Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
642/04.5TBSEI.C2
Nº Convencional: JTRC
Relator: FALCÃO DE MAGALHÃES
Descritores: RESPONSABILIDADE
BANCÁRIO
GERENTE
RESPONSABILIDADE CIVIL DO COMITENTE
Data do Acordão: 10/06/2009
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE SEIA – 1º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTºS 165º E 500º, NºS 1 E 2, DO C. CIV..
Sumário: I - Embora todo o facto ilícito encerre, em certo sentido, um excesso de competência, um acto, não obstante ilícito, se se integrar, formalmente, no quadro geral da competência do comissário, é susceptível de ser havido como praticado “no exercício da função” que a este foi confiada, para efeitos do disposto no art.º 500° do CC.

II - Responde enquanto comitente, nos termos do art.º 500º, nº 1, do CC, o Banco cujo director de balcão, servindo-se dessas funções e prometendo taxas de juro elevadíssimas em contrapartida de supostas aplicações em sucursais do Banco no estrangeiro, cuja constituição propõe a diversos clientes do mesmo, convence estes clientes a entregarem-lhe valores, supostamente destinados a constituir tais aplicações - entregando-lhes, por sua vez, "documentos" por si forjados (designadamente, quanto ao "timbre", aos dizeres, e às "assinaturas”), com o nome do Banco, a "confirmar" as ditas "aplicações" -, quando, na realidade, deposita esses valores em contas que possuía noutras instituições bancárias e utiliza-os em proveito próprio.

III - Trata-se, a responsabilidade do Banco, não de responsabilidade contratual emergente dos acordos que o seu funcionário, na prossecução de conduta criminalmente ilícita, firmou com os ditos clientes, mas sim de responsabilidade objectiva, que, como tal, não pressupõe a culpa do comitente, que funciona como garante do ressarcimento dos danos que para o terceiro lesado decorram da conduta do comissário, sem prejuízo de, em princípio, pela via do direito de regresso, poder vir a exigir deste as importâncias que a esse título tenha satisfeito àquele (art.º 500º, n.º 3, do CC).

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

I - A) - A... e B..., intentaram, em 28/10/2004, no Tribunal Judicial da Comarca de Seia, acção declarativa de condenação, com processo comum, sob a forma ordinária, contra o C... (ao qual veio a suceder, na sequência de operação de fusão, o D...), pedindo a condenação do réu a pagar-lhes quantia de € 1.892.315,42, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a sua citação e até integral “liquidação”.

Alegaram para o efeito, em síntese, que:

- Os seus pais, que procedem habitualmente ao investimento financeiro do dinheiro que vão amealhando, numa das suas deslocações à agência de Seia do C... foram informados da existência de um produto financeiro que oferecia taxas de juros aliciantes, sendo o dinheiro investido através da sucursal do Banco Réu em Londres;

- Assim, entre Julho de 1993 e Fevereiro de 2001, os pais dos AA. fizeram dez aplicações financeiras (a última com vencimento em 01/02/2004), com taxas de juros variáveis, revertendo o valor dos referidos juros para os AA.;

- Dessas 10 aplicações, as primeiras 3 foram bem sucedidas, tendo sido creditados a favor dos pais dos AA. capital e juros remuneratórios nas respectivas datas de vencimento;

- Quanto às restantes 7 aplicações, em Setembro de 2003 os pais dos AA. foram informados pelo Réu de que o seu gerente do balcão de Seia teria cometido actos ilícitos no exercício da sua profissão, tendo os representantes do Réu pedido àqueles que reunissem todos os documentos que possuíam relativamente a tais 7 aplicações, uma vez que as mesmas nunca tinham sido concretizadas junto da sucursal do Banco em Londres ou qualquer outro lugar e que o aludido gerente se havia apropriado das quantias entregues, quer pelos pais dos AA., quer por outros clientes.

- O Réu devolveu todo o capital que os AA. haviam investido, mas decidiu não devolver os juros convencionados.

- Caso as aplicações 4 a 10 se tivessem vencido nas datas convencionadas, os AA. teriam obtido um ganho global de 379.375.180$86 / € 1.892.315,42.

Contestando, sustentou o Réu, em síntese, que:

- Os seus serviços, em Setembro de 2003, detectaram um conjunto de irregularidades e de ilícitos praticados pelo seu funcionário E..., à data a desempenhar as funções de director na agência de Seia, que, com a promessa de taxas de juro elevadas, convenceu diversos clientes do C... a constituírem supostas aplicações nas sucursais do C... em Londres e Luxemburgo, utilizando em seu proveito os montantes entregues, e forjando documentos com o nome do C...;

- Apenas sabe que os pais dos AA. entregaram, por intermédio do E..., ao C... a importância de 475.000.000$00, que já devolveu, mas desconhece se foram acordadas taxas de juro e, a terem-no sido, quais em concreto, impugnado toda a matéria da PI relacionada com tais acordos e documentos apresentados;

- As taxas juros alegadamente prometidas são desajustadas às praticadas no mercado, e não existiam nem na sucursal de Londres, Luxemburgo ou em Portugal, nem na banca em geral, nem na agência do C... em Londres havia aplicações a mais de um ano.

Concluiu, defendendo a improcedência da acção e a sua absolvição do pedido.

Replicando, os AA. mantiveram, no essencial, quanto à factualidade alegada, o já afirmado na petição inicial, concluindo como nesse articulado haviam feito.

Foi proferido despacho saneador, tendo-se procedido à selecção da matéria de facto assente e à elaboração da base instrutória, com posterior reclamação do Réu que veio a ser atendida parcialmente.

Efectuada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença, em 21 de Janeiro de 2007, que, na parcial procedência da acção, condenou o Réu a pagar aos AA. A... e B..., a quantia de € 555.283,32, acrescida de juros, à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento.

Inconformadas com tal sentença, dela apelaram ambas as partes, tendo esta Relação, por Acórdão de 30/10/2007, anulando a resposta ao quesito 49º, bem assim como o julgamento (na parte afectada) e, consequentemente, a sentença, determinado a realização de julgamento para produção de prova sobre os factos abrangidos pelo aludido quesito 49°, salvaguardando a possibilidade de o tribunal “a quo” ampliar o julgamento de modo a apreciar outros pontos da matéria de facto, com o fim de evitar contradições na decisão.

Deste Acórdão pediu o réu, sem êxito, a respectiva reforma.

B) - Volvendo os autos à 1.ª Instância e aí tendo seguido os seus ulteriores termos em cumprimento do decidido no referido Acórdão de 30/10/2007, procedeu-se à determinada audiência de julgamento, proferindo-se, a anteceder a decisão sobre a matéria de facto, o despacho de fls. 940, em que se decidiu que a factualidade objecto de reapreciação seria ampliada aos factos inquiridos nos quesitos 46º, 47º e 48º.

No despacho de 29/07/2008 (fls. 951 a 952), além de se ter decidido quais os quesitos que se tinham por provados, determinou-se, ainda, que a alínea E) dos factos assentes passasse a ter a seguinte redacção: “Nesse acordo, AA. e Banco R. consignaram que o capital aplicado ascendia a 2.369.290,00 euros, quantia que o Banco entregou aos AA.”.

