Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
54/19.6T8PNH.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: VÍTOR AMARAL
Descritores: UNIÃO DE FACTO
CESSAÇÃO
ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA
Data do Acordão: 11/17/2020
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DA GUARDA - PINHEL - JUÍZO C. GENÉRICA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS.473, 474, 479, 1672 CC
Sumário: 1. - Na união de facto, os unidos não estão juridicamente vinculados ao cumprimento dos deveres conjugais previstos na lei para o casamento (art.ºs 1672.º e segs. do CCiv.), por o regime da união de facto não o prever, não equiparando, neste âmbito, as uniões de facto ao casamento civil, nem sendo o regime específico deste aplicável àquelas.

2. - A ação por enriquecimento sem causa depende da verificação de um enriquecimento à custa de outrem, que careça de causa justificativa, por nunca a ter tido ou por a ter perdido, tornando-se, assim, injusto e inaceitável para o direito, correndo o respetivo ónus da prova contra o demandante.

3. - Tendo o réu vivido em união de facto com a autora, de quem tem duas filhas menores, durante mais de nove anos, e apurando-se que nesse tempo de vida em comum juntos contribuíram para a economia doméstica e para a aquisição de diverso património imobiliário, compartilhando as responsabilidades financeiras do agregado, trabalhando a autora com o companheiro na atividade agropecuária deste, para além de assegurar as lides domésticas e familiares comuns, concorrendo, assim, para o auferir de rendimentos que integravam o acervo financeiro da união, para além de assegurar sozinha a habitação onde juntos residiam, tudo no pressuposto da permanência/subsistência dessa união, ocorre enriquecimento injustificado do réu – por cessação da causa (união de facto) justificativa para a deslocação patrimonial operada –, se este fez exclusivamente seu tal património imobiliário.

4. - Em tal caso, não demonstrado que o preço dos imóveis adquiridos foi suportado com fundos levados pelo réu para o âmbito da união, tem a autora direito, no quadro do enriquecimento sem causa, a receber do ex-companheiro de vida metade do valor (com referência ao preço pago) desse património imobiliário, alcançado no tempo de vivência em comum.

Decisão Texto Integral:









Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra:

I – Relatório

A (…), com os sinais dos autos,

intentou ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra

J (…), também com os sinais dos autos,

pedindo que:

a) Se declare que todos os prédios rústicos, urbanos, veículos, alfaias agrícolas e bens descritos nos art.ºs 16.º, 18.º, 19.º e 20.º da petição inicial são compropriedade de A. e R. em partes iguais; ou, caso assim não se entenda,

b) Se declare que foi constituída uma sociedade entre A. e R., desde 2008 até 2017, cujo património são os bens descritos naqueles art.ºs 16.º e 18.º a 20.º, num valor total de € 68.790,00;

c) Condenando-se o R. no pagamento à A. do valor de metade do património da sociedade, cujo montante se cifra em € 34.395,00; ou ainda

d) Se declare que o R. enriqueceu à custa da A. em, pelo menos, o valor de € 34.395,00;

e) Condenando-se tal R. no pagamento à A. do valor de € 34.395,00.

Mais requereu que, com base na sentença a proferir, seja ordenado o cancelamento do registo feito exclusivamente a favor do R. ou de qualquer outro que eventualmente venha a fazer-se e que incida sobre os prédios urbanos e rústicos descritos no art.º 16.º da petição.

