Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1109/17.7T9VIS.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: BELMIRO ANDRADE
Descritores: PRINCÍPIOS DA CONTINUIDADE E DA CONCENTRAÇÃO DA AUDIÊNCIA
DECLARAÇÕES PARA MEMÓRIA FUTURA
LEITURA EM AUDIÊNCIA
APRECIAÇÃO DA PROVA
MEMÓRIAS
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
REQUISITOS
PENA ACESSÓRIA
EFEITO AUTOMÁTICO
INCONSTITUCIONALIDADE
Data do Acordão: 05/06/2020
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: VISEU (JUÍZO CENTRAL CRIMINAL)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS. 328.º, N.ºS 1, 6 E 7, E 355.º, DO CPP, E ACÓRDÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA PARA UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA N.º 8/2017, DE 11/19/2017; ART. 50.º E 65.º DO CP; ART. 30.º, N.º 4, DA CRP.
Sumário: I - Com a entrada em vigor da Lei 27/2015, de 14 de abril, pese embora se tenha mantido inalterada a primeira parte do art.º 328.º, n.º 6 do CPP, a verdade é que desapareceu do texto da Lei a sanção da perda de eficácia da prova para as situações em que, entre cada uma das sessões, não foi possível assegurar o limite aí estabelecido de 30 dias.

II – Mantendo-se, porém, as regras da continuidade da audiência contidas nesse artigo, seus n.ºs 1 e 6, primeira parte, a eliminação da cominação da perda de eficácia da prova não significa a possibilidade de perpetuação indefinida da fase da audiência de discussão e julgamento. Nem a postergação do princípio da continuidade e concentração, balizados nos termos das restantes disposições do art.º 328.º. O próprio carácter excecional do excesso do prazo de trinta dias continua a ser acentuado pelo legislador, quer com a ressalva dos casos previstos no n.º 7, quer por efeito das exigências contidas na segunda parte do n.º 6, relativas à demonstração dos motivos de impedimento da observância do referido prazo de trinta dias, devidamente explicitados no processo, devendo ficar objetivados em ata, nos aludidos termos da parte final do n.º 6.

O tribunal deverá continuar a disciplinar a sua atividade por forma a concentrar os trabalhos de produção de prova a produzir na audiência de discussão e julgamento, no período temporal mais curto possível, obrigando à justificação de qualquer adiamento por mais de 30 dias, mas deixando de estar cominada a inexorável perda de eficácia da prova nessas circunstâncias específica.

Isto é, a regra continua a ser a da continuidade da audiência de discussão e julgamento que apenas poderá ser adiada por mais de 30 dias, nas circunstâncias previstas na 2.ª parte do n.º 6 conjugado com o n.º 7 do art.º 328.º.

III - Quando se trata de uma agressão sexual, devemos lembrar que a memória é um processo muito complexo. Existem vários fatores que vão influenciar sobre quais os elementos de uma experiência que provavelmente serão codificados, consolidados e armazenados na memória, juntamente com as informações contextuais e temporais. Para ser capaz de produzir o tipo de narrativa que normalmente consideramos como uma memória, uma pessoa tem que ser capaz de recordar a informação e colocá-la em algum tipo de sequência ou contexto significativo. Agora entendemos que uma experiência traumática constitui uma coleção de peças de puzzle que muitas vezes não podem ser colocadas juntas de forma consistente. A lembrança inicial da experiência muitas vezes parece desarticulada (“em todo o lugar”) e, como tal, pode parecer difícil de acreditar. Entretanto, se pensarmos no processo de recordação como descascando camadas da experiência, isso pode ajudar a entender a memória traumática.

IV - As memórias da agressão tendem a ser imagens fragmentadas, sons e sensações corporais, além de emoções fortes como desgosto e horror. As memórias traumáticas têm poucos detalhes periféricos, pouca ou nenhuma informação de sequência de tempo e pouca ou nenhuma palavra ou narrativa, especialmente logo após o trauma e no início da recuperação.

V – A lei não impõe a leitura, em audiência, das declarações para memória futura anteriormente prestadas.

Tratando-se de provas pré-constituídas, obtidas antecipadamente, incorporadas nos autos, e arroladas como meio de prova da acusação, o que se exige é o efetivo exame e discussão, na audiência final, do seu conteúdo, em cuja produção participem todos os sujeitos processuais, que além estiveram presentes ou representados e onde exerceram o contraditório. Exigência é, pois, apenas o respetivo exame e a discussão cruzada do seu conteúdo, na audiência final, no confronto com os restantes meios de prova.

VI - Na base da decisão de suspensão da execução da pena deverá estar uma prognose favorável ao agente, baseada num risco prudencial. A suspensão da pena funciona como um instituto em que se une o juízo de desvalor ético-social contido na sentença penal com o apelo, fortalecido pela ameaça de executar no futuro a pena, à vontade do condenado em se reintegrar na sociedade. O tribunal deve estar disposto a assumir um risco prudente; mas se existem sérias dúvidas sobre a capacidade do condenado para compreender a oportunidade de ressocialização que se oferece, a prognose deve ser negativa, o que supõe, de facto, um in dubio contra reo.

VII – In casu, deparando-se-nos a prática pelo agente de dois crimes de coação sexual agravados, previstos e punidos pelas disposições conjugadas dos art.ºs 163.º, n.º 1 e 177.º, n.º 1, al. b), ambos do CP, a atitude de ausência de censura perante a violação do bem jurídico protegido pelo tipo de crime – independentemente da não admissão da prática do facto em si - afasta a formulação do juízo de prognose favorável de que a suspensão possa satisfazer as necessidades de prevenção especial.

Do mesmo modo que a suspensão não satisfaz as necessidades mínimas de tutela da ordem jurídica, visto que se trata, além do mais, de dois crimes praticados em diferentes circunstâncias de tempo e lugar, contra uma criança em relação à qual o arguido tinha especiais deveres de cuidado, educação e respeito, pelo que a comunidade não aceitaria como adequada a suspensão.

VII – A pena acessória imposta ao agente nos termos do art.º 69.º-B, do CP, da proibição de exercer profissão, emprego, funções ou atividades, públicas ou privadas, cujo exercício envolva contacto regular com menores, pelo período de seis anos, não constitui efeito automático da sua condenação pela prática dos dois crimes de coação sexual agravados, nem envolve a violação dos princípios constitucionais da culpa e do direito ao trabalho.

Decisão Texto Integral:

Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: 

I- RELATÓRIO

1. A decisão recorrida

Após realização da audiência pública de discussão e julgamento, pelo tribunal coletivo, com exercício amplo do contraditório, foi proferido acórdão final, com apreciação da matéria de facto e de direito, com o seguinte DISPOSITIVO:

Pelo exposto, acordam os juízes que compõem este tribunal coletivo em

A. julgar procedente a acusação e, em consequência, condenar AA, pela prática de dois crimes de coação sexual agravados, previstos e punidos pelas disposições conjugadas dos artigos 163.º, n.º 1 e 177.º, n.º 1, alínea b), e 69.º- B, n.º 2, do Código Penal, o primeiro deles em 5/7/2015, na pena de dois anos e dez meses de prisão; o segundo, em setembro de 2016, na pena de dois anos e seis meses de prisão e na pena acessória de proibição de exercer profissão, emprego, funções ou atividades, públicas ou privadas, cujo exercício envolva contacto regular com menores, pelo período de seis anos.