A sentença, que veio a ser proferida em 28/10/2008 (fls. 956 e ss.), julgando a acção parcialmente procedente, condenou o Réu “D...”, a pagar aos AA. A... e B... a quantia de € 555.283,32, acrescida de juros, à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento.

Inconformados com tal sentença, desta recorreram AA. e Réu, tendo os respectivos recursos sido recebidos como apelações, com efeito devolutivo (fls. 1006).

C) - Os AA., a findar as respectivas e doutas alegações de recurso, formularam as seguintes conclusões:

[…]

Defendendo a revogação da sentença impugnada, terminaram requerendo que, em lugar desta, fosse proferida decisão que, reconhecendo a existência dos seis contratos firmados entre AA e o Banco Réu, se condenasse este “no seu integral e escrupuloso cumprimento, como ab initio peticionado…”.

D) - O Réu, por sua vez, terminou as doutas alegações da sua Apelação, com as seguintes conclusões:

[…]

Terminou pugnando pela revogação da sentença recorrida, substituindo-se esta por decisão que o absolva do pedido.

Corridos os “vistos” e nada a isso obstando, cumpre decidir.

E) - Questões a resolver:

Em face do disposto nos art.ºs 684, nº 3 e 4, 690, nº 1, ambos do Código de Processo Civil (CPC)[1], o objecto dos recursos delimita-se, em princípio, pelas conclusões dos recorrentes, sem prejuízo do conhecimento das questões que cumpra apreciar oficiosamente, por imperativo do art.º 660, n.º 2, “ex vi” do art.º 713, nº 2, do mesmo diploma legal.

Não haverá, contudo, que conhecer de questões cuja decisão se veja prejudicada pela solução que tiver sido dada a outra que antecedentemente se haja apreciado, salientando-se que, com as “questões” a resolver se não confundem os argumentos que as partes esgrimam nas respectivas alegações e que, podendo, para benefício da decisão a tomar, ser abordados pelo Tribunal, não constituem verdadeiras questões que a este cumpra solucionar (Cfr., entre outros, Ac. do STJ de 13/09/2007, proc. n.º 07B2113 e Ac. do STJ de 08/11/2007, proc. n.º 07B3586 [2]).

As questões que se colocam, traduzem-se em saber:

a) Se a sentença ora recorrida enferma de nulidade:

- Devido a oposição entre a decisão e os respectivos fundamentos (alínea c) do n.º 1 do art.º 668.º do CPC);

- Por ocorrer omissão de pronúncia (alínea d) do n.º 1 do art.º 668.º do CPC);

- Por condenar em objecto diverso do pedido (alínea e), n.º 1, do art.º 668.º, do CPC).

b) Se a sentença recorrida padece de erro de julgamento, ou seja, se, atenta a factualidade provada e as normas legais aplicáveis, revela desacerto a condenação proferida pelo Tribunal “a quo” e, em caso afirmativo, se a acção deve proceder na íntegra, ou se, ao invés, deve ser julgada improcedente, absolvendo-se o réu do pedido.

II - A) - Na sentença da 1.ª Instância foi considerada como factualidade provada, a seguinte matéria:

[…]

B) - 1 - Nulidades de sentença:

- Oposição entre a decisão e os respectivos fundamentos (alínea c) do n.º 1 do art.º 668.º do CPC):

Os AA. sustentam a existência desta nulidade, alegando, em síntese, que:

Em face da matéria de facto dada como provada sob os pontos 8, 9, 21, 22, 23, 25 e 33 da sentença e através da qual o Tribunal a quo julga existentes, válidos e vigentes entre as partes, as aplicações identificadas como 1, 2 e 3; - sem nunca questionar a respectiva qualificação como "verdadeiros contratos" (bancários), como genericamente desenhados no artigo 405.º do Código Civil Português, e assim "susceptíveis de vincular o Réu" nos seus exactos termos e condições -, confrontada com a matéria ali também considerada provada sob os pontos 39, 43 e 44, 46, 55 a 59, 61 e 63, 66 e 67, 69 a 71 e 73 a 75, não se vislumbra que fundamento haja para a sua não qualificação como "verdadeiros contratos bancários", antes impondo a afirmação da existência de um verdadeiro contrato bancário.

Assim, defendem os AA., ser “…notória a contradição de tal decisão com os fundamentos que lhe subjazem, o que a torna nula nos termos do art. 668º, nº 1, al.-c) do C.P.Civil”.

Por outro lado, sustentam os AA., relembremos: “A afirmação de que «Para além de informar mal, E... convenceu os pais dos AA. a entregarem-lhe dinheiro com a finalidade anunciada de o aplicar, com determinada remuneração»21 padece, no mínimo, de ambiguidade, na medida em que, ao não aludir à qualidade em que o agente actuou, omite, ou contradiz mesmo, os factos considerados provados sob os números 73, 74 e 75; estando, portanto, ferida da nulidade prevista no artigo 668.º/1,-c) ou de mera ambiguidade que urge esclarecer, nos termos do artigo 669.º/1,-a), ambos do C.P.Civil.”.

Vejamos.

A nulidade em causa, como se escreve no Acórdão do STJ de 26/4/95, (Cfr., Col. Jur., Acórdãos do STJ, Ano III, 1995, Vol. II, pág. 57 e ss.), “...pressupõe um erro lógico na ponta final da argumentação jurídica: os fundamentos invocados apontam num sentido, e, inesperadamente, contra a conclusão decisória que dos mesmos, e dentro da linha de raciocínio adoptada, se esperava, veio-se a optar afinal pela solução adversa”.

Para que ocorra a oposição considerada na aludida alínea c) do n.º 1 do art.º 668.º do CPC, é essencial que se verifique uma real contradição entre a parte dispositiva da sentença ou do acórdão e os respectivos os fundamentos. O raciocínio do julgador terá de enfermar deste vício real: “a fundamentação aponta num sentido; a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direcção diferente”[3].

A circunstância de se darem como provados factos que se contradigam, pode, eventualmente, conduzir a uma subsequente errada aplicação do direito, mas não traduz a oposição de que trata a alínea c) do n.º 1 do art.º 668.º do CPC, consubstanciando, antes, um vício do julgamento de facto [4].

Por outro lado, a circunstância de se darem como provados factos que criem, ainda que legitimamente, face ao que se entende que seria o correcto enquadramento jurídico daqueles, a expectativa de a causa ser julgada de determinada forma, vindo, depois, a ser proferida decisão em sentido contrário, não consubstancia, também, a oposição de que trata a alínea c) do n.º 1 do art.º 668.º do CPC. O que haverá, nesse caso, será erro na subsunção dos factos ao direito. Ou seja, se a solução jurídica encontrada na sentença não se adequa à expectável correcta aplicação do direito aos factos, a hipótese é enquadrável no erro de julgamento e não em nulidade de sentença.