Para tanto, alegou, em síntese, que:

- tendo a A. vivido em união de facto com o R. desde agosto de 2008 até janeiro de 2018, do qual se encontra separada desde então – união de que nasceram duas filhas –, nesse tempo de vida em comum juntos contribuíram para a economia doméstica e para a aquisição de património (móvel e imóvel), o qual, apesar de registado a favor do R. e na posse dele, pertence a ambos;

- juntos adquiriram esse património, considerando-se ambos proprietários de todos os bens e comportando-se como tal, sendo, porém, que após a separação a A. quis fazer partilhas, ao que o R. não correspondeu;

- A. e R. compartilhavam as responsabilidades financeiras familiares em comunhão de vida, sendo que a A. sempre trabalhou, contribuindo para o acervo financeiro da união, para além de assegurar as lides domésticas comuns;

- com a separação ficou dissolvida a união e, em consequência, a sociedade, implicando a divisão dos seus bens e tendo em conta que a contribuição de cada sócio ocorreu em partes iguais, razão pela qual também a divisão deve ser em partes iguais (a A. declarada comproprietária na proporção de metade de cada um dos imóveis, veículos e alfaias identificados), ou ser condenado o R. no pagamento à A. do valor de metade do património da sociedade (€ 34.395,00), ou, assim não se entendendo, ser reconhecido que o R. enriqueceu à custa da A., pelo menos no valor de € 34.395,00, equivalente a metade do património angariado por ambos no âmbito da união.

Contestou e reconveio o R.:

- defendendo-se por impugnação, negando, nomeadamente, que a A. tivesse contribuído para a aquisição do património a que alude, o qual é pertença do R., assim concluindo pela improcedência da ação;

- quanto ao pedido reconvencional, invocou que, no período de vivência em comum, emprestou à A. diversas quantias em dinheiro, destinadas à aquisição de bens próprios dela, de que a mesma beneficiava de forma exclusiva e que fez integrar no seu património pessoal, tendo-se aquela obrigado a uma restituição faseada, ao longo do tempo da união, o que não fez, apesar das solicitações do Reconvinte;

- por isso, a Reconvinda é devedora da quantia de € 13.991,59, sendo que, caso se entenda que os contratos de mútuo do valor de € 8.000,00 e € 3.491,59 padecem de vício de forma, deverá proceder à sua repetição sem acréscimo de quaisquer juros.

Concluiu, por isso, pela condenação da Reconvinda a pagar-lhe aquela quantia de € 13.991,59, acrescida de juros de mora, à taxa supletiva legal, desde a notificação da reconvenção e até efetivo pagamento.

A A./Reconvinda replicou, concluindo pela total improcedência da reconvenção e por dever declarar-se que o R. lhe deve o montante de € 30.000,00 – a título de rendas de casa, pelos dez anos em que residiu em casa da A. –, com condenação em conformidade, a que acrescem juros desde a citação até pagamento efetivo e integral, ou então ser efetuada compensação de créditos entre ambos.

Realizada audiência prévia, foi admitida a reconvenção, considerando-se, porém, inadmissível a ampliação do pedido em sede de réplica, e foi proferido despacho saneador, dispensando-se a fixação do objeto do litígio e dos temas de prova.

Foi realizada a audiência final, seguida da prolação de sentença ([1]), que, decidindo de facto e de direito, julgou totalmente improcedente a reconvenção e parcialmente procedente a ação, com o seguinte dispositivo:

«a) Condena-se o réu (…) a pagar à autora (…) a quantia de € 23.095,00 (vinte e três mil e noventa e cinco euros).

b) Julga-se totalmente improcedente o pedido reconvencional deduzido pelo Réu e, em consequência, absolve-se a Autora dos pedidos formulados.

(…)

d) Absolve-se o Réu do demais peticionado.» (destaques retirados).

Inconformado com o assim decidido, veio o R. interpor recurso, apresentando alegação, culminada com as seguintes

(…)

Este foi admitido como apelação, com efeito meramente devolutivo e subida imediata, tendo sido ordenada a remessa do processo a este Tribunal ad quem, onde foi mantido tal regime recursivo.

Nada obstando, na legal tramitação, ao conhecimento do mérito do recurso, cumpre apreciar e decidir.

