Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
372/01.0TALRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE DIAS
Descritores: PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO CRIMINAL
TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA
Data do Acordão: 05/18/2016
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: LEIRIA (INSTÂNCIA LOCAL)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS. 118.º A 120.º DO CP
Sumário: I - Transitada em julgado a sentença de condenação do arguido precludido ficou o direito de requerer ou de conhecer oficiosamente a prescrição do procedimento criminal.

II - A questão da prescrição do procedimento criminal tem necessariamente de ser suscitada e apreciada até ao trânsito em julgado da decisão, ficando o eventual erro que tenha sido cometido nesse âmbito coberto pelo caso julgado.

III - Se a prescrição respeita a momento anterior ao trânsito em julgado da decisão está-se numa situação de prescrição do procedimento criminal; se for posterior àquele momento então é caso para aludir à prescrição da pena.

IV - A lei é clara ao determinar que a prescrição do procedimento criminal se suspende durante o tempo em que, a sentença não puder ser notificada ao arguido julgado na ausência. Sendo que para esta causa de suspensão a lei não indica qualquer prazo máximo, a partir do qual a prescrição voltasse a correr.

V - Se o legislador pretendesse incluir nesta causa de suspensão um prazo máximo, tê-lo-ia indicado.

Decisão Texto Integral:




Processo nº 372/01.0TALRA.C1, do Tribunal da Comarca de Leiria - Instância Local – Secção Criminal - J1.


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            No processo supra identificado foi proferida decisão na qual se julgou ter decorrido o prazo de prescrição do procedimento criminal contra o arguido A... , determinando-se o oportuno arquivamento dos autos.

Inconformado, o Magistrado do Mº Pº recorre para esta Relação.

Apresenta motivação e conclusões, sendo que estas delimitam o objeto do recurso, e são do seguinte teor:

1. Por douta sentença, proferida a 21/04/2004, foi o arguido, A... , condenado, como autor material, pela prática de um crime de desobediência, p. e p. pelo disposto no artigo 348.º, n.º 1, do Código Penal, conjugado com o artigo 5.º, n.º 2 e 4, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3/01, na pena de 110 (cento e dez) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), o que perfaz € 550,00 (quinhentos e cinquenta euros);

2. O arguido foi regularmente notificado da data designada para audiência de discussão e julgamento, mas não compareceu, tendo julgado na respetiva ausência, também não tendo comparecida na data da leitura da sentença proferida;

3. Por se desconhecer o paradeiro do mesmo, apenas foi notificado, da douta sentença proferida, a 09/07/2015;

4. O tribunal "a quo" entendeu, porém, que na referida data da notificação, já o procedimento criminal, pela prática do aludido crime, se encontrava prescrito;

5. Ora, os factos imputados ao arguido, na acusação, que integram a prática de crime de desobediência, ocorreram a 6 de fevereiro de 2001, pelo que ocorreram na vigência da versão do Código Penal, introduzida pela Lei n°. 65/98, de 02/09;

6. No caso "subjudice", e desde a data em que foi proferida a douta sentença, 21/04/2004, não pôde, a mesma, ser notificada ao arguido, julgado na sua ausência, por se desconhecer o respetivo paradeiro, pelo que se verificou uma causa de suspensão da prescrição do procedimento criminal, nos termos do disposto no artigo 120.º, n.º 1, alínea d), do mesmo código;

7. Não consta dessa norma legal, qualquer limite máximo de tempo, para a vigência de tal causa de suspensão do procedimento criminal, e nem para a causa de suspensão prevista, a contumácia (tal limite apenas se prevê para a situação previsto na alínea b), da mesma norma);

8. A Lei n.º 19/2013, de 21/02, alterou o disposto no referido artigo 120.º, no que concerne à situação de contumácia, como causa de suspensão do procedimento criminal, estabelecendo um prazo máximo, de cinco anos, mas mantendo a ausência de prazo máximo, quanto ao disposto na referida alínea d), bem como relativamente às causas previstas nas alíneas a) e f), do mesmo artigo;

9. E se tal assim foi legislado é porque foi essa a vontade do legislador, ou seja, a não notificação da sentença ao arguido, julgado na ausência, implica a suspensão do procedimento criminal, o qual fica indefinidamente suspenso;

10. Não pode ser aplicado, ao caso dos autos, o disposto o artigo 120°., n°. 1, alínea d), na redação atual, tal como o foi, por analogia, aplicando um termo máximo, de cinco anos, de prazo de suspensão da prescrição do procedimento criminal, este, apenas previsto para a situação de contumácia, até porque não se trata da norma aplicável no tempo;