Independentemente de divergirmos da afirmação sobre a existência das contradições que os AA. apontam, com respeito à discrepância que no que concerne à qualificação dos acordos respeitantes às “aplicações financeiras” aqui em causa, bem como à falta de alusão à qualidade em que o agente actuou, quando na sentença se refere a conduta do funcionário do Réu que levou os pais dos AA. a entregarem-lhe dinheiro com a finalidade de o aplicar, diremos que, “in casu”, a parcial procedência da acção está baseada em fundamentos que se revelam harmónicos com essa decisão, não ocorrendo, pois, a oposição que, nos termos acima explanados, relevaria para efeitos de se considerar verificada a nulidade prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 668.º do CPC.

Também se entende que a sentença é clara, nomeadamente, quanto à caracterização da conduta do aludido E... e à qualificação deste - enquanto seu funcionário - como comissário do Réu, não se vendo que uma interpretação diferente, ou contrária, resulte da falta de alusão que os AA. apontam, pelo que não se descortina aí qualquer ambiguidade ou contradição.

- Omissão de pronúncia (alínea d) do n.º 1 do art.º 668.º do CPC:
A sanção prevista na alínea d) do n.º 1, do artigo 668.º do CPC, para a omissão de pronúncia, tem a ver, como é sabido, com a inobservância do que se preceitua no n.º 2 do art. 660º, na parte que impõe ao juiz o dever de “...resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras...”.
Já acima salientamos que, com as “questões” a resolver se não confundem os argumentos que as partes esgrimam nas respectivas alegações.
A esse propósito escreveu o Prof. Alberto dos Reis: «São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiaram para sustentar a sua pretensão.» (...) «A sentença é nula se deixa de conhecer, devendo fazê-lo, de questões suscitadas pelas partes (...); mas não é nula se, no julgamento de tais questões, deixa de tomar em consideração algumas das razões ou algum dos fundamentos jurídicos de que as partes se hajam servido.»[5].
Percorrendo a decisão recorrida, não se vê nela sinal de que o Tribunal “a quo” haja aí omitido a apreciação de qualquer questão que lhe cumprisse conhecer.

Os Apelantes AA. alegam, a este propósito, relembre-se: «…ao só considerar a quantia de Esc.21.575.000$00 (peticionada pelos AA) como participação de capital na aplicação n.º 7, olvidando que, antes do mais, constitui remuneração (juros) de uma aplicação financeira realizada pelos AA. em Agosto de 1996, no valor de Esc.50.000.000$00 _quesitos 46 a 48.º e pontos 52 a 54 dos Factos Provados_, cujo pagamento foi, como tal, nestes autos peticionado pelos AA., sobre o que o Tribunal a quo se não pronunciou…».

Ora, em nosso entender a apontada matéria foi abordada pelo Tribunal “a quo” e, adiante-se, de forma correcta, a nosso ver, pelo que, sendo lícito aos AA. discordaram da solução encontrada, isso não legitima a afirmação da existência de omissão de pronúncia.

Vejamos.

Já na fundamentação respeitante às respostas que, após a repetição do julgamento, se deu aos quesitos (fls. 951-952), se havia dito, o que veio a justificar também a alteração da redacção da alínea E) dos factos assentes, nos termos referidos em I-B) “supra”: “Conforme a testemunha relatou, havia efectuado uma aplicação financeira de 50.000 contos junto do Banco A. em 1996 (fls. 90), e esta rendeu-lhe um montante de juros de 21.575.000S00, em 2000. Uma vez decidido o reinvestimento destes valores no novo "produto financeiro" apresentado por E..., resultou uma aplicação de 71.575.000$00, conforme desde o primeiro julgamento ficou a constar dos factos provados. Ora, as alíneas D) e E) dos factos assentes referem-se a um acordo extrajudicial celebrado pelas partes na presente acção, e no qual a quantia de 21.575.000500 não foi pelas mesmas considerada como capital, antes como juros, face à sua diversa origem. Erradamente, afirmamos nós, uma vez que, após recebida a remuneração do investimento inicial, esta passa a revestir a natureza de capital, mormente se esse montante for reinvestido - como sucedeu, no condicionalismo provado. Este o fundamento da contradição existente na matéria de facto, que, embora melhor esclarecida através das respostas agora dadas, impõe ainda, em nosso entender, a alteração da alínea E) dos factos assentes, de forma a consignar que aquela quantia foi a que as partes fizeram constar do acordo extrajudicial celebrado - o que vai de encontro à verdade material. É que a consideração, pelas partes, num acordo extrajudicial da natureza de capital ou de juros de determinado montante não vincula - nem poderia vincular - o tribunal, que aplica o direito, e qualifica juridicamente os factos, de forma livre.”.

O Réu, a propósito da invocada omissão, referiu nas suas doutas contra-alegações: «…o pedido formulado na presente acção pelos AA., ora recorrentes, respeita exclusivamente a juros (e unicamente às taxas acordadas com E...), não abrangendo qualquer parcela de capital.

E, ressalta claro dos autos que os próprios AA. consideram os Esc. 21.575.000$00 em causa como juros e como tal os peticionaram -vd., designadamente, o ponto 94 da p.i.

Sendo igualmente claro que o valor total do pedido formulado nos autos (que, repete-se, corresponde apenas a juros) integra a referida verba de Esc. 21.575.000$00.

Ou seja, os AA. não peticionaram a condenação do R a pagar-lhes a verba em causa a título de capital, mas sim como juros.

Ora, é irrefutável que a sentença se pronunciou sobre o pedido enunciado pelos AA., tendo decidido que o R. deveria efectivamente pagar juros, mas a taxas diferentes das por aqueles cobiçadas.

Julga-se, assim, manifesto que não ocorreu qualquer omissão de pronúncia, pelo que deve ser indeferido o inerente pedido de nulidade suscitado pelos AA.».

Concordando-se com este entendimento expresso pelo Réu, salienta-se, ainda, que, embora sem conclusão de que os AA. colhessem benefício, considerou-se na sentença recorrida: «Conforme se referiu na fundamentação da resposta à matéria de facto de fls. 951-952, resulta a diferença entre este valor e a soma do capital aplicado do facto de não terem as partes considerado como capital, para esse efeito, no acordo extrajudicial celebrado, parte do montante da aplicação financeira n.º 7, a saber, os juros resultantes da anterior aplicação de 1996, que foram reinvestidos - tendo, a partir do momento em que teriam sido recebidos pelos AA. e posteriormente reinvestidos, passado a constituir parte do capital, e nunca juros, conforme parece ter sido considerado pelas partes.

Porém, não foi peticionado nos autos a condenação do Banco Réu a entregar aos Autores essa diferença, encontrando-se o tribunal impedido de o condenar em conformidade.

Na verdade, a divergência entre as partes que dá origem aos presentes autos respeita apenas à remuneração devida aos AA. pela entrega daquelas quantias, em face da finalidade apurada.».

Improcede, pois, o alegado pelos AA. quanto à omissão de pronúncia que imputam à sentença recorrida.

- Nulidade prevista no n.º 1, alínea e), do art.º 668.º, do CPC:

A nulidade prevista no art.º 668º, n.º 1, al. e), do CPC, radica na violação da proibição da condenação “extra vel ultra petitum”, proibição esta imposta pelo art.º 661º, n.º 1, do mesmo Código.