II – Âmbito do Recurso

Sendo o objeto do recurso delimitado pelas respetivas conclusões, pressuposto o objeto do processo delimitado em sede de articulados – como é consabido, são as conclusões da parte recorrente que definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso ([2]), nos termos do disposto nos art.ºs 608.º, n.º 2, 609.º, 620.º, 635.º, n.ºs 2 a 4, 639.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil em vigor (doravante, NCPCiv.), o aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26-06 –, importa saber:

a) Se, a ser admissível a impugnação da decisão da matéria de facto, ocorre erro de julgamento nesse âmbito, devendo alterar-se as respostas impugnadas;

b) Se, por força dessa alteração fáctica, ou por razões de ordem jurídica, deve alterar-se a decisão de direito, em termos de improcedência da ação (absolvição do R./Recorrente quanto ao pagamento da quantia pecuniária em que foi condenado, por não se verificarem os pressupostos do instituto do enriquecimento sem causa, aplicado à cessação da vida em comum, após longa união de facto).

III – Fundamentação

          A) Impugnação da decisão de facto

1. - O R./Apelante não se conforma com a decisão da matéria de facto, recaindo a sua discordância sobre o juízo positivo do Tribunal recorrido quanto aos pontos 14, 19, 21 e 22 da factualidade dada por provada (a dever ser julgada como não provada) e, por outro lado, relativamente ao juízo negativo acerca da al.ª P) dos factos dados como não provados (cuja factualidade deveria ser julgada provada) – cfr. conclusões recursivas 4.ª e 5.ª.

A contraparte, por seu lado, pugna pela inexistência de qualquer erro de julgamento de facto e, desde logo, pela rejeição da impugnação da decisão de facto, por invocada falta de transcrição dos excertos considerados relevantes da prova gravada.

Ora, começando por esta última parte, dir-se-á que a transcrição dos excertos considerados relevantes da prova gravada não é obrigatória, tratando-se, apenas, de uma faculdade, que a parte recorrente pode, livremente, exercer ou não, sem que o respetivo não exercício, assim, lhe determine qualquer desvantagem ou prejuízo.

Com efeito, o que é obrigatório, neste âmbito, sob pena de rejeição do recurso na parte respetiva, é a indicação, pelo recorrente, com exatidão das passagens da gravação em que se funda o recurso, “sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes” [cfr. art.º 640.º, n.º 2, al.ª a), do NCPCiv.].

Assim sendo, claro se torna que a transcrição de excertos da gravação é meramente facultativa.

E, da leitura das conclusões do Apelante também se torna evidente que foi cumprido o disposto no art.º 640.º, n.º 1, al.ªs a) a c), do NCPCiv., termos e que motivos não existem para rejeição liminar da impugnação da decisão da matéria de facto, da qual, por isso, deve conhecer este Tribunal ad quem, o que se fará de imediato.

2. - Os impugnados pontos 14, 19, 21 e 22 têm o seguinte teor:

«14. No período compreendido entre 2008 e 2018, A. e R. em conjunto e com o rendimento conseguido fruto do trabalho dos dois e da sua vida conjunta, compraram os seguintes prédios: (…) ([3]).

(…)

19. Todos os bens referidos foram comprados enquanto A. e R. viveram em união de facto e com o dinheiro que ambos ganhavam na agricultura onde ambos trabalhavam, em conjunto, totalizando os bens imóveis o valor de € 46.190,00.

(…)

21. O dinheiro que sobrava após o pagamento das despesas ou era depositado na conta titulada apenas pelo R. ou guardado em casa.

22. Foi com o fruto do trabalho e do dinheiro ganho por A. e R., e depositado nessa conta, ou guardado em casa, que compraram os prédios, os veículos e alfaias descritos nos pontos 14, 16 e 17 sendo todas as aquisições realizadas com dinheiro de ambos.».

