Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3582/13.3TJCBR-F.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MANUEL CAPELO
Descritores: APOIO JUDICIÁRIO
DATA DE PROPOSITURA DE AÇÃO CÍVEL
PRAZO
Data do Acordão: 06/07/2016
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE COIMBRA – COIMBRA – INST. LOCAL – SEC. CÍVEL – J1
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTº 33º, Nº 1 DO DL Nº 34/2004, DE 29 DE JULHO.
Sumário: I – Tendo sido solicitado apoio judiciário pelo demandante para propor ação cível, esta considera-se proposta na data em que este requereu o benefício do apoio judiciário.

II - Se o patrono nomeado não propuser a ação no prazo de 30 dias que lhe determina o art. 33º, nº 1 do DL 34/2004 ou tendo este pedido escusa do patrocínio, se o novo patrono nomeado não propuser a ação no prazo de trinta dias a contar da notificação da sua nomeação deve considerar-se que a ação não foi proposta, perdendo-se o benefício de considerar como proposta a ação na data do requerimento do apoio judiciário.

III - Assim, quando o pedido de apoio judiciário foi requerido antes de decorrido o prazo para propor a ação (prazo de caducidade) e a petição inicial respectiva tenha sido apresentada fora desse prazo, deve considerar-se tempestivamente proposta se o patrono nomeado (ou aquele outro que o substituiu depois de deferido pedido de escusa) realizou essa apresentação dentro do prazo de 30 dias a que alude o art. 33º, nº 1 do DL 34/2004.

IV - No entanto, quando o pedido de apoio judiciário tenha sido requerido antes de decorrido o prazo para propor a acção (prazo de caducidade) e a petição inicial respectiva tenha sido apresentada depois de decorrido esse prazo, deve considerar-se a caducidade da propositura da ação se o patrono nomeado (ou aquele outro que o substituiu depois de deferido pedido de escusa) realizou essa apresentação fora do prazo de 30 dias a que alude o art. 33º, nº 1 do DL 34/2004.

Decisão Texto Integral:

      Acordam em Conferência no Tribunal da Relação de Coimbra

Nos presentes autos de resolução em benefício da massa insolvente que correm por apenso ao processo de insolvência em que é insolvente M..., oriundos do Tribunal da Comarca de Coimbra – Instância Local – Secção Cível – Juiz 1, proferiu o ora relator decisão singular, nos termos do disposto no art. 656 do CPC, confirmando a decisão recorrida, isto é, julgando verificada a excepção de caducidade do direito de impugnar a resolução da doação em causa, absolvendo a Ré da instância.

Notificado dessa decisão, ainda que não questionando a legalidade de se haver proferido decisão singular, veio o reclamante solicitar, para a conferência, decisão colegial.

Nesta sua reclamação para a conferência protesta a recorrente que a decisão singular não indica fundamentos conformes o direito para decidir pela procedência da excepção de caducidade, discordando dessa decisão singular e pretendendo, por isso, decisão colegial.

… …

Nesta conformidade, na apreciação para a Conferência, faz-se agora constar que o teor da decisão sumária ora reclamada foi o seguinte (na parte referida à fundamentação e decisão):

“ Os factos que interessam à decisão são os seguintes:

- A autora recebeu a carta da administradora da insolvência a resolver a doação em causa nos presentes autos no dia 7 de Maio de 2014 (cfr. fls. 67).

- A autora requereu em 15 de Maio de 2014 apoio judiciário junto dos serviços da Segurança Social, nas modalidades de dispensa de pagamento da taxa de justiça e demais encargos com o processo e nomeação e pagamento de compensação a patrono e tal pedido foi deferido a 21 de Maio de 2014, tendo-lhe sido nomeada como patrona a Drª ... (cfr. fls. 104).

- No dia 17 de Junho de 2014, a identificada patrona pediu escusa (cfr. fls. 92), sendo que, na sequência desse pedido de escusa veio a ser nomeada patrona à ora autora a Drª ... no dia 30 de Junho de 2014 (cfr. fls. 40).

- a petição inicial deu entrada no Tribunal no dia 30 de Setembro de 2014.