11. Só seria aplicável a lei atual se o referido artigo 120.º., na redação dada pela Lei nº, 19/2013, de 21/02, previsse um prazo máximo para a causa de suspensão da prescrição do procedimento criminal, em causa, a não notificação da sentença ao arguido julgado na respetiva ausência, então seria de aplicar tal norma, nos termos do disposto no artigo 2.º, do Código Penal, devendo ser aplicada ao arguido, a lei penal mais favorável;

12. De contrário, como sucede no caso, não havendo previsão de termo máximo, relativamente à mesma causa de suspensão, então não há qualquer razão para a não aplicação da referida lei aplicável, vigente, à data da prática dos factos, portanto, o disposto, além do mais, no artigo 120.º, alínea d), do Código Penal, na versão introduzida pela Lei n.º 65/98, de 02/09;

13. Todavia, o tribunal "a quo" foi colher argumentos, referentes a situação de contumácia, como causa de suspensão da prescrição do procedimento criminal, por analogia, ao disposto no artigo 120.º, do Código Penal, na redação atual, quando é certo que nem sequer é esse o regime aplicável ao caso "subjudice", tratando-se erro de aplicação da lei no tempo;

14. Sendo o artigo 120.º, alínea d), do Código Penal, na versão introduzida pela Lei n.º 65/98, de 02/09, a norma aplicável, no caso, não pode pretender-se a integração de suposta lacuna, por analogia, quanto ao prazo máximo de suspensão, no caso "subjudice", pois que o legislador, expressamente, não quis estabelecer, para essas situações, qualquer prazo máximo, assim como não o quis, para a situação de contumácia como causa de suspensão do procedimento criminal;

15. Ainda que tal assim não fosse, certo é que, entre a situação de contumácia e a situação de falta de notificação da sentença, do arguido, julgado na ausência, a situação de similitude consiste, apenas, de em ambos os casos, se desconhecer o paradeiro do arguido (o que originou uma causa de suspensão de prescrição do procedimento criminal), mas com implicações e efeitos distintos, decorrentes do estado do processo, tratando-se de fases processuais completamente distintas;

16. A causa de suspensão, falta de notificação da sentença ao arguido, julgado na ausência, sem prazo máximo, visa sancionar um comportamento revel do arguido, que o legislador, expressamente, pretendeu punir, tanto na versão anterior do artigo 120.º, alínea d), do Código Penal (dada pela referida Lei n.º 65/98, de 02/09), a aplicável ao caso concreto, como na versão atual do mesmo preceito legal (na redação da Lei n.º 19/2013, de 21/02);

17. Daí que, pelo despacho recorrido pretendeu-se aplicar, através de implícita analogia, um entendimento contrário à lei penal, o disposto no referido artigo 120°., alínea d), do Código Penal (nas duas versões referidas), entendimento que também não é compatível com o regime penal da suspensão da prescrição do procedimento criminal, nem à data dos factos, nem à data da sentença proferida e nem atualmente.

18. A douta sentença, proferida a 21/04/2004, foi notificado ao arguido, A... , a 09/07/2015, sendo que nesta data, e atento o acima referido, não se encontrava prescrito o respetivo procedimento criminal;

19. Pelos fundamentos expostos, conclui-se que não se encontra prescrito o procedimento criminal instaurado contra o arguido;

20. Destarte, o douto despacho proferido violou o disposto nos artigos 118.º, n.º 1, alínea c), 120.º, n.º 1, alínea d), 120.º, n.º 3, 121.º, n.º 3, e 348.º, n.º 1, todos do Código Penal, na redação dada pela Lei n.º 65/98, de 02/09, bem o disposto no artigo 120.º, n.º 1, alínea d), do mesmo código, na redação introduzida pela Lei n.º 19/2013, de 21/02.

Deve ser dado provimento ao recurso e, consequentemente, revogado o despacho recorrido, determinando-se o prosseguimento dos autos.

Não foi apresentada resposta.

Nesta Relação, o Ex.mº P.G.A. emitiu parecer, entendendo que se deve julgar procedente o recurso e ordenado o prosseguimento dos autos.

Foi cumprido o art. 417 n.º 2 do CPP.

Não foi apresentada resposta.

Cumpre decidir:


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            É do seguinte teor a decisão recorrida:

O arguido A... foi julgado na sua ausência (fls. 69) e condenado por sentença de 21.04.2004, por incorrer na prática de um crime de desobediência, na pena de 110 dias de multa à taxa diária de €5,00 (fls. 81).----------

Os factos foram praticados a 06.02.2001 (fls. 73).--------------

A sentença apenas veio a ser notificada ao arguido a 09.07.2015 (fls. 286).------------

Tendo em conta a pena abstracta do tipo legal em presença, o prazo de prescrição do procedimento criminal é de 5 anos (art.ºs 348º e 118º-1-c) do C. Penal).-------------

Suscita-se a questão da prescrição do procedimento criminal uma vez que o respectivo prazo a considerar para o efeito decorreu antes de se operar a notificação da sentença na pessoa do arguido, razão por que, se bem se ajuíza, não nos encontramos na fase de eventual prescrição da pena (a qual só pode computar-se após a notificação da sentença: art.º 122º-2 do C. Penal), mas sim no plano, processualmente prévio, do procedimento criminal.---------

Preceitua o art.º 121º-3 do C. Penal que “…a prescrição do procedimento criminal tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal de prescrição acrescido de metade…”.--------------

Preceitua também o art.º 120º-1-d) do C. penal que “a prescrição do procedimento criminal se suspende (…) durante o tempo em que: (…) d) a sentença não puder ser notificada ao arguido julgado na ausência”.-------------

Nos casos de contumácia, a lei, no art.º 120º-3 do C. Penal (desde a redacção dada pela Lei n.º 19/2013, de 21-02), quebrando com a anterior formulação, preceitua que o processo não pode estar suspenso indefinidamente, pelo que veio estabelecer um limite à suspensão ocasionada com a contumácia, sendo hoje o limite igual ao prazo normal de prescrição; se este fosse o nosso exemplo, então o prazo de suspensão não poderia ser superior a 5 anos.--------------

Mas não é este o nosso caso.-----------------

O que sucede no caso dos autos é que o processo se poderia encontrar indefinidamente suspenso enquanto a sentença não for notificada ao arguido julgado na ausência.-------

Pensamos que existe identidade de razões, portanto é possível utilizar um argumento a pari, nas duas situações ocasionadoras de suspensão: quer a contumácia (cujo limite é o do prazo da prescrição respectivo: 5 anos, 10 anos, etc…), quer a não notificação de arguido julgado na ausência.---------------

Porquê? – porque em primeiro lugar se trata de uma interpretação favor reo e, depois, de duas situações que exprimem uma ausência processual do arguido em tudo idêntica: de um lado, a contumácia (o arguido tem o seu paradeiro desconhecido; de outro, a frustração da notificação da sentença por desconhecimento do paradeiro do arguido); então se assim é, por que razão se hão-de tratar de forma diferente situações análogas, sendo certo que uma interpretação literal do art.º 120º-1-d) do C. Penal – uma norma processual material - pode ocasionar uma situação de quase imprescritibilidade do crime, sem fundamento legal e constitucional que a fundamente, sendo, claramente, uma solução contra reum, violadora dos princípios constitucionais, não colhendo o argumento de que o processo deve ficar indefinidamente suspenso por radicar em ficcionada culpa do arguido em não se apresentar em juízo para ser notificado da sentença.----------

Assim, no caso dos autos, se considerarmos, por identidade de razões, o limite de 5 anos para a situação de não notificação da sentença ao arguido como limite máximo para a suspensão por essa causa, importa considerar que o procedimento criminal prescreveu ao termo de 12 anos e 6 meses, isto é, tendo em conta o prazo normal de prescrição (=5A), acrescido de metade (=2A+5m) e acrescendo o prazo máximo da suspensão (=5A).---------

Considerando a data da prática dos factos, acima indicada - 06.02.2001 - conclui-se que, na presente data, o procedimento criminal se mostra extinto, desde 06.08.2013.--------------

Nesta medida, declara-se extinto, por efeito da prescrição, o procedimento criminal instaurado nestes autos contra o indicado arguido A... , determinando-se, após trânsito, o arquivamento dos autos.--------

Notifique.---------

Oportunamente, remeta boletim.---------------

Oportunamente, arquivem-se os autos.----------


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            Analisemos:

A questão única suscitada é a da prescrição do procedimento criminal.

Factos relevantes:

O arguido foi julgado na sua ausência e condenado por sentença de 21-04-2004, por incorrer na prática de um crime de desobediência.

Os factos foram praticados a 06-02-2001 .

A sentença apenas veio a ser notificada ao arguido a 09-07-2015 .

O despacho recorrido foi proferido em 04-11-2015.


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            Entendemos que o despacho recorrido deve ser revogado por duas ordens de razões.


A sentença foi notificada ao arguido em 09-07-2015, pessoalmente, como consta de fls. 286, pelo que transitou em julgado decorridos 30 dias, ou seja, em 24-09-2015, ou em 29-09-2015 caso tivesse sido interposto recurso nos termos do art. 107 nº 5 e 107-A, do CPP.

Assim, quando foi proferido o despacho recorrido, em 04-11-2015, há muito que a sentença de condenação havia transitado em julgado.

E transitada em julgado a sentença de condenação do arguido precludido ficou o direito de requerer ou de conhecer oficiosamente a prescrição do procedimento criminal.

Neste sentido veja-se o Ac. da Rel. Guimarães de 03-06-2013, proferido no processo nº 1037/08.7PBGMR-A.G1, que refere “A prescrição do procedimento criminal deve ser suscitada até ao trânsito em julgado da sentença condenatória, sob pena de ficar precludido o direito de a suscitar em virtude do caso julgado entretanto constituído”.

E também do STJ, vejam-se:

Acórdão de 11.01.2007, Processo n.º 06P4261, que refere «Transitada a decisão, ficam precludidas todas as questões que com base nela poderiam ser suscitadas. É o que sucede com a prescrição do procedimento criminal. A partir do trânsito em julgado da decisão condenatória, já não se pode mais falar em prescrição do procedimento criminal, mas, eventualmente, se for caso disso, em prescrição da pena (art. 122.º, n.º 2 do CP)»

E no mesmo sentido, acórdãos de 03.06.2006, Processo n.º 1509/03-3.ª, e de 26.11.2009, Processo n.º 74/02.0GTLRA.C1-A.S1  e de 14.04.2011, Processo n.º Proc. n.º 267/99.5TBTNV-A.S1 - 5.ª Secção.

Como se refere no primeiro acórdão citado:

“No âmbito penal, o instituto da prescrição compreende:

-A prescrição do procedimento criminal e

-A prescrição da pena. ---

Em ambos os casos está-se perante um pressuposto negativo de punibilidade: no primeiro caso, a ocorrência de prescrição impede sem mais o prosseguimento do processo, ao passo que no segundo caso, a prescrição obsta à execução da pena em que o agente foi condenado.

O trânsito em julgado da decisão constitui a fronteira entre aquelas duas formas de prescrição.

Se a prescrição respeita a momento anterior ao trânsito em julgado da decisão está-se numa situação de prescrição do procedimento criminal; se for posterior àquele momento então é caso para aludir à prescrição da pena.

«Pode por isso afirmar-se com Jescheck § 86 antes de I. ---, com inteira justiça, que as duas espécies de prescrição se justapõem, no sentido de que (por estranho que tal à primeira vista possa parecer) uma delas começa no preciso momento em que a outra termina, isto é, com o trânsito em julgado da decisão» Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, edição de 1993, páginas 699.

Também o Ac. desta Relação, de 18-05-2011, proferido no processo nº 16/98.5IDCBR.C2 refere, “Se uma decisão não é, por força da lei recorrível, a produção dos seus efeitos deve verificar-se na data em que ela se fixe na ordem jurídica, ou seja, quando, ultrapassadas as questões da sua interpretação ou de nulidades existentes, ela se torne compreensível para os sujeitos processuais e assim insuscetível de recurso (porque a lei já não permite tal recurso)”.

Assim que o despacho recorrido que declara a prescrição do procedimento criminal contra o arguido não podia ser proferido na data em que o foi (independentemente das razões invocadas), por já haver transitado em julgado a sentença de condenação.

A questão da prescrição do procedimento criminal tem necessariamente de ser suscitada e apreciada até ao trânsito em julgado da decisão, ficando o eventual erro que tenha sido cometido nesse âmbito coberto pelo caso julgado.



            Por outro lado, não podemos acompanhar o entendimento sufragado no despacho recorrido e, nesta situação não tem qualquer aplicação o princípio in dúbio pro reo, mas há que aplicar a lei.

            E a lei é clara ao determinar que a prescrição do procedimento criminal se suspende durante o tempo em que, a sentença não puder ser notificada ao arguido julgado na ausência.

            Sendo que para esta causa de suspensão a lei não indica qualquer prazo máximo, a partir do qual a prescrição voltasse a correr.

            Se o legislador pretendesse incluir nesta causa de suspensão um prazo máximo, tê-lo-ia indicado.

Em relação a algumas causas de suspensão do prazo de prescrição indica um máximo e noutras não o faz, mas isso é intencional.

Se o legislador no art. 2 da L. nº 19/2013 de 21-02, que alterou o art. 120 do CP, introduz prazos máximos de suspensão, nos casos de se verificar a contumácia, ou a sentença notificada não transitar em julgado, als. c) e e) do nº 1 e nºs 3 e 4, também teria procedimento igual, se o pretendesse fazer, em relação à causa de suspensão do prazo prescricional previsto na al. d) “a sentença não puder ser notificada ao arguido julgado na ausência”.

A analogia, que por princípio deve ser aplicada com parcimónia, apenas se reporta a casos análogos, que o não são a situação de contumácia e a situação de não notificação de sentença a arguido julgado na ausência.

Enquanto na segunda o arguido se encontra notificado regularmente para comparecer na audiência de julgamento e esta foi efetuada, na primeira (contumácia) verifica-se em fase antecedente, quando não é possível notificar o arguido para a audiência de julgamento e demais situações previstas no art. 335 do CPP.

A inclusão de um prazo máximo de suspensão nos casos de contumácia visa obstar a “que o julgamento pudesse ter lugar muitos anos depois dos factos, com os inerentes inconvenientes de ordem processual de que pode destacar-se as dificuldades de acesso à prova e a qualidade da mesma”, Desemb. António Latas in Revista CEJ, 2014-I, “as alterações ao código penal introduzidas pela lei nº 19/2013, de 21 de fevereiro”.

Assim que as situações são totalmente distintas, não fazendo sentido o recurso a analogia.

No sentido do que vimos afirmando, de que não há prazo máximo para a suspensão da prescrição, no caso previsto na al. d) do nº 1 do art. 120 do CP, o Ac. de 31-01-2012, no processo nº 264/05.3TCLSB.L1-5, que refere, “Não tem razão de ser, por conseguinte, a identificação de qualquer lacuna quanto ao prazo máximo de suspensão, em relação às restantes alíneas do n.º1 do artigo 120.º, que tenha de ser integrada por analogia, já que o legislador, com toda a clareza, não quis estabelecer, para essas situações, o prazo máximo de três anos que expressamente fixou no caso da alínea a)”.

E, com as alterações de 2013, o legislador soube indicar os demais casos em que quis estabelecer um prazo máximo de suspensão e, não incluiu a causa de suspensão prevista na al. d) do nº 1 do art. 120 do CP.

Neste aresto se cita o Prof. Paulo Pinto de Albuquerque que sustenta (Comentário do Código Penal, UCE, 2008, p. 333, anotação 10 ao artigo 120.º):

«No caso da al.ª a) do n.º1, o prazo máximo para a suspensão da prescrição resulta do disposto no artigo 7.º do CPP, ou seja, um ano. No caso da al.ª b) do n.º1, o prazo máximo é de 3 anos. Nos casos das al.ª c), d) e e) do n.º1 do artigo 120.º, não há prazo máximo para a suspensão da prescrição. Portanto, verificando-se o facto suspensivo, o processo permanece indefinidamente suspenso até que cesse o facto suspensivo. Esta suspensão do prazo não é inconstitucional, em face do artigo 2.º da CRP, na medida em que se deve a facto imputável ao arguido» (anterior às alterações legislativas de 2013).

Assim, temos que não decorreu de forma contínua um prazo de prescrição que no caso é de 5 anos, bem como não decorreu o referido prazo de prescrição, acrescido de metade e ressalvados os casos de suspensão.

E temos que foi proferida sentença que transitou em julgado e que esgotava o poder jurisdicional para pronúncia sobre questões respeitantes ao procedimento criminal, nomeadamente sobre a prescrição do mesmo.

Assim que há-de ser julgado procedente o recurso e, alterado o despacho recorrido.


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Decisão:

Tendo em conta o exposto, acordam no Tribunal da Relação de Coimbra, na 4ª Secção Criminal em, julgar procedente o recurso interposto pelo magistrado do Mº Pº e consequentemente, revogar o despacho recorrido, o qual deve ser substituído por outro que determine o prosseguimento dos autos.

Sem custas.

Coimbra, 18 de Maio de 2016

(Jorge Dias - relator)

(Orlando Gonçalves - adjunto)