Efectivamente, decorrente do princípio do dispositivo, a norma do citado art.º 661º, n.º 1, impede que o Juiz condene em quantidade superior, ou em objecto diverso do que se pedir.

Pressuposto da apontada violação e, consequentemente, da correspondente nulidade de sentença, é que nesta se tenha extravasado o pedido.

A sentença, nas palavras de Manuel de Andrade, “…deve manter-se no âmbito da acção (pedido, lato sensu), identificada através dos sujeitos, do objecto e da causa de pedir…” (in, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora - 1979 - pág. 298).

Não se olvidando, assim, que a apontada infracção também se verificará no caso de se absolver o réu de um pedido que o autor não formule [6], a patologia de que tratamos ocorre, em regra, nos casos em que o Juiz, saindo do “thema decidendum” configurado pelo autor, condena em quantidade superior, ou em objecto diverso do que este pediu.

Ora, no caso “sub judice”, o que os AA. pediam era o pagamento da quantia a que ascendia a totalidade dos juros que, às taxas que indicaram, renderiam as importâncias entregues ao funcionário do Réu relativas às “aplicações financeiras” em causa, não sendo diverso do pedido formulado, nem indo além deste, mas antes nele se contendo, a condenação do Réu no pagamento de quantia atinente aos juros dessas mesmas importâncias, só que calculados estes a taxas muito inferiores às pedidas, não sendo esta conclusão infirmada pela circunstância de tais taxas terem como referência, não os valores prometidos pelo funcionário do Réu, mas antes as taxas de juro praticadas pela sucursal de Londres do C... em cada um dos anos de imobilização (acrescidas 0,25% - margem de negociação de que dispunha o comissário do Réu)[7].

A sentença recorrida não enferma, pois, da nulidade prevista no art.º 668º, n.º 1, al. e), do CPC.

2 - Erro de julgamento:

De harmonia com o disposto no art.º 165º do Código Civil (CC) “As pessoas colectivas respondem civilmente pelos actos ou omissões dos seus representantes, agentes ou mandatários nos mesmos termos em que os comitentes respondem pelos actos ou omissões dos seus comissários”.

Remete tal norma, pois, para o que o art.º 500º do CC preceitua, referindo o n.º 1 deste artigo que: “Aquele que encarrega outrem de qualquer comissão responde, independentemente de culpa, pelos danos que o comissário causar, desde que sobre este recaia também a obrigação de indemnizar”.

O n.º 2 deste art.º 500º, por sua vez, dispõe: «A responsabilidade do comitente só existe se o facto danoso for praticado pelo comissário, ainda que intencionalmente ou contra as instruções daquele, no exercício da função que lhe foi confiada».

Em várias decisões dos nossos Tribunais Superiores foi já objecto de análise a questão do alcance da expressão “no exercício da função que lhe foi confiada” constante da citada norma.

Diz-se no Acórdão do STJ de 25/06/1998 (Revista n.º 306/98, Colectânea de Jurisprudência - STJ - Tomo II/1998, pág. 130 e ss.): «Na doutrina e na jurisprudência de diversos países era bastante controvertida a questão de saber se o comitente respondia por todos os factos praticados pelo comissário por ocasião da comissão ou apenas pelos praticados no exercício do encargo que lhe foi cometido - (Vaz Serra, Responsabilidade Contratual e Responsabilidade Extracontratual, pág. 165; Manuel Andrade, obra citada, pág. 153).

Com a fórmula restritiva adoptada, a lei quis afastar da responsabilidade do comitente os actos que apenas têm um nexo temporal ou local com a comissão, conforme sublinha Antunes Varela que acrescenta que:

- por um lado, afastada a orientação de que o comitente só responderia quando o comissário, no desempenho das suas funções, obedecesse rigorosamente às instruções que lhe foram dadas (a responsabilidade mantém-se ainda que o acto seja praticado intencionalmente contra as instruções);

- por outro lado, afastada está também a orientação de que o comitente seria responsável por todos os actos do comissário que tenha com as suas funções alguma conexão, ainda que meramente ocasional. - (Das Obrigações em Geral, vol. I, 9ª ed., pág. 665).

P. Lima e A. Varela, em anotação ao art. 500º do Cód. Civil, depois de exporem as três orientações fundamentais do problema em causa, definem a sua posição nos seguintes termos:

"A orientação preferível consiste... em responsabilizar o comitente pelos factos ilícitos do comissário que tenham com as funções deste uma conexão adequada.

Por outras palavras, deverá entender-se que um facto ilícito foi praticado no exercício da função confiada ao comissário quando, quer pela natureza dos actos de que foi incumbido, quer pela dos instrumentos ou objectos que lhe foram confiados, ele se encontra numa posição especialmente adequada à prática de tal facto - (Código Civil Anot., vol. I, 4ª ed., pág. 509).

Era esta a orientação defendida por Manuel de Andrade, face ao Código de Seabra, que escreve:

"...será mister que o órgão ou agente tenha procedido em tal veste ou qualidade; que tenha praticado o facto ilícito no desempenho das suas funções... e por causa dessas funções, que não apenas por ocasião delas, o nexo, portanto, do facto ilícito com as funções do órgão ou agente deve ser directo, interno, causal. Não basta uma simples relação indirecta, externa, puramente ocasional". - (Teoria Geral da Relação Jurídica, vol. I, pág. 151).

Esta é também a orientação adoptada por Mota Pinto ao escrever:

"O órgão ou agente deve ter procedido em tal veste ou qualidade ou ter actuado por causa (sublinhado nosso) das suas funções, e não apenas por ocasião delas e precisa-se que basta que o acto se integre no quadro geral da respectiva competência". - (Teoria Geral do Direito Civil, 1980, pág. 207).

E na mesma orientação se coloca Heinrich Hörster ao escrever:

"Parece que será de responsabilizar a pessoa colectiva pelos actos dos seus representantes e mandatários ou agentes que, da perspectiva do lesado, tenham com as funções destes uma conexão adequada, uma vez que foi a pessoa colectiva quem os escolheu". - (A Parte Geral do Código Civil Português, 1992, pág. 395).

Esta orientação foi acolhida por este Supremo Tribunal quer no seu acórdão de 14/10/87 - B.M.J. nº 370, pág. 379 - quer no de 3 de Maio de 1995, sendo relator o do presente acórdão, onde se concluiu, secundando os ensinamentos de P. Lima e A. Varela, quando, em consolidação da orientação que perfilham, rematam, dizendo:

"Trata-se, afinal, de aplicar, também aqui, num problema de responsabilidade pelo risco, a teoria da causalidade adequada, sempre que as funções do comissário, segundo um critério de experiência, favoreçam ou aumentem o perigo de verificação de certo dano, deverá o comitente arcar com a respectiva responsabilidade". - (Código Civil Anotado, vol. I, 4ª ed., pág. 509 - in B.M.J., nº 447, pág. 431). ».

