Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1053/21.3T8CVL.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: AZEVEDO MENDES
Descritores: PENSÃO DE REFORMA
BANCÁRIO
CONTRIBUIÇÕES PARA A SEGURANÇA SOCIAL
Data do Acordão: 07/12/2022
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DO TRABALHO DA COVILHÃ DO TRIBUNAL JUDICIAL DE CASTELO BRANCO
Texto Integral: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: DLEI N.º 1-A/2011, DE 3-01, CLÁUSULA 136.º DO ACORDO COLETIVO DE TRABALHO PARA O SETOR BANCÁRIO, PUBLICADO NO BTE, 1.ª SÉRIE, N.º 3 DE 22/01/2011, E CLÁUSULA 94.ª DO ACORDO COLETIVO DE TRABALHO PARA O SETOR BANCÁRIO, PUBLICADO NO B.T.E., 1.ª SÉRIE, N.º 29, DE 08/08/2016
Sumário: A cláusula 136.º do Acordo Coletivo de Trabalho para o setor bancário (de 2011) e a cláusula 94.ª que lhe sucedeu (de 2016), ao referirem “entregando estes à Instituição a totalidade das quantias que receberem dos serviços de Segurança Social a título de benefícios da mesma natureza”, devem ser interpretadas no sentido de os trabalhadores, na situação de reforma, só terem a obrigação de entregar as quantias que receberem dos serviços de Segurança Social respeitantes ao exato período de tempo em que exerceram a sua atividade bancária e que efetuaram descontos para a Segurança Social.
Decisão Texto Integral:

Apelação n.º 1053/21.3T8CVL.C1

(secção social)

Relator: Azevedo Mendes

Adjuntos:

Felizardo Paiva

Paula Maria Roberto

Autor: AA

Ré: Banco 1..., SA

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:
I. O autor instaurou contra a ré a presente acção declarativa de condenação, pedindo que esta fosse condenada no seguinte:
a) a reconhecer o seu direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzida do valor correspondente à percentagem de 75 %, correspondente a 9 anos de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;
b) a pagar-lhe o valor de quantia de € 5.149,40, acrescido de juros de mora no montante de € 32,03, num valor total global de € 5.181,43, correspondente ao valor excessiva e ilegalmente descontado, valor onde se encontram englobados os respetivos subsídios de férias e de Natal, acrescida dos juros vencidos até integral pagamento do valor em divida.
c) a aplicar uma regra pro-rata temporis ou regra de três simples pura no apuramento da parte da pensão do CNP a entregar ao Banco, respeitante aos descontos efetuados pelo autor para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;
d) a pagar-lhe todas as quantias que ilicitamente venha a reter da pensão do CNP pela não aplicação da regra descrita em c) do pedido, desde a propositura da presente ação até trânsito em julgado da mesma, acrescidas de juros de mora vincendos, a liquidar em execução de sentença.
Para tanto alegou, em síntese, que trabalhou para a ré, tendo o seu contrato de trabalho cessado por reforma, sucedendo que a dita ré lhe vem descontando indevidamente quantias nos valores que lhe paga mensalmente. Defende que a ré faz ilicitamente sua 96,71% do valor da pensão que lhe é paga pelo Centro Nacional de Pensões, correspondente a € 585,97, quando na realidade só teria direito a 75% da pensão que lhe foi atribuída pelo CNP e que corresponde a € 454,43.
A ré contestou defendendo, em suma, que: a pensão que foi fixada ao autor pelo CNP no montante de € 605,91 traz consigo um mesmo tempo de contagem que também considerou para efeitos de antiguidade e pagamento da pensão ao abrigo do ACT  e no momento em que o autor se reformou da banca ao abrigo da figura da invalidez presumível; a conclusão a que chega o autor resulta de uma deficiente interpretação da cláusula 94.ª do ACT e do Decreto-Lei 1-A/2011, de 03 de Janeiro, que regulou a integração no Regime Geral de Segurança Social dos trabalhadores bancários e outros trabalhadores no ativo abrangidos por regime de segurança social substitutivo, constante de IRCT vigente no sector, que à data da sua entrada em vigor se encontrem no ativo e sejam beneficiários da CAFEB; que até o autor passar à situação de reforma por velhice, pela Segurança Social, por atingir a idade para o efeito, a ré através do fundo de pensões pagou-lhe a pensão de reforma por velhice, como pagou a taxa social única (TSU) fixada de 23,60%; que a reforma por invalidez presumida, direito que está condicionado ao acordo com a instituição, é para todos os efeitos uma reforma por velhice; apesar de prevalecer a regra geral quanto à idade da reforma, os trabalhadores bancários não deixaram de, ainda assim, continuar a poder antecipar a sua reforma por velhice, pela via da invalidez presumível, e a sua pensão continua a ser paga pelo fundo de pensões; esta é a regra do direito que a integração na Segurança Social não alterou, continuando o fundo de pensões a ser responsável pelo pagamento da pensão de velhice, ao abrigo da figura da invalidez presumível, e as instituições, na qual se inclui a ré, a provisioná-lo(s), porque esta eventualidade invalidez/velhice para a Segurança Social não foi por si assumida na integração daqueles trabalhadores bancários, razão pela qual que, quando da determinação da taxa contributiva a aplicar aos trabalhadores bancários ex-CAFEB esta apenas foi determinada segundo as eventualidades que passariam a ser assumidas pelo sistema de Segurança Social, excluindo-se aquelas que as instituições através dos fundos de pensões continuaram a assumir e a considerarem suas responsabilidades e, em virtude do mesmo, tiveram de manter os fundos provisionados para os pagamentos que teriam de assumir; portanto, a ré desde a integração do autor na Segurança Social e até ao momento que o mesmo passou à situação de reforma, não só viu onerada a sua responsabilidade contributiva, como pagou uma pensão de reforma antecipada por velhice, que à luz do ACT segue a forma da invalidez presumível, cujo período foi considerado igualmente para a atribuição de uma pensão de velhice pelo CNP; que a tese do autor, ao atender ao momento a partir da qual ocorreu a passagem para a Segurança Social, para daí se entender aplicar todas as regras e interpretações do regime geral e que do mesmo resultam, esquece-se que nessa passagem existiam especificidades que só caso a caso se podiam conhecer, como acontece nos presentes autos.
Concluiu pela improcedência da acção e consequente absolvição do pedido.
O autor respondeu, mantendo a sua posição antes expressa.
Foi proferido o despacho saneador, no qual se conheceu de mérito da acção, sendo proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, absolvendo a ré do demais pedido, condenou-a no seguinte: a) a reconhecer que o autor tem direito a receber a pensão completa paga pelo Centro Nacional de Pensões, sendo as quantias a pagar pela ré ao autor deduzidas do valor correspondente à percentagem de 81,52% dessa mesma pensão, que corresponde aos anos de descontos efetuados enquanto trabalhador bancário no regime geral de Segurança Social;  b) a pagar ao autor o valor excessiva descontado, valor onde se encontram englobados os respetivos subsídios de férias e de Natal, acrescida dos juros vencidos até integral pagamento do valor em divida, a liquidar em execução de sentença; c) a aplicar uma regra pro-rata temporis ou regra de três simples pura no apuramento da parte da pensão do CNP a entregar ao Banco, respeitante aos descontos efetuados pelo autor para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário; d) a pagar ao autor todas as quantias que ilicitamente venha a reter da pensão do CNP pela não aplicação da regra descrita em a) do pedido, desde a propositura da presente ação até trânsito em julgado da mesma, acrescidas de juros de mora vincendos, a liquidar a liquidar nos termos dos artigos 609.º n.º 2 e 716.º do Código de Processo Civil.

A ré veio apresentar recurso desta sentença, concluindo da seguinte forma:
«1. Não podia a sentença a quo condenar a Ré a aplicar a regra da pro-rata temporis no apuramento da  parte da pensão a abater naquela que é paga pelo CNP, quando o peso das respectivas contribuições relevam para o cálculo do valor da pensão atribuída por aquele centro.
2. Porque, a percentagem de 81,52% que diz aquela sentença ser a correcta está errada.
3. Porque mesmo tendo-se escudado nas diferentes decisões que já foram proferidas sobre esta questão, não deixa de transparecer uma apreciação limitada, senão parcial, deste dissenso.
4. Desde logo, porque o entendimento encontrado para a aplicação da regra da proporcionalidade temporal não resulta da interpretação a dar com relação ao teor da cláusula 94ª, n.ºs 1 e 2 do ACT, que manteve teor idêntico ao da cláusula 136ª, n.º 1 e 2 do ACT que foi alvo de revisão global, como se as partes outorgantes daquele instrumento o quisessem bem o teriam feito, como o fizeram de forma clara e expressa na cláusula 98ª, quanto ao reconhecimento de direito em caso de cessação do contrato de trabalho.
5. Porque, seguindo as regras da interpretação da lei, aplicável aos instrumentos de regulamentação colectiva, de acordo com o disposto no artigo 9º do Cod. Civil, se atendermos aos elementos literal, sistemático, histórico e teleológico depressa o concluiríamos.
6. Começando pelo elemento literal, temos que nos casos em que benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por Instituições ou Serviços de Segurança Social a trabalhadores que sejam beneficiários dessas instituições, in casu, o Autor, desde 01/11/2011, apenas será garantida pelas instituições a diferença entre o valor desses benefícios e o do previsto no ACT do Sector Bancário (como resulta do n.º 1 da cláusula 94ª, que em tudo era igual ao então n.º 1 da cláusula 136ª).
7. Sendo que, o benefício a descontar o que decorre de contribuições feitas no período de serviço contado pela Ré para o cálculo da pensão a pagar por estar em causa os benefícios decorrentes de contribuições, como se retira do n.º 2 daquela cláusula (como já acontecia do n.º 2 da cláusula 136ª). Como tal, a pensão a descontar é o benefício do CNP pelo tempo de carreira ao serviço da Ré que resulta das contribuições feitas no período de 01/01/2011 a 12/06/2019, apurado segundo as regras da Segurança Social, segundo a qual servem para o cálculo do benefício a pagar pelo CNP.
8. Não resulta, por isso, expresso qualquer critério que aponte à pretendida pro-rata temporis e muito menos foi essa a vontade dos outorgantes do identificado instrumento de regulamentação colectiva, porque se assim tivesse sido bem o exprimiam, como expressamente o fizeram no n.º 3 da cláusula 98ª.
9. Igual caminho fazemos se atendermos ao elemento sistemático. Porque inserindo-se aquela cláusula no sistema de previdência quando alude Instituições ou Serviços de Segurança Social, isto é, o regime do Sector Bancário e o regime da Segurança Social, impondo, por isso, a sua interpretação no sentido da aplicação das mesmas regras que servem para o cálculo da pensão do CNP.
10. São, precisamente estas regras que a Ré aplica para determinar o desconto a fazer na pensão que é paga pelo CNP.
11. Se dúvidas houvesse, os elementos histórico e teleológico depressa as dissipavam porque a referida cláusula (como já acontecia na cláusula 136ª) tem por finalidade impedir que pelo mesmo tempo o trabalhador venha a auferir cumulativamente dois benefícios.
12. A admitir-se o sentido da decisão seria o mesmo que aceitar um duplo benefício, ou acréscimo de direitos, para os trabalhadores bancários ex-CAFEB, designadamente através da possibilidade de cumularem à pensão de reforma que têm direito no âmbito do fundo de pensões outra que lhe fosse concedida com a sua integração no regime geral de Segurança Social, quando efectivamente a integração naquele regime não se traduziu em nenhuma alteração da sua situação quanto à pensão de reforma.
13. Tanto mais que, não foi esta a intenção do legislador, sequer minimamente, porque o ACT do Sector Bancário já implicava um tratamento mais favorável daqueles trabalhadores relativamente ao regime geral de Segurança Social no que respeita às pensões de reforma, quando se contratou o direito da antecipação da passagem à situação de reforma, por via da invalidez presumível, ao abrigo da cláusula 95ª, n.º 5 do ACT, como acontecia na anterior cláusula 136ª, n.º 6 do ACT revisto globalmente, equiparando-a a uma situação de reforma por velhice, que a Ré fez consagrar no contrato constitutivo do seu fundo de pensões.
14. A pensão de reforma a que os trabalhadores bancários têm direito é apenas aquela que resulta do ACT do Sector Bancário ou do regime geral da Segurança Social, caso esta seja maior. Não obstante o facto duma parte dessa pensão ser paga pelas instituições bancárias e a outra parte ser paga pelo CNP.
15. Este princípio foi firmado pelo legislador no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 127/2011, de 31 de Dezembro, quando definiu as responsabilidades das instituições bancárias e da Segurança Social quanto ao pagamento das pensões de reforma após a integração naquele regime geral.
16. Naquele preâmbulo pode ler-se que “tal processo apenas produziu efeitos para o futuro, tendo-se mantido as responsabilidades das instituições de crédito, através dos respectivos fundos de pensões, pelos pagamentos devidos por força da aplicação dos instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho do sector”. Precisamente o que resulta da cláusula 136ª, n.º 1 e 2 do ACT do Sector Bancário. Segundo a qual, nos casos em que benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por instituições ou serviços de Segurança Social a trabalhadores que sejam beneficiários dessas instituições, tal como acontece com o Autor, após a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 1-A/2011, de 03 de Janeiro, e a integração dos trabalhadores bancários no regime geral de Segurança Social, apenas será garantida, pelas instituições bancárias a diferença entre o valor desses benefícios e aquele que resulta do ACT do Sector Bancário.
17. Acontece que, esta conclusão não foi afastada pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Dezembro de 2003, que foi prolatado cerca de sete anos antes da integração dos trabalhadores bancários no regime geral da Segurança Social, de acordo com o qual “o sistema de segurança social instituído pelo Acordo Colectivo de Trabalho dos Bancários, assume uma dupla finalidade: substitui o sistema público de Segurança Social e, quando o trabalhador se encontra abrangido pelo sistema público, completa este”, em que a realidade que esteve subjacente à sua fundamentação foi a da existência de duas pensões de reforma distintas. Uma do regime geral da Segurança Social e outra da instituição bancária.
18. Quando aplicado ao caso dos autos temos de concluir que o Autor não tem razão na tese que defende e a sentença proferida peca em a sufragar, porquanto não existe qualquer possibilidade de cumulação.
19. Apenas está em causa uma pensão de reforma, por um lado, e, por outro lado, as deduções a que a Ré tem vindo a fazer na pensão paga pelo CNP de 96,71% correspondem à sua responsabilidade relativamente ao pagamento da pensão de reforma do Autor.
20. Daqui se conclui que os valores das remunerações auferidas nos diferentes períodos e os diferentes pesos das respectivas contribuições relevam para o cálculo do valor a atribuir. Peso que não podia a Ré olvidar quando da determinação do valor de abate na pensão atribuída pelo CNP.
21. Ao Autor é pago uma pensão de reforma a que tem direito, calculada segundo as regras do ACT do Sector Bancário para a qual foi considerado toda a sua antiguidade, ou seja, todo o seu tempo de trabalho.
22. Por isso, nunca se pode considerar unicamente o factor tempo, por aplicação da regra da pro-rata temporis, para a determinação do valor a abater na pensão que é paga pelo CNP, porque não resulta da interpretação da cláusula 94ª do ACT do Sector Bancário qualquer critério que aponte à sufragada regra.
23. A Ré mesmo depois da integração dos trabalhadores bancários ex-CAFEB, no regime geral de Segurança Social, não deixou de pagar, por um lado, a reforma por velhice através do fundo como, por outro, teve de passar a pagar a contribuição que foi determinado para aqueles trabalhadores e que foi fixada em 26,6% (23,60% pela Ré e 3% pelo trabalhador) pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, que aditou o artigo 3º-A à Lei n.º 110/2009, de 16 de Setembro que aprovou o Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, que incidia sobre a remuneração global daqueles trabalhadores, como aconteceu com o Autor.
24. Taxa contributiva aplicada para os trabalhadores bancários ex-CAFEB, segundo as eventualidades que passariam a ser assumidas pelo regime geral de Segurança Social, excluindo-se aquelas que as instituições através dos fundos de pensões continuaram a assumir e considerarem suas as responsabilidades. Como acontece nos presentes autos.
25. Por isso, mantendo-se o direito daqueles trabalhadores em poderem antecipar a sua passagem à reforma por velhice, pela via da invalidez presumível, a Ré pagou ao Autor uma pensão de reforma, por velhice, desde 12/06/2019, através do fundo de pensões.
26. Resulta, assim, que a legalidade daquela norma esconde uma realidade que assenta no facto de embora a partir de 01/01/2011 aqueles trabalhadores ex-CAFEB passarem a integrar o Sistema Previdencial de Segurança Social, as responsabilidades quanto as prestações de reforma por velhice não eram por si assumidas por continuarem a ser das instituições, contrariamente aos restantes trabalhadores bancários para os quais a taxa contributiva se fixou em 34,75% (23,75% pela Ré e 11% para os trabalhadores).
27. Entre 01/01/2011 e 12/06/2019 a eventualidade velhice era da responsabilidade da Ré, que pagou uma pensão de reforma por velhice com efeitos a 12/06/2019.
28. Significa, assim, que o CNP quando atribui a pensão de reforma por velhice ao Autor, ex-CAFEB, calculada desde o momento da sua integração no regime geral de Segurança Social em 2011 os seus cálculos trazem consigo igual período de tempo para o qual a Ré paga a mesma pensão.
29. A Ré desde a integração do Autor no regime geral de Segurança Social e até ao momento que passou à situação de reforma, com a pensão fixada pelo CNP, não só viu onerada a sua responsabilidade contributiva, como pagou uma igual pensão de reforma.
30. Deste modo, tratando-se de pensões tinha a Ré de fazer a ponderação para determinar o valor a descontar na pensão que é paga pelo CNP relativos aos 9 anos.
31. Porque, corresponde exactamente a igual período em que assumiu o pagamento da pensão de velhice, através do fundo de pensões, e as contribuições para o regime geral de Segurança Social calculada a partir da TSU que foi determinada (26,60%).
32. Compensação devida pela sobreposição do período compreendido entre 2011 e 12/06/2019, que está integrado na pensão determinada pelo CNP.
33. Razão que nos leva a concluir que a regra da proporcionalidade temporal, isto é, a regra da pro-rata temporis, não é de se aplicar para a determinação do valor do desconto a fazer na pensão que é paga pelo CNP, porque não é o que conduz a um resultado mais equitativo.
Termos em que com o douto suprimento de V. Exas. deve a presente apelação ser julgada procedente e, consequentemente, ser revogada a decisão a quo, substituindo-a por outra em que se determine a inaplicabilidade da regra da pro-rata temporis para a determinação do valor a abater na pensão que é paga pelo CNP, continuando a Ré a fazer o desconto no valor de 585,97 €, correspondente a 96,71% daquela pensão.»

O autor respondeu a este recurso da ré, apresentando as suas contra-alegações. Por sua vez, veio apresentar o seu próprio recurso da sentença, no qual conclui:           

«a) Os anos relevantes para a carreira contributiva da A., no que concerne á Segurança Social, são 12.

b) Desde logo porque os anos de 1978 e 1980 correspondem a três anos de descontos, como refere, impressivamente, aliás, a notificação da segurança social que se juntou aos autos;

c) Depois, porque a mesma notificação refere que o número de anos relevante para o cálculo da pensão é “12”, sendo três ao serviço de entidade não bancária;

d) Por último, o próprio Regime Geral da Segurança Social impõe que se contabilizem “3” anos, nomeadamente nos artigos 28.º, 32.º, 33.º, 34.º, 39.º e 63.º do DL 187/2007, de 10 de Maio de 2007, e por aplicação da Lei 64-A/2008 e DL 167-E/2013, ambos de 31 de Dezembro, que são violados pela decisão recorrida.

e) Nestes precisos termos, impõe-se a revisão da mesma neste trecho decisório, contabilizando-se os 12 anos de descontos e o R. a reconhecer que a A. tem o direito a receber 25 % da pensão paga pela segurança social.

Termos em que,

Deverá ser dado provimento ao presente recurso, anulando-se a decisão recorrida e dando-se procedência à acção, como é de direito e é de inteira justiça.»

Pronunciou-se o Exmº Procurador-Geral Adjunto no sentido de que não assiste razão a nenhum dos recorrentes.


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II- FUNDAMENTAÇÃO

A. De facto             

Da decisão de facto da 1ª instância, é a seguinte a factualidade que vem dada como provada:

1-  A R. é uma instituição de crédito e exerce a atividade bancária.

2- Participou nas negociações e outorgou o ACT para o Sector Bancário, cuja versão integral se encontra publicada no B.T.E., 1ª Série, n.º 29, de 08/08/2016, pg. 2339 e ss., instrumento de regulamentação coletiva de trabalho que aplicou e aplica aos trabalhadores integrados nos seus quadros ou que deles fizeram parte.

3- O A. encontra-se filiado no M..., que também usou S..., onde figura como o ....

4- O A. foi admitido ao serviço da R. em 05 de Maio de 1980.

5- Por carta, a R. informou o A. da sua passagem à situação de reforma por invalidez, com efeitos a 12 de Junho de 2019.

6- O A. foi posteriormente informado por carta do Centro Nacional de Pensões, datada 18/12/2020, de que a pensão por VELHICE tem início em 2020-09-29, sendo o seu valor actual de € 605,91 Euros.

7- O A. informou a R. do valor inicial da pensão que lhe havia sido atribuída pelo Centro Nacional de Pensões.

8- A partir daí, descontou mensalmente, o montante de €576,44 referente aos meses de Setembro a Janeiro de 2021, tendo, a partir daí, passado a descontar a quantia de €585,97 Euros, ou seja, o correspondente 95,14% e a 96,71 % do valor pago pelo CNP.

9- Conforme comunicação do Banco, datada de 12.02.2020, a R. informou que iria descontar o correspondente a 95,14 % da pensão atribuída pela Segurança Social, e

10- O A. passou então à situação de reforma integrado no nível 12 do ACT para o Sector Bancário.

11- Na presente data o R. entrega ao A. uma pensão de reforma, pagável 14 vezes por ano, com a pensão base de € 1.438,67 Euros e diuturnidades no valor de € 295,33 Euros, de onde deduz o montante que entende ser devido,

12- O A. teve uma carreira contributiva com 3 momentos distintos de descontos:

 De 06/1978 a 04/1980 o A. efetuou descontos para a Segurança Social decorrentes da prestação de atividade dependente remunerada a entidade não bancária (3 anos);

 De 05-1980 a 12-2010 o A., enquanto trabalhador bancário, efetuou os descontos obrigatórios para a Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários (CAFEB);

 A partir de Janeiro de 2011) o A. passou a descontar para a Segurança Social, até passar à situação de reforma em junho de 2019

13- Quando a Ré conheceu a pensão de velhice fixada pela Segurança Social, paga pelo CNP, no valor de 605,91 €, informou ao Autor que passaria a descontar naquela pensão a importância de 576,44 € e que posteriormente passou para 585,97 €, o que correspondia a 95,14% e 96,71% daquela pensão, respetivamente, relativos ao tempo que esteve ao serviço da Ré, nos termos previstos da cláusula 94ª do Acordo Coletivo de Trabalho para o Sector Bancário, referente ao período de Janeiro de 2011 a Junho de 2019, momento da sua passagem à reforma por invalidez presumível, ao abrigo do disposto na cláusula 95ª, n.º 9 do Acordo Coletivo de Trabalho do Sector Bancário (ACT), publicado no BTE n.º 29, de 08/08/2016.

14- A partir daí, descontou mensalmente, o montante de €576,44 referente aos meses de Setembro a Janeiro de 2021, tendo, a partir daí, passado a descontar a quantia de €585,97 Euros, ou seja, o correspondente 95,14% e a 96,71 % do valor pago pelo CNP.


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B. De direito

É pelas conclusões das alegações que se delimita o âmbito da impugnação.

Decorre do exposto que as questões essenciais que importa dilucidar e resolver se podem equacionar da seguinte forma:

- no recurso da ré: se é inaplicável a regra pro-rata temporis para a determinação do valor a abater na pensão que é paga ao autor pelo Centro Nacional de Pensões, tendo ela, ré, o direito de continuar a fazer o desconto na pensão que lhe paga no valor de € 585,97, correspondente a 96,71% daquela primeira pensão.

- no recurso do autor: se se justifica a alteração da sentença, no reconhecimento que ele tem o direito a receber 25 % da pensão paga pela segurança social.

B.1. O recurso da ré:

Sustenta a ré que o tribunal a quo não podia tê-la condenado a aplicar a regra pro-rata temporis, ou uma regra de “três simples”, no apuramento da parte da pensão a abater na que é paga pelo CNP, regra que leve em conta apenas o tempo em que o autor trabalhou para o banco empregador (o réu) e que foi levado em conta no cálculo do valor da pensão da Segurança Social, ignorando o peso das respectivas contribuições para o cálculo desse valor da pensão atribuída pela mesma Segurança Social.

Afirma que o entendimento expresso para a aplicação da regra da proporcionalidade temporal não é consentâneo com interpretação devida do teor da cláusula 94.ª, n.ºs 1 e 2 do ACT aplicável e que manteve teor idêntico ao da cláusula 136.ª, n.º 1 e 2 do anterior ACT que foi alvo de revisão global.

Na sentença recorrida, consistentemente fundamentada e apoiada na abundante jurisprudência que tem vindo a ser afirmada sobre a questão, começou por afirmar-se o seguinte:

«Os trabalhadores bancários beneficiam de um regime específico de segurança social que resulta dos instrumentos de regulamentação coletiva aplicáveis, seja de um subsistema de segurança social estabelecido para o sector bancário em sede de instrumentos de regulamentação coletiva, que remonta ao CCT de 1994, publicado no BINTP, nº 3, de 15.2.44, no caso dos autos, o Acordo Coletivo de Trabalho para o Sector Bancário, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, 1ª Série, nº 3, de 22.1.2011, com as alterações publicadas no BTE, 1ª Série, nº 8, de 29.2.2012.

A partir de 1 de Janeiro de 2011, por força da extinção e integração da Caixa de Abono da Família dos Empregados Bancários (CAFEB) no Instituto de Segurança Social pelo Decreto-Lei nº 1-A/2011, de 3 de Janeiro, os trabalhadores bancários passaram a estar protegidos pelo regime geral da Segurança Social, na eventualidade de maternidade, paternidade e adoção e na velhice.

Assim, a cl.ª 136ª do ACT publicado no BTE, 1.ª série, n.º 3 de 22/01/2011, dispunha o seguinte:

“1 - As instituições de crédito, por si ou por serviços sociais privativos já existentes, continuarão a garantir os benefícios constantes desta secção aos respectivos trabalhadores, bem como aos demais titulares das pensões e subsídios nela previstos. Porém, nos casos em que benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por instituições ou serviços de segurança social a trabalhadores que sejam beneficiários dessas instituições ou seus familiares, apenas será garantida, pelas instituições de crédito, a diferença entre o valor desses benefícios e o dos previstos neste acordo.

2 - Para efeitos da 2.ª parte do número anterior, apenas serão considerados os benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou serviços de segurança social com fundamento na prestação de serviço que seja contado na antiguidade do trabalhador nos termos das cláusulas 17.ª e 143.ª

3 - As instituições adiantarão aos trabalhadores abrangidos pelo regime geral da segurança social as mensalidades a que por este acordo tiverem direito, entregando estes à instituição a totalidade das quantias que receberem dos serviços de segurança social a título de benefícios da mesma natureza”.

O regime específico de proteção dos trabalhadores bancários articula-se, assim, com outros regimes de segurança social que os abranjam, nomeadamente com o Regime Geral, permitindo às instituições bancárias responsáveis pelo pagamento das específicas prestações consagradas a favor destes trabalhadores, o desconto nas prestações por si pagas dos benefícios que os trabalhadores aufiram de outros sistemas, com fundamento na prestação de atividade bancária, para evitar duplicação de benefícios.

Assim, na prática, a pensão recebida pelos reformados bancários é paga por duas entidades distintas.

O referido ACT veio a ser objeto de revisão global, cuja versão integral se encontra publicada no B.T.E., 1ª Série, n.º 29, de 08/08/2016, pg. 2339 e ss. (ACT/2016).

Cumpre assim, interpretar e aplicar ao caso sub judicio o n.º 1 da cl.ª 94, Secção II do Capítulo I do Título V, sob a epígrafe “Benefícios Sociais” do ACT para o Sector Bancário, cuja versão integral se encontra publicada no B.T.E., 1ª Série, n.º 29, de 08/08/2016, pg. 2339 que prevê que:

“As instituições de crédito garantem os benefícios constantes da presente secção aos trabalhadores referidos no número 3 da cláusula 92.ª, bem como aos demais titulares das pensões e subsídios nela previstos. Porém, nos casos em que benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por Instituições ou Serviços de Segurança Social a trabalhadores que sejam beneficiários dessas Instituições ou seus familiares, apenas será garantida, pelas Instituições de Crédito, a diferença entre o valor desses benefícios e o dos previstos neste Acordo.”.

O n.º 3 da cl.ª 92ª do citado ACT prevê que “Aos trabalhadores que à data da entrada em vigor do presente acordo estejam abrangido pelo capítulo XI, secção I do acordo coletivo de trabalho do sector bancário ora revogado, é garantido o regime de proteção social em regime de benefício definido nos termos das secção II – Benefício definido do presente capítulo”.

Cláusulas que mantiveram a mesma previsão e estatuição, com o seguinte texto: “As Instituições de Crédito, por si ou por serviços sociais privativos já existentes, continuarão a garantir os benefícios constantes desta Secção aos respetivos trabalhadores, bem como aos demais titulares das pensões e subsídios nela previstos. Porém, nos casos em que benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por Instituições ou Serviços de Segurança Social a trabalhadores que sejam beneficiários dessas Instituições ou seus familiares, apenas será garantida, pelas Instituições de Crédito, a diferença entre o valor desses benefícios e o dos previstos neste Acordo”.

Importa, então, saber como se procede ao cálculo do valor que as entidades bancárias têm direito a deduzir na pensão paga pela Segurança Social, nos casos em que os trabalhadores têm uma carreira contributiva no regime geral da segurança social, antes de ingressarem na carreira do sector bancário.»

E mais adiante, descrevendo a análise jurisprudencial já tomada nos tribunais superiores e à qual se manifestou adesão, disse-se o seguinte na sentença:

«O Supremo Tribunal de Justiça já teve oportunidade de se pronunciar sobre questão idêntica, em que estava em causa a interpretação da referida cláusula convencional, firmando sobre a matéria jurisprudência [citada no recentíssimo Acórdão do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15-09-2021, Processo: 19922/19.9T8PRT.P1.S1 Relator: LEONOR CRUZ RODRIGUES consultável em www.dgsi.pt]

No acórdão de 27.10.2010, Procº nº 1889/06.5TTLSB.L1.S., decidiu-se que:

“1. Atendendo a que o trabalhador se reformou pela Segurança Social com base num período contributivo de vinte anos, dos quais oito anos respeitam a actividade profissional no sector bancário, o banco empregador deverá descontar da pensão que lhe paga o correspondente a oito vinte avos do valor da pensão da Segurança Social atribuída ao mesmo trabalhador, referente ao período em que trabalhou no banco empregador e sobre o qual foi calculada a pensão resultante da aplicação do ACTV do sector bancário.

2. Na verdade, o banco empregador apenas pode descontar do montante da pensão prevista no ACTV aplicável a parte proporcional da pensão da Segurança Social que corresponda ao período em que o trabalhador exerceu funções no sector bancário, uma vez que o trabalhador não pode receber duas pensões pela mesma prestação de trabalho de oito anos na instituição bancária.

3. Só assim é respeitado o princípio da não acumulação de prestações emergentes do mesmo facto, bem como o princípio constitucional, consagrado no n.º 4 do artigo 63.º da Constituição da República Portuguesa, de acordo com o qual todo o tempo de trabalho contribui, nos termos da lei, para o cálculo das pensões de velhice e invalidez, independentemente do sector de atividade em que tiver sido prestado”.

No acórdão de 6.12.2016, Procº nº 4044/15.0T8VNG.P1.S1:

“1- Atribuída pela Segurança Social uma pensão de reforma por velhice a um trabalhador bancário em que, para além de 5 anos relativos ao tempo de serviço militar obrigatório, nos termos do artigo 48.º do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de maio, foi ponderado um período contributivo por atividade bancária de 3 anos, o banco empregador deverá descontar da pensão que lhe paga o correspondente a 37,5 % do valor da pensão da Segurança Social atribuída ao mesmo trabalhador, referente ao período em que trabalhou no banco empregador e tomado em consideração no cálculo da pensão resultante da aplicação do ACT aplicável.

2- Na verdade, o banco empregador apenas pode descontar do montante da pensão prevista no ACT aplicável a parte proporcional da pensão da Segurança Social que corresponda ao período em que o trabalhador exerceu funções no setor bancário, uma vez que o trabalhador não pode receber duas pensões pela mesma prestação de trabalho de 3 anos na instituição bancária.

3. Só assim é respeitado o princípio da não acumulação de prestações emergentes do mesmo facto, bem como o princípio constitucional, consagrado no n.º 4 do artigo 63.º da Constituição da República Portuguesa, de acordo com o qual todo o tempo de trabalho contribui, nos termos da lei, para o cálculo das pensões de velhice e invalidez, independentemente do setor de atividade em que tiver sido prestado.

(…)”.

Pronunciando-se especificamente sobre a questão de saber como deve ser calculada a parte da pensão que é paga ao trabalhador bancário pela Segurança Social e que deve ser entregue à instituição bancária nos termos e à luz do disposto na cláusula 136ª do ACT para o sector bancário, decidiu-se, no acórdão de 22.2.2018. Procº nº 9336/16.5T8LSB.L1.S1:

“I. O número 3.º da cláusula n.º 136.ª do Acordo Coletivo de Trabalho para o sector bancário ao referir no seu segundo segmento “entregando estes (os trabalhadores que passem à reforma) à Instituição (de Crédito) a totalidade das quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social a título de benefícios da mesma natureza” pretende significar que os trabalhadores, na situação de reforma, só têm a obrigação de entregar as quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social referentes ao período de tempo em que exerceram a sua atividade bancária e que efetuaram descontos para a Segurança Social, na sequência da extinção da Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários.

II. As expressões utilizadas na referida cláusula “a diferença entre o valor desses benefícios” na parte final do n.º 1, “benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou Serviços de Segurança Social” no segundo segmento do n.º 2 e “benefícios da mesma natureza” na parte final do n.º 3, referem-se tão só às pensões, não se podendo afirmar que dos respetivos textos resulte um mínimo de correspondência verbal que possa suportar a interpretação no sentido da introdução de um fator de ponderação que tenha a ver com o valor das contribuições efetuadas”.

E no acórdão de 12.7.2018, Procº nº 3312/16.8T8PRT.P1.S1:

“I. O número 3.º da cláusula n.º 136.ª do Acordo Coletivo de Trabalho para o sector bancário ao referir no seu segundo segmento “entregando estes à Instituição a totalidade das quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social a título de benefícios da mesma natureza”, pretende significar que os trabalhadores, na situação de reforma, só têm a obrigação de entregar as quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social referentes ao período de tempo em que exerceram a sua atividade bancária e em que efetuaram descontos para a Segurança Social, na sequência da extinção da Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários.

II. As expressões utilizadas na referida cláusula, na parte final do n.º 1 “a diferença entre o valor desses benefícios”, no segundo segmento do n.º 2 “benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou Serviços de Segurança Social”, e na parte final do n.º 3 “benefícios da mesma natureza”, referem-se tão só às pensões na parte proporcional ao tempo de contribuições para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário, não resultando dos respetivos textos a introdução de um fator de ponderação que tenha a ver com o valor das contribuições efetuadas”.

Mais recentemente, no acórdão de 8.6.2021, Procº nº 2276/20.8VCT.S1, que concluiu que a tese do réu não tem o mínimo de apoio na letra da cláusula:

“1. A letra da convenção é não apenas o ponto de partida da interpretação, mas o limite da mesma;

2. Se uma interpretação proposta não tiver o mínimo de apoio no teor literal da cláusula torna-se desnecessário recorrer a outros elementos, já que o recurso aos mesmos não permite fazer vingar tal interpretação, carecendo a mesma do referido mínimo de apoio na letra da cláusula”.

Afirma-se nesse aresto, sobre a interpretação da referida disposição convencional, que:

“A letra da Lei – aqui a cláusula da convenção – é não apenas o ponto de partida da interpretação, mas o limite da mesma, o que é de particular importância nesta sede já que as partes de uma convenção não devem obter pela interpretação da convenção pelo tribunal o que não lograram obter nas negociações.

Ora, da letra da cláusula resulta tão-só a garantia de benefícios pelas instituições de crédito, sendo que caso benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por instituições ou serviços de Segurança Social, aos trabalhadores e seus familiares, as instituições de crédito apenas garantirão a diferença entre o valor desses benefícios e o valor dos benefícios previsto no ACT. Por outro lado, e para o cálculo desta diferença apenas são relevantes os benefícios decorrentes de contribuições pelas instituições ou serviços de segurança social respeitantes a período que contam na antiguidade do trabalhador.

A cláusula refere-se única e exclusivamente ao valor dos benefícios o que, obviamente, e como este Tribunal teve já ocasião de referir, não coincide (nem se confunde) com o valor das contribuições. E quando se refere no nº 2 às contribuições é para mandar atender aos benefícios decorrentes das contribuições em um determinado período e, portanto, para esclarecer qual o período de tempo relevante – o período de tempo relevante para a antiguidade do trabalhador ao serviço da instituição de crédito, mas em que houve contribuições para outras instituições ou serviços de segurança social.

Em suma, a cláusula nunca refere o valor das contribuições. E partindo da presunção do legislador que se sabe exprimir adequadamente há que concluir que não se pretendeu atribuir qualquer relevância ao valor em concreto dessas contribuições. Acresce que não há qualquer remissão para o Decreto-Lei nº 187/2007, nem qualquer referência ao cálculo de duas pensões como pretende o recorrente”,

Idêntico entendimento foi perfilhado no acórdão de 23 de Junho de 2021, Procº nº 2115/20.0T8VFR.S1., que decidiu, como nele se sumariou, que:

“1. O nº 3 da cláusula 136º do Acordo Coletivo de Trabalho para o sector bancária (cláusula 98ª do ACT do Banco Montepio) ao referir no seu segmento “entregando estes (os trabalhadores que passem á reforma) à Instituição de Crédito a totalidade das quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social a título de benefícios da mesma natureza” pretende significar que os trabalhadores, na situação de reforma, só têm a obrigação de entregar as quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social referentes ao período de tempo em que exerceram a sua atividade bancária e que efetuaram descontos para a Segurança Social, na sequência da extinção da Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários.

2. As expressões utilizadas na referida cláusula “a diferença entre o valor desses benefícios” na parte final do seu nº 1, “benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou Serviços de Segurança Social” no segundo segmento do nº 2 e “benefícios da mesma natureza” na parte final do nº 3, referem-se tão só às pensões, não se podendo afirmar que dos respetivos textos resulte um mínimo de correspondência verbal que possa suportar a interpretação no sentido da introdução de um fator de ponderação que tenha a ver com o valor das contribuições efetuadas”.

Entendimento que, mais recentemente ainda, foi sufragado nos acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, da mesma Relatora, de 14 de Julho de 2021, proferidos nos Processos nº 74/19.0T8MTS.P1.S1, nº 284/20.6T8VLG.S1 e nº 2457/20.4T8OAZ.P1.S1, e que por nossa parte, humildemente, sufragamos, também.

Assim, concordando e subscrevendo tais considerações, não vemos razões para alterar a jurisprudência que se vem consolidando naquela secção do Supremo Tribunal de Justiça, bem como na segunda instancia, sobre a interpretação da cláusula 136ª (e 94ª) do Acordo Coletivo de Trabalho em causa.

Assim, não resultando do texto da clausula 94ª a introdução de um fator de ponderação que tenha a ver com o valor das contribuições efetuadas, designadamente os valores pagos pelo réu, banco, a título de pensão de reforma por invalidez presumível, no período compreendido entre 12 de Junho de 2019 e 29 de setembro de 2020.

Na verdade, não resultando da referida clausula do ACT aplicável que, para o cálculo das quantias que os trabalhadores reformados têm que entregar à Instituição, correspondentes àquelas que receberem dos Serviços de Segurança Social a título de benefícios da mesma natureza – decorrente da circunstância de os trabalhadores do setor bancário, em situação de reforma, auferirem uma pensão suportada por duas entidades distintas, atenta a extinção em 2011 da Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários (CAFEB) – deva ser considerado o pagamento da pensão de reforma por invalidez presumível.

Aliás, também não assiste razão ao réu, quando alega que, o período de reforma por invalidez presumível, foi considerado igualmente para a atribuição de uma pensão de velhice pelo CNP, resultando da comunicação do ISS que o período contributivo considerado, coincide com a reforma por invalidez do autor, ou seja, junho de 2019 – cfr. facto 12. da matéria de facto provada.

Pelo que, ao contrário do que o réu defende, não se verifica duplicação de pagamento de pensões.»

A nosso ver, todas estas considerações e conclusões são ajustadas e conformes à jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal de Justiça nos termos indicados, focando os argumentos mencionados pela apelante nas conclusões do recurso.

Sublinhamos que este mesmo entendimento já foi afirmado por esta Relação de Coimbra, designadamente no Acórdão de 15-02-2022, no proc. n.º 1308/20.4T8FIG.C1, relatado pela aqui Ex.ma 2.ª Adjunta (Paula Maria Roberto).

Por outro lado, o mais recente Acórdão do STJ sobre esta matéria foi tirado há pouco mais de um mês e continua a afirmar a mesma posição em modo de reiteração que faz antever uma próxima decisão de valor reforçado (referimo-nos ao Acórdão de 11-05-2022, proc. 798/20.6T8BRG.G1.S1, relator: Mário Belo Morgado, no qual na sua parte final já se adianta que a fundamentação já antes expressa nos anteriores Acórdãos do STJ é sólida e exaustiva não havendo “necessidade/utilidade em proceder a desenvolvimentos argumentativos adicionais e onde se reafirma que «o número 3.º da cláusula n.º 136.ª do Acordo Coletivo de Trabalho para o sector bancário, ao referir no seu segundo segmento “entregando estes à Instituição a totalidade das quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social a título de benefícios da mesma natureza”, pretende significar que os trabalhadores, na situação de reforma, só têm a obrigação de entregar as quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social referentes ao período de tempo em que exerceram a sua atividade bancária e em que efetuaram descontos para a Segurança Social, na sequência da extinção da Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários» e que «as expressões utilizadas na referida cláusula “a diferença entre o valor desses benefícios” na parte final do n.º 1, “benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou Serviços de Segurança Social” no segundo segmento do n.º 2 e “benefícios da mesma natureza” na parte final do n.º 3, referem-se tão só às pensões, não se podendo afirmar que dos respetivos textos resulte um mínimo de correspondência verbal que possa suportar a interpretação no sentido da introdução de um fator de ponderação que tenha a ver com o valor das contribuições efetuadas.»

Confirmamos aqui esse entendimento - que mantemos - e, assim, a apelação da ré deve improceder, uma vez que a alteração da sentença, pretendida no recurso, estava dependente da alteração do mesmo entendimento.

B.2. O recurso do autor:

A questão aqui é tão só o de quantificar qual o tempo relevante para a aplicação da regra da proporcionalidade temporal no cálculo do que se pode chamar a “pensão de abate”.

Já deixámos dito que observamos a partir das regras convencionais estabelecidas que só deve contar o tempo em que o autor trabalhou para o banco empregador (o réu) e que foi levado em conta no cálculo do valor da pensão da Segurança Social.

Refere o autor no recurso que são doze os anos relevantes para a sua carreira contributiva no que concerne á Segurança Social, desde logo porque os anos de 1978 e 1980 correspondem a três anos de descontos, como refere a notificação da segurança social “que se juntou aos autos” e porque da mesma notificação resulta que o número de anos relevante para o cálculo da pensão é “12”, sendo três ao serviço de entidade não bancária.

Ora, do facto provado 12. acima transcrito consta que o autor teve uma carreira contributiva com 3 momentos distintos de descontos: a) de 06/1978 a 04/1980 efectuou descontos para a Segurança Social decorrentes da prestação de atividade dependente remunerada a entidade não bancária (3 anos); b) de 05-1980 a 12-2010, enquanto trabalhador bancário, efectuou os descontos obrigatórios para a Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários (CAFEB); c) a partir de Janeiro de 2011 passou a descontar para a Segurança Social, até passar à situação de reforma em Junho de 2019.

A sentença do tribunal a quo expressou o seguinte raciocínio:

«(…) o autor teve um período de 41 anos de descontos para a Segurança Social, 30 anos e 7 meses dos quais como trabalhador bancário, tendo-lhe sido atribuída uma pensão pelo CNP no valor de €605,91, correspondente aos mais de 10 anos de descontos para a “Previdência”.

Consequentemente, a ré, ao abrigo do estabelecido na cláusula 94.ª do referido Acordo Coletivo de Trabalho, apenas pode deduzir na pensão que paga ao autor a parte proporcional correspondente àquele período.

Dito por outras palavras, o réu deve apenas descontar da pensão, calculada nos termos do ACT, a parte proporcional da pensão da segurança social que corresponde ao período em que o trabalhador exerceu funções no sector bancário, pois só aí existe uma sobreposição das prestações por serem da mesma natureza

Assim, temos que o A. tem contribuições para a Segurança Social durante mais de 10 anos, sendo 1 anos e 10 meses antes de ter entrado para o R. e 8 anos, 5 meses e 12 dias depois de 2011, quando já trabalhava para a R., momento a partir do qual começou de novo a efetuar descontos para a Segurança Social, agora já como bancário, pelo que o R. tem direito a fazer seu o valor resultante da percentagem correspondente aos anos de descontos da integração da CAFEB no ISS, I.P., como preconiza o autor.

Assim sendo, o Banco réu apenas pode descontar do valor da pensão que paga ao Autor a parte proporcional ao tempo de exercício da atividade bancária com descontos para a Segurança Social [de Janeiro de 2011 a 12 de Junho de 2019 – 8 anos e 5 meses e 12 dias], ou seja, 81,52% [sendo que os 10 anos e 3 meses correspondem a 100% e o 1 ano e 10 meses, de 06-1978 a 04-1980 a 18,48%] e não os 95,14% da pensão atribuída ao autor pela Segurança Social, que fez seus, o mesmo se tendo de referir quanto aos retroativos pagos pelo CNP ao autor.

Em face de tudo o exposto, importa concluir que o Banco réu só tem direito a compensar na pensão de reforma que paga ao autor a percentagem correspondente ao tempo de exercício dessa atividade bancária com descontos para a Segurança Social, ou seja 81,52%.»

Este raciocínio parece bem claro e coerente com a posição que antes foi expressa na sentença, com o nosso acolhimento, no que toca à posição da ré e à interpretação das cláusulas convencionais do ACT aplicável e que se reporta como critério de cálculo apenas ao período de tempo de exercício da atividade bancária e em que se efectuaram descontos para a Segurança Social, excluindo quaisquer outras interpretações que introduzam factores de ponderação que tenham a ver com as contribuições efectuadas ou outros critérios normativos de aferição indirecta do valor da pensão a “descontar”. É isto mesmo em que se traduz a simples e seca regra pro-rata temporis, afinal a defendida pelo autor na acção.

Assim a proporcionalidade deve ser estabelecida, como se concluiu na sentença, tendo em conta que o autor tem contribuições para a Segurança Social durante 10 anos, 3 meses e 12 dias (e não doze anos como defende o autor no recurso), sendo 1 anos e 10 meses (e não três anos) antes de ter entrado para a ré e 8 anos, 5 meses e 12 dias depois de 2011.

Entendemos, por isso, que está certa a proporção de “abate” decidida na sentença recorrida.

Por conseguinte, também improcede a apelação do autor.


*

Sumário:
(…).

                    


*

III- DECISÃO

Termos em que se delibera julgar improcedentes quer a apelação da ré, quer a apelação do autor.

Custas em cada um dos recursos pelos respectivos recorrentes.


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   Coimbra, 12 de Julho de 2022


 (Luís Azevedo Mendes)

 (Felizardo Paiva)

(Paula Maria Roberto)