Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | GERMANO DA FONSECA | ||
Descritores: | OBRIGAÇÃO DE PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS OBRIGAÇÃO ALIMENTAR MAIORIDADE | ||
Data do Acordão: | 03/22/2006 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | COMARCA DE VISEU | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | RECURSO CRIMINAL | ||
Decisão: | CONFIRMADA | ||
Legislação Nacional: | ARTº. 250º DO C. PENAL | ||
Sumário: | 1. Só existe obrigação legal de pagar alimentos a filho de maioridade a partir da decisão judicial que vincule o progenitor a prestá-los. 2. Na ausência dessa decisão proferida em processo próprio, o pai, que não paga alimentos a filho maior, não comete o crime de violação da obrigação de alimentos p. e p. pelo artº. 250 do C. Penal. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra: A... apresentou queixa contra B... por factos que, na sua óptica, integrariam o crime p. e p. pelo art.250º do Cod. Penal. No final do inquérito foi determinado o arquivamento dos autos, uma vez que o denunciado já não estava legalmente obrigado à prestação de alimentos. Requereu o queixoso a abertura da instrução, no final da qual foi proferido despacho de não pronúncia. De tal recorre o queixoso, formulando uma única conclusão: 1. Fez aplicação insuficiente do artº250 do Código Penal precisamente na medida em que faz a interpretação do instituto jurídico dos alimentos de uma forma susceptível de o reduzir e lhe retirar, em grande parte, o seu efeito útil. O M. P. e o denunciado entendem que o recurso não merece provimento. Foi cumprido o disposto no art.417º,nº2 do Cod. Proc. Penal. Colhidos os vistos legais cumpre decidir. X X X Para melhor esclarecimento da questão em análise nos autos transcreve-se a parte decisória do despacho recorrido: Pretende o assistente que o arguido seja pronunciado pela prática de um crime de violação a obrigação de alimentos, previsto e punido, nos termos do artigo 250º, n01 do Código Penal. Como resulta do artigo 250º, n.01 do Código Penal “Quem, estando legalmente obrigado a prestar alimentos e em condições de o fazer, não cumprir a obrigação, pondo em perigo a satisfação, sem auxílio de terceiro, das necessidades fundamentais de quem a eles tem direito, é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias”. Trata-se de um crime de perigo concreto, uma vez que, basta a perspectiva do perigo para que o crime se consuma. São elementos constitutivos do crime de violação da obrigação de alimentos: a) a vinculação de uma pessoa a uma obrigação legal de alimentos; b) que essa pessoa esteja em condições de os prestar; c) o não cumprimento da obrigação; d) que esse não cumprimento ponha em perigo a satisfação das necessidades fundamentais de quem a eles tem direito; e) a ocorrência desse perigo, independentemente do auxílio de terceiros. Nos termos do artigo 2003º do Código Civil entende-se por alimentos “tudo o que e indispensáveis ao sustento, habitação e vestuários” neles se compreendendo, também “a instrução e educação do alimentando no caso deste ser menor”. No âmbito do poder paternal a temática dos alimentos ganha ainda a contemplação das regras especiais ínsitas nos artigos 1877º e ss. do Código Civil, designadamente o artigo 1878º, n.1 que refere que “Compete aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigira sua educação(..)”. Ora, a questão em debate nesta instrução prende-se com a obrigação de o arguido prestar ou não alimentos ao seu filho, depois de este ter atingido a maioridade (sendo certo que a prova recolhida, assente inclusive nas declarações do assistente, vai no sentido de que o arguido pagou sempre a prestação alimentícia e que só o deixou de fazer no momento em que o assistente completa 18 anos, sendo certo que, depois desta data, nunca lhe foi solicitada qualquer ajuda financeira). Quanto a nós, e perante os elementos de facto recolhidos, bem andou o Ministério Público quando decidiu arquivar o inquérito. Com efeito, o comportamento do arguido não preenchia, desde logo, o primeiro dos elementos típicos do crime em questão e já enunciado: a vinculação de uma pessoa a uma obrigação legal de ‘«alimentos. Sabe-se que, a partir de Janeiro de 2002, com a maioridade do assistente, o arguido deixou de estar legalmente obrigado a prestar-lhe alimentos (as obrigações morais não servem para o preenchimento do tipo criminal), e para que voltasse a pender sobre si tal obrigação necessário se tornava a instauração de uma acção de alimentos e a respectiva procedência a favor do assistente. Julga-se, assim, sem necessidade de outras considerações, que não há nenhuma probabilidade de o arguido vir a sofrer uma futura condenação razão pela qual: se decide não pronunciar B... pelos factos e ilícito que lhe é imputado no requerimento de abertura da instrução. E teremos de concordar com o decidido. Com efeito, para que se verifique a existência do tipo legal de crime em causa, torna-se necessário que exista uma obrigação de prestação de alimentos. Esse encargo recaía sobre o denunciado por via de regulação do exercício do poder paternal. Nos termos do art.1880º do Cod. Civil subsiste tal obrigação, atingida a maioridade, quando tal seja necessário para que o alimentando complete a sua formação profissional. Como se decidiu no Ac. da Rel. Lisboa, de 15/7/82, BMJ 325,595, “o direito a alimentos advindo da condição jurídica de menor extingue-se com o advento da maioridade. II- O ora maior só manterá o direito a alimentos se se verificar o condicionalismo referido no art.1880º do Cód. Civil, mas, para tanto, terá de convencer judicialmente o obrigado de que o direito existe, intentando o procedimento no Tribunal Comum, através do meio processual consignado no art.1412º do Cod. Proc. Civil.” Só a partir de decisão judicial que vincule o progenitor a prestar alimentos é que essa obrigação tem existência legal, não sendo, até aí, exigível. Isso reconhece, aliás, o recorrente ao referir na motivação do recurso, ao dizer já tendo intentado acção nesse sentido. Por isso não se pode dizer que a decisão recorrida restringiu o âmbito do art.250º do Cod. Penal, pois fez-se uma interpretação totalmente de acordo com a lei, pelo que o recurso não merece provimento. X X X Pelo exposto, acordam em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão recorrida. Custas pelo recorrente, fixando a taxa de justiça em 8 UCs. Coimbra, |