Já a mencionada al.ª P) apresenta a seguinte redação:

«p) Os bens mencionados nos pontos 14, 16 e 17 dos factos provados foram adquiridos com uma parte de dinheiro de que o réu já dispunha quando começou a viver na casa da A. na outra, fruto do seu trabalho, prestado apenas por si no exercício da atividade agrícola e pecuária e outra que, primeiro os seus pais, e depois a sua mãe, lhe foram dando ao longo do tempo.».

A questão de facto a esclarecer prende-se, assim, essencialmente, com saber se os ditos bens adquiridos (imóveis, mas também, como invocado, alguns móveis, tais como “veículos e alfaias”) foram comprados com “o dinheiro que ambos ganhavam na agricultura onde ambos trabalhavam, em conjunto” ou, ao invés, com dinheiro exclusivamente angariado pelo R. (por já dispor de parte dele aquando do início da união, por ter ganho outra parte fruto do seu exclusivo trabalho agrícola e pecuário e ainda por doações de seus pais).

Argumenta o impugnante, para além da invocação de prova testemunhal concreta e por declarações de parte da A./Apelada, de que caberá conhecer, que uma pobre agricultura de interior não permitiria angariar, em apenas nove anos e quatro meses de trabalho, o suficiente para apurar € 46.190,00, tendo em conta que era ainda necessário sustentar um agregado de quatro pessoas (os litigantes e as suas duas filhas, uma nascida em março de 2003 e a outra em agosto de 2007).

Na sentença expendeu-se assim:

«Os pontos 14 e 15 da matéria de facto dada como provada assentaram na análise da prova documental junta aos autos e supra mencionada. Quanto ao valor dos bens imóveis o Tribunal ateve-se ao mencionado quanto ao preço nas respectivas escrituras, pois de acordo com as regras da experiencia comum, normalmente o valor aí mencionado até é por vezes inferior ao que foi efectivamente pago e nenhuma prova foi produzida no sentido de este estar inflacionado (alínea c).

(…)

Os pontos 19 a 26 dos factos provados resultaram, essencialmente, do depoimento de parte da autora que descreveu de forma credível a dinâmica familiar, o trabalho conjunto desenvolvido, o destino dos proventos desse trabalho de ambos e o papel que cada um desempenhava na economia familiar, igualmente confirmada, de forma coerente e não contraditória, pelo depoimento das testemunhas já supra mencionadas a propósito dos pontos 5 a 13. Com efeito trabalhando a Autora e Réu conjugadamente na actividade agrícola, os proventos que retiravam dessa actividade eram destinados a suportar as despesas do agregado e o que sobrava era amealhado pelo réu em conta própria e de era o único titular, sendo ele que geria todas as receitas e subsídios atribuídos. E não se diga que os subsídios eram só dele, que o dinheiro já existia antes, pois se existia como alegou o réu, nenhuma prova produziu nesse sentido (alínea p)), ao invés, a versão da autora é que obteve respaldo na prova produzida que conjugada com as regras da experiencia comum permitem antever que a sua versão é sustentada na globalidade da prova produzida e estás de acordo com a normalidade do acontecer. Não se nos afigura possível sustentar como pretende o réu que todos os imoveis adquiridos resultaram exclusivamente do seu labor, do seu esforço laboral e financeiro (alínea o) e q). Todas as aquisições resultaram igualmente e na mesma medida do contributo do trabalho agrícola desenvolvido pela autora a par do réu, que sem dúvida sempre existiu. E também não se diga que os prédios de onde provinham tais proventos eram do pai do réu e que este dava dinheiro ao réu, pois se assim sucedia tal factualidade atenta a falta de isenção com que depôs a mãe do réu não obteve amparo em mais nenhum meio de prova. Ademais, não vislumbramos em que medida o facto de “amanharem” um prédio do pai do réu, impedia que o dinheiro resultante da venda de gado, ou dos produtos que produziam não fosse da A. e do R. Claramente o argumento apresentado pelo réu não pode merecer credibilidade pois, ao invés do que sustentou, o que resultou demonstrado é que depois do seu pai falecer assitiu-se a um incremento da actividade, como na percepção da testemunha (…) ocorreu.» ([4]).

Vejamos, então, desde logo, se das provas convocadas pelo R./Apelante decorre claramente que os bens aludidos foram adquiridos com dinheiros exclusivamente por si angariados, seja por já deles dispor, em parte, no início da união, por os ter ganho sozinho, noutra parte, ou seja por doações de seus pais, ainda noutra parte.

Começando pelo depoimento da testemunha M (…), tia por afinidade do R. (como consta da ata de fls. 66 v.º do processo físico), resulta da respetiva gravação ter esta dito que o R. é agricultor, sempre o tendo sido (antes ajudava os pais), sendo que eles tinham diversos prédios e animais, bem como máquinas agrícolas e alfaias, tendo o R. ficado com a casa agrícola do pai após a morte deste (minutos 02,32 a 03,49 e 04,05 a 04,31).

A testemunha M (…)pessoa amiga do R., disse que aquele, tal como o seu pai, sempre tiveram prédios e gado (vacas), bem como máquinas agrícolas (designadamente, ceifeira e enfardadeira, bem como trator), passando o R. a assegurar a atividade (agrícola e pecuária) após a morte do pai (minutos 02,00 a 02,44, 03,11 a 03,20 e 03,36 a 05,34).

Passando à testemunha M (…), mãe do R., referiu que o filho trabalhava na agricultura, sendo que o filho, quando foi viver com a A., “já tinha tudo o que tem agora”, tendo terrenos que comprou, recebendo subsídios (minutos 07,49 a 09,43).

Já a testemunha P (…), primo do R., disse que este sempre vem trabalhando na agricultura (“toda a vida o conheceu como agricultor”, primeiro com o seu pai e, após a morte deste, continuando a exploração do progenitor, com tratores, alfaias, máquinas), sendo que enfarda, ceifa, tem gado; esclareceu que o R. já tinha terrenos e equipamentos/máquinas agrícolas quando iniciou o seu relacionamento com a A. (minutos 01,18 a 02,03, 02,11 a 03,25 e 03,49 a 04,14).

Invoca ainda o Recorrente o depoimento de parte da A., sendo, porém, que da ata da respetiva sessão de audiência final nada consta quanto a registo de qualquer confissão que houvesse sido prestada (cfr. ata de fls. 62 e v.º e art.º 463.º, n.º 1, do NCPCiv.).

Ainda assim, ouvida a gravação do respetivo depoimento (minutos 02,49 a 03,49), referiu a A. que o R. já era agricultor aquando do início do relacionamento em comum (já o era com o seu pai).

De toda esta prova conclui o Recorrente estar demonstrado que aquando do começo da vivência em comum com a A. já se dedicava havia largo tempo à atividade agropecuária, dispondo de terrenos, próprios ou dos pais, bem como de máquinas, alfaias agrícolas e animais. O que – diga-se desde já – está em conformidade com esta prova convocada e até, de algum modo, com o próprio facto do ponto 4 do acervo provado.

Acrescenta que é “notório e do conhecimento geral” que a agricultura da zona “é uma forma de empobrecer alegremente”, sendo de todo impossível que A. e R., durante apenas 9 anos e 4 meses de trabalho, conseguissem apurar/lucrar, assegurando o seu próprio sustento e o das filhas, o montante líquido de € 46.190,00 para adquirir os referidos prédios.

Todavia, se se dividir esse montante por dois (admitindo que ambos, A. e R., contribuíram, a seu modo, para a economia comum, também, pois, para a obtenção de rendimentos, ajudando a A. nas lides agropecuárias, como logo resulta dos factos provados 5 e 6, não impugnados, e assegurando ela as domésticas de todo o agregado, como se alcança do facto 7, também não impugnado, incluindo as duas filhas menores comuns), obtém-se o montante de € 23.095,00. E, dividindo-o por nove anos (por defeito), obtém-se o valor anual de € 2.566,11, correspondente a € 213,84 por mês (€ 2.566,11 : 12 = € 213,84).

Valor este (o de € 213,84 mensais) que não se afigura, salvo o devido respeito, exagerado para quem tem a seu cargo aquelas tarefas, sem esquecer que o agregado (incluindo, pois, o R. e as filhas menores) vivia numa casa de habitação pertença da A., permitindo a poupança quanto a eventuais custos de habitação (rendas ou empréstimo bancário para aquisição de casa própria).

Assim se compreende, pois, que se tenha dado como provado que as aquisições objeto de impugnação foram conseguidas com o esforço de ambos, isto é, em termos monetários, com o dinheiro resultante da atividade/labor de ambos, posto ambos a ela se dedicarem em comum.

Perspetiva esta não inviabilizada pelo facto de o R. já dispor de terrenos anteriormente ao início do relacionamento com a A., posto todos os imóveis em causa terem sido adquiridos na constância da união entre ambos (especificamente, entre os anos de 2010 e 2017), sendo, por outro lado, que nada mostra, em concreto – designadamente, as provas convocadas pelo impugnante –, que os discutidos móveis sejam de aquisição anterior ao início da vida em comum, ao que acresce – decisivamente – que estes (móveis) não foram considerados para o cômputo do montante a satisfazer.

Também nada mostra, do mesmo modo, que as aquisições tenham sido suportadas com dinheiro que o R. já houvesse obtido anteriormente, ou com fundos fruto exclusivo do seu trabalho ou sequer mediante doações de seus pais.

Donde que, ouvida nesta 2.ª instância a gravação da prova pessoal, não se evidencie qualquer erro de julgamento de facto nos termos pretendidos pelo impugnante, consabido que a Relação, mais limitada na imediação face a tal prova pessoal do que a 1.ª instância, apenas deve “alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa” (art.º 662.º, n.º 1, do NCPCiv., com destaques aditados).

Haverá, todavia, de corrigir-se um erro/lapso na redação do facto 14, parte inicial: é que foi dado como provado que “A. e R. em conjunto (…) compraram os seguintes prédios”, quando, diversamente, resulta das respetivas escrituras/títulos de compra e venda que apenas o R. ali figura como outorgante comprador (cfr. documentos de fls. 17 e segs. do processo físico).

Donde que não possa subsistir que “em conjunto compraram” quando, comprovadamente, só o R. outorgou nos respetivos títulos de compra, só ele tendo declarado comprar (e só a ele tendo sido declarado vender).

Assim, improcedendo, embora, a empreendida impugnação da decisão da matéria de facto (quanto aos diversos pontos concretamente questionados), determina-se a correção daquele erro/lapso, passando a redação do facto 14 a ser a seguinte:

«14. No período compreendido entre 2008 e 2018, o R., com o rendimento conseguido fruto do trabalho dos dois (R. e A.) e da sua vida conjunta com a A., comprou os seguintes prédios:

a) Em 27 de Janeiro de 2016, o prédio urbano, destinado a casa de habitação, composta por 2 pisos, sito no Lugar (...) , limite da freguesia de (...) , inscrita na matriz da dita freguesia sob o artigo 1030, descrita na Conservatória do Registo Predial sob o nº 2715/20150625, a confrontar de Norte com caminho Publico, Sul com herdeiros de (...) , Nascente com (...) l, Poente com Estrada, pelo preço de € 32.140,00 euros;

b) Em 27 de Janeiro de 2016, um prédio urbano destinado a arrecadação e arrumos, composto por 1 piso, sito no lugar do (...) , inscrito na matriz da dita freguesia sob o artigo 1312, descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o nº 2790/20160127, a confrontar (…), pelo preço de € 5.490,00 euros;