Também, a Relação do Porto, no Acórdão de 03/07/95, (Apelação n.º 9550087),[8] cuja similitude da situação nele versada, não pode, relativamente àquela de que os presentes autos tratam, deixar de se notar, expressou o seguinte entendimento:

«Conforme ensinava o Prof. Manuel de Andrade (Teoria Geral da Relação Jurídica, vol. I, 1964, pág. 150 e seg. ), para que exista conexidade entre o facto ilícito e as funções do respectivo agente não basta um mero nexo local ou cronológico, externo ou instrumental entre o facto e a comissão. É necessário, para tanto, que o agente " tenha procedido em tal veste ou qualidade " no desempenho das suas funções, por causa delas, e não apenas por ocasião delas (cfr. Antunes Varela, " Das Obrigações em Geral ", vol. I, 6ª ed., pág. 611 e seg., nota ).

Não é necessário que o acto seja praticado rigorosamente no exercício da função, bastando que se integre no quadro geral da respectiva competência. De outra maneira ficaria praticamente excluída - ou pouco menos - a responsabilidade das pessoas colectivas, pois todo o facto ilícito envolve, em certo sentido, uma extralimitação daquela competência, isto é, em sair para fora dela ( v. Prof. Manuel de Andrade, idem, pág. 152, e Prof. Vaz Serra, BMJ nº 85, pág. 487 e seg., nota ).

Entre os critérios que a doutrina tem enunciado para definir o nexo que - para se dizer que o acto foi praticado pelo comitido no exercício das funções que lhe foram confiadas - deve existir entre esse acto e a função, a doutrina tem indicado como meios precisos os dos chamados nexo local e temporal (ou seja, o de que o comitente responde por tal acto se praticado no lugar e no tempo dos serviços a cargo do comitido) e nexo instrumental (isto é, o de que aquele responde pelo acto se foi facilitado pelas funções do comitido, ou seja, pelos meios postos à sua disposição em consequência delas) - para além do que costuma designar-se por critério teleológico (segundo o qual o comitente responde pelos actos do comitido se praticados no interesse dele, comitente) - v. Prof. Vaz Serra, idem, pág. 489.

A dificuldade surge, quando o agente comete um abuso de funções ou um excesso nítido da esfera da acção que o comitente lhe tenha assinado, como acontece no caso de actos dolosos dos agentes, praticados com vista de fins pessoais, mas integrados formalmente no quadro geral da sua competência.

Como se diz no Ac. do S.T.J. de 15-1-1992 ( BMJ nº 413, pág. 456 e seg. ), a resolução do problema da responsabilidade do comitente nesses casos tem de ser encontrada segundo o justo equilíbrio entre o interesse da pessoa colectiva ou do comitente, por um lado, e o interesse do lesado, por outro.

Aderimos à orientação que os Profs. Pires de Lima e Antunes Varela ( " Código Civil Anotado", vol. I, 4ª ed., pág. 509 ) entendem ser a preferível, nos termos da qual o comitente deve ser responsabilizado pelos factos ilícitos do comissário que tenham com as funções deste uma conexão adequada, aplicando aqui, num problema de responsabilidade pelo risco, a teoria da causalidade adequada.

Assim, "sempre que as funções do comissário, segundo um critério de experiência, favoreçam ou aumentem o perigo da verificação de certo dano, deverá o comitente arcar com a respectiva responsabilidade. Por outras palavras: deverá entender-se que um facto ilícito foi praticado no exercício da função confiada ao comissário quando, quer pela natureza dos actos a que foi incumbido, quer pela dos instrumentos ou objectos que lhe foram confiados, ele se encontra numa posição especialmente adequada à prática de tal facto”.

Dentro deste entendimento, refere o Prof. Carlos Mota Pinto ("Teoria Geral do Direito Civil ", 3ª ed., pág. 323 ) que será legítimo responsabilizar uma sociedade por actos dolosos dos seus agentes, praticados em vista de fins pessoais, mas integrados formalmente no quadro geral da sua competência, se o agente aproveita uma aparência social que cria um estado de confiança (boa fé) do lesado na lisura do comportamento daquele, como acontece, por ex., no caso de o empregado dum banco, sem poderes suficientes, receber uma quantia dum particular para fins de investimento, com a intenção de a dissipar em proveito próprio.».

Na verdade, como se lembra na sentença recorrida, transcrevendo os ensinamentos do Prof. Mota Pinto, é legítimo - no quadro do art.º 500 do CC - “…responsabilizar uma sociedade por actos dolosos dos seus órgãos ou agentes, praticados em vista de fins pessoais, mas integrados formalmente no quadro geral da sua competência, se o agente aproveita uma aparência social que cria um estado de confiança (boa fé) do lesado na lisura do comportamento daquele…” [9].

Assim, no seguimento de tudo o acima exposto, diremos que se concluiu com acerto na sentença recorrida ao afirmar-se que “se verificam todos os pressupostos de que depende a constituição do Réu na obrigação de indemnizar os AA. pelos danos que lhes foram causados pela conduta do seu funcionário E..., nos termos do art. 500º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil”.[10]

Ora, conforme se concretizou na decisão impugnada quanto à actuação do funcionário do Réu e ao dano sofrido pelos AA., “Encontra-se proficuamente provado, em 73 e seguintes, que E... convenceu os pais dos AA., clientes do Réu, a entregarem-lhe valores monetários (facto voluntário), para uma suposta constituição de aplicações financeiras no estrangeiro, tendo feito suas tais quantias (ilícito culposo, que constitui crime), provocando aos AA., beneficiários dessas quantias e dos seus futuros proventos, um dano correspondente aos valores entregues e respectiva remuneração.”.

Reiterando-se, mais à frente, que “os danos provocados correspondem aos valores monetários entregues pelos pais dos AA. a E..., ao que acresce a respectiva remuneração.”, fez-se na sentença o seguinte reparo ou ressalva, que também merece a nossa concordância: “Ficou provado que o Banco Réu restituiu já aos AA. o capital, em singelo, que os seus pais haviam entregue a E... com a finalidade de este constituir a favor dos AA. as “aplicações financeiras” n.ºs 4 a 10, dos factos provados, no montante de € 2.369.290,00.

Conforme se referiu na fundamentação da resposta à matéria de facto de fls. 951-952, resulta a diferença entre este valor e a soma do capital aplicado do facto de não terem as partes considerado como capital, para esse efeito, no acordo extrajudicial celebrado, parte do montante da aplicação financeira n.º 7, a saber, os juros resultantes da anterior aplicação de 1996, que foram reinvestidos - tendo, a partir do momento em que teriam sido recebidos pelos AA. e posteriormente reinvestidos, passado a constituir parte do capital, e nunca juros, conforme parece ter sido considerado pelas partes.

Porém, não foi peticionado nos autos a condenação do Banco Réu a entregar aos Autores essa diferença, encontrando-se o tribunal impedido de o condenar em conformidade.

Na verdade, a divergência entre as partes que dá origem aos presentes autos respeita apenas à remuneração devida aos AA. pela entrega daquelas quantias, em face da finalidade apurada.».

Diz-se no já citado Acórdão da Relação do Porto de 03/07/95: «…não oferece dúvidas que o Réu Carlos se aproveitou dessa aparência e do dito estado de confiança ou boa fé do Autor para levar a cabo o facto ilícito sob análise, isto é, o de receber essa quantia (que assim lhe fora entregue para ficar depositada nos cofres do Banco Réu) com o fim de se apropriar dela e a gastar em proveito próprio, como gastou.