B. Em cúmulo jurídico, condenar AA na pena única de três anos e sete meses de prisão efetiva e na pena acessória de proibição de exercer profissão, emprego, funções ou atividades, públicas ou privadas, cujo exercício envolva contacto regular com menores, pelo período de seis anos.

C. (…)

D. Determinar a recolha de amostras para fins de identificação de células humanas, a respetiva análise e obtenção de perfis de ADN.

E. (…)


*

2. O recurso

Inconformado com o acórdão (…), recorre o arguido.

Na motivação do recurso são formuladas as seguintes CONCLUSÕES:

(…)


*

Corridos vistos cumpre decidir.

***

II – FUNDAMENTAÇÃO

1. Síntese das questões a decidir

Tendo por referência a natureza do recurso (apreciação da existência de erro in judicando ou in procedendo cometido na decisão impugnada que não a realização de um novo julgamento) e o dever de motivação, especificada, que incide sobre o recorrente, nos termos previstos no artigo 412º do CPP, constitui entendimento pacífico que, sem prejuízo daqueles casos em que a lei imponha o dever de conhecimento oficioso de determinadas questões, o âmbito do recurso é definido pelas respetivas conclusões – cfr., designadamente, Germano Marques as Silva, Curso de processo Penal, 2ª ed., III, 335; Simas Santos / Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 5ª ed., p. 74; Ac. STJ de 28.04.99, CJ/STJ, ano de 1999, p. 196.

As questões suscitadas serão analisadas pela ordem de precedência lógica indicada nos artigos 368º/369º do CPP, por remissão do artigo 424º, nº2 do mesmo diploma.

Assim, vistas as conclusões, ordenando-as desde já pela referida ordem lógica, são colocadas à apreciação deste tribunal as seguintes questões:

- Nulidade do Julgamento, pelo decurso de mais de 30 dias entre a 1ª e a 2ª sessão;

 - (…)

- Vícios de erro notório na apreciação da prova (…);

 - (…)

- (…); - suspensão da execução.

- Pena acessória: - desproporcionalidade e exagero da pena acessória de proibição de exercer profissão; - inconstitucionalidade da interpretação do art. 69º-B do C. Penal;

- (…)


*

Visto que a apreciação das nulidades invocadas não depende da decisão da matéria de facto, podendo antes prejudicá-la, procede-se à sua apreciação, desde já.

2 - Nulidades - apreciação

2.1. - Nulidade do Julgamento, pelo decurso de mais de 30 dias entre a 1ª e a 2ª sessão:

O julgamento nos presentes autos iniciou-se em 19 de abril de 2019, quando já se encontrava em vigor a Lei 27/2015 de 14 de abril, que deu nova redação ao art. 328º do CPP.

Sob a epígrafe “Continuidade da audiência”, postula o art. 328º do CPP (redação dada pela referida Lei):

1- A audiência é contínua, decorrendo sem qualquer interrupção ou adiamento.

2 – (…)

3- O adiamento da audiência só é possível, sem prejuízo dos demais casos previstos nesta Código quando, não sendo a simples interrupção bastante para remover o obstáculo:

(…)

6 - O adiamento da audiência de discussão e julgamento não pode exceder 30 dias. Se não for possível retomar a audiência neste prazo, por impedimento do tribunal ou por impedimento dos defensores constituídos em consequência de outro serviço judicial já marcado de natureza urgente e com prioridade sobre a audiência em curso, deve o respetivo motivo ficar consignado em ata, identificando-se expressamente a diligência e o processo a que respeita.

Por sua vez o nº 7 do mesmo preceito estabelece, na mesma redação introduzida pela Lei 27/2015:

7 - Para efeitos da contagem do prazo referido no nº anterior não é considerado o período das férias judiciais, nem o período em que, por motivo estranho ao tribunal, os autos aguardem a realização de diligências de prova, a prolação de sentença ou que, em via de recurso o julgamento seja anulado parcialmente, nomeadamente para repetição de prova ou produção de prova suplementar.

A segunda parte do nº6 e o nº7 do art. 328º foram introduzidos pela já referida Lei nº 27/2015, de 14 de abril.

Na versão originária, o citado art. 328º, nº6 do CPP estabelecia, como consequência expressa que o decurso de mais de 30 dias entre cada uma das sessões da audiência de discussão e julgamento, determinava, como consequência inexorável, a perda de eficácia da prova previamente produzida.

O aludido limite inultrapassável de trinta dias, para o adiamento, dá consagração ao princípio da continuidade e da concentração da audiência de julgamento, previsto no nº 1 do art. 328º que impõe como regra que a audiência de discussão e julgamento decorra, sem interrupção ou adiamento, até ao seu encerramento.

Trata-se de assegurar, ainda, a concretização dos princípios da oralidade e da imediação, concebidos como os instrumentos privilegiados para a discussão cruzada e apreciação unitária do objeto do processo, assegurando ainda a realização da Justiça Penal em tempo útil e razoável.

O princípio da continuidade da audiência visa atingir duas finalidades: - a concentração da produção da prova devendo os termos e atos processuais desenvolver-se, no espaço e no tempo, de forma unitária e contínua, por forma a que a prova seja apreciada o mais próximo possível do momento em que é produzia e discutida, mantendo-se viva na memória de todos os intervenientes processuais e do julgador.

Assegurando ainda a eficácia da administração da justiça valor este consagrado na Constituição - art. 20 nº 5 - segundo o qual a defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais deve ser legalmente assegurada, mediante procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade. Bem como do direito à decisão em prazo razoável - art. 20º nº 4 da CR - também previsto no artigo 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.

Com a entrada em vigor da Lei 27/2015, de 14 de abril, pese embora se tenha mantido inalterada a primeira parte do art. 328º nº 6 do CPP - que o adiamento não pode exceder trinta dias - a verdade é que desapareceu do texto da Lei a sanção da perda de eficácia da prova para as situações em que, entre cada uma das sessões, não foi possível assegurar esse limite.

A alteração introduzida, além de afastar o efeito automático da perda de eficácia da prova independentemente da natureza dos fundamentos, levando ao extremo de que, por virtualidades mais ou menos justificadas, designadamente em julgamentos mais complexos, ficasse sem efeito aturado labor processual, cumprido. Obrigando à repetição automática de depoimentos e atos sobre cujo conteúdo não se suscitam dúvidas relevantes, tanto mais quando a prova esteja gravada.

Com efeito, na redação originária do CPP não estava prevista a gravação universal da prova produzida em audiência - introduzida apenas pela reforma de 1995, por efeito da disponibilização nos tribunais dos meios técnicos entretanto massificados. Assegurando a gravação a preservação e a genuinidade da prova, bem como a efetiva possibilidade de reapreciação em via de recurso.

A alteração referida, correspondeu à intenção do legislador de banir da ordem jurídica processual penal a cominação, radical, da perda de eficácia da prova, gravada, caso seja ultrapassado aquele prazo de trinta dias, que deixou de se justificar em função do “contexto tecnológico atual”, além do mais por efeito da universalidade da gravação da prova.

Tal como equacionado na “Exposição de Motivos” da Proposta de Lei nº 263/XII, a propósito da eliminação da sanção consistente na perda da prova, por ultrapassagem do prazo de 30 dias para a continuação de audiência de julgamento interrompida «no contexto tecnológico atual, a sanção legalmente prevista - perda da eficácia da prova pela ultrapassagem do prazo legal de 30 dias para a continuação da audiência de julgamento - antolha-se desajustada, sendo certo que se considera que a eliminação desta sanção não contende com a manutenção plena dos princípios da concentração da audiência e da imediação».

Vista a aludida alteração legislativa, deixou de ter efeito a doutrina do Ac. do STJ para Uniformização de Jurisprudência nº 11/2008, de 11/12, DR, Série I, de 11/12.2008 por prolatado no âmbito de norma entretanto revogada.

Também o Ac. do STJ para Uniformização de Jurisprudência nº 1/2016, de 12 de novembro de 2015, in DR, Série I, de 5 de janeiro de 2016, não tem aplicação no caso por relativo à redação do preceito anterior à introduzida pela Lei 27/2015, como resulta do respetivo dispositivo

Mantendo-se as regras da continuidade da audiência contidas no art. 328º nº 1 e nº 6, primeira parte, a eliminação da cominação da perda de eficácia da prova não significa a possibilidade de perpetuação indefinida da fase da audiência de discussão e julgamento. Nem a postergação do princípio da continuidade e concentração, balizados nos termos das restantes disposições do art. 328º. O próprio carácter excecional do excesso do prazo de trinta dias continua a ser acentuado pelo legislador, quer com a ressalva dos casos previstos no nº 7, quer por efeito das exigências contidas na segunda parte do nº 6, relativas à demonstração dos motivos de impedimento da observância do referido prazo de trinta dias, devidamente explicitados no processo, devendo ficar objetivados em ata, nos aludidos termos da parte final do nº6.

O tribunal deverá continuar a disciplinar a sua atividade por forma a concentrar os trabalhos de produção de prova a produzir na audiência de discussão e julgamento, no período temporal mais curto possível, obrigando à justificação de qualquer adiamento por mais de 30 dias, mas deixando de estar cominada a inexorável perda de eficácia da prova nessas circunstâncias específica.

A regra continua a ser a da continuidade da audiência de discussão e julgamento que apenas poderá ser adiada por mais de 30 dias, nas circunstâncias previstas na 2ª parte do nº6 conjugado com o nº7 do art. 328º.

Vistas as aludidas limitações à continuidade da audiência para além de 30 dias, sempre justificadas, a preservação dos atos, para além de 30 dias, não só não viola a lei, como satisfaz o princípio do julgamento em tempo razoável, assegurado pela razoabilidade do fundamento, na ponderação de valores entre a continuidade e a exequibilidade funcional. 

Ainda que não seja justificado o adiamento por mais de 30 dias, nos termos a que se fez referência, com a entrada em vigor da Lei 27/2015, deixou de ser cominada a radical perda de eficácia ou invalidade absoluta.

Pelo que a eventual falta sempre cairia no âmbito das meras irregularidades, como tal sujeita ao regime dos artigos 118º e 123º do CPP.

No caso sob apreciação os adiamentos foram requeridos pelos Assistentes e pela Defesa do Arguido, invocando para o efeito serviço prioritário previamente agendado (cfr. fls. 192v. /193 e 200v/201).

Tal requerimento foi deferido com fundamento em “serviço judicial já marcado de natureza urgente e com prioridade sobre a audiência em curso”, com fundamento no citado art. 328º, nº 6 do CPP.

Nenhuma irregularidade ocorreu assim, no caso.

Resulta ainda dos autos que na 1ª Sessão da audiência de discussão e julgamento, decorrida no dia 11.06.2019, foi designada a data de 02.07.2019, pelas 14h00, para continuação da Audiência de Julgamento. Mostrando-se assim a data compreendida nos 30 dias seguintes.

No entanto, tal como resulta da informação constante de fls. 485 dos autos, com a conclusão datada de 03.07.2019, constava a seguinte informação: “apresentando os autos a V.a Ex.a, em virtude de ter sido agendada greve para o dia de ontem, pelo SFJ - Sindicato dos Funcionários Judiciais, à qual aderiram os funcionários deste Juízo”.

Na sequência de tal informação foi proferido despacho com o seguinte teor:

Para a continuação do julgamento designo o próximo dia 10 de setembro, pelas 9 horas e não antes por interposição das férias judiciais.

Consigna-se desde já que inexiste outro dia disponível em agenda e que para esse dia estão já agendadas continuações noutros processos, havendo o tribunal coletivo de reunir-se também para eles, com a minha intervenção e a intervenção da senhora juiz adjunta que a essa data estará a exercer funções noutro tribunal e se deslocará a esta comarca com o exclusivo propósito de assegurar continuar a audiência de julgamento”.

O tribunal fundamentou, pois, a razão do adiamento da Audiência em prazo superior a 30 dias, sem que algum dos sujeitos processuais tivesse, aliás, levantado qualquer questão em tempo oportuno. Pelo que não ocorreu qualquer nulidade ou irregularidade.

Improcede assim a nulidade invocada.

(…)


***

3. A apreciação das restantes questões obriga a que se convoque a decisão da matéria de facto, a fim de verificar da justeza das críticas que lhe são dirigidas e à consequente qualificação jurídico-penal.

3.1. A DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO com a motivação probatória que a suporta é a seguinte:

A) MATÉRIA DE FACTO PROVADA

1- DF nasceu a 17 de novembro de 2000 e é filha de PF e FL.

2- Desde pelo menos 16 de abril de 2003, aquela DL passou a residir permanentemente com MA, sua tia paterna e madrinha, e com o arguido, marido da referida tia e seu padrinho, na Rua (…), em (…).

3- Por acordo judicialmente homologado por sentença de 10 de fevereiro de 2006, proferido nos autos de regulação das responsabilidades parentais n.º (…), a DL foi confiada à guarda e cuidados da referida tia e do arguido, com os quais se manteve a residir até 21 de março de 2017, altura em que passou a residir com a tia CR até ao dia 03/04/2017, após o que passou a residir no Lar de Infância e Juventude de (…), em (…), na sequência da aplicação da medida de promoção e proteção de acolhimento institucional.

4- O arguido é professor de eletricidade e de matemática no Agrupamento de Escolas de (…), onde dá aulas a estudantes que frequentam o 10.º e 11.º anos de escolaridade.

5- No dia 5 de julho de 2015, dia do aniversário da tia/madrinha da DL, em hora que não foi possível apurar, mas situada entre as 15 e as 16 horas, quando a DL tinha 15 anos de idade, o arguido, aproveitando-se do facto de se encontrar sozinho com esta na residência sita na Rua (…), dirigiu-se ao quarto onde a mesma se encontrava, deitou-se na cama junto da D e despiu-lhe o pijama que ela tinha vestido, deixando-a completamente desnudada.

6- A D, porque percebeu a intenção do arguido, de consigo praticar atos sexuais, para se opor à concretização de tais atos, começou a gritar, a bater no arguido e a chorar, tendo o arguido agarrado a D, imobilizando-a, ao mesmo tempo que lhe disse para se calar senão que lhe faria “pior!” e, contra a vontade da mesma, lambeu-lhe os seios desnudos.

7- A D conseguiu libertar-se do arguido e fugiu para o corredor, onde escorregou e caiu pelas escadas, ficando imobilizada no chão.

8- Com a D caída no chão, o arguido voltou a agarrá-la e a imobilizá-la, tendo esta voltado a gritar e a esbracejar, na tentativa de se libertar do arguido e para se opor a que este praticasse mais atos sexuais consigo, tendo o arguido, com vista a praticar com ele mais atos sexuais, lhe batido, após o que, contra a vontade da D, lhe lambeu a vagina.

9- Em data não concretamente apurada, mas situada no mês de setembro de 2016, numa quarta-feira, dia em que a D não tinha aulas da parte de tarde, pelas 14 horas e 30 minutos, o arguido, aproveitando-se do facto de se encontrar sozinho com a mesma na residência acima identificada, aproximou-se desta, que se encontrava a dormir no sofá e despiu-lhe as calças e as cuecas que ela tinha vestidas, deixando-a nua da cintura para baixo.

10- A D acordou e começou a gritar e a esbracejar na tentativa de se libertar do arguido e para se opor a que ele praticasse consigo atos sexuais, tendo o arguido, com vista à concretização do propósito por si formulado de praticar atos sexuais com a D, lhe batido e a agarrado e, contra sua vontade desta, lambeu-lhe a vagina.

11- O arguido tinha perfeito conhecimento de que a D era sua afilhada e sobrinha por afinidade e que ela tinha menos de 16 anos de idade à data da prática dos factos, sabendo ainda que era ele, juntamente com a sua esposa, MA, madrinha e tia de D, quem providenciavam pela educação e sustento desta, exercendo também sobre a mesma as competentes responsabilidades parentais, e que tais circunstâncias, e o facto de ser tio de D, lhe agravava a responsabilidade criminal em que sabia incorrer.

12- O arguido agiu, com o propósito concretizado, de satisfazer os seus instintos libidinosos, bem sabendo que os atos sexuais e de cariz sexual que praticou eram adequados a prejudicar o livre e harmonioso desenvolvimento da personalidade da sua afilhada e sobrinha por afinidade na sua esfera sexual, aproveitando-se da idade desta que a tornava incapaz de opor resistência aos atos que levou a cabo, bem como da sua ingenuidade e inexperiência, do facto de com ela coabitar e dela dele depender economicamente, e ainda da sua qualidade de legal representante, assim a obrigando a suportar os atos sexuais e a constrangendo e perturbando e ofendendo os mais elementares princípios da moral sexual.

13- O arguido agiu em todas as circunstâncias atrás descritas voluntária e conscientemente, bem sabendo que estava a agir contra a vontade da sua afilhada e sobrinha por afinidade, menor de idade, e que dessa forma a ofendia na sua liberdade e desenvolvimento sexual e a constrangia a sofrer os atos sexuais descritos.

14- O arguido bem sabia ainda que todas as suas condutas eram proibidas e punidas por lei como crimes.

15- O arguido não tem antecedentes criminais.

16- O arguido é oriundo de um agregado familiar numeroso e com uma dinâmica disfuncional associada aos hábitos alcoólicos do progenitor.

17- Não obstante concluiu a sua formação escolar, cumpriu o serviço militar obrigatório, mais tarde concluiu o curso de engenharia eletrotécnica no Instituto Politécnico de (…).

18- Desde então tem mantido uma vida profissional estável, nomeadamente como professor contratado, lecionando eletrotecnia e matemática.

19- Casou com 22 anos, casamento que se mantém, com a esposa, de 45 anos, empregada doméstica, com quem tem dois filhos, o mais novo, de 18 anos, ainda integrado no agregado familiar.

20- O agregado reside em habitação unifamiliar, em meio socioeconómico de características rurais e subsiste com os rendimentos do trabalho do arguido e das atividades da esposa.

21- A situação económica é descrita como equilibrada.

22- Em termos profissionais o arguido é considerado como um professor competente e empenhado, com comportamento adequado com os alunos, professores e funcionários.

23- Inexistem registos consumos excessivos de bebidas alcoólicas ou de estupefacientes

24- O arguido não assume a prática de qualquer ato censurável, atribui a denúncia dos factos a uma vingança de DL e não expressa qualquer empatia pela situação daquela, apesar de, em abstrato, compreender a ilicitude dos atos de igual natureza e as consequências para a sua pessoa e para os outros.

25- A postura do arguido enquadra-se num perfil de abusador secundário ou situacional, em que a situação de abuso surge em circunstâncias específicas e de oportunidade, despoletadas por situações de stress ou outras, que não foi possível apurar, o que aliado à falta de reconhecimento do mal feito e à falta de empatia com a vítima, demanda uma pena que promova uma adequada interiorização da ilicitude da conduta.

(…)

C) MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO / ANÁLISE CRÍTICA DA PROVA

O julgamento decorreu na presença do arguido, que prestou declarações sobre os factos, com os quais foi confrontado, assim como também já havia prestado declarações na fase da instrução, perante o JIC, declarações essas que foram também analisadas.

Foi ouvida como testemunha DF (em memória futura a fls. 86 e seguintes), esta que havia também prestado declarações no decurso da instrução, as quais também se analisaram.

(…)

Nas declarações que prestou o arguido admitiu apenas a factualidade provada em 1), 2), 3) e 4). Entre estes, estão também documentados aqueles provados em 1), 2) e 3).

Incontroversa foi também a factualidade relativa à situação pessoal do arguido, assim como o seu passado criminal que, por via do relatório social e aquele CRC, respetivamente, se vieram a julgar provadas e nos termos provados.

Já os demais factos foram controversos e objeto de ampla discussão probatória. O arguido não os admitiu e da conjugação de todas as declarações e depoimentos ficou claro que - à semelhança do que acontece na maioria das situações de violência intrafamiliar e em particular nos crimes contra a liberdade sexual, ocorrida na reserva dos espaços habitacionais partilhados por agressor e vítima - ninguém presenciou os factos.

Relativamente a estes factos, o pilar probatório construiu-se, pois, a partir da conjugação das declarações de DL e do arguido e o ponto de partida para a formação da convicção do tribunal foram as próprias declarações do arguido, em julgamento e em instrução.

É incontornável que o arguido admitiu terem ocorrido interações de sentido claramente sexual com DL; embora tais interações tenham acontecido, na sua versão, de forma diversa daquela que se provou e por iniciativa de DL: a primeira delas na escadaria e patamar da casa, a segunda no quarto e a terceira no sofá da sala.

Por assim ser, temos por certo que a versão dos factos trazida ao processo por DL – que já levara ao processo de promoção e proteção, como se pode constatar da certidão extraída daqueles autos - não é uma pura fabulação sua.

Logo, a discussão probatória a fazer não é, seguramente, aquela de saber se ocorreram ou não ocorreram interações de cariz sexual entre o arguido e DL, é antes a de saber em que termos ocorreram essas interações, o que torna meramente secundária a questão de saber se as interações ocorreram num determinado ano ou num determinado dia da semana, ou se ocorreram às horas X ou Y.

Depois de tudo sopesado, o tribunal não encontrou qualquer razão que o levasse a desacreditar naquilo que DL afirmou e, por isso, foi com base nas suas declarações que se vieram a julgar provados os factos elencados em 5), 6), 7), 8), 9) e 10).

O discurso de DL foi, de facto, escorreito, coerente e intrinsecamente lógico, tal a forma descritiva dos eventos vivenciados, descrição essa que levou a julgar provados os factos elencados, e a prova produzida pelo arguido não abalou o seu valor.

A circunstância de terem sido efetuadas compras com os referidos cartões no dia 5/7/2015, não garante que foi o arguido que os usou – comum como é que no dia-a-dia das lides domésticas ambos os cônjuges / companheiros (ou mesmo demais membros do agregado) usem dinheiro, cartões ou cheques nas aquisições, independentemente das contas bancárias a que respeitam serem apenas de um ou ambos – e mesmo que fosse, não permitem concluir que o seu uso significa, inevitavelmente que não pudesse estar em casa entre as 15 e as 16 horas - como por exemplo se se tratasse de aquisições feitas no estrangeiro – sendo que, segundo os referidos estratos juntos, a única aquisição que está documentada em termos horários ocorreu pelas 18h:48m:26s

A circunstância de, no dia 5/7/2015, ao jantar, perante terceiros e nas fotografias que a representem nesse contexto, DL se apresentar aparentemente sorridente.

O facto de, às quartas feiras, o arguido dar aulas no período da tarde, assim como DL não poder estar em casa sozinha, porque aí dever estar também pelo menos um dos filhos do casal, MT e algum amigo, como aquele PJ – factos que resultaram das declarações destes últimos - não pressupõe que os factos tenham ocorrido no período de aulas, tanto assim que, como resulta dos documentos juntos pelo próprio arguido, este terá começado a sua atividade letiva a 14/9/2016.

Por outro lado, o que é certo para DL, como resultou claro das suas declarações, é que os factos ocorreram numa 4.ª feira de setembro de 2016, dia da semana que ficou na memória por não ter aulas, assim como aqueloutro de 2015 por ser o dia de aniversário da esposa do arguido. Tudo o demais é compreensivelmente incerto: os detalhes periféricos dos eventos que relatou, como as horas do dia ou, em Setembro de 2016, qual a concreta quarta feira entre as demais desse mês.

DL, pessoa que nutria particular afeto pelo arguido e pela esposa, seus padrinhos, que desde tenra idade dela cuidaram - como se extrai da certidão do processo de promoção e proteção – foi confrontada de forma súbita e inesperada com um evento agressor provindo de uma das pessoas que lhe prestava cuidados e proteção, ou seja, que até então tinha tido comportamento exatamente oposto aquele que agora empreendia.

Mesmo desconsiderando a questão de saber se o insucesso escolar e o comportamento aparentemente errático e incongruente de DL em contexto escolar - uma vez mais como se extrai da certidão do processo de promoção e proteção - não foi também fruto da deste evento traumático inicial, não podemos ignorar aqueles que são os normais efeitos da própria ação agressora traumática na vítima[1] ao nível da memória e da forma da reprodução dos eventos, uma vez que os recentes estudos nesta área nos vêm ensinando, por exemplo, que uma das manifestações da atividade agressora traumática, como todas as agressões sexuais, sobre as vítimas crianças e jovens é a de haver, além de dificuldades de aprendizagem a médio prazo e “prejuízo no processo da memória e do pensamento”[2]

As memórias consistem inicialmente em pontos de dados (incluindo pensamentos, sensações, etc.) que precisam ser codificados para se consolidarem e serem armazenados como memórias. O processo é auxiliado pelo hipocampo, que normalmente codifica os dados de memória com dados contextuais, temporais e informação (como um carimbo de hora), isto permite que seja recordado mais tarde como uma significativa narrativa que tem alguma estrutura lógica, bem como um começo, meio e fim. (…) O hipocampo quando trabalha normalmente, faz a memória ter detalhes, contexto e organização cronológica. As hormonas do stress degradam as funções do hipotálamo e do lobo frontal, a memória fica fragmentada e a vítima tenta associar as memórias, para aquilo que lhe parece lógico [9]. As memórias consistem inicialmente em pontos de dados (incluindo pensamentos, sensações, etc.) que precisam ser codificados para se consolidarem e serem armazenados como memórias. O processo é auxiliado pelo hipocampo, que normalmente codifica os dados de memória com dados contextuais, temporais e informação (como um carimbo de hora), isto permite que seja recordado mais tarde como uma significativa narrativa que tem alguma estrutura lógica, bem como um começo, meio e fim.

Primeiro, quando o circuito de defesa entra em ação, e o processamento de baixo para cima e a atenção tomam conta, é como se o hipocampo dissesse: “Oh isto é realmente importante.” imediatamente entra em “overdrive”, para codificar na memória tantos dados quanto possível. Também começa a trabalhar na consolidação ou armazenamento de qualquer informação que já tinha sido codificada na memória de curto prazo antes que o medo entre em ação. Esta informação é extraída de um armazenamento de memória que dura cerca de 30 segundos. O fenómeno é descrito às vezes como uma memória flash, e explica porque as vítimas muitas vezes têm um alto nível de detalhe nos momentos iniciais de uma agressão sexual ou outro evento traumático.

Depois de um tempo – e a quantidade de tempo varia de pessoa para pessoa, de apenas alguns segundos a minutos – o hipocampo muda para um modo diferente, onde se concentra em consolidar tudo o que foi absorvido e que já estava a ser consolidado durante esta fase inicial de flash. Como resultado, o hipocampo entra num modo fragmentado ou refratário, onde há menos recursos disponíveis para codificar as novas informações, especialmente informações mais complexas associadas à sequência de contexto e tempo. Estes fragmentos geralmente são codificados sem detalhes contextuais, como o momento dos eventos, o que explica porque muitas vítimas conseguem lembrar-se de sons, cheiros e outros aspetos de um ataque, mas não conseguem colocá-los numa ordem sequencial ou informar quando ocorreram.

(…) Quando chega a hora do córtex pré-frontal integrar todos os dados cognitivos e sensoriais codificados durante um evento traumático num relato narrativo – por exemplo, quando uma vítima de agressão sexual está a ser entrevistada por um investigador – o processo é um pouco como montar um puzzle. Pensemos no processo que a maioria de nós segue quando montamos um puzzle. Primeiro, olhamos para a caixa para obter um quadro de referência: “Como isto deve ser?” Então colocamos todas as peças sobre a mesa à nossa frente, viramos todas para a direita e começamos a procurar os bordos e os cantos. Se encontrarmos uma peça que é difícil de colocar, podemos olhar para a caixa e usar essa referência para colocar a peça no lugar certo. As vítimas de agressão sexual não têm o benefício deste tipo de processo. Primeiro, elas normalmente não têm um quadro de referência para ajudá-las a lembrar o que aconteceu, mesmo que tenham sido vítimas de abuso sexual antes, porque não há dois ataques idênticos. Além disso, a única outra pessoa que normalmente estava lá – o suspeito – descreve isto de uma maneira muito diferente (seja negando que isso aconteceu ou dizendo que a vítima consentiu).

Em segundo lugar, porque o hipocampo vai do flash ao modo fragmentário, as vítimas normalmente não terão todas as peças do puzzle à sua disposição, e nem todas as peças incluirão informações de carimbo de hora. Como tal, frequentemente não há nenhuma narrativa disponível na sua memória para ajudar a juntar as peças, e há lacunas na sequência lógica dos eventos (na forma de peças de puzzle ausentes ou invertidas). Em terceiro lugar, quando as vítimas são questionadas sobre detalhes periféricos, elas geralmente fazem o possível para responder com base no que podem lembrar – ou nas suas suposições sobre o que aconteceu. Embora seja considerada uma prática padrão para os investigadores dizerem às vítimas: “Tudo bem se você não se consegue lembrar de alguma coisa”, a realidade é que as vítimas não se sentem bem. Elas normalmente querem lembrar-se e querem poder responder às perguntas do investigador.

Quando se trata de uma agressão sexual, devemos lembrar que a memória é um processo muito complexo. Existem vários fatores que vão influenciar sobre quais os elementos de uma experiência que provavelmente serão codificados, consolidados e armazenados na memória, juntamente com as informações contextuais e temporais. Para ser capaz de produzir o tipo de narrativa que normalmente consideramos como uma memória, uma pessoa tem que ser capaz de recordar a informação e colocá-la em algum tipo de sequência ou contexto significativo. Agora entendemos que uma experiência traumática constitui uma coleção de peças de puzzle que muitas vezes não podem ser colocadas juntas de forma consistente. A lembrança inicial da experiência muitas vezes parece desarticulada (“em todo o lugar”) e, como tal, pode parecer difícil de acreditar. Entretanto, se pensarmos no processo de recordação como descascando camadas da experiência, isso pode ajudar a entender a memória traumática.

(…) Por todas as razões que abordamos, as memórias da agressão tendem a ser imagens fragmentadas, sons e sensações corporais, além de emoções fortes como desgosto e horror [10]. As memórias traumáticas têm poucos detalhes periféricos, pouca ou nenhuma informação de sequência de tempo e pouca ou nenhuma palavra ou narrativa, especialmente logo após o trauma e no início da recuperação (…)”

Portanto, o modo de relato de DL não constitui senão o padrão descritivo das memórias de quem foi vítima de agressão sexual traumática.

Impressionaria, sim, negativamente este tribunal se a sua descrição narrativa fosse diversa, nomeadamente se fosse fílmica e detalhada!

(…)


***

3. 2. Apreciação – questões relativas à matéria de facto e (…).

3. 2. 1. Vícios de erro notório na apreciação da prova e contradição insanável da fundamentação.

(…)

Neste âmbito, como fundamento de erro manifesto de apreciação / valoração de prova, invoca o recorrente a ausência da leitura, em audiência, das declarações para memória futura prestadas por DL.

Estabelece o art. 355º do CPP:

1- Não valem em julgamento, nomeadamente para o efeito da formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência.

2- Ressalvam-se do disposto no numero anterior as provas contidas em atos processuais cuja leitura, visualização ou audição em audiência sejam permitidas, nos termos dos artigos seguintes. 

No entanto o CPP prevê especificamente situações em que a prova testemunhal ou por declarações não pode ou não deve, obrigatoriamente, ser produzida na audiência – por impossibilidade material ou por grave inconveniente, por efeito da especial vulnerabilidade da pessoa a ser ouvida, da presença física na audiência de discussão e julgamento. Caso em que a prova é produzida antecipadamente, com todas as garantias de defesa e do contraditório da audiência.

Sob a epígrafe “Declarações para memória futura”, prevê especificamente o art. 271º, nº2 do CPP que “Nos processos por crime contra a liberdade e autodeterminação sexual de menor, procede-se sempre à inquirição do ofendido no decurso do inquérito, desde que a vitima não seja ainda maior”.

Para o efeito, a fim de salvaguardar todas as garantias de defesa e do contraditório, são notificados todos os sujeitos processuais “para que possam estar presentes, sendo obrigatória a comparência do MºPº e do defensor” – conforme previsto no nº3 do citado preceito.

Assim, no caso das declarações para memória futura, o contraditório pleno é exercido durante a realização do ato, perante o juiz, com as formalidades da audiência, com exercício do contraditório, constituindo uma cessão da audiência, naquela parte – “a fim de o depoimento possa ser tomado em conta em julgamento”, como refere a parte final do nº1 do preceito.

Neste aspeto, constitui entendimento corrente que tais provas (incorporadas nos autos e arroladas como meio de prova na acusação) não têm (nem podem, na maioria dos casos em que já se encontram incorporadas nos autos quando o processo entra na fase de julgamento) que ser produzidas em audiência, ali sendo examinadas e discutidas, objeto de contraditório – cfr. designadamente: Simas Santos / Leal Henriques, CPP Anotado anotação ao art. 355º; Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário ao CPP, 3ª ed., p. 851; Acórdão do T. Constitucional n.º 87/99 de 10.02, DR IIS de 01.07.99; Acórdão do T. Constitucional n.º 110/2011, DR IIS de 06.04.2001 (onde se conclui: que “não é indispensável às garantias de defesa a leitura de toda a prova documental pré-constituída e junta ao processo” salvaguardando que “há-de facultar-se à parte não apresentante a impugnação”); Ac. STJ de 10.11.1993, CJ/STJ, tomo III/93, p. 233; Ac. STJ de 25.02.1993, BMJ 442º, p. 535; Ac. STJ de 10.07.1996, CJ/STJ, tomo II/96, p. 229; Ac. STJ de 27.01.1999, SASTJ n.º27, p. 83; AC. TC n.º 87/99 de 10.02, DR IIS de 01.07.99; outra jurisprudência citada Por Maia Gonçalves no seu Código de Processo Penal Anotado em anotação ao art. 355º.

Neste sentido e no que diz respeito especificamente às declarações para memória futura, decidiu o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça para Uniformização de Jurisprudência nº 8/2017, de 11/19/2017, publicado no Diário da República n. 224/2017, Série I de 21/11/2017: «As declarações para memória futura, prestadas nos termos do artigo 271.º do Código de Processo Penal, não têm de ser obrigatoriamente lidas em audiência de julgamento para que possam ser tomadas em conta e constituir prova validamente utilizável para a formação da convicção do tribunal, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 355º e 356º, nº 2, alínea a), do mesmo Código

Dos próprios votos de vencido lavrados no referido acórdão resulta que a exigência fundamental que decorre da lei e dos princípios é a da efetiva análise e discussão em audiência.

Tratando-se de provas pré-constituídas, como é o caso das declarações prestadas antecipadamente, com participação e contraditório de todos os sujeitos processuais, perante o juiz, incorporadas nos autos, arroladas como meio de prova da acusação, exige-se é o efetivo exame e discussão, na audiência final, do seu conteúdo, em cuja produção participaram todos os sujeitos processuais, em ato presidido por juiz, onde estiveram presentes ou representados e onde exerceram o contraditório. Impondo-se assim, apenas, o respetivo exame e a discussão cruzada do seu conteúdo, na audiência final, no confronto com os restantes meios de prova.

Ora, no caso, resulta evidente, quer da própria alegação do recorrente quer da motivação probatória da decisão recorrida, que as declarações para memória futura, arroladas como meio de prova na acusação, pré-produzidas com conhecimento e participação de todos os sujeitos processuais, bem conhecedores, portanto, do respetivo conteúdo, incorporadas dos autos, constituíram objeto de amplo debate, exame e discussão, em audiência. Tendo constituído o meio de prova nuclear sobre que incidiu a discussão da causa em audiência, enfim a contraprova arrolada pelo arguido.

Pelo que nenhuma censura merece a decisão recorrida por ter valorado o meio de prova em questão.

(…)

Relativamente à suspensão, postula o artigo 50º, nº1 do Código Penal: O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

 Na base da decisão de suspensão da execução da pena deverá estar uma prognose favorável ao agente, baseada num risco prudencial. A suspensão da pena funciona como um instituto em que se une o juízo de desvalor ético-social contido na sentença penal com o apelo, fortalecido pela ameaça de executar no futuro a pena, à vontade do condenado em se reintegrar na sociedade. O tribunal deve estar disposto a assumir um risco prudente; mas se existem sérias dúvidas sobre a capacidade do condenado para compreender a oportunidade de ressocialização que se oferece, a prognose deve ser negativa, o que supõe, de facto, um in dubio contra reo” – cfr. Jeschek, Tratado de Direito Penal, Parte Geral, 2º vol., p. 1152, ed. espanhola.

Sendo certo que o juízo de prognose não deve assentar necessariamente numa «certeza», bastando uma «expectativa» fundada de que a simples ameaça da pena seja suficiente para realizar as finalidades da punição e, consequentemente, a ressocialização em liberdade do arguido – cfr. Ac. STJ de 08.07.1998, CJ/STJ, tomo II/98, p. 237.

Como salientou o AC. do STJ de 25 de Junho de 2003, Col. Jur. Acs do STJ , ano XXI, tomo II, 2003, p. 221, “Na suspensão da execução da pena (de prisão) não são as considerações sobre a culpa do agente que devem ser tomadas em conta, mas antes juízos prognósticos sobre o desempenho da sua personalidade perante as condições da sua vida, o seu comportamento e bem assim as circunstâncias de facto, que permitam ao julgador fazer supor que as expectativas de confiança na prevenção da reincidência são fundadas”.

A suspensão apenas deve ser decretada quando haja fundamentos para que o tribunal se convença que o crime cometido se não adequa à personalidade do agente e foi um simples acidente de percurso, esporádico. E – assim - que a ameaça da pena será suficiente para evitar o cometimento de novos ilícitos típicos.

Por outro lado, ainda que o Tribunal formule a propósito do arguido um prognóstico favorável – à luz de considerações exclusivas de prevenção especial e socialização – a suspensão da execução da prisão não deverá ser decretada se à mesma se opuserem as necessidades de reprovação e prevenção do crime. Sendo certo que estão em causa, exclusivamente, considerações de prevenção geral, enquanto exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico.

A suspensão da execução da pena não depende de um qualquer modelo de discricionariedade, mas, antes, do exercício de um poder-dever vinculado, devendo ser decretada, na modalidade que for considerada mais conveniente, sempre que se verifiquem os respetivos pressupostos legais.

O juízo de prognose há-de ser estruturado com base na matéria de facto provada e na personalidade do agente revelada no facto bem como na sua conduta anterior e posterior á prática do mesmo.

Sendo certo que nenhum ordenamento jurídico suporta pôr-se em causa a si mesmo, sob pena de deixar de existir enquanto tal. A sociedade tolera uma certa “perda” de efeito preventivo geral – isto é conforma-se com a aplicação de uma pena de substituição. Já não tolera a sua ineficácia - Cfr. Costa Andrade, RLJ, 134º, p. 76.

No caso, o tribunal recorrido concluiu que à suspensão da pena de prisão opõem-se as exigências de prevenção, geral e especial e, por assim ser, a pena de prisão haverá de ser efetivamente cumprida, ponderando, para o efeito:

 (...) Pese embora, no caso dos autos, a falta de antecedentes criminais, não podemos ignorar que foi no ambiente familiar que o arguido veio a cometer os crimes, que não assume o mal feito (…) e não demonstra sequer qualquer empatia para com a vítima. Por outro lado, como se prova, a postura do arguido enquadra-se num perfil de abusador secundário ou situacional, em que a situação de abuso surge em circunstâncias específicas e de oportunidade, despoletadas por situações de stress ou outras, que não foi possível apurar, o que, aliado à ausência de qualquer empreendimento do arguido em descobrir, debelar estas situações e compreender porque é que elas o levaram ao cometimento dos crimes, não deixa senão em aberto o risco voltar a delinquir.

Ora, a atitude de ausência de censura perante a violação do bem jurídico protegido pelo tipo de crime – independentemente da não admissão da prática do facto em si - afasta a formulação do juízo de prognose favorável de que a suspensão possa satisfazer as necessidades de prevenção especial.

Do mesmo modo que a suspensão não satisfaz, no caso, as necessidades mínimas de tutela da ordem jurídica, visto que se trata, além do mais, de dois crimes praticados em diferentes circunstâncias de tempo e lugar, contra uma criança em relação à qual o arguido tinha especiais deveres de cuidado, educação e respeito, pelo que a comunidade não aceitaria como adequada a suspensão.

Impondo-se assim improcedência do recurso também quanto a este ponto.

3.2.5. Inconstitucionalidade do artigo 69º-B do Código Penal

Sustenta o recorre e inconstitucionalidade do artigo 69º-B do Código Penal na interpretação dele efetuada pela decisão recorrida.

Alega para tanto que “sempre foi professor, sem qualquer notícia ou mácula de comportamento ilícito ou desviante, no seu desempenho, seja para com os alunos, ou mesmo para com os adultos, colegas ou familiares dos alunos. E esta é, por conseguinte, uma matéria que não pode ser decidida, do ponto de vista unicamente formal”. Questionando: “só porque ficou provado um crime, na situação confusa e iniqua descrita, é obrigatório o afastamento do convívio com os alunos?

Nos termos do artigo 30º, nº4 da Constituição da Constituição da República nenhuma pena envolve como efeito necessário automático a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos.

Em conformidade com o aludido preceito, postula, por sua vez o artigo 65º do C. Penal:

1 - Nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de direitos civis, profissionais ou políticos. 2 – A lei pode fazer corresponder a certos crimes a proibição do exercício de determinados direitos ou profissões.

Sob a epígrafe “Proibição de exercício de funções por crimes contra a autodeterminação sexual e liberdade sexual”, estabelece o artigo 69º-B do Código Penal:

(…)

2- É condenado na proibição de exercer profissão, emprego, funções ou atividades, públicas ou privadas, cujo exercício envolva contacto regular com menores, por um período entre 5 (cinco) e 20 (vinte) anos quem for punido por crime previsto no artigo 163º a 176º-A do CP, quando a vítima seja menor.

Nos termos do aludido artigo 69º-B do CP, a aplicação da proibição do exercício de profissão ou atividade, além de temporária, está dependente do reconhecimento judicial, numa ponderação ope judice: - da prática de um dos crimes de natureza sexual catalogados no preceito; - de a atividade envolver contacto regular com menores; - de a vítima do crime cometido ser menor.

E, no caso, tais pressupostos foram efetivamente apreciados e tidos por verificados pelo acórdão recorrido, no caso concreto, ope judice. Não como efeito automático da pena.

Por outro lado, o recorrente, focando-se no alegado efeito automático, o recorrente não cura de rebater a verificação em concreto dos aludidos pressupostos, efetivamente verificados, no caso - vista não só a idade da vítima e especial relação decorrente da responsabilidade parental que o arguido mantinha com aquela, como ainda porque, como provado, este é professor no Agrupamento de Escolas de (...) , onde dá aulas a estudantes que frequentam o 10º e 11º anos de escolaridade, o que envolve, manifestamente, contacto regular com menores.

Nos termos das disposições legais invocadas, a decisão recorrida apenas inibe temporariamente, por efeito da natureza do crime, de a vítima ser menor, de no exercício da atividade o condenado ter contacto regular com crianças. Pressupostos esses verificados no caso e que o recorrente não questiona.

Tal entendimento mostra-se compatível com a interpretação do artigo 69º B do C. Penal conforme aos princípios constitucionais da culpa e do direito ao trabalho, dentro da faculdade do legislador em harmonizar interesses protegidos pela Constituição e pela Lei - no caso, os direitos das crianças em ambiente escolar perante o agente professor que incorreu em crimes de natureza sexual praticados precisamente contra criança menor em relação a quem tinha especial dever de atenção e cuidado, tal como sucede com os alunos. 

A pena acessória constitui, em relação à pena principal, uma censura - e consequente punição - adicional ou complementar do facto. Sendo-lhe atribuída uma função preventiva adjuvante da pena principal, cuja finalidade não se esgota na intimidação da generalidade, mas dirige-se também, ao menos em alguma medida, à perigosidade do agente, reforçando e diversificando o conteúdo penal sancionatório da condenação – cfr. Figueiredo Dias, in Consequências Jurídicas do Crime, § 88 e § 232.

Tem como pressuposto formal a condenação do agente numa pena principal por crime cometido. E como pressuposto material a circunstância de, consideradas as circunstâncias do facto e da personalidade do agente, o exercício de determinada atividade se revelar especialmente censurável.

Não constitui, assim, um efeito automático da pena, mas antes uma consequência do crime ligada ao grau de ilicitude do facto e ao grau de culpa do agente e perigosidade revelada no facto.

Não afronta, por isso, o disposto do art. 30º, n.º 4 da Constituição da República ou no art. 65º, n.º1 do CP.

Neste sentido se pronunciou, entre outros, o Ac. T. Constitucional nº 630/2004 de 04.11.2004, DR IIS de 14.12.2004.

Mesmo que se entenda que a lei impôs sempre como condição de aplicação da pena acessória a cominação de uma pena principal, como já decidiu o TC (do Ac. 520/2000, DR IIS de 31.01.2001) de tal imposição legal não resulta qualquer colisão com a proibição de automaticidade, esse entendimento não colide com a proibição do feito automático das penas, desde que tal cominação se encontre justificada pela gravidade do ilícito e pela culpa do agente.

Por outro lado, o cumprimento da sanção acessória não contende com o direito ao trabalho, como decidiu, entre outros o Ac.TC nº 440/2002, DR IIS de 29.11.2002, página 19592.

Com efeito a aplicação da proibição do exercício de profissão ou atividade, além de temporária, está dependente do reconhecimento judicial, numa ponderação ope judice: - da prática de um dos crimes de natureza sexual catalogados no preceito; - de a atividade envolver contacto regular com menores; - de a vítima do crime cometido ser menor.

E, no caso, tais pressupostos foram efetivamente apreciados e tidos por verificados pelo acórdão recorrido, no caso concreto, ope judice. Não como mero efeito automático da pena.

Por outro lado, focando-se no alegado efeito automático, o recorrente não cura de rebater a verificação em concreto dos aludidos pressupostos.

Ora tais pressupostos mostram-se efetivamente verificados, no caso, vista não só a idade da vítima e especial relação decorrente da responsabilidade parental que o arguido mantinha com aquela, como ainda porque, como provado, este é professor no Agrupamento de Escolas de (...) , onde dá aulas a estudantes que frequentam o 10º e 11º anos de escolaridade, o que envolve, manifestamente, contacto regular com menores.

Tal entendimento mostra-se compatível com a interpretação do artigo 69º B do C. Penal conforme aos princípios constitucionais da culpa e do direito ao trabalho, dentro da faculdade do legislador em harmonizar interesses protegidos pela Constituição e pela Lei - no caso, os direitos das crianças em ambiente escolar perante o agente professor que incorreu em crimes de natureza sexual praticados precisamente contra criança menor em relação a quem tinha especial dever de atenção e cuidado, tal como sucede com os alunos.

(…)

III – DECISÃO

Nos termos e com os fundamentos expostos, decide-se negar provimento ao recurso com a consequente manutenção integral da decisão recorrida.

Custas pelo arguido/recorrente (artigo 513º do CPP, nº1 do CPP), fixando-se a taxa de justiça, nos termos da Tabela III anexa ao RCP - reapreciação da prova e matéria de direito – em 5 (cinco) UC.

Coimbra, 06 de maio de 2020

Assinado eletronicamente

Belmiro Andrade (relator)

Luís Ramos (adjunto)

[1] Vide, entre outros, este por via da exposição sintética e descodificada em linguagem comum, NEUROBIOLOGIA DO TRAUMA EM VITIMAS DE VIOLÊNCIA INTERPESSOAL, Albino Gomes, “Forensic Nurse Examiner”, artigo publicado em “Nursing”, nursing.pt.
[2] Idem.