Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
323/20.2T8CTB.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: PAULA MARIA ROBERTO
Descritores: PORTARIA DE CONDIÇÕES DE TRABALHO
COMPETÊNCIA
MINISTRO
ÂMBITO DE APLICAÇÃO
INEFICÁCIA
Data do Acordão: 01/14/2022
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DO TRABALHO DE CASTELO BRANCO DO TRIBUNAL DA COMARCA DE CASTELO BRANCO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTIGO 36.º, N.º 1, DO DL N.º 519-A1/79, DE 29/12
ARTIGO 577.º DO CT DE 2003
ARTIGO 518.º DO CT DE 2009
Sumário: I) É da competência conjunta do ministro responsável pela área laboral e do ministro responsável pelo sector de actividade em causa a emissão de uma portaria de condições de trabalho.

II) As portarias de condições de trabalho são ineficazes em relação a quem opera em sectores de actividade não tutelados pelos ministros que as subscreveram.

III) As portarias de condições de trabalho para os trabalhadores administrativos não são aplicáveis a todos os trabalhadores administrativos, mas apenas àqueles que desempenhem funções nos sectores tutelados pelos ministros que as subscrevem.

Decisão Texto Integral:








Acordam[1] na Secção Social do Tribunal da Relação de Coimbra:

I - Relatório

A. , residente em ...

intentou a presente ação de processo comum, contra

B., com sede em ...

alegando, em síntese que:

Foi admitida ao serviço da Ré em 01/08/1995 com a categoria profissional de escriturária de 3ª; é-lhe aplicável o IRCT e PCT para os trabalhadores administrativos a desempenhar funções em setor de atividade para o qual não existe associação de empregadores constituída com a qual as associações sindicais que os representam possam celebrar convenções coletivas; os salários pagos à A. sempre foram inferiores às remunerações mínimas devidas para a sua categoria profissional, pelo que, a Ré deve ao A. a título de diferenças salariais a quantia de € 28.311,84, a que acrescem juros de mora, até hoje, no valor de € 18.032,75; deve a Ré à A. a quantia de € 6.594,12, a título de abono para falhas, acrescida de juros de mora, até hoje, no montante de € 4.063,69 e deve-lhe, ainda, a título de diuturnidades a quantia de € 10.927,60  a que acrescem juros, até hoje, no montante de € 3.091,44.

Termina, dizendo que a presente ação deve ser julgada procedente e a Ré condenada a pagar à A. a quantia de € 71.021,44, nos termos sobreditos, acrescida de juros de mora vincendos a calcular desde a data da citação e até integral pagamento sobre a quantia de € 45.833,56.

                                                             *

A Ré contestou alegando, em sinopse, que:

A PRT para os trabalhadores administrativos não é aplicável ao R. que é uma associação desportiva de direito privado e utilidade pública, sendo que, a área do desporto não se encontrava sob a tutela de qualquer dos ministros subscritores da referida portaria e nunca foi alargado o âmbito de aplicação da mesma; a A. é filiada no CESP, subscritor de variadas CCT e, assim, não tem direito às retribuições previstas na citada portaria.

Mais alega que a A. não tem direito ao reclamada abono para falhas e o horário da A. é de 35 horas e não o de 40 horas semanais previsto na citada PRT, pelo que, mesmo que esta seja aplicável, apenas teria direito à retribuição proporcional correspondente.

Termina dizendo que a presente ação deve ser julgada improcedente, por não provada, e, em consequência, o R. absolvido dos pedidos formulados.

                                                             *

Foi proferido o despacho saneador de fls. 44, no qual foi fixado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova.

                                                             *

Procedeu-se a julgamento conforme resulta das respetivas atas.

                                                             *

Foi, depois, proferida sentença (fls. 751 e segs.) e cujo dispositivo tem o seguinte teor:

Nestes termos, e em face do exposto, decido julgar a ação parcialmente procedente, e, em consequência, condeno o clube réu “ B. ” a pagar à autora A. a quantia de €69.884,86, acrescida de juros de mora vincendos a calcular desde a citação e até integral pagamento sobre a quantia de € 45.407,21.”

                                                             *

O Réu, notificado desta sentença, veio interpor o presente recurso que concluiu da forma seguinte:

(…)

                                                             *

II – Questões a decidir:

Como é sabido, a apreciação e a decisão dos recursos são delimitadas pelas conclusões da alegação do recorrente (art.º 639.º do CPC) com exceção das questões de conhecimento oficioso.

No caso, face às conclusões apresentadas pelo recorrente, a única questão que importa apreciar e decidir é a seguinte:

Se não são aplicáveis à relação laboral existente entre a A. e o Réu nos anos de 1995 a 2020, as PRT e PCT para os trabalhadores administrativos e, em consequência, não são devidas à A. as diferenças salariais peticionadas nem as quantias peticionadas a título de diuturnidades e abono para falhas.

                                                                       *

                                                             *

III – Fundamentação

a) Factos provados

1) A autora trabalha sob as ordens, autoridade e direção da R. desde 1 de agosto de 1995 - doc. nº 1.

2) A Autora foi admitida com a categoria profissional de escriturária de 3ª, auferindo a retribuição mensal de € 259,40 - doc. nº 1.

3) A Autora está incumbida de várias tarefas, designadamente, arquiva a documentação, separa-a em função do tipo de assunto ou do tipo de documento, respeitando as regras e procedimentos de arquivo, procede à expedição da correspondência, notas informativas e outros documentos, manualmente ou através de equipamentos informáticos, dando-lhes o seguimento apropriado, examina o correio recebido, separa-o, classifica-o e compila os dados que são necessários para preparar as respostas por escrito ou por via eletrónica, elabora, ordena e prepara os documentos relativos às encomendas que faz de material de escritório, recebe pedidos de informações e transmite-os às pessoas, serviço ou departamento competente, informa as pessoas das condições de admissão de sócio e da formação de atletas e efetua os registos, preenche formulários oficiais relativos ao pessoal e à sua entidade empregadora, inscreve, regista e presta informações a atletas e recebe telefonemas.

4) Além disso, recebe as mensalidades das escolas de formação, faz depósitos bancários, faz pagamentos, recebe quotizações dos sócios, recebe os preços dos equipamentos que vende, põe em caixa os pagamentos, regista as receitas e despesas, tem a seu cargo as operações da caixa, recebe numerário e outros valores e verifica se as importâncias que recebe correspondem aos documentos contabilísticos, registando esses movimentos, preenche cheques bancários para serem assinados pelos legais representantes da R..

5) No ano de 1995 o salário mensal pago foi de € 259,40.

6) No ano de 1996 o salário mensal pago foi de € 272,30.

7) No ano de 1997 o salário mensal pago foi de € 282,80.

8) No ano de 1998 o salário mensal pago foi de € 293,80.

9) No ano de 1999 o salário mensal pago foi de € 305,76.

10)No ano de 2000 o salário mensal pago foi de € 318,20.

11)No ano de 2001 o salário mensal pago foi de € 334,20.

12)No ano de 2002 o salário mensal pago foi de € 348,00.

13)No ano de 2003 o salário mensal pago foi de € 392,30.

14)No ano de 2004 o salário mensal pago respeitante aos meses de janeiro a junho inclusive foi de € 392,30.

15)No ano de 2004 o salário mensal pago respeitante aos meses de julho a dezembro inclusive foi de € 375,00.

16)No ano de 2005 o salário mensal pago respeitante aos meses de janeiro a abril inclusive foi de € 375,00.

17)No ano de 2005 o salário mensal pago respeitante aos meses de maio a novembro inclusive foi de € 421,35.

18)No ano de 2005 o salário mensal pago respeitante ao mês de dezembro foi de € 421,35.

19)No ano de 2006 o salário mensal pago respeitante aos meses de janeiro a junho inclusive foi de € 421,35;

20)No ano de 2006 o salário mensal pago respeitante aos meses de julho a dezembro inclusive foi de € 421,35

21)No ano de 2007 o salário mensal pago foi de € 421,35.

22)No ano de 2008 o salário mensal pago respeitante ao mês de janeiro foi de € 426,00.

23)No ano de 2008 o salário mensal pago respeitante aos meses de fevereiro a dezembro inclusive foi de € 445,00.

24)No ano de 2009 o salário mensal pago foi de € 450,00.

25)No ano de 2010 o salário mensal pago foi de € 475,00.

26)No ano de 2011 o salário mensal pago foi de € 500,00.

27)No ano de 2012 o salário mensal pago nos meses de janeiro a março inclusive foi de € 500,00.