E não há dúvida de que o facto verificado só foi possível por causa das funções confiadas ao mesmo Réu, compreendendo-se formalmente no âmbito da comissão, embora praticado com um fim estranho a ela ( v. Prof. Antunes Varela, ob. e cód. citados, pág. 612).

Podemos, pois, concluir que o descrito facto ilícito foi cometido pelo comissário (Réu Carlos) no exercício dessas funções.

Sendo assim, e porque se verifica também o pressuposto da responsabilidade do próprio comissário quanto à obrigação de indemnizar o Autor, dado o seu comportamento doloso que violou o direito de outrem ( cfr. art. 483º, nº1, do Cód. Civil), tem de aceitar que estão preenchidos todos os requisitos da responsabilidade civil da U.B.P., como comitente, nos termos do citado art. 500º, nº 1, conjugado com o dito art. 165º.

(…)

O que acaba de se dizer tem como pressuposto o entendimento de que o comitente assume a posição de garante da indemnização perante o terceiro lesado, respondendo na mesma medida da responsabilidade do comissário (cfr. Prof. Antunes Varela, ob. cita, pág. 614, e dito " Código Civil Anotado, vol. I, pág. 510 ).

Nos termos do art. 562º do Cód. Civil, quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação.

Deve ainda atender-se, para a fixação da indemnização, ao disposto no art. 566º, nº 2, do mesmo Código.

Se a quantia entregue pelo Autor ao funcionário Carlos .... tivesse sido depositada no Banco Réu, esse depósito teria gerado juros remuneratórios à taxa dos depósitos "poupança emigrante", por 181 dias, na U.B.P. ( ou seja, na data em causa - 26/8/89 -, à taxa ilíquida anual de 13,5%), e que seriam capitalizados nas datas dos respectivos e sucessivos vencimentos, até à data do reembolso.

Trata-se aqui de responsabilidade por facto ilícito extracontratual.

A obrigação de indemnização tem como escopo a reconstituição da situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obrigou à reparação ( v. dito art. 562º ).

O n.1 do citado art. 566º manda que, em princípio, se repare o dano mediante a reconstituição natural.

O cálculo da indemnização pela forma acabada de apontar leva a que se considerem todos os danos causados pelo facto lesivo a partir da ocorrência desse facto.

É possível a reconstituição do património que o lesado teria, se não fosse o facto ilícito em causa, até ao momento em que ele quis ser reembolsado da quantia que julgava estar depositada a prazo no Banco Réu, bem como dos respectivos juros remuneratórios.

Tal reconstituição desse património faz-se através do pagamento ao Autor da importância que este entregou ao Réu Carlos, acrescida dos mencionados juros que, entretanto, teriam sido vencidos e capitalizados, se não fosse esse facto ilícito.».

Mutatis mutandis”, com as particularidades que mais adiante se notarão, dir-se-á que este entendimento, se aplica, ao mencionado E... e ao Réu, enquanto comitente, bem como à responsabilidade deste último face aos AA..

E recordam-se, a propósito, as palavras do Acórdão da Relação do Porto de 21/11/2005 (Colectânea de Jurisprudência, Tomo V/2005, pág. 188 e ss.): «Se há domínio da vida de relação, que postula comportamentos confiáveis, um é, sem dúvida, o exercício da actividade bancária, dada não só a desproporção dimensional dos contraentes, como também as regras próprias do comércio do bancário, v.g. o sigilo profissional, entre outros factores, que impelem os clientes dos Bancos a confiar em quem administra e guarda as suas aplicações; daí que não é lícito ao Banco pretender exonerar-se de responsabilidade, por prática de actos ilícitos, praticados pelos seus agentes, colaboradores ou auxiliares, desde que tais actos se emoldurem no quadro do exercício profissional da sua actividade e exprimam actuação ilícita.

Esse risco corre, objectivamente, por conta do comitente, desde que a actuação do comitido/auxiliar se inscreva no quadro funcional daquele, e exista actuação sua ilícita, culposa, bem como dano resultante da actuação lesiva.

O Autor confiou em que o gerente que conhecia e com quem contratou os depósitos, agia em nome do Banco e, não se tendo provado que actuou com culpa, ignorando factos que não podia razoavelmente ignorar, a sua confiança no Banco não pode ser frustrada com o argumento de que o gerente actuou em violação dos comandos internos da entidade que o emprega ["Para que o banco como pessoa colectiva responda por actos do seu funcionário, é necessário que sobre este recaia igualmente a obrigação de indemnizar e que o acto danoso tenha sido praticado no exercício da função confiada àquele mesmo funcionário. A responsabilidade do banco não é afastada se os actos dolosos do agente, embora praticados em vista de fins pessoais, estiverem integrados formalmente no quadro geral da sua competência e o agente infiel aproveita uma aparência social que cria um estado de confiança do lesado na lisura do comportamento daquele. O comissário responde a título de culpa e o comitente a título de responsabilidade objectiva, sendo este um dos casos em que existe obrigação de indemnizar independentemente de culpa" - Ac. do STJ, de 2.3.1999 (Ref. 1860/1999), in CJSTJ, 1999, I, 127].

A responsabilidade é, por isso, objectiva, prescindindo de culpa, pelo que não pode o Banco deixar de ser responsabilizado pela actuação do seu gerente, tendo que honrar os compromissos assumidos, sem prejuízo do direito de o responsabilizar civilmente pelos prejuízos decorrentes da sua actuação…».

O comitente responde pelos danos causados pelos actos do comissário, não significando isto, todavia, que tais actos vinculem contratualmente aquele.

Não se compreenderia, designadamente, que, não obstante o funcionário estar, na realidade, a utilizar as suas funções na empresa em seu (dele) exclusivo interesse próprio, apenas aparentado negociar em nome desta com terceiro, sem intuito de vincular aquela, mas tão-só como “mise en scène” destinada a obter deste terceiro uma vantagem patrimonial ilícita, não se compreenderia, dizia-se, que uma tal conduta criminalmente punível[11], fosse susceptível de vincular contratualmente a empregadora, ou seja, fosse susceptível de gerar, tal como idealizados e artificialmente “formalizados” pelo dito funcionário para execução do seu plano, contratos geradores de direitos e obrigações para ela e para aquele terceiro.

Admitir o contrário seria, assim, como se entende na sentença recorrida a propósito de hipótese semelhante que aí se configura, ficcionar verdadeiramente uma relação contratual que para o Réu nunca existiu, onerando-o com um encargo totalmente desajustado e dando origem a um enriquecimento injustificado do cliente, apenas com base numa conduta ilícita e criminosa de um seu funcionário.

Mas mal se compreenderia, também, que, nessas circunstâncias, esse terceiro, cuja boa fé não se lograsse afastar, não visse ressarcidos os danos provocados por conduta que confiou corresponder à regular e normal actuação do funcionário em nome da respectiva empregadora.

Daí a responsabilidade objectiva atribuída ao comitente no art.º 500º, n.º 1 e 2, garantindo este[12], em primeira linha, o ressarcimento dos danos que hajam resultado para o terceiro lesado, sem prejuízo de, em princípio, poder vir a exercer o direito de regresso sobre o comissário quanto às quantias que a esse título satisfaça ao lesado (art.º 500º, n.º 3, do CC).

Ora, é este regime, como aliás já se foi dizendo ao longo da explanação que fizemos, que entendemos aplicável ao caso “sub judice”.

Daí que, ressalvando-se o respeito que nos merecem ambos, se repudie, quer o entendimento defendido pelos AA. na respectiva Apelação quanto à aplicação do regime da responsabilidade contratual, quer o entendimento defendido pelo Réu quanto à inaplicabilidade, ao caso, do disposto no n.º 2, do art.º 500º, do CC.

Diga-se, até, que alguns dos Acórdãos aqui citados, versando situações muito semelhantes àquela que ocorre nos presentes autos, seguiram, precisamente, a via da responsabilidade objectiva, plasmada no referido art.º 500.[13]

Para além daquilo que ficou exposto quanto à consideração da actuação do funcionário do Réu no quadro da previsão do n.º 2, do aludido art.º 500º, adianta-se que se subscreve o entendimento de Pedro Pitta e Cunha Nunes de Carvalho, que ora se transcreve: «A expressão «no exercício da função confiada» não deve ser entendida num sentido muito estrito, sob pena de se limitar excessivamente o alcance do art. 500.° do C. Civil. É certo que todo o facto ilícito contém em certo sentido um excesso de competência, isto é, um sair fora dela (conforme nota Vaz Serra no BMJ n.° 85, pág. 179). Mas basta «que o acto se integre no quadro geral da competência» do comissário, para que se considere ser praticado no exercício da função que lhe foi confiada. Neste sentido aponta claramente a lei ao considerar que mesmo o facto danoso, praticado intencionalmente ou contra as instruções do comitente, pode sê-lo no exercício da função confiada (cfr. art. 500.° n.° 2).»[14].

Saliente-se, por outro lado, que à colação não é de trazer, no presente caso, a norma do art.º 800º, n.º 1, do CC, já que a mesma versa os actos dos representantes legais ou auxiliares que o devedor utilize no cumprimento das obrigações, tendo como pressuposto, pois, uma vinculação contratual anterior[15].

De tudo o exposto resulta que não podemos considerar o Réu vinculado contratualmente às taxas de juro oferecidas pelo seu funcionário E..., não obstante entender-se que nos danos sofridos pelos AA., se devem atender os juros remuneratórios que não receberam, relativos aos montantes que foram entregues ao aludido funcionário e que seria expectável receberem se acaso tais montantes tivessem, efectivamente, sido objecto do anunciado depósito.

Trata-se, no fundo, de ressarcir lucros cessantes (art. 564º, n.º 1, do CC) provocados pela conduta do funcionário do Réu e que este último, enquanto comitente, deve indemnizar.

Concorda-se, pois, com o entendimento da Mma. Juiz do Tribunal “a quo”, quando diz na sentença impugnada: «… não poderemos deixar de considerar o objectivo visado pelos pais dos AA. com a entrega das quantias pecuniárias ao comissário do Réu, a saber, a constituição de aplicações financeiras na sucursal do C... em Londres.

Perante este quadro, fácil se torna apurar o dito quantum do lucro cessante: o que os AA. viram frustrado foram os ganhos decorrentes da imobilização da quantia para constituição de aplicação financeira em Londres, ou seja, o juro que lhes adviria pela constituição das ditas aplicações.

Em consonância, teremos de ter presentes as taxas de juro que a sucursal de Londres do C... praticou em cada um dos anos de imobilização, e sempre as taxas máximas, ao que acrescerá a margem de negociação de que dispunha o comissário do Réu - 0,25% -, de forma a podermos obter o mínimo prejuízo possível para os AA.. Na verdade, as quantias entregues ao funcionário da Ré, gerente de balcão, que deveriam ter sido por este aplicadas em Londres foram muito elevadas, e constitui facto notório que, perante um mercado no sector bancário liberalizado e fortemente concorrencial, são oferecidas as melhores condições possíveis aos bons clientes, que são os que investem quantias económicas elevadas.

Poderemos desta feita considerar os AA. como uns dos tais “bons clientes” que a um qualquer Banco interessa manter, oferecendo-lhe melhores juros remuneratórios, de forma a suplantar a concorrência (porquanto, como igualmente constitui facto notório, em actividades de forte concorrência, como a bancária, a oferta praticada pelos vários Bancos tendem a igualar-se para cada grupo de clientes, diferindo apenas em pormenores). Por esta razão, aplicaremos no caso as taxas máximas praticadas pelo C..., acrescidas da referida margem de negociação.».

Deste modo, divergindo do Réu - que defende a aplicação das taxas correntes praticadas pelo C... em Portugal - afigura-se-nos que a Mma. Juiz do Tribunal “a quo” seguiu o entendimento correcto, quer na aplicação das taxas de juros consideradas na sentença recorrida - “as taxas de juro máximas praticadas na sucursal de Londres do C..., durante o período em causa nos autos (entre 1.2.1999 e 25.6.2004, data do acordo extrajudicial celebrado e da restituição das quantias em causa nos autos, em singelo, pelo Réu aos AA.)” - quer no que concerne aos montantes sobre os quais incidiram tais taxas e respectivos prazos, entendendo, enfim, como correctos os cálculos efectuados para o efeito na decisão impugnada, pelo que concluímos ser exacta a conclusão que aí se chegou, de que, à data da restituição das quantias entregues ao comissário do Réu, E..., tais montantes teriam, desta forma, gerado um lucro aos AA. no montante global de € 555.283,32, que é o montante devido aos AA. a título de lucros cessantes.

Temos, assim, por correcta a condenação do Réu no pagamento da dita quantia aos AA., acrescida dos juros de mora, conforme se decidiu na sentença recorrida.

O Réu sustenta que os AA. incorrem em abuso do direito.

Vejamos.

Nos termos do art. 334.° do Código Civil é ilegítimo o exercício do direito quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.

A alegação do Réu radicava na exigência dos AA. de juros a taxas «clamorosamente superiores às praticadas à data dos factos», ambicionando, por via disso, «…obter do C... uma quantia (€ 1.892.315,42) correspondente a cerca de 80% do dinheiro que entregaram ao dito ex-gerente», ou seja, «“embolsar em juros quase a duplicação (!) do capital que "aplicaram"» (Cfr. art.ºs 142º a 149º da contestação).

Ora, atento o decidido, muito aquém daquilo que era pretendido pelos AA., quanto aos juros, sendo que não era no direito à percepção destes, mas nas respectivas taxas exigidas pelos AA., que radicava a arguição do Réu quanto ao abuso do direito, falecem, desde logo, os pressupostos dessa arguição.

Assim, dir-se-á apenas que o exercício, pelos AA., do direito a serem indemnizados pelo Réu, à luz dos preceitos legais citados e com base nas taxas de juro efectivamente utilizadas na sentença recorrida, não consubstancia, nos termos em que o Tribunal o acolheu, excesso manifesto dos limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes, ou pelo fim social ou económico desse direito.

Conclui-se, pois, pela inexistência de abuso do direito por parte dos AA..
De tudo o exposto resulta, assim, ter sido correcta a decisão do Tribunal “a quo” ao julgar a acção parcialmente procedente nos termos em que o fez, não tendo a sentença recorrida infringido as disposições legais cuja violação os Apelantes lhe imputam.

É, pois, em face de tudo o exposto, de julgar improcedentes as Apelações e de manter a sentença da 1.ª Instância.

III - Decisão:
Em face de tudo o exposto, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar as Apelações improcedentes, mantendo a douta sentença recorrida.
 
Custas pelos Apelantes AA. e R., na proporção dos respectivos decaimentos.

Coimbra[16],


(Falcão de Magalhães)

(Gregório Silva de Jesus)

(Regina Rosa)


[1] Os preceitos que deste Código forem citados, reportam-se, salvo indicação em contrário, à redacção anterior à introduzida pelo DL n.º 303/07, de 24/08.
[2] Consultáveis na Internet, em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/, endereço este através do qual poderão ser acedidos todos os Acórdãos do STJ, ou os correspondentes sumários, citados sem referência de publicação.
[3] Cfr. Antunes Varela, obra citada, pág. 590; Rodrigues Bastos, “in” Notas ao Código de Processo Civil - 1992 - nota 4 ao artigo 668º; Alberto dos Reis, obra citada, págs. 140 e 141.
[4] Cfr. Acórdãos desta Relação de 14/12/2006 e de 14/11/2006, proferidos, respectivamente, na Apelação n.º 733/03.0TAAGD.C1 e na Apelação n.º 31/2002.C1, ambos consultáveis na Internet, através do endereço http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/.
[5]In” Código de Processo Civil anotado, vol. V, págs. 143, 497 e 498.
[6] Cfr. Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto (Código de Processo Civil Anotado, 2.º volume, pág. 648).
[7] Note-se que foi o Réu, na sua douta contestação, que trouxe à liça as taxas médias de juro efectivamente praticadas na  sua sucursal de Londres – cfr. v.g. art.ºs 47º a 89º e art.º 133º.
[8] Consultável, tal como os restantes Acórdãos da Relação do Porto que venham a ser citados sem referência de publicação, em http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf?OpenDatabase .
[9] Em Itália, lembra Pitta e Cunha Nunes de Carvalho (A Responsabilidade do Comitente, “in” Revista da Ordem dos Advogados, Lisboa, Abr.1988, pág. 115) «… a responsabilidade do comitente vem prevista no artigo 2049 (do Codice Civile), cujo texto é o seguinte:«Os patrões e os comitentes são responsáveis pelos danos causados pelo facto ilícito dos seus criados e comitidos no exercício das incumbências em que são empregados».Trata-se de uma responsabilidade objectiva, independente de culpa (56), assente na ideia expressa pelo brocardo «ubi commodum, ib incommodum». Exige-se, também, a subordinação do comitido ao comitente (57) e que o facto seja praticado no exercício das incumbências em que foi empregado (58), pois fora deste campo não existe nexo causal em relação aos patrões ou comitentes (59). Note-se que o facto do comitido tem de ser ilícito, excluindo-se assim a responsabilidade objectiva do comitente nos casos em que o comissário incorrer em responsabilidade independente de culpa. O comitente tem direito de regresso contra o comissário (art. 2055).».
[10] Cfr. t.b. Acórdão do STJ de 28/04/1999 (Colectânea de Jurisprudência - STJ - Tomo II/1999, pág. 185 e ss.), em cujo sumário se pode ler:«II - A responsabilidade do comitente prevista no art. 500º do CC só existe quando o acto do comissário é praticado no exercício das suas funções, bastando no entanto, que ele esteja conexionado com o quadro geral da competência ou com os poderes que lhe são conferidos, sendo certo que o comitente apenas responde pelos actos ilícitos praticados pelo comissário, mesmo que cometidos intencionalmente ou contra as instruções daquele, desde que a comissão seja adequada ou idónea desses eventos. 
III - Verifica-se essa responsabilidade objectiva de uma companhia de seguros quando um dos seus funcionários, enquanto técnico comercial, contacta um dos ofendidos propondo-lhe uma aplicação financeira naquela seguradora, com boas condições de rentabilidade, apresentando uma carta na qual escreveu o nome do gerente de uma delegação, simulando que fora escrita e assinada pelo mesmo, dando a aparência e criando a confiança de que os ofendidos estavam a contratar com a respectiva seguradora. 
IV - Não impede essa responsabilidade da companhia de seguros, ainda que o arguido tenha manifestamente excedido as instruções daquela, desde que o seu o comportamento se insira no exercício das funções que então desempenhava na mesma.».
[11] Esta classificação parece, no caso, não gerar dúvidas, julgando-se, até, que a questão, no âmbito criminal, terá já sido já tratada em termos definitivos pelo STJ, no Acórdão de 19/03/2009 (Processo n.º 09P0392).
[12] Esta posição de garante justifica-se, como se diz na sentença recorrida, “…pelo facto de o lesante ter actuado enquanto seu comissário, e poder não dispor de meios económicos suficientes para satisfazer a indemnização ao terceiro lesado.”.
[13] Cfr. t.b. Acórdão da Relação do Porto de 04/07/96, Apelação n.º 9530654, em cujo sumário se pode ler: « I - O gerente de uma agência bancária que, nessa aparente qualidade e agindo também como mandatário de um cliente do respectivo banco a quem atendia também naquela qualidade, recebeu desse cliente, na aludida agência e para depósito no respectivo banco, importâncias várias, tendo chegado, para titular os correspondentemente desejados depósitos a prazo, a entregar ao cliente documentos impressos e timbrados daquele Banco com o preenchimento aparentemente normal dos pretendidos títulos de depósitos a prazo finalizados com a rubrica de tal gerente, é responsável perante o cliente por tais importâncias que não deram entrada nos cofres do respectivo banco, mesmo sem a prova de que daquelas importâncias haja tirado proveito próprio.
II - Em tal hipótese, ocorre a relação de subordinação de tal gerente à respectiva entidade bancária sob cuja direcção e em cujo interesse ele normal e aparentemente actuava, daí resultando a responsabilidade solidária para com o aludido cliente também da entidade bancária, nos termos do artigo 500 do Código Civil, a despeito da procuração outorgada pelo cliente; esta só excluiria a responsabilidade do Banco se a entrega das importâncias aquele gerente ocorresse em circunstâncias que excluíssem a função bancária do gerente. ».
[14] Obra citada, pág. 107, nota n.º 38.
[15] “…um vínculo obrigacional entre dois sujeitos, em cuja execução intervenha um terceiro por iniciativa do devedor”- Ana Prata, “in, Cláusulas de Exclusão e Limitação da Responsabilidade Contratual, Almedina, pág. 684. A responsabilidade que, desta norma – conjugada, v.g. com o disposto nos artigos 406º, nº 1, 798º, do CC -, advém para o devedor, já tem sido apelidada de “responsabilidade civil contratual objectiva” (Cfr. Ac. do STJ de 14/06/2007, Revista n.º 07B1731).
[16] Acórdão processado e revisto pelo Relator.