Além de delimitado pelo objecto da acção, pelos eventuais casos julgados formados na instância recorrida e pela parte dispositiva da decisão impugnada que for desfavorável ao impugnante, o âmbito, subjectivo ou objectivo do recurso pode ser limitado pelo próprio recorrente. Essa restrição pode ser realizada no requerimento de interposição ou nas conclusões da alegação (arts. 635 nº3 e 4 e 637 nº2 do CPC).

Na observação destas prescrições normativas concluímos que o objecto do presente recurso incide sobre determinar se quando a acção de resolução em benefício da massa insolvente foi proposta já havia decorrido o prazo para ser proposta.

O art. 125 do CIRE estabelece que “[O] direito de impugnar a resolução caduca no prazo de três meses, correndo a acção correspondente, proposta contra a massa insolvente, como dependência do processo de insolvência.”

Numa primeira abordagem aos termos da acção, verificamos que na aplicação deste preceito, tendo a autora recebido em 7 de maio de 2014 a carta da administradora da insolvência que lhe comunicava a resolução do acto (doação), o prazo de três meses estabelecido no citado art. 125 terminaria em 7 de Agosto de 2014.

Acontece que em 15 de maio de 2014 a Autora solicitou a concessão de benefício de apoio judiciário, razão pela qual teremos de questionar qual a relevância dessa solicitação relativamente à propositura da acção a que se destinava tal apoio.

Neste sentido o art. 33 do D. L. 34/2004 determina que “1- o patrono nomeado para a propositura da acção deve intentá-la nos 30 dias seguintes à notificação da nomeação, apresentando justificação à Ordem dos Advogados ou à Camara dos solicitadores se não instaurar a acção naqueles prazo



 (…) 4 - A acção considera-se proposta na data em que for apresentado o pedido de nomeação de patrono.”.

Neste sentido, tendo a autora solicitado a concessão do pedido de apoio judiciário em 15 de Maio de 2014 teríamos de concluir que a propositura da acção de impugnação da resolução em benefício da massa insolvente havia sido proposta nessa data (15 de maio de 2014), muito antes de decorrido o prazo de caducidade de três meses em que ela poderia ser proposta.

Trata-se de uma simples e directa aplicação da lei que julgamos não deixa margem de dúvidas.

De facto, a lei pretende que nos casos em que alguém tenha de propor uma acção, a simples circunstância de requerer o benefício do apoio judiciário valha como data de propositura do processo judicial a que se destina esse apoio[1].

Não se exige assim, para que se considere proposta a acção, que dê entrada em juízo a petição inicial, valendo simplesmente o requerimento de apoio judiciário para garantir esse fim.

Assim sendo, julgamos ser de concluir que, estando provado que a autora solicitou o apoio judiciário em 15 de maio de 2014, é nessa data que, em princípio, se deve considerar proposta a acção, verificando-se desse modo que o foi antes do termo do prazo de caducidade que ocorreria em 7 de Agosto de 2014.

Não obstante esta aparente simplicidade da aplicação da lei, a circunstância de ela atribuir a data de propositura da acção ao momento em que haja sido solicitado pela autora o beneficio do apoio judiciário para a propor, não ilude a realidade segundo a qual, embora se deva ficcionar que a data da propositura da acção é essa, na realidade, nesse momento, a petição inicial ainda não entrou em juízo, tendo de saber-se até quando deve e pode essa petição inicial entrar em juízo e quais as consequências se ela não der entrada no prazo devido ou, até, se nunca vier a dar entrada.

Neste domínio o art. 33 do DL 34/2004 estabelece que: “1 – O patrono nomeado para a propositura da acção deve intentá-la nos 30 dias seguintes à notificação da nomeação, apresentando justificação à Ordem dos Advogados ou à Câmara dos Solicitadores se não instaurar a acção naquele prazo.

2 - O patrono nomeado pode requerer à Ordem dos Advogados ou à Câmara dos Solicitadores a prorrogação do prazo previsto no número anterior, fundamentando o pedido.

3 - Quando não for apresentada justificação, ou esta não for considerada satisfatória, a Ordem dos Advogados ou a Câmara dos Solicitadores deve proceder à apreciação de eventual responsabilidade disciplinar, sendo nomeado novo patrono ao requerente.