28)No ano de 2012 o salário mensal pago nos meses de abril a dezembro inclusive foi de € 500,00.

29)No ano de 2013 o salário mensal pago foi de € 500,00, quando deveria ter sido pago € 609,00.

30)No ano de 2014 o salário mensal pago respeitante aos meses de janeiro a setembro inclusive foi de € 500,00.

31)No ano de 2014 o salário mensal pago respeitante aos meses de outubro a dezembro inclusive foi de € 505,00.

32)No ano de 2015 o salário mensal pago de janeiro a novembro inclusive foi de € 550,00.

33)No ano de 2015 o salário mensal pago no mês de dezembro foi de € 550,00.

34)No ano de 2016 o salário mensal pago foi de € 550,00.

35)No ano de 2017 o salário mensal pago foi de € 557,00.

36)No ano de 2018 o salário mensal de janeiro a maio inclusive pago foi de € 580,00

37)No ano de 2018 o salário mensal de junho a dezembro inclusive pago foi de € 580,00.

38)No ano de 2019 o salário mensal pago respeitante aos meses de janeiro a junho inclusive foi de € 600,00.

39)No ano de 2019 o salário mensal pago respeitante aos meses de julho a dezembro inclusive foi de € 600,00.

40)No ano de 2020 o salário mensal pago respeitante ao mês de janeiro foi de € 635,00.

41)Em 1 de agosto de 1998 a autora não passou a ter a categoria de escriturária de 2ª, nem em 1 de agosto de 2001 ascendeu à categoria de escriturária de 1ª.

42)À autora nunca foram pagas diuturnidades.

43)O Clube Réu foi fundado no ano de 1934, sob o nome de Onze Vermelho Albicastrense, tendo alterado a sua denominação para a atual “ B. ” – Docs. 1 e 2.

44)Foi-lhe concedido no ano de 1983 o estatuto de utilidade pública desportiva (Docs. 3 e 4) que se mantém desde então.

45)O clube Réu é associado quer da Associação de Futebol de ... quer da Federação Portuguesa de Futebol, entidades igualmente dotadas de utilidade pública.

46)A autora é filiada no Sindicato dos Trabalhadores do Comércio e Serviços de Portugal (CESP).

47)Por acordo entre autora e réu desde o início do contrato foi estabelecido um período de apenas 35h de trabalho semanal, ou seja, das 09h30 às 12h30m e das 14h00m às 17h30m, de segunda a sexta-feira.

                                                                       *

                                           *

b) - Discussão

Apreciando a questão suscitada pelo Réu recorrente: 

Se não são aplicáveis à relação laboral existente entre a A. e o Réu nos anos de 1995 a 2020, as PRT e PCT para os trabalhadores administrativos e, em consequência, não são devidas à A. as diferenças salariais peticionadas nem as quantias peticionadas a título de diuturnidades e abono para falhas.  

Alega o recorrente que as PRT e PCT para os trabalhadores administrativos não são aplicáveis à relação laboral em apreço nos autos, uma vez que as mesmas não foram subscritas ou assinadas pelos ministros que tutelaram a área do desporto, sendo que o clube recorrente tem a sua atividade exclusivamente dedicada a esse setor de atividade, gozando do estatuto de utilidade pública desportiva; por força do disposto nos artigos 36.º do DL n.º 519-C1/79, de 29712, artigos 577.º e 578.º, ambos do CT de 2003 e artigos 517.º e 518.º, ambos do CT de 2009, as citadas portarias não são aplicáveis a todos os trabalhadores administrativos mas apenas àqueles que desempenhem funções nos setores tutelados ou da responsabilidade dos ministros que as subscrevem.

A este propósito consta da sentença recorrida, além do mais, o seguinte:

“Na petição inicial que apresentou, defende a autora que se lhe aplica o Instrumento de Regulação Coletiva de Trabalho (IRCT) e Portaria de Condições de Trabalho (PCT) para as condições de trabalho para os trabalhadores administrativos a desempenhar funções em sector de atividade para o qual não existe associação de empregadores constituída com a qual as associações sindicais que os representam possam celebrar convenções coletivas, no caso, a Portaria de Regulamentação de Trabalho (PRT) para os trabalhadores administrativos publicada no Boletim Trabalho e Emprego (BTE), 1ª série, nº 43, 22.11.1994, PRT para os trabalhadores administrativos publicada no BTE, 1ª série, nº 9, de 8.3.1996, PRT para os trabalhadores administrativos, BTE, 1ª série, nº 48, de 29.12.2002, PRT para os trabalhadores administrativos- Retificação, BTE, 1ª série, nº 7, de 22.2.2003, PRT para os trabalhadores administrativos, BTE, 1ª série, nº 3, de 22.1.2004, Portaria que aprova o regulamento de condições mínimas para os trabalhadores administrativos, BTE, 1ª série, nº 43, de 22.11.2005, Portaria que aprova o regulamento de condições mínimas para os trabalhadores administrativos, BTE, 1ª série, nº 27, de 22.7.2006, Portaria que aprova o regulamento de condições mínimas para os trabalhadores administrativos, BTE, 1ª série, nº 46, de 15.12.2007, Portaria que aprova a atualização do regulamento de condições mínimas para os trabalhadores administrativos, BTE, 1ª série, nº 2, de 15.1.2009, Portaria que aprova o regulamento de condições mínimas para os trabalhadores administrativos, BTE, 1ª série, nº 14, de 15.4.2010, Portaria de condições de trabalho para trabalhadores administrativos, BTE nº 39, de 22.10.2010, Portaria de condições de trabalho para trabalhadores administrativos, BTE nº 12, de 22.7.2012, Portaria de condições de trabalho para trabalhadores administrativos, BTE nº41, de 8.11.2015, Portaria de condições de trabalho para trabalhadores administrativos, BTE nº 26, de 15.7.2018, Portaria 182/18 de 22.6. e Portaria 411-A/2019, de 31.12.,

Por sua vez, defende a ré, na sua contestação, que à relação laboral havida entre as partes não se aplica a referida PRT, sustentando que o clube réu é uma associação de direito privado dotada de utilidade pública, sendo que a PRT em questão se aplica apenas a pessoas coletivas de direito privado e utilidade pública cuja tutela seja exercida por um membro do governo que a não subscreve e após parecer desse membro do governo, sendo certo que a área do desporto não se encontrava sob a tutela de qualquer dos Ministros subscritores da referida Portaria e nunca foi alargado o âmbito de aplicação da referida Portaria - o que determina a inaplicabilidade da Portaria invocada na petição inicial à relação laboral entre autora e réu. Acresce que o clube Réu é associado quer da Associação de Futebol de ... quer da Federação Portuguesa de Futebol, entidades igualmente dotadas de utilidade pública, e como tal excluídas do âmbito de aplicação da citada PRT. Ademais, a autora é filiada no Sindicato dos Trabalhadores do Comércio e Serviços de Portugal (CESP), subscritor de variadas convenções coletivas de trabalho, pelo que, também por essa via, a PRT em causa não é aplicável às relações laborais entre autora e réu, pelo que não te, a autora direito às retribuições (salário, abono para falhas e diuturnidades) aí previstas.

Invoca, em sentido contrário, a autora que a PRT publicada no BTE, 1ª série, nº 44 de 29.11.1996 que atualizou parcialmente a PRT publicada no BTE, 1ª série, nº 9, de 8.3.1996, foi subscrita pelo Secretário de Estado do Desporto sob a tutela da Presidência do Conselho de Ministros e do Ministro Adjunto, com efeitos a partir do dia 1.1.1996 (nº 2 do art.º 20º; vd. art.º 6º nºs 1 al. f) e 2, art.º 9º nº 2 do DL 296-A/95, de 17.11. que aprovou a Lei Orgânica do XIII Governo Constitucional e DL 164/96, 5.9. onde se lê no seu preâmbulo que, nos termos da Lei Orgânica do XIII Governo Constitucional, o desporto deixou de estar integrado no Ministério da Educação, passando a ficar na dependência da Presidência do Conselho de Ministros, sob a responsabilidade do respetivo Ministro Adjunto. Entretanto a PRT publicada no BTE, 1ª série, nº 9, de 8.3.1996 e as suas alterações, foram revogadas pela PRT publicada no BTE, 1ª série, nº 48, de 29.12. (nº 1 do art.º 16º), cujo âmbito de aplicação se alargou às pessoas coletivas de direito privado e utilidade pública, deixando de ser excecionadas ou com os constrangimentos decorrentes da subscrição ou de despacho ministeriais (vd. art.º 1º), regime que se manteve nos regulamentos de condições mínimas que lhe sobrevieram, designadamente a Portaria 736/06, de 26.7. e RCM publicado BTE, 1ª série, nº 27, de 22.7.2006 (art.º 1º), Portaria 182/18, 22.6.2018 e PCT publicada BTE, nº 26, de 15.7.2018º (art.º 1º).

Vejamos:

A Portaria de Regulamentação de Trabalho para os trabalhadores administrativos, doravante PRT, vigente à data da celebração do contrato de trabalho em apreço nos autos era a publicada no Boletim do Trabalho e Emprego, 1ª série, nº9 de 8.3.1996, cuja tabela salarial e subsídio de alimentação foram, entretanto, atualizados, a qual no artigo 1º definia o respetivo âmbito de aplicação da seguinte forma:

“1- A presente portaria é aplicável no território nacional, a entidades patronais que tenham ao seu serviço trabalhadores cujas funções correspondam a profissões ou categorias profissionais constantes do anexo I, bem como a estes trabalhadores.

2- A presente portaria é, designadamente, aplicável a cooperativas e a empresas públicas e de capitais públicos, sem prejuízo do disposto no respectivo regime legal e nos seus estatutos, a fundações, associações sindicais e patronais e outras associações sem fim lucrativo.

3- São excluídos do âmbito da presente portaria:

a) Os partidos políticos

b) As entidades patronais que exerçam actividade económica pela qual se possam filiar em associações patronais legalmente constituídas à data da publicação da presente portaria.

c) As relações de trabalho abrangidas por regulamentação colectiva convencional ou administrativa, publicada ou já apresentada para depósito à data da publicação da presente portaria.”

Ora, como vimos, o clube réu é uma associação de direito privado dotada de utilidade pública, defendendo por isso o mesmo que, sendo a PRT em questão aplicável apenas a pessoas coletivas de direito privado e utilidade pública cuja tutela seja exercida por um membro do governo que a não subscreve e após parecer desse membro do governo, e não se encontrando a área do desporto sob a tutela de qualquer dos Ministros subscritores da referida Portaria (e nunca tendo sido alargado o âmbito de aplicação da referida Portaria), a mesma será inaplicável à relação laboral havida entre autora e réu.

Adiantando desde já conclusões, entende-se assistir razão ao clube réu quanto à não aplicabilidade da PRT publicada no BTE, 1ª série, nº 9, de 8.3.1996, no que diz respeito apenas ao ano de 1995, atento o estatuto de utilidade pública desportiva de que beneficia o clube – conforme aliás pela própria autora admitido no seu requerimento datado de 25.06.2020.

Já não será assim quanto aos restantes anos nos quais vigorou o contrato de trabalho objeto dos autos.

Na verdade, e como bem salientado pela autora no referido requerimento, a PRT publicada no BTE, 1ª série, nº 44 de 29.11.1996 que atualizou parcialmente a PRT publicada no BTE, 1ª série, nº 9, de 8.3.1996, foi subscrita pelo Secretário de Estado do Desporto sob a tutela da Presidência do Conselho de Ministros e do Ministro Adjunto, com efeitos a partir do dia 1.1.1996 (nº 2 do art.º 20º; vd. art.º 6º nºs 1 al. f) e 2, art.º 9º nº 2 do DL 296-A/95, de 17.11. que aprovou a Lei Orgânica do XIII Governo Constitucional e DL 164/96, 5.9. onde se lê no seu preâmbulo que, nos termos da Lei Orgânica do XIII Governo Constitucional, o desporto deixou de estar integrado no Ministério da Educação, passando a ficar na dependência da Presidência do Conselho de Ministros, sob a responsabilidade do respetivo Ministro Adjunto. Entretanto a PRT publicada no BTE, 1ª série, nº 9, de 8.3.1996 e as suas alterações, foram revogadas pela PRT publicada no BTE, 1ª série, nº 48, de 29.12. (nº 1 do art.º 16º), cujo âmbito de aplicação se alargou às pessoas coletivas de direito privado e utilidade pública, deixando de ser excecionadas ou com os constrangimentos decorrentes da subscrição ou de despacho ministeriais (vd. art.º 1º), regime que se manteve nos regulamentos de condições mínimas que lhe sobrevieram, designadamente a Portaria 736/06, de 26.7. e RCM publicado BTE, 1ª série, nº 27, de 22.7.2006 (art.º 1º), Portaria 182/18, 22.6.2018 e PCT publicada BTE, nº 26, de 15.7.2018 (art.º 1º).

Daqui resulta que o clube réu não é excluído do âmbito de aplicação da referida Portaria (com exceção do ano de 1995, como vimos), por ser uma associação de direito privado dotada de utilidade pública.

Por outro lado, também não assiste razão ao clube réu quando alega que à autora não é aplicável a PRT invocada por ser filiada no Sindicato dos Trabalhadores do Comércio e Serviços de Portugal (CESP), subscritor de variadas convenções coletivas de trabalho, na medida em que, quanto à aplicabilidade das convenções coletivas, vigora, como é sabido, o princípio da dupla filiação.

Com efeito, as convenções coletivas obrigam apenas aqueles que, durante a respetiva vigência, estiverem filiados ou se filiarem nas entidades outorgantes (associações de empregadores e sindicatos) e ainda os empregadores que outorguem diretamente, nos casos dos acordos coletivos de trabalho e dos acordos de empresa.

Este princípio encontra-se plasmado no artigo 496.º do Código do Trabalho nos termos do qual a convenção coletiva “obriga o empregador que a subscreve ou filiado em associações de empregadores celebrantes, bem como os trabalhadores ao seu serviço que sejam membros de associação sindical celebrante”.

Como resulta do disposto no artigo 492º, n.º 1, al. c) do Código do Trabalho, além da exigência da “dupla filiação” (que justifica a obrigatoriedade de se fazer menção no texto da convenção da designação das entidades celebrantes), a definição pessoal dos destinatários da CCT infere-se, ainda, da menção obrigatória no instrumento de regulamentação coletiva do respetivo “âmbito do sector de atividade”, o que nos reconduz ao sector de atividade económica que a convenção pretende abranger.

A normação plasmada na convenção coletiva pode, contudo, alargar-se total ou parcialmente, nas seguintes situações:

- Extensão dos efeitos da convenção coletiva a trabalhadores e/ou a empregadores não filiados na associação sindical ou patronal outorgante (ou por se terem filiado na associação após a outorga da convenção ou por se terem desfiliado da associação depois de iniciado o processo negocial (art.º 496º nºs 3 e 4);

- Extensão dos efeitos da convenção coletiva a empregador não outorgante, por efeito da transmissão de empresa ou de estabelecimento (art.º 498º);

- Extensão dos efeitos da convenção coletiva a trabalhador não sindicalizado, por escolha desse trabalhador (art.º 497º);

- Extensão dos efeitos da convenção coletiva a trabalhadores inicialmente não abrangidos, por portaria de extensão (art.º 514º).

Na verdade, nos termos do artigo 514º, n.º 1 do Código do Trabalho, a “convenção coletiva ou decisão arbitral em vigor pode ser aplicada, no todo ou em parte, por portaria de extensão a empregadores e a trabalhadores integrados no âmbito do sector de atividade e profissional definido naquele instrumento”.

Pode por isso dizer-se que as Portarias de Extensão são regulamentos normativos emanados da Administração (portaria ministerial) que alargam a aplicação das convenções (artigo 516º do Código do Trabalho).

Em suma: as convenções coletivas de trabalho obrigam os empregadores que as subscrevem e os inscritos nas associações signatárias, bem como os trabalhadores ao seu serviço que sejam membros quer das associações sindicais celebrantes, quer das associações sindicais representadas pelas associações sindicais celebrantes – artigo 496º do Código do Trabalho – e o âmbito da aplicação que é traçado no seu texto pode ser estendido, por portaria, a empregadores e trabalhadores do mesmo sector de atividade e profissional – artigo 514º do mesmo Código – Cfr. a este respeito, o acórdão da Relação do Porto de 17.02.2014, disponível em www.dgsi.pt, que aqui vimos seguindo de perto.

Ora, no caso em apreço, não resultou demonstrado nos autos ter o clube réu subscrito qualquer convenção coletiva de trabalho ou existir alguma Portaria de Extensão a estender o âmbito de aplicação de qualquer convenção do mesmo setor de atividade, pelo que improcede também este argumento do clube réu no sentido da inaplicabilidade da PRT invocada.

E aqui chegados, conclui-se, pois, que, não sendo a atividade da ré excluída do âmbito da portaria, a mesma será de aplicar à relação laboral constituída entre a autora e o clube réu, face ao disposto no nº1, se as funções da primeira corresponderem a uma das profissões ou categorias profissionais constantes do Anexo I, sendo que como estabelece o artigo 2º da PRT os trabalhadores são classificados de acordo com as funções efetivamente desempenhadas.

Impõe-se por isso determo-nos sobre as funções da autora e respetiva categoria profissional.

*

ii) da categoria profissional da autora:

(…)

Cotejando a descrição de funções constante da portaria com as efetivamente exercidas pela autora vemos que o conjunto inicial de funções é idêntico, correspondendo às funções administrativas de qualquer escritório / estabelecimento.

Com efeito, para a atribuição de uma categoria profissional basta, conforme supra referido, que o trabalhador exerça o núcleo essencial das funções correspondentes, o que no presente caso se verifica, pois a autora assegurava as tarefas correspondentes ao expediente geral de qualquer tipo de escritório e, simultaneamente, executava outras funções conexas com a atividade do clube réu, como as relativas à cobrança de quotas, ao recebimento de mensalidades ou à inscrição de jogadores.

Assim sendo, e atendendo a que no caso dos autos a autora logrou demonstrar que exercia as funções essenciais, fulcrais e juridicamente caracterizadoras da categoria profissional de escriturária, entendemos ser de classificar a autora com a categoria profissional de escriturária.

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iii) das diferenças salarias reclamadas pela autora:

Afirmando-se a aplicabilidade da PRT para os trabalhadores administrativos e reconhecendo-se à autora a categoria profissional de “Escriturária” que através da Portaria publicada no BTE, 1ª série, nº48 de 29.12.2002, passou a designar-se de “Assistente Administrativo”, passemos à 2ª questão: saber se a autora tem direito aos créditos peticionados, para o que será necessário confrontar os valores previstos nos IRCT sucessivamente aplicáveis com os valores pela autora auferidos (com exceção do ano de 1995 em que, como vimos não se aplica a PRT invocada, nos termos supra expostos).

A este respeito resultou provado que:

No ano de 1996 o salário mensal pago foi de € 272,30.

No ano de 1997 o salário mensal pago foi de € 282,80.

No ano de 1998 o salário mensal pago foi de € 293,80.

No ano de 1999 o salário mensal pago foi de € 305,76.

No ano de 2000 o salário mensal pago foi de € 318,20.

No ano de 2001 o salário mensal pago foi de € 334,20.

No ano de 2002 o salário mensal pago foi de € 348,00.

No ano de 2003 o salário mensal pago foi de € 392,30.

No ano de 2004 o salário mensal pago respeitante aos meses de Janeiro a Junho inclusive foi de € 392,30.

No ano de 2004 o salário mensal pago respeitante aos meses de Julho a Dezembro inclusive foi de € 375,00.

No ano de 2005 o salário mensal pago respeitante aos meses de Janeiro a Abril inclusive foi de € 375,00.

No ano de 2005 o salário mensal pago respeitante aos meses de Maio a Novembro inclusive foi de € 421,35.

No ano de 2005 o salário mensal pago respeitante ao mês de Dezembro foi de € 421,35.

No ano de 2006 o salário mensal pago respeitante aos meses de Janeiro a Junho inclusive foi de € 421,35;

No ano de 2006 o salário mensal pago respeitante aos meses de Julho a Dezembro inclusive foi de € 421,35

No ano de 2007 o salário mensal pago foi de € 421,35.

No ano de 2008 o salário mensal pago respeitante ao mês de Janeiro foi de € 426,00.

No ano de 2008 o salário mensal pago respeitante aos meses de Fevereiro a Dezembro inclusive foi de € 445,00.

No ano de 2009 o salário mensal pago foi de € 450,00.

No ano de 2010 o salário mensal pago foi de € 475,00.

No ano de 2011 o salário mensal pago foi de € 500,00.

No ano de 2012 o salário mensal pago nos meses de Janeiro a Março inclusive foi de € 500,00.

No ano de 2012 o salário mensal pago nos meses de Abril a Dezembro inclusive foi de € 500,00.

No ano de 2013 o salário mensal pago foi de € 500,00, quando deveria ter sido pago € 609,00.

No ano de 2014 o salário mensal pago respeitante aos meses de Janeiro a Setembro inclusive foi de € 500,00.

No ano de 2014 o salário mensal pago respeitante aos meses de Outubro a Dezembro inclusive foi de € 505,00.

No ano de 2015 o salário mensal pago de Janeiro a Novembro inclusive foi de € 550,00.

No ano de 2015 o salário mensal pago no mês de Dezembro foi de € 550,00.

No ano de 2016 o salário mensal pago foi de € 550,00.

No ano de 2017 o salário mensal pago foi de € 557,00.

No ano de 2018 o salário mensal de Janeiro a Maio inclusive pago foi de € 580,00

No ano de 2018 o salário mensal de Junho a Dezembro inclusive pago foi de € 580,00.

No ano de 2019 o salário mensal pago respeitante aos meses de Janeiro a Junho inclusive foi de € 600,00.

No ano de 2019 o salário mensal pago respeitante aos meses de Julho a Dezembro inclusive foi de € 600,00.

No ano de 2020 o salário mensal pago respeitante ao mês de Janeiro foi de € 635,00, quando deveria ter sido pago € 660,00 havendo uma diferença de € 25,00.

Daqui resulta que:

- No ano de 1996 o salário mensal pago foi de € 272,30, quando deveria ter sido pago € 317,24, havendo uma diferença de € 44,94 x 14 meses, o que perfaz € 629,16.

- No ano de 1997 o salário mensal pago foi de € 282,80, quando deveria ter sido pago € 317,24, havendo uma diferença de € 34,44 x 14 meses, o que perfaz € 482,16.

- No ano de 1998 o salário mensal pago respeitante aos meses de Janeiro a Julho inclusive foi de € 293,80, quando deveria ter sido pago € 317,24, havendo uma diferença de € 23,44 x 7 meses + subsídio de férias, o que perfaz € 187,52.

- No ano de 1998 o salário mensal pago respeitante aos meses de Agosto a Dezembro inclusive foi de € 293,80, quando deveria ter sido pago € 343,17, uma vez que deveria ter ingressado na categoria imediatamente superior -escriturária de 2ª-, porque já se haviam completado 3 anos de serviço na categoria de escriturária de 3ª, havendo uma diferença de € 49,37 x 5 meses + subsídio de Natal, o que perfaz € 296,22.

- No ano de 1999 o salário mensal pago foi de € 305,76, quando deveria ter sido pago € 343,17, havendo uma diferença de € 37,41 x 14 meses, o que perfaz € 523,74.

- No ano de 2000 o salário mensal pago foi de € 318,20, quando deveria ter sido pago € 343,17, havendo uma diferença de € 24,97 x 14 meses, o que perfaz € 349,58.

- No ano de 2001 o salário mensal pago respeitante aos meses de Janeiro a Julho inclusive foi de € 334,20, quando deveria ter sido pago € 343,17, havendo uma diferença de € 8,97 x 7 meses + subsídio de férias, o que perfaz € 71,76.

- No ano de 2001 o salário mensal pago respeitante aos meses de Agosto a Dezembro inclusive foi de € 334,20, quando deveria ter sido pago € 373,60, uma vez que deveria ter ingressado na categoria imediatamente superior -escriturária de 1ª-, porque já se haviam completado 3 anos de serviço na categoria de escriturária de 2ª, havendo uma diferença de € 39,40 x 5 meses + subsídio de Natal, o que perfaz € 236,40.

- No ano de 2002 o salário mensal pago foi de € 348,00, quando deveria ter sido pago € 479,54, havendo uma diferença de € 131,54 x 14 meses, o que perfaz € 1.841,56.

- No ano de 2003 o salário mensal pago foi de € 392,30, quando deveria ter sido pago € 494,40 havendo uma diferença de € 102,10 x 14 meses, o que perfaz € 1.429,40.

- No ano de 2004 o salário mensal pago respeitante aos meses de Janeiro a Junho inclusive foi de € 392,30, quando deveria ter sido pago € 494,40, havendo uma diferença de € 102,10 x 6 meses, o que perfaz € 612,60.

- No ano de 2004 o salário mensal pago respeitante aos meses de Julho a Dezembro inclusive foi de € 375,00, quando deveria ter sido pago € 494,40, havendo uma diferença de € 119,40 x 6 meses + subsídio férias + subsídio de Natal, o que perfaz € 995,20.

- No ano de 2005 o salário mensal pago respeitante aos meses de Janeiro a Abril inclusive foi de € 375,00, quando deveria ter sido pago € 494,40 havendo uma diferença de € 119,40 x 4 meses, o que perfaz € 477,60.

- No ano de 2005 o salário mensal pago respeitante aos meses de Maio a Novembro inclusive foi de € 421,35, quando deveria ter sido pago € 494,40, havendo uma diferença de € 73,40 x 8 meses + subsídio férias, o que perfaz € 584,40.

- No ano de 2005 o salário mensal pago respeitante ao mês de Dezembro foi de € 421,35, quando deveria ter sido pago € 531,00, havendo uma diferença de € 110,00 x 1 mês + subsídio de Natal, o que perfaz € 219,30.

- No ano de 2006 o salário mensal pago respeitante aos meses de Janeiro a Junho inclusive foi de € 421,35, quando deveria ter sido pago € 531,00 havendo uma diferença de € 105,65 x 6 meses, o que perfaz € 657,90.

- No ano de 2006 o salário mensal pago respeitante aos meses de Julho a Dezembro inclusive foi de € 421,35, quando deveria ter sido pago € 545,50, havendo uma diferença de € 120,15 x 6 meses + subsídio férias + subsídio de Natal, o que perfaz € 993,20.

- No ano de 2007 o salário mensal pago foi de € 421,35, quando deveria ter sido pago € 559,00, havendo uma diferença de € 133,87 x 14 meses, o que perfaz € 1.927,10

- No ano de 2008 o salário mensal pago respeitante ao mês de Janeiro foi de € 426,00, quando deveria ter sido pago € 576,00 havendo uma diferença de € 150,00.

- No ano de 2008 o salário mensal pago respeitante aos meses de Fevereiro a Dezembro inclusive foi de € 445,00, quando deveria ter sido pago € 576,00, havendo uma diferença de € 131,00 x 11 meses + subsídio férias + subsídio de Natal, o que perfaz € 1.703,00.

- No ano de 2009 o salário mensal pago foi de € 450,00, quando deveria ter sido pago € 591,00 havendo uma diferença de € 141,00 x 14 meses, o que perfaz € 1.974,00.

- No ano de 2010 o salário mensal pago foi de € 475,00, quando deveria ter sido pago € 597,00 havendo uma diferença de € 122,00 x 14 meses, o que perfaz € 1.708,00.

- No ano de 2011 o salário mensal pago foi de € 500,00, quando deveria ter sido pago € 597,00 havendo uma diferença de € 97,00 x 14 meses, o que perfaz € 1.358,00

- No ano de 2012 o salário mensal pago nos meses de Janeiro a Março inclusive foi de € 500,00, quando deveria ter sido pago € 597,00 havendo uma diferença de € 97 x 3 meses, o que perfaz € 291,00.

- No ano de 2012 o salário mensal pago nos meses de Abril a Dezembro inclusive foi de € 500,00, quando deveria ter sido pago € 609,00 havendo uma diferença de € 109,00 x 9meses + subsídio de férias + subsídio de Natal, o que perfaz € 1.199,00.

- No ano de 2013 o salário mensal pago foi de € 500,00, quando deveria ter sido pago € 609,00 havendo uma diferença de € 109,00 x 14 meses, o que perfaz € 1.526,00.

- No ano de 2014 o salário mensal pago respeitante aos meses de Janeiro a Setembro inclusive foi de € 500,00, quando deveria ter sido pago € 609,00 havendo uma diferença de € 109,00 x 8 meses + subsídio de férias, o que perfaz € 1.090,00.

- No ano de 2014 o salário mensal pago respeitante aos meses de Outubro a Dezembro inclusive foi de € 505,00, quando deveria ter sido pago € 609,00, havendo uma diferença de € 104,00 x 3 meses + subsídio de Natal, o que perfaz € 416,00.

- No ano de 2015 o salário mensal pago de Janeiro a Novembro inclusive foi de € 550,00, quando deveria ter sido pago € 609,00 havendo uma diferença de € 59,00 x 11 meses + subsídio de férias, o que perfaz € 708,00.

- No ano de 2015 o salário mensal pago no mês de Dezembro foi de € 550,00, quando deveria ter sido pago € 620,00 havendo uma diferença de € 70,00 x 1 mês + subsídio de Natal, o que perfaz € 140,00.

- No ano de 2016 o salário mensal pago foi de € 550,00, quando deveria ter sido pago € 620,00 havendo uma diferença de € 70,00 x 14 meses, o que perfaz € 980,00.

- No ano de 2017 o salário mensal pago foi de € 557,00, quando deveria ter sido pago € 620,00 havendo uma diferença de € 63,00 x 14 meses, o que perfaz € 882,00.

- No ano de 2018 o salário mensal de Janeiro a Maio inclusive pago foi de € 580,00, quando deveria ter sido pago € 620,00 havendo uma diferença de € 40,00 x 5 meses, o que perfaz € 200,00.

- No ano de 2018 o salário mensal de Junho a Dezembro inclusive pago foi de € 580,00, quando deveria ter sido pago € 632,00 havendo uma diferença de € 52,00 x 7 meses + subsídio de férias + subsídio de Natal, o que perfaz € 468,00.

No ano de 2019 o salário mensal pago respeitante aos meses de Janeiro a Junho inclusive foi de € 600,00, quando deveria ter sido pago € 632,00 havendo uma diferença de € 32,00 x 6 meses, o que perfaz € 192,00.

- No ano de 2019 o salário mensal pago respeitante aos meses de Julho a Dezembro inclusive foi de € 600,00, quando deveria ter sido pago € 660,00, havendo uma diferença de € 60,00 x 6 meses + subsídio de férias + subsídio de Natal, o que perfaz € 480,00.

- No ano de 2020 o salário mensal pago respeitante ao mês de Janeiro foi de € 635,00, quando deveria ter sido pago € 660,00 havendo uma diferença de € 25,00.

Note-se que tendo a A. sido admitida como escriturária de 3ª, deveria ter ingressado na categoria profissional imediatamente superior logo que completasse 3 anos de serviço, i. é, em 1 de Agosto de 1998 passaria ater a categoria de escriturária de 2ª e em 1 de Agosto de 2001 ascenderia à categoria de escriturária de 1ª, com os consequentes aumentos dos índices remuneratórios, o que não sucedeu (Portaria de Regulamentação de Trabalho (PRT) para os trabalhadores administrativos publicada no BTE, 1ª série, nº 9, de 8.3.1996, nº 1 do art.º 7º).

Deve assim o clube réu à autora a título de diferenças salariais a quantia de € 27.964,80, assim calculada:

(…)

Não se descura a argumentação do clube réu no sentido de que a autora não tem direito também às retribuições que reclama, correspondentes a 40h de trabalho semanal, mas apenas à retribuição proporcional correspondente a 35h semanais, já que por acordo entre as partes a retribuição seria proporcional ao tempo de trabalho, ou seja, a retribuição devida seria a correspondente a um horário de 35h semanais e não a correspondente às 40h semanais de um horário a tempo completo.

A verdade, porém, é que não resultou provado qualquer acordo nesse sentido, sendo certo que não consta do contrato de trabalho o período normal de trabalho ou o horário de trabalho. Acresce que o nº 1 do art.º 10º do PRT de 8.3.1996 apenas estabelece o limite máximo de horas de trabalho semanal (40h00), entendendo-se por isso não ser de reduzir a retribuição devida à autora, conforme preconizado pelo clube réu.

E assim sendo, mantém-se a conclusão de que clube réu deve à autora a título de diferenças salariais a quantia de € 27.964,80, nos termos acima expostos – a cujo pagamento será condenado.

**

 *

iv) da falta de pagamento do abono para falhas:

Defende a autora na sua petição inicial que a autora sempre exerceu as funções de pagamento e recebimento em numerário e outros valores, sendo recebedora, recebedora-pagadora ou pagadora, pelo que tem direito a um abono mensal de 5% dos montantes estabelecidos nos níveis constantes das tabelas de remunerações mínimas, destinado a suprir eventuais falhas no exercício dessas funções e com consagração convencional prevista na PRT para os trabalhadores administrativos, devendo-lhe a ré a título de abono para falhas a quantia de € 6.594,12.

Como é sabido, o abono para falhas é um suplemento ou acréscimo remuneratório atribuído em função de uma particularidade específica da prestação de trabalho que se traduz no manuseamento de dinheiro ou valor, caracterizando-se e justificando-se como um subsídio  destinado a indemnizar funcionários e agentes pelas despesas e riscos inerentes a tal manuseamento que é suscetível de gerar falhas contabilísticas em operações de tesouraria.

Ora, tendo em conta que a autora desempenhou efetivamente funções de pagamento e recebimento de numerário e outros valores, de forma regular ao longo de toda a execução do contrato (recebendo as mensalidades das escolas de formação, fazendo depósitos bancários e pagamentos, recebendo quotizações dos sócios e os preços dos equipamentos que vende, pondo em caixa os pagamentos, registando as receitas e despesas, tendo a seu cargo as operações da caixa, verificando se as importâncias que recebia correspondiam aos documentos contabilísticos, registando esses movimentos, e preenchendo cheques bancários para serem assinados pelos legais representantes da R.), entende-se que a mesma tem efetivamente direito a receber o subsidio para falhas previsto no PRT para os trabalhadores administrativos publicada no BTE, 1ª série, nº 9, de 8.3.1996, art.º 12º, nível VIII da tabela de renumerações mínimas constante do anexo IV, PRT para os trabalhadores administrativos, BTE, 1ª série, nº 48, de 29.12.2002, art.º 10º, nível VIII da tabela de renumerações mínimas constante do anexo III, Portaria que aprova o regulamento de condições mínimas para os trabalhadores administrativos, BTE, 1ª série, nº 27, de 22.7.2006, BTE nº 26, de 15.7.2018, art.º 10º, nível IX da tabela de renumerações mínimas constante do anexo II, Portaria de condições de trabalho para trabalhadores administrativos, BTE nº 26, de 15.7.2018, art.º 10º, nível IX da tabela de renumerações mínimas constante do anexo II, Portaria 182/18 de 22.6., art.º 10º, nível IX da tabela de renumerações mínimas constante do anexo II e Portaria 411-A/2019, de 31.12., art.º 10º, nível IX da tabela de renumerações mínimas constante do anexo II).

Deve assim a ré à autora a título de abono para falhas a quantia de € 6.514,81€, calculada nos seguintes termos:

(…)

Nestes termos, conclui-se que clube réu deve à autora a título de abono para falhas a quantia de € 6.514,81, nos termos acima expostos – a cujo pagamento será também condenado.

*

*

*

v) da falta de pagamento das diuturnidades:

Sustenta a autora na sua petição inicial que depois do dia 1 de Agosto de 2003 e até hoje a categoria profissional da A. nunca mais deixou de ser a de primeira-escriturária ou assistente administrativa de 1ª, conforme passou sucessivamente a ser designada tal categoria, pelo que desde então passou a ter direito a 1 diuturnidade por cada 3 anos de serviço até ao limite de 5 (1.8.2003-1ª; 1.8.2006-2ª; 1.8.2009- 3ª; 1.8.2012-4ª; 1.8.2015-5ª até à atualidade), correspondente a 3% da retribuição dos níveis constantes das tabelas de remunerações mínimas previstas na PRT para os trabalhadores administrativos.

Reclama por isso a quantia total de € 10.927,60, a título de diuturnidades nunca pagas.

Como refere António Monteiro Fernandes (in Manual de Direito do Trabalho, 13.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2006, p. 225/226), “na fórmula mais usual, o sistema de diuturnidades visa compensar as dificuldades de progresso do trabalhador no seu estatuto socio-profissional», o que sucede nos casos de categorias sem acesso obrigatório ou de promoção condicionada (progressão não automática, por não directamente imposta pelo decurso do tempo), apresentando-se os acréscimos que representam as diuturnidades expressamente referidos a certa categoria de uma carreira profissional e calculados em função da correspondente remuneração, caso em que, nitidamente, se destinam «a ser consumidos pelo aumento de retribuição de posterior promoção», reportando-se, então, os acréscimos à «antiguidade na categoria”.

Ora, conforme resulta da matéria de fato provada, depois do dia 1 de agosto de 2003 e até hoje a categoria profissional da A. nunca mais deixou de ser a de primeira-escriturária ou assistente administrativa de 1ª, conforme passou sucessivamente a ser designada tal categoria.

Assim sendo, a autora tem efetivamente direito a 1 diuturnidade por cada 3 anos de serviço até ao limite de 5 ( 1.8.2003-1ª; 1.8.2006-2ª; 1.8.2009- 3ª; 1.8.2012-4ª; 1.8.2015-5ª até à atualidade), correspondente a 3% da retribuição dos níveis constantes das tabelas de remunerações mínimas previstas na PRT para os trabalhadores administrativos, BTE, 1ª série, nº 48, de 29.12.2002, art.º 11º, nível VI da tabela de renumerações mínimas constante do anexo III, Portaria que aprova o regulamento de condições mínimas para os trabalhadores administrativos, BTE, 1ª série, nº 27, de 22.7.2006, BTE nº 26, de 15.7.2018, art.º 12º, nível VII da tabela de renumerações mínimas constante do anexo II, Portaria de condições de trabalho para trabalhadores administrativos, BTE nº 26, de 15.7.2018, art.º 12º, nível VII da tabela de renumerações mínimas constante do anexo II, Portaria 182/18 de 22.6., art.º 12º, nível VII da tabela de renumerações mínimas constante do anexo II e Portaria 411-A/2019, de 31.12., art.º 12º, nível VII da tabela de renumerações mínimas constante do anexo II).

Terá, pois, direito a receber, a título de diuturnidades não pagas, a quantia total de €10.927,60, assim calculada:

(…)

E assim sendo, conclui-se que clube réu deve à autora a título de diuturnidades a quantia de € 10.927,60, nos termos acima expostos – a cujo pagamento será igualmente condenado.

Perfaz assim o montante total em dívida à autora a título de diferenças salariais, abono para falhas e diuturnidades a quantia global de €45.407,21.”- fim de citação.

O Réu recorrente não se conforma com esta decisão.

Vejamos, então, se lhe assiste razão.

Conforme resulta do disposto no artigo 517.º do CT:

 <<1. Quando circunstâncias sociais e económicas o justifiquem, não exista associação sindical ou de empregadores nem seja possível portaria de extensão, pode ser emitida portaria de condições de trabalho.

2. A portaria de condições de trabalho só pode ser emitida na falta de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho negocial>>.

Era idêntica a redação do artigo 578.º do CT de 2003 e o disposto no artigo 36.º do DL 519-C1/79, de 29/12.

Por outro lado, resulta da matéria de facto provada que em 1983 foi concedido ao clube Réu o estatuto de utilidade pública desportiva que se mantém, clube que é associado da Associação de Futebol de ... e da Federação Portuguesa de Futebol, entidades dotadas de utilidade pública.

Acresce que, com interesse para o caso em apreciação foram publicadas as seguintes portarias:

- PRT para os trabalhadores administrativos publicada no BTE n.º 26, de 15/07/1992 e cuja Base I dispunha o seguinte:

<<1 – A presente portaria é aplicável, no território nacional, a todas as entidades empregadoras que tenham ao seu serviço trabalhadores cujas funções correspondam às de qualquer das profissões ou categorias profissionais constantes dos anexos referidos na base III, bem como a estes trabalhadores, salvo o disposto no n.º 3 e na base seguinte, sem prejuízo do disposto no n.º 4.

2 — A presente portaria é, designadamente, aplicável aos trabalhadores referidos no número anterior que prestem serviço em empresas privadas, cooperativas e públicas ou de capitais públicos, sem prejuízo do disposto no respectivo regime legal e nos estatutos de cada uma delas, e em associações sindicais e patronais e outras associações que eu não tenham por fim o lucro económico.

3 – A presente portaria não é aplicável aos trabalhadores que prestem serviço a partido políticos nem a pessoas colectivas de direito privado e utilidade pública cuja tutela seja exercida por membros do Governo não subscritores.

4 – Por despacho do Ministro do Emprego e da Segurança Social, proferido após parecer do membro do Governo que exerça a respectiva tutela, pode ser determinada a aplicação da presente portaria a pessoas colectivas de direito privado e utilidade pública excecionadas no número anterior.>> - sublinhado nosso.

- A PRT publicada no BTE n.º 26, de 15/07/1993 que manteve a mesma redação dos n.ºs 3 e 4 da Base I quanto ao seu âmbito.

- A PRT publicada no BTE n.º 43, de 22/11/1994 que não alterou a Base I das supra mencionadas.

- A PRT publicada no BTE n.º 9, de 08/03/1996 que revogou as anteriores supra mencionadas, constando do seu artigo 1º:

<<1 – A presente portaria é aplicável, no território nacional, a entidades patronais que tenham ao seu serviço trabalhadores cujas funções correspondam a profissões ou categorias profissionais constantes do anexo I, bem como a estes trabalhadores.

2 – A presente portaria é, designadamente aplicável a cooperativas e a empresas públicas e de capitais públicos, sem prejuízo do disposto no respectivo regime legal e nos seus estatutos, a fundações, associações sindicais e patronais e outras associações sem fim lucrativo.

3 — São excluídos do âmbito da presente portaria:

a) Os partidos políticos;

b) As entidades patronais que exerçam actividade económica pela qual se possam filiar em associações patronais legalmente constituídas à data da publicação da presente portaria;

c) As relações de trabalho abrangidas por regulamentação colectiva convencional ou administrativa, publicada ou já apresentada para depósito à data da publicação da presente portaria.

4 — A presente portaria é, no entanto, aplicável às relações de trabalho referidas na alínea b) do n.º 3 sempre que uma associação patronal não proceda à eleição de corpos gerentes nos últimos seis anos, bem como a relações de trabalho referidas na alínea c) do mesmo número, depois do período mínimo de vigência da convenção colectiva, desde que esta não possa ser revista por causa da extinção de associação sindical ou patronal outorgante ou quando a segunda não proceda à eleição de corpos gerentes nos últimos seis anos.

5 – Por despacho da Ministra para a Qualificação e o Emprego pode ser determinada a aplicação da presente portaria a pessoas colectivas de direito privado e utilidade pública cuja tutela seja exercida por um membro do Governo que a não subscreve e após parecer desse membro do Governo.>> - sublinhado nosso.

- A PRT publicada no BTE n.º 44, de 29/11/1996, com efeitos a partir de 01/01/1996, que não alterou a redação do artigo 1º da anterior publicada no BTE nº 9, de 08/03/1996.

- O mesmo ocorreu com as PRT publicadas no BTE nº 35, de 22/09/1997, com efeitos a partir de 01/01/1997; no BTE n.º 2, de 22/09/1997; no BTE n.º 31, de 22/08/1999; no BTE n.º 34, de 15/09/2000 e no BTE n.º 35, de 22/09/2001.

- A PRT publicada no BTE n.º 48 de 29/12/2002 que revogou as anteriores publicadas no Boletim do Trabalho e Emprego n.º 9, de 8 de Março de 1996, e suas alterações, publicadas no mesmo Boletim do Trabalho e Emprego n.ºs: 35, de 22 de setembro de 1997, 31, de 22 de agosto de 1999, 34, de 15 de setembro de 2000, e 35, de 22 de setembro de 2001 (artigo 16.º), estabelecendo o seu artigo 1.º:

<<1 — A presente portaria é aplicável, no território nacional, a entidades empregadoras que tenham ao seu serviço trabalhadores cujas funções correspondam a profissões constantes do anexo I, bem como a estes trabalhadores.

2 — A presente portaria é designadamente aplicável a empresas públicas e de capitais públicos, sem prejuízo do disposto no regime legal e nos estatutos respectivos, a cooperativas, fundações, associações sindicais e patronais e outras associações sem fim lucrativo.

3 — São excluídos do âmbito da presente portaria:

a) Os partidos políticos;

b) As entidades empregadoras que exerçam actividade económica pela qual se possam filiar em associações patronais legalmente constituídas à data da publicação da presente portaria;

c) As relações de trabalho abrangidas por regulamentação colectiva de trabalho convencional ou administrativa, publicada ou já apresentada para depósito à data da publicação da presente portaria.

4 — A presente portaria é, no entanto, aplicável a relações de trabalho em que sejam parte entidades empregadoras referidas na alínea b) do n.º 3 sempre que a associação patronal não proceda à eleição de corpos gerentes nos últimos seis anos, bem como a relações de trabalho referidas na alínea c) do mesmo número, depois do período mínimo de vigência da convenção colectiva, desde que esta não possa ser revista por causa da extinção de associação sindical ou patronal outorgante ou quando a segunda não proceda à eleição de corpos gerentes nos últimos seis anos.

Posto isto, tendo em conta o âmbito de aplicação das portarias supra definido, facilmente se conclui que com a PRT publicada no BTE n.º 9, de 08/03/1996 que revogou as anteriores supra mencionadas, deixou de estar prevista de forma explícita a exclusão no sentido de que a portaria não é aplicável aos trabalhadores que prestem serviço a pessoas coletivas de direito privado e utilidade pública cuja tutela seja exercida por membros do Governo não subscritores mantendo-se, no entanto, na mesma que: <<por despacho da Ministra para a Qualificação e o Emprego pode ser determinada a aplicação da presente portaria a pessoas colectivas de direito privado e utilidade pública cuja tutela seja exercida por um membro do Governo que a não subscreve e após parecer desse membro do Governo.>>.

Ora, independentemente de outras considerações que se poderiam tecer a propósito da abolição da citada exclusão, por um lado, e da manutenção do citado despacho, por outro, certo é que, não resulta dos autos que a PRT publicada no BTE n.º 9, de 08/03/1996 tenha sido alvo do citado despacho do ministro do emprego.

Por outro lado, a PRT publicada no BTE n.º 44, de 29/11/1996, com efeitos a partir de 01/01/1996, foi assinada pelo secretário do desporto, sob a tutela do Ministro adjunto

E o mesmo ocorreu com a PRT publicada no BTE n.º 35, de 22/09/1997, com efeitos a partir de 01/01/1997 que se encontra assinada pelo secretário de estado do desporto, sob a tutela do Ministro adjunto.

Acontece que, pese embora se acompanhe a sentença recorrida quando na mesma se refere que não é aplicável a PRT publicada no BTE n.º 9, de 08/03/1996, no que diz respeito ao ano de 1995, atento o estatuto de utilidade pública desportiva de que beneficia o clube (o que nem foi posto em causa) e que o clube réu não é excluído do âmbito de aplicação da referida portaria por ser uma associação de direito privado dotada de utilidade pública, atenta a revogação operada pela PRT publicada no BTE n.º 48, de 29/12/2002, quanto aos restantes anos não nos podemos ficar por aqui.

Na verdade, dispunha o n.º 1 do artigo 36.º do DL n.º 519-A1/79, de 29/12, que: <<nos casos em que seja inviável o recurso à portaria de extensão prevista no artigo 29.º, poderá ser emitida pelos Ministros do Trabalho e da tutela ou responsável pelo sector de actividade uma portaria de regulamentação de trabalho (…)>>.

E estabelecia o artigo 577.º do CT de 2003, que <<compete ao Ministro responsável pela área laboral e ao Ministro da tutela ou ao Ministro responsável pelo sector de actividade a emissão de regulamentos de condições mínimas, nos termos dos artigos seguintes>>.

E, hoje, por força do disposto no n.º 1 do artigo 518.º do CT (Lei n.º 7/2009, de 12/02): <<São competentes para a emissão de portaria de condições de trabalho o ministro responsável pela área laboral e o ministro responsável pelo sector de atividade>>.

Acresce que, quanto à competência e procedimento para emissão destas portarias é subsidiariamente aplicável o Código do Procedimento Administrativo (n.º 4 do artigo 514.º do CT, ex vi do n.º 6 do artigo 516.º do mesmo código e n.º 4 do artigo 576.º do CT, ex vi do n.º 5 do artigo 579.º do mesmo Código.)

Como refere Maria do Rosário Palma Ramalho[2], <<a portaria de condições de trabalho é o conjunto de normas criadas ela Administração, para a regulamentação heterónoma e ex nuovo das situações jurídicas laborais.

(…)

O objectivo essencial deste tipo de portarias é estabelecer a regulamentação laboral colectiva em áreas económicas ou sectores de actividade vedadas à contratação colectiva ou situações em que, podendo haver contratação colectiva, não há associações sindicais ou de empregadores.

(…)

A competência para a emissão da portaria de condições de trabalho é uma competência conjunta do ministro responsável pela área laboral e do ministro do sector de actividade (art. 518º nº 1).

Ao contrário do que sucedeu com a portaria de extensão, a lei não optou, pois, pela singularização da competência para a emissão destes instrumentos, mantendo antes uma solução de responsabilidade alargada através da intervenção de dois Ministérios. É a solução que melhor se adequa ao papel residual da portaria de condições de trabalho no sistema de regulamentação colectiva e à especial ponderação que deve estar associada à respectiva emissão, uma vez que se trata de criar uma regulamentação colectiva ex nuovo.>>

Assim sendo, parece não existirem dúvidas de que a competência para a emissão de uma portaria de condições de trabalho é uma competência conjunta do ministro responsável pela área laboral e do ministro responsável pelo sector de atividade em causa.

Por outro lado, conforme resultava do artigo 123.º, n.º 1, g), do CPA de 1991 e resulta hoje do artigo 151.º do CPA, devem constar do ato administrativo, além do mais, <<a assinatura do autor do ato ou do presidente do órgão colegial que o emana>>, sendo nulos os atos a que falte qualquer dos elementos essenciais (artigo 133.º do CPA de 1991).

Pois bem, compulsadas as citadas portarias publicadas nos BTE n.º 9, de 08/03/1996; n.º 44, de 29/11/1996, com efeito a partir de 01/01/1996; n.º 35, de 22/09/1997, com efeitos a partir de 01/01/1997; n.º 2, de 15/01/1999; n.º 31, de 2/08/1999; n.º 34, de 15/09/2000; n.º 35, de 22/09/2001; n.º 48, de 29/12/2002; n.º 3, de 22/01/2004; n.º 43, de 22/11/2005; n.º 27, de 22/07/2006 e as Portarias n.º 1636/2007, de 31/12/2007;  n.º 1548/2008, de 31/12/2008; n.º 1068/2010, de 19710/2010; n.º 210/2012, de 12/07/2012; n.º 382/2015, de 26/10/2015; n.º 182/2018, e 22/06/2018 e n.º 411-A/2019, de 31/12/2019, conclui-se que apenas as publicadas nos BTE n.º 44 de 1996 e n.º 35 de 1997 foram subscritas/assinadas pelo secretário de estado do desporto sob tutela do ministro adjunto. Todas as restantes não têm na sua emissão qualquer intervenção do ministro que tutela a área do desporto, área de atividade em causa.

Na verdade, conforme resulta das leis orgânicas dos respetivos Governos constitucionais de 1995 a 2019 (DL 296-A/95, DL 474-A/99, DL 120/2002, 215-A/2004, DL 79/2005, 321/2009, DL 86-A/2011, DL 249-A/2015, DL 251-A/2015 e DL 169-B/2019), a área do desporto foi tutelada pelo Ministro Adjunto (de 1995 a 2004), pelo Ministro da Presidência (de 2005 a 2011), pelo Ministro Adjunto e dos Assuntos Parlamentares (de 2011 a 2015), pelo Ministro da Presidência (em 2015) e pelo Ministro da Educação (de 2015 a 2019). 

Assim, uma vez que as PRT ou portarias de condições de trabalho supra enunciadas não se encontram subscritas, como deviam, pelo ministro responsável pelo setor de atividade em causa (do desporto), nos termos previstos nos citados normativos da LRCT e dos Códigos do trabalho de 2003 e de 2009, não podem produzir os respetivos efeitos normativos na relação laboral existente entre o Réu e a A. (são ineficazes relativamente ao R.).

Face ao que ficou dito, assiste razão ao Réu recorrente quando alega que as PRT ou PCT para os trabalhadores administrativos emitidas ao abrigo dos citados preceitos, não são aplicáveis a todos os trabalhadores administrativos, mas apenas àqueles que desempenhem funções nos setores tutelados ou da responsabilidade dos ministros que as subscrevem.

Assim sendo, a A. apenas tem direito às diferenças salariais peticionadas respeitantes aos anos de 1996 e 1997, por força do disposto nas PRT publicadas no BTE n.º 44, de 29/11/1996, com efeitos a partir de 01/01/1996 e no BTE n.º 35, de 22/09/1997, com efeitos a partir de 01/01/1997, sendo certo que esta última só foi revogada pela PRT publicada no BTE n.º 48 de 29/12/2002.

Desta forma, uma vez que resultou provado que:

No ano de 1996 o salário mensal pago foi de € 272,30 mas por força do disposto na tabela anexa à citada PRT de 1996, o escriturário de terceira deveria receber a quantia mensal de € 331,70, a A. tem direito à diferença de € 59,40 x 14 = € 831,60.

No ano de 1997 o salário mensal pago foi de € 282,80 mas por força do disposto na tabela anexa à citada PRT de 1997, o escriturário de terceira deveria receber a quantia mensal de € 344,17, a A. tem direito à diferença de € 61,37 x 14 = € 859,18.

No ano de 1998 o salário mensal pago foi de € 293,80 mas por força do disposto na tabela anexa à citada PRT de 1997, o escriturário de terceira deveria receber a quantia mensal de € 344,17, a A. tem direito à diferença de € 50,37 x 14 = € 705,18.

No ano de 1999 o salário mensal pago foi de € 305,76 mas por força do disposto na tabela anexa à citada PRT de 1997, o escriturário de terceira deveria receber a quantia mensal de € 344,17, a A. tem direito à diferença de € 38,41 x 14 = € 537,74.

No ano de 2000 o salário mensal pago foi de € 318,20 mas por força do disposto na tabela anexa à citada PRT de 1997, o escriturário de terceira deveria receber a quantia mensal de € 344,17, a A. tem direito à diferença de € 25,97 x 14 = € 363,58.

No ano de 2001 o salário mensal pago foi de € 334,20 mas por força do disposto na tabela anexa à citada PRT de 1997, o escriturário de terceira deveria receber a quantia mensal de € 344,17, a A. tem direito à diferença de € 97 x 14 = € 139,58.

No ano de 2002 o salário mensal pago foi de € 348,00, pelo que, sendo superior ao fixado na PRT de 1997 esta já não é aplicável.

Os montantes das retribuições mínimas fixadas nas tabelas anexas às citadas PRT de 1996 e 1997, são superiores aos valores peticionados pela A. para os respetivos anos de 1996 e 1997, no entanto, tendo em conta o disposto no artigo 74.º do CPT, ou seja, que estamos perante a aplicação à matéria de facto provada de preceitos inderrogáveis de instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, no caso, do direito à retribuição que é irrenunciável na vigência do contrato, deve ocorrer a condenação extra vel ultra petitum.

A A. peticiona, ainda, o pagamento do abono para falhas e de diuturnidades, no entanto, como já referimos, a PRT publicada no BTE n.º 9, de 08/03/1996 que previa nos seus artigos 12.º e 13.º, respetivamente, o direito àquele abono e a diuturnidades, não é aplicável à relação laboral existente entre a A. e o Réu e, por isso, a A. não tem direito às quantias peticionadas a estes títulos.

Resta dizer que não tendo sido impugnada a matéria de facto, a este tribunal está vedada a reapreciação da mesma e, consequentemente, o alegado pela A. recorrida no sentido da inversão do ónus da prova, sendo certo, no entanto, que não é o facto de no quadro de pessoal se remeter para um determinado BTE que torna uma PRT ou PCT constante do mesmo aplicável a uma determinada relação laboral. 

Em suma, o Réu deve à A. a quantia total € 3.436,86, a título de diferenças salariais respeitantes aos anos de 1996 a 2001, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, a contar desde a data dos vencimentos das quantias parcelares supra enunciadas e até integral e efetivo pagamento. 

Procedem, assim, em parte, as conclusões do recorrente.

                                                             *

Na parcial procedência das conclusões formuladas pelo Réu recorrente, impõe-se a revogação da sentença recorrida em conformidade.

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                                                             *                                                        

(…)

                                                                         *

                                                             *

V - DECISÃO

Nestes termos, sem outras considerações, na parcial procedência do recurso, acorda-se em revogar a sentença recorrida, condenando-se o Réu B. a pagar à A. A. a quantia total de € 3.436,86 (três mil quatrocentos e trinta e seis euros e oitenta e seis cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, a contar desde a data dos respetivos vencimentos e até integral e efetivo pagamento

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                                                             *

Custas a cargo do R. recorrente e da A. recorrida, na proporção do decaimento, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário que foi conferido.

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                                                             *

                                                                                          Coimbra, 2022/01/14

                                                                                                            _____________________

                                                                                            (Paula Maria Roberto)

                                                                                         ____________________

                                                                                              (Ramalho Pinto)

                                                                                               ____________________                                                                                                                                                                                                                          (Felizardo Paiva)

                                                                                                                                                                                                                                                               


[1] Relator – Paula Maria Roberto
  Adjuntos – Ramalho Pinto
                      Felizardo Paiva

[2] Tratado de Direito do Trabalho, Parte III, Situações Laborais Colectivas, edição atualizada, Almedina, pág. 381 e segs.