c) Em 18 de Abril de 2013, um prédio rustico composto por terreno de lameiro e pastagem, sito no lugar de (...) , limite da freguesia de (...) , inscrito na matriz da dita freguesia sob o artigo 1953, descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o nº1205/19990617, a confrontar (…), pelo preço de 5.000,00 euros;

d) Em 2 de Junho de 2017 um prédio rustico composto por terra de regadio, vinhas e fruteiras, sita no lugar de (...) , limite da freguesia de (...) , inscrito na matriz da dita freguesia sob o artigo 2076, descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o nº 2099, a confrontar (…), pelo preço de € 330,00 euros;

e) Em 2 de Junho de 2017, um prédio rustico composto por terreno de sequeiro, pinhal e pastagem, sito no lugar de (...) , limite da Freguesia de (...) , inscrito na matriz da dita freguesia sob o artigo 2078, descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o nº 2100/20090805, a confrontar (…), pelo preço de € 730,00 euros.

f) Em 9 de Novembro de 2010, um prédio rustico composto por terra de regadio, pastagem, vinha e fruteiras, sito no lugar da (...) , limite da Freguesia de (...) , inscrito na matriz da dita freguesia sob o artigo 3601, descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o nº 2172/20091210, a confrontar (…), pelo preço de 2.500,00 euros;».

B) Quadro fáctico dado como provado

1. - Sindicada já a decisão da matéria de facto plasmada na sentença recorrida, é o seguinte o factualismo julgado provado:

«1. A. e R. começaram a namorar em data não concretamente apurada mas anterior ao ano de 2003, encontravam-se diariamente e desse relacionamento nasceram duas filhas:

a) A (…), nascida a 6 de Março de 2003;

b) V (…), nascida a 22 de Agosto de 2007;

2. Após a morte da mãe da A, que aconteceu a 17 de Agosto de 2008, A. e R. passaram a viver maritalmente, como se de marido e mulher se tratassem, na casa que a A. herdou de sua mãe, partilhando casa, cama e mesa, desde 18 de Agosto de 2008 até Janeiro de 2018, altura em que se separaram.

3. A A. antes de viver maritalmente com o R. trabalhava na D (…) empresa sediada na cidade da (...) .

4. O R. dedicava-se à agricultura cultivando terrenos e detinha uma exploração de gado na localidade de J (…), freguesia de (...) , concelho de (...) .

5. A partir da data em que encetaram a vida em comum, a A. começou a trabalhar na agricultura em conjunto com o R.

6. Era a A. quem se deslocava ao fornecedor de rações para os animais, adubos e outros produtos para o gado e para os terrenos que agricultavam em conjunto, para aí fazer as compras necessárias a essa exploração, solicitando os produtos, rubricando e pagando as facturas dos produtos que levava.

7. Além do trabalho que desenvolvia na exploração agrícola, a A. ainda cuidava da casa, das lides domésticas, confecionava as refeições e cuidava das filhas de ambos.

8. A A. não tinha um salário.

9. As despesas da vida agrícola, da vida doméstica, do casal eram satisfeitas com os rendimentos que os dois, com o seu trabalho, retiravam dessa mesma actividade agrícola.

10. Desse rendimento, que obtinham os dois em conjunto e fruto do trabalho dos dois, pagavam todas as despesas tais como electricidade, água, gasóleo, gás, impostos e produtos agrícolas necessários a exploração.

11. A A. nunca teve conta conjunta com o R., nem nunca o exigiu ou reclamou, uma vez que trabalhavam em conjunto, como se de uma só pessoa se tratasse, e confiava no Réu.

12. Tinham em conjunto duas filhas e desde 2008 passaram a viver maritalmente, pelo que a A. nunca achou necessário, nem nunca exigiu uma conta sua, ou exigiu que também fosse titular da conta onde eram depositados os rendimentos conseguidos na actividade agrícola, bem como os subsídios que recebiam, pois mantinha com o réu uma relação e um projecto de vida em comum.

13. O réu, no decurso da vivência comum entre ambos, nunca negou qualquer dinheiro à A. para os gastos domésticos, profissionais e familiar de ambos, não se justificando também por esta razão a abertura de uma conta em nome dos dois ou só dela, uma vez que esta tratava o dinheiro como seu.

14. No período compreendido entre 2008 e 2018, o R., com o rendimento conseguido fruto do trabalho dos dois (R. e A.) e da sua vida conjunta com a A., comprou os seguintes prédios:

a) Em 27 de Janeiro de 2016, o prédio urbano, destinado a casa de habitação, composta por 2 pisos, sito no Lugar (...) , limite da freguesia de (...) , inscrita na matriz da dita freguesia sob o artigo 1030, descrita na Conservatória do Registo Predial sob o nº 2715/20150625, a confrontar (…) pelo preço de € 32.140,00 euros;

b) Em 27 de Janeiro de 2016, um prédio urbano destinado a arrecadação e arrumos, composto por 1 piso, sito no lugar do (...) , inscrito na matriz da dita freguesia sob o artigo 1312, descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o nº 2790/20160127, a confrontar (…),pelo preço de € 5.490,00 euros;

c) Em 18 de Abril de 2013, um prédio rustico composto por terreno de lameiro e pastagem, sito no lugar de (...) , limite da freguesia de (...) , inscrito na matriz da dita freguesia sob o artigo 1953, descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o nº1205/19990617, a confrontar (…), pelo preço de 5.000,00 euros;

d) Em 2 de Junho de 2017 um prédio rustico composto por terra de regadio, vinhas e fruteiras, sita no lugar de (...) , limite da freguesia de (...) , inscrito na matriz da dita freguesia sob o artigo 2076, descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o nº 2099, a confrontar (…) pelo preço de € 330,00 euros;

e) Em 2 de Junho de 2017, um prédio rustico composto por terreno de sequeiro, pinhal e pastagem, sito no lugar de (...) , limite da Freguesia de (...) , inscrito na matriz da dita freguesia sob o artigo 2078, descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o nº 2100/20090805, a confrontar (…)pelo preço de € 730,00 euros.

f) Em 9 de Novembro de 2010, um prédio rustico composto por terra de regadio, pastagem, vinha e fruteiras, sito no lugar da (...) , limite da Freguesia de (...) , inscrito na matriz da dita freguesia sob o artigo 3601, descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o nº 2172/20091210, a confrontar (…)  pelo preço de 2.500,00 euros [ALTERADO];

15. Os referidos prédios encontram-se apenas inscritos a favor do Réu.

16. A. e R. compraram com as economias que ambos conseguiram, fruto do trabalho de ambos, os seguintes veículos:

a. Um Mercedes Benz

b.. Um Opel Astra

c. Um Citroen Berlingo

d. Um tractor agrícola,

e. Uma máquina “retro escavadora”

f. Um reboque.

17. Adquiriram também diversas alfaias agrícolas, nomeadamente:

a. Um espalhador.

b. Um pulverizador/sulfatador.

c. Uma alfaia de malhar.

d. Uma grade de discos.

18. Compraram ainda uma “moita de lenha” para revenda pelo preço de € 5.000,00 (cinco mil euros).

19. Todos os bens referidos foram comprados enquanto A. e R. viveram em união de facto e com o dinheiro que ambos ganhavam na agricultura onde ambos trabalhavam, em conjunto, totalizando os bens imóveis o valor de € 46.190,00.

20. As despesas do agregado familiar, fossem elas de alimentação, vestuário, saúde, educação ou assistência dos filhos e de ambos eram pagas da conta bancária em nome do R.

21. O dinheiro que sobrava após o pagamento das despesas ou era depositado na conta titulada apenas pelo R. ou guardado em casa.

22. Foi com o fruto do trabalho e do dinheiro ganho por A. e R., e depositado nessa conