Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
8995/18.1T8CBR-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: SÍLVIA PIRES
Descritores: ASSEMBLEIAS DE CONDÓMINOS
ACTAS
TÍTULO EXECUTIVO
Data do Acordão: 05/25/2020
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DA GUARDA – JL CÍVEL DA GUARDA - JUIZ 2
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTº 6º, Nº 1 DO DL Nº 268/94, DE 25/10.
Sumário: I – O Decreto-Lei n.º 268/94, no art.º 6º, nº 1, atribuiu força executiva às actas das assembleias de condóminos que contenham deliberações sobre o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços comuns, que não devam ser suportadas pelo condomínio.

II - Exige este preceito que para serem título executivo as actas das assembleias de condóminos, estas terão que fixar os montantes das contribuições devidas ao condomínio ou das despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns ou serviços de interesse comum, e que contenham o prazo destinado ao pagamento e a fixação da quota-parte de cada condómino nessas contribuições e despesas.

III - Devem considerar-se abran­gidas pelo âmbito do art.º 6º, nº 1, do DL 268/94, de 25 de Outubro, subscrevendo o que a este respeito consta do Ac. do T. R. L, de 8.7.2007, a deliberação que proceda à fixação dos montantes devidos pelos condóminos, e não a deliberação que se limite a declarar a existência da dívida e o seu montante.

Decisão Texto Integral: Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra
Por apenso à execução para pagamento de quantia certa que o Exequente lhe moveu a Executada deduziu oposição mediante embargos, alegando, em síntese, que o título executivo que serve de base à presente execução é constituído por acta da Assembleia de Condóminos que não fixa o valor devido por si quanto às contribuições devidas.
O Exequente apresentou contestação, defendendo que a acta que serve de título executivo não foi impugnada e que a origem das quantias peticionadas são do conhecimento da Executada.
Veio a ser proferida saneador-sentença que julgou os embargos procedentes.
A exequente interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões:
...
Conclui pela procedência do recurso.
A embargante apresentou resposta, pugnando pela confirmação da decisão.
1. O objecto do recurso
Considerando que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões apresentadas a questão a apreciar são as seguintes:
 - A decisão é nula por omissão de pronúncia?
- As actas dadas à execução não são título executivo para obter o pagamento reclamado da executada?
2. Nulidade da decisão
A nulidade prevista na alínea d) do nº 1 do artigo 615º do C. P. C. – quando o Juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento – verifica-se quando o Juiz deixe de tomar posição sobre todas as causas de pedir invocadas na petição, sobre todos os pedidos formulados e mesmo sobre as excepções suscitadas ou de conhecimento oficioso, isto sem prejuízo do conhecimento de alguma delas prejudi­car a apreciação das restantes – artigo 660º, nº 2, do C. P. C.
Da conjugação das normas citadas o juiz deve pronunciar-se sobre todas as questões que sejam submetidas à sua apreciação, mas está, naturalmente, impe­dido de se pronunciar sobre questões não submetidas ao seu conhecimento: no primeiro caso – se não se pronunciar sobre todas as questões – existirá uma omissão de pronúncia, no segundo caso – conhecer de questões não submetidas à sua apre­ciação – ocorrerá um excesso de pronúncia.
Neste caso, o juiz pronunciou-se sobre todas as questões colocadas, em especial a existência de título executivo, não englobando as mesmas a apreciação dos meios de prova que o recorrente enumera.
Temos, deste modo que concluir que não se verifica a nulidade de omissão de pronúncia uma vez que essa questão foi conhecida.
3. Os factos
Com interesse para a decisão importa considerar a verificação dos seguintes factos:
1 – No requerimento executivo, visando o pagamento pela executada a Exequente alega:
3. - No dia 16 de setembro de 2017 reuniu a Assembleia de Condóminos do prédio em regime de propriedade horizontal, sito na Rua ... - Ata da Assembleia de Condóminos de 16/09/2017.
4. - Resulta da Lista de Presenças anexa à ata que no referido dia 16/09/2017 esteve presente a proprietária da Fração D, 1.º. Esq.º. do prédio identificado supra, isto é M...
5. - A supra-referida proprietária é devedora, a título de quotas do condomínio da quantia global de 6.931,23€ (seis mil novecentos e trinta e um euros e vinte e três cêntimos), a que acrescem juros vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento, conforme resulta do ofício de interpelação datado de 13/11/2017 que adiante se junta como documento n.º 2 e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos.
6. - Até à presente data os juros vencidos a acrescer à supra-referida quantia ascendem ao valor de 284,09€ (duzentos e oitenta e quatro euros e nove cêntimos), o que somado ao valor das quotas em atraso perfaz o montante de 7.215,32€ (sete mil duzentos e quinze euros e trinta e dois cêntimos), continuando a vencer-se juros vincendos até efetivo e integral pagamento.
7. - À quantia supra-referida acresce a quantia de €450,00€ acrescido de IVA conforme deliberado na Assembleia datada de 16/09/2017.
8. - Acresce, ainda, à supra-referida quantia o valor de 800,00€ (oitocentos euros) a título de quota de caráter extraordinário para suportar despesas de processos de devedores, conforme igualmente deliberado por unanimidade na Assembleia de 16/09/2017.
9. -À quantia supra-referida acresce a quantia de €450,00€ acrescido de IVA conforme deliberado na Assembleia datada de 16/09/2017.
2 – Acompanhou o requerimento executivo a acta da Assembleia do Condomínio Exequente realizada em 16.9.2017 onde consta a seguinte deliberação:
“A Assembleia deliberou por unanimidade dar plenos poderes à Administração para interpor acção judicial contra os devedores, sendo que se os devedores/ condóminos no prazo de dez dias após receberem a presente acta não liquidarem o valor em dívida, será accionada a cobrança nos seguintes termos: após os dez dias da recepção da acta, é-lhes dirigido uma interpelação para pagamento, onde ao valor em dívida é acrescido o valor de €450,00 por fracção acrescida de IVA, valor a reverter para a Administração, após este prazo se não houver pagamento, é fixada uma quota de caracter extraordinário no montante de €800,00 (oitocentos euros). Para suportar todas as despesas extrajudiciais de cada processo, a ser imputado ao condómino devedor que der origem a esse mesmo processo”
4. O direito aplicável
O Exequente discorda da procedência dos embargos deduzidos pela Executada, alegando que a acta da Assembleia de Condomínio realizada em 16.9.2017 serve de título executivo, uma vez que as mesmas se encontram compreendidas no art.º 6º do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25 de Outubro, quando este preceito alarga o seu âmbito de aplicação a quaisquer outras contribuições devidas ao condomínio
A decisão recorrida entendeu que a acta dada à execução não é título executivo, nos seguintes termos:
… por um lado, não fixa os montantes das contribuições devidas ao condomínio, o prazo de pagamento e a fixação da quota parte de cada condómino; nem, por outro lado, vem acompanhada da acta ou actas que discriminem (ou permitam calcular), por períodos e valores intermédios, as quantias alegadamente em dívida.
No fundo, do teor da acta apenas se extrai que, por deliberação tomada na Assembleia do dia 16.09.2017, a Administração se encontra mandatada para agir judicialmente contra os devedores que se encontrem em incumprimento, sem qualquer referência aos montantes em dívida, e a que título (se contribuições devidas ao condomínio, despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns, ou pagamento de serviços de interesse comum).
O Decreto-Lei n.º 268/94, no art.º 6º, nº 1, atribuiu força executiva às actas das assembleias de condóminos que contenham, deliberações sobre o montante das contribuições devidas ao condomínio ou quaisquer despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços comuns, que não devam ser suportadas pelo condomínio.
Exige este preceito que para serem título executivo as actas das assembleias de condóminos, estas terão que fixar os montantes das contribuições devidas ao condo­mínio ou das despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns ou serviços de interesse comum, e que contenham o prazo destinado ao pagamento e a fixação da quota-parte de cada condómino nessas contribuições e despesas.
Assim, devem  considerar-se  abran­gidas pelo âmbito do art.º 6º, nº 1, do DL 268/94, de 25 de Outubro, subscrevendo o que a este respeito consta do Ac. do T. R. L, de 8.7.2007:  [1] [2]
No âmbito da acta, enquanto título executivo, cabem o montante das “contri­buições devidas ao condomínio”. Esta expressão deve ser entendida em sentido amplo. Nela se devem incluir as despesas necessárias à conservação e à fruição das partes comuns do edifício, as despesas com inovações, as contribuições para o fundo comum de reserva, o pagamento do prémio de seguro contra o risco de incêndio, as despesas com a reconstrução do edifício e as penas pecuniárias fixadas nos termos do art.º 1434º do Cód. Civil. Na expressão “contribuições devidas ao condomínio” cabem as contri­buições devidas e em dívida ao condomínio, isto é, vencidas e não pagas.
A deliberação exequível para efeitos do art.º 6º é aquela que proceda à fixação dos montantes devidos pelos condóminos, e não a deliberação que se limite a declarar a existência da dívida e o seu montante [3].
Alega e Exequente que o valor devido pela Embargante resulta do montante das despesas orçamentadas na permilagem da fracção de que é proprietária e constante dos documentos juntos com o requerimento executivo – orçamento -  e que fazem parte integrante da acta. Ora, salvo o devido respeito esse documento teve como única finalidade a aprovação das despesas para o exercício seguinte, não constando, de qualquer modo, do mesmo, a que título são devidos os montantes nele inscritos.
Acresce que nem da conjugação do aludido documento como a acta da assembleia resulta a verificação dos requisitos exigíveis pelo art.º 6º, nº 1 do Decreto-Lei n.º 268/94 para que a mesma possa ser considerada título executivo.
Assim conclui-se que a acta apresentada à execução não pode alicerçar a quantia exequenda uma vez que da mesma não consta qualquer deliberação que tenha fixado os montantes devidos pelos condóminos, confirmando-se a decisão proferida.
Decisão
Nos termos acima expostos, confirmando-se a decisão proferida julga-se improcedente o recurso.
Custas do recurso pelo recorrente.
                                       Coimbra, em 25/05/2020 


***


[1] Relatado por Arnaldo Silva, proc. 9276/2007-7, acessível em www.dgsi.pt.

[2]  No mesmo sentido, Sandra Passinhas, in A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal, pág. 310, ed. 2000. Almedina.

[3]  Neste sentido, entre outros os seguintes acórdãos acessíveis em www.dgsi.pt

do T. R. C.:
de 14.12.2010 relatado por Carlos Gil e
de 23.1.2018 relatado por Pires Robalo.

do T. R. L.:
de 11.10.2012 relatado por Jorge Leal,
de 22.3.2018 relatado por Luís Mendonça e
de 24.4.2019 relatado por Arlindo Crua.

do T. R. P. de 15.1.2019 relatado por Cecília Agante.