especialista em alta como em baixa tensão e que na altura dos factos auferia 1.800 €, o quíntuplo do salário mínimo. É com este enquadramento sócio-profissional e remuneratório que se terá de fazer o cálculo mais uma vez se lançando mão a critérios de equidade. Assim considerando o exposto, o tempo de vida activa do ofendido, que parte significativa dos rendimentos por si auferidos, se destinavam a si próprio, entendemos não merecer censura o quantitativo fixado pelo tribunal a quo.
# Nestes termos se decide: O recorrente subordinado pagará 5(cinco) Ucs de taxa de justiça, sendo que a recorrente seguradora pagará 10(dez) Ucs de taxa de justiça |