(…)”

De acordo com este normativo, no caso em decisão o patrono nomeado em 21 de maio de 2014 dispunha do prazo de 30 dias, que terminava em 30 de Junho de em 2014, para intentar a acção, pelo que julgamos ser razoável concluir que só nesta circunstância (isto é propondo a acção nesse prazo de 30 dias) poderia beneficiar da “ficção” concedida no art. 24 nº4 citado, segundo a qual a acção se considera proposta, não no dia em que a petição dá entrada em juízo mas sim na data em que foi requerido o pedido de apoio judiciário para a propor.

Configuramos pois este art. 24 nº4 como uma fixação da data de propositura da acção condicionada à apresentação da petição inicial respectiva no prazo de 30 dias a contar da data em que o patrono nomeado foi notificado da nomeação.

Contrariamente ao que defende a recorrente, não cremos que a não apresentação da petição inicial pelo patrono nomeado no prazo aludido dos 30 dias seja configurável como um causa de interrupção do prazo da caducidade, porquanto o art. 285 do CPCivil para que remete se inscreve no capítulo da interrupção da instância e não nos parece ser aplicável à caducidade como causa de interrupção ou suspensão, como adiante veremos.

A caducidade, referida ao direito de propor uma acção em juízo, como expressamente a lei proclama (artigo 328 do Código Civil), em princípio não se suspende nem se interrompe, pelo que a não ser quando isso seja ordenado, não lhe são aplicáveis as regras de suspensão e da interrupção da prescrição.

E não se suspendendo nem se interrompendo o prazo de caducidade, só a prática, dentro do prazo, do acto a que a lei atribua o efeito impeditivo (artigo 331 do Código Civil) é causa impeditiva da sua ocorrência.

Reportada ao direito de propor a acção de impugnação da resolução em benefício da massa insolvente, parece indiscutível que o acto a que tem de atribuir-se o efeito impeditivo dessa mesma caducidade é o da propositura dessa mesma acção, como resulta claro da letra do artigo 332 do Código Civil, onde se fala na acção “…tempestivamente proposta (n. 1); e…prazo decorrido entre a propositura da acção e…”.

Aqui se revela, cremos que sem margem para dúvidas, que o acto impeditivo da caducidade é o da propositura da acção, sem mais. E o que importa para impedir a caducidade é a manifestação de vontade do titular do direito, exercendo-o, não a chegada dessa manifestação ao conhecimento da outra parte, sendo que, no caso de se haver requerido o apoio judiciário o momento da propositura da acção é situado, por determinação legal, com referência à data em que o apoio judiciário foi requerido.

Ora, regressando à questão antes suscitada, se o patrono nomeado, ao contrário do que a lei lhe impõe, não apresenta a petição inicial no prazo de 30 dias, como antes deixámos expresso, julgamos que isso não determina que se tenha a instância processual por suspensa (nos termos do art. 285 do CPC então aplicável) uma vez que, em rigor, essa instância, materialmente, ainda não existe. Efectivamente, é quando dá entrada em juízo a petição inicial que o julgador pode concluir que sendo embora aquela a data em que se inicia materialmente o processo, afinal, a acção se deve ter por proposta em momento anterior, ou seja, naquele em que haja sido requerido o apoio judiciário. Mas é também nesse momento que o tribunal deve aferir se a petição inicial é apresentada depois do prazo de diligência de 30 dias a que alude o art.33 nº1 do DL 34/2004.

Até ser apresentada a petição inicial, que traz consigo a certificação de haver sido requerido (e em que data) e concedido o apoio judiciário, o tribunal não tem forma de saber se a propositura da acção é tempestiva ou não, razão pela qual o argumento (da recorrente) segundo o qual se deveria tomar a não apresentação como uma suspensão da instância julgamos não ter sentido lógico, bastando pensar que para se considerar suspensa a instância a partir do momento da nomeação do patrono estar-se-ia a considerar suspensa uma instância que materialmente não existe e sem possibilidade de proferir um despacho a julgar tal suspensão. E, por absurdo, teria de admitir-se que ao iniciar-se materialmente a instância com a apresentação da petição inicial, retroagindo a data da propositura da acção à do requerimento de apoio judiciário, o processo se iniciaria estando, ou tendo já estado, com a instância suspensa.  

Aliás, veja-se que o próprio preceito do C.Civil (o art. 332 nº1), para que a recorrente remete, tem como previsão os casos em que “(…) a caducidade se refere ao direito de propor certa acção em juízo e esta tiver sido tempestivamente proposta (…)”, o que reforça a ideia de que este normativo não tem aplicação se a acção, como forma material de processo não tiver existência real no tribunal.     

Pelo sobredito, entendemos que a solução do objecto do recurso deve ser encontrada na conjugação dos prazos de caducidade e de obrigação do patrono propor a acção em 30 dias com aquela outra disposição que fixa a data da propositura da acção fazendo-a coincidir com a do requerimento de apoio judiciário.

De uma forma mais simples e impressiva, podemos pensar que a situação que se coloca ao juízo do tribunal neste recurso não é diferente e não deverá ter diferente solução daquela outra que se colocaria se, nas mesmas condições e contexto de facto, tendo sido requerido o apoio judiciário numa determinada data, a petição inicial só viesse a entrar em juízo um ou mais anos depois de o patrono haver sido nomeado, sendo o prazo de caducidade de três meses 

Ora, se o aludido prazo de 30 dias para propor a acção se situa ainda dentro do prazo de caducidade, se o patrono não a propuser incorrerá em responsabilidade disciplinar (art. 33 nº 3 do DL 34/2004) mas a acção poderá ainda ser proposta até ao termo do prazo de caducidade por esse mesmo patrono ou por outro que a Ordem do Advogados venha a nomear.

Por outro lado, se o prazo de 30 dias para propor a acção terminar, ou mesmo se iniciar, depois de decorrido o prazo de caducidade esta não ocorrerá desde que o requerimento de apoio judiciário tenha sido apresentado enquanto estava ainda a decorrer tal prazo (de caducidade) e isto porque, quando vier a dar entrada em juízo a petição inicial, ao observar-se que a data de tal requerimento se situa dentro do prazo de caducidade, se deverá considerar que a acção foi proposta nesse momento (da apresentação do requerimento de apoio judiciário) e, como assim, tempestivamente proposta.

Diferentemente, se o requerimento de apoio judiciário foi apresentado durante o período em que estava a decorrer o prazo de caducidade mas se o patrono nomeada não apresenta em juízo a petição inicial respectiva nos 30 dias de que dispõe para o fazer, julgamos que caso o venha a fazer depois desses 30 dias e num momento em que o prazo de caducidade já se esgotou, deverá ser considerado que a caducidade ocorreu e o direito de propor a acção se extinguiu. E isto porque, para que tal não sucedesse, para que a petição inicial pudesse impedir a ocorrência da caducidade seria necessário que se verificasse que o requerimento de apoio judiciário foi apresentado ainda quando estava a decorrer esse prazo de propor a acção e, também, que a petição inicial correspondente entrou em juízo no prazo de 30 dias de que o patrono dispunha.

Trata-se de um caso em que poderíamos ser tentados a dizer que o prazo de caducidade se alargou e é acrescentado do prazo concedido para o patrono nomeado apresentar a petição inicial mas em que, verdadeiramente, nenhum acréscimo existe porque é a própria lei que manda considerar como data de propositura a do requerimento de apoio judiciário.

Este entendimento é, segundo cremos, o que melhor garante os imperativos de certeza e segurança da ordem jurídica pois não se poderia aceitar que, por o apoio judiciário ter sido requerido enquanto estava a decorrer o prazo de caducidade o patrono pudesse vir a apresentar a petição inicial mais de trinta dias, meses ou, até por absurdo, anos, sustentando que a caducidade nunca ocorreria porque a data do requerimento do apoio judiciário garantia, ad aeternum, essa tempestividade.

No caso em decisão, temos presente que o prazo de caducidade terminava em 7 de Agosto de 2014 e que o apoio judiciário foi requerido em 15 de Maio de 2014.

Na aplicação das considerações normativas deixadas expressas, tendo o patrono sido nomeado em 21 de Maio de 2014 ele devia apresentar a petição correspondente à acção até 20 de Junho de 2014, sem embargo de não o fazendo até essa data, ainda que incorrendo em eventual responsabilidade disciplinar, o poder ainda realizar até 7 de Agosto de 2014, momento em que terminava o prazo de caducidade de três meses.

Porém, antes de terminar o prazo de 30 dias para apresentar em juízo a petição inicial, em 17 de Junho de 2014, o patrono nomeado pediu escusa, a que veio a ser dado provimento, tendo sido nomeado outro patrono em 30 de Junho de 2014 (cfr. fls. 40).



Nos termos do disposto no art. 34 nº2 do DL 34/2004 o pedido de escusa formulado (…) interrompe o prazo que estiver em curso com a junção aos autos do respectivo documento comprovativo, aplicando-se o disposto no art. 24 nº5, ou seja, o prazo interrompido inicia-se, começa a contar de novo, a partir da notificação ao patrono nomeado da sua designação.

Advirta-se porém que o prazo que se refere no preceito citado como sendo interrompido não é, obviamente, o prazo de caducidade que é imutável e não se suspende nem interrompe, mas sim o prazo, no caso, de 30 dias de apresentação em juízo da petição inicial.

Assim, no caso em decisão, a partir de 30 de Junho de 2014 começou a contar um novo prazo de 30 dias para ser apresentada a petição inicial sem prejuízo de se continuar a considerar proposta a acção respectiva na data do requerimento de apoio judiciário desde que viesse a ser respeitado o prazo de 30 dias de que o patrono dispunha.

No entanto, verificamos que a petição inicial foi apresentada em juízo no dia 30 de Setembro de 2014, data em que havia já decorrido o prazo de 30 dias que o patrono dispunha para apresentar a petição inicial (tal prazo terminava em 30 de Julho de 2014) e, também, data em que já havia decorrido por completo o prazo de caducidade.

Em consequência, face ao que deixamos dito deve ter-se por verificada a excepção de caducidade e por intempestiva a propositura da acção.

De facto, não é o prazo de caducidade que se alarga, suspende ou interrompe, sendo sempre esse prazo o mesmo (de três meses nos termos do art. 125 do CIRE), podendo apenas a petição inicial ser apresentada em juízo para lá desse prazo natural de caducidade (7 de Agosto de 2014) quando se possa entender que a acção foi proposta ainda dentro dele por se haver requerido, em conformidade, o apoio judiciário, num momento em que estava a decorrer o prazo de caducidade.

Contudo, não é apenas a data do requerimento de apoio judiciário que garante a tempestividade da propositura da acção permitindo que a apresentação da petição inicial venha a entrar em juízo em qualquer momento posterior (meses ou anos que sejam) sem consequências, estando, em nosso entender, essa tempestividade condicionada ao cumprimento do prazo de apresentação da petição inicial imposto ao patrono nomeado ou àquele outro que lhe suceda por igual nomeação em virtude de escusa pedida pelo antecessor.

Em resumo, se o prazo de caducidade terminava em 7 de Agosto de 2014; se o apoio judiciário foi requerido em 15 de Maio de 2014; se o patrono que devia apresentar a petição inicial em juízo foi nomeado em 30 de Junho de 2014 e se a petição só veio a dar entrada em juízo em 30 de Setembro de 2014 deve concluir-se que nesta última data, já não podia considerar-se que a acção havia sido proposta em 15 de Maio (data do requerimento de apoio judiciário) uma vez que não havia sido respeitado o prazo de 30 dias para apresentação da petição inicial.

Nesta conformidade merece provimento o recurso devendo decidir-se que o prazo para intentar a acção se encontrava expirado quando esta foi proposta.

Síntese conclusiva:

- Tendo sido solicitado apoio judiciário pelo demandante para propor acção cível, esta considera-se proposta na data em que aquele requereu o benefício do apoio judiciário.

- Se o patrono nomeado não propuser a acção no prazo de 30 dias que lhe determina o art. 33 nº 1 do DL 34/2004 ou se, tendo este pedido escusa do patrocínio, o novo patrono nomeado não propuser a acção no prazo de trinta dias a contar da notificação da sua nomeação, deve considerar-se que a acção não foi proposta, perdendo-se o benefício de considerar como proposta a acção na data do requerimento do apoio judiciário.

- Assim, quando o pedido de apoio judiciário foi requerido antes de decorrido o prazo para propor a acção (prazo de caducidade) e a petição inicial respectiva tenha sido apresentada fora desse prazo, deve considerar-se tempestivamente proposta se o patrono nomeado (ou aquele outro que o substituiu depois de deferido pedido de escusa) realizou essa apresentação dentro do prazo de 30 dias a que alude o art. 33 nº1 do DL 34/2004.

- No entanto, quando o pedido de apoio judiciário tenha sido requerido antes de decorrido o prazo para propor a acção (prazo de caducidade) e a petição inicial respectiva tenha sido apresentada depois de decorrido esse prazo, deve considerar-se a caducidade da propositura da acção se o patrono nomeado (ou aquele outro que o substituiu depois de deferido pedido de escusa) realizou essa apresentação fora do prazo de 30 dias a que alude o art. 33 nº1 do DL 34/2004.”

… …

Decisão

Pelo exposto, decide-se julgar procedente a Apelação e, em consequência, revogando a decisão recorrida, julga-se verificada a excepção de caducidade do direito de impugnar a resolução da doação em causa, absolvendo a Ré da instância.

Custas pela Apelada.”

… …

 Tendo sido este o teor da decisão singular proferida a reclamação apresentadas pela Apelante limita-se a suscitar a intervenção da Conferência, sem enunciar qualquer fundamento tendente a demonstrar o desacerto da Decisão Singular, para além da reafirmação dos que já constavam do recurso e foram equacionados na decisão reclamada.

     Porém, conforme se ponderou relativamente a uma situação em tudo semelhante, no Acórdão nº 514/2003 do Tribunal Constitucional[2]:

“[…]

A natureza colegial dos tribunais superiores implica que, em regra, a formação de julgamento integre, no mínimo, três juízes e a tomada de decisão exija, também no mínimo, dois votos conformes. Admitindo, porém, a lei, por óbvias razões de economia e celeridade processuais, que certas decisões sejam tomadas individualmente pelo relator, esta possibilidade não pode deixar de ser acompanhada pela outorga à parte que se sinta prejudicada com tais decisões da faculdade de as fazer reexaminar pela conferência, de composição colegial. Assim sendo, a circunstância de o reclamante não ter explicitado as razões pelas quais discorda do despacho reclamado não conduz inexoravelmente ao indeferimento da reclamação (e muito menos ao seu não conhecimento), antes se impõe que a conferência repondere a questão, bem podendo acontecer que, mesmo na ausência de críticas do reclamante ao despacho reclamado, no colectivo de juízes acabe por prevalecer entendimento diverso do inicialmente assumido pelo relator.

[…]”.

     Não obstante, no presente caso, procedendo-se em Conferência a essa reponderação, entende-se que, pelas exactas razões indicadas na Decisão Sumária reclamada, as apelações (e a reclamações) carecem de fundamento.

     Aliás, sempre se acrescenta que, no conhecimento que o presente colectivo decisório tem do recíproco entendimento sobre determinadas questões jurídicas, esse conhecimento e constância de decisão permite, também ele, em determinadas questões (como a do presente recurso) que seja proferida decisão singular com benefício da celeridade e tempestividade das decisões e sem detrimento algum da segurança e certeza jurídicas.

… …

Decisão

Assim, desatendendo as presentes reclamação, decide-se, na total improcedência da Apelação interposta por T..., confirmar, agora em Conferência, a decisão recorrida.

Custas pela Apelante, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário de que beneficie.

Coimbra, 7 de Junho de 2016

Relator: Des. Manuel Capelo

J.A.: Sr. Des. Falcão de Magalhães

J.A.: Srª Des. Sílvia Pires


                  ***


                  [1] Diferentemente nos casos em que a o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de acção judicial e o requerente pretende a nomeação de patrono, nos termos do art. 24 nº4 do DL 24/2004, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo.

                  [2] Disponível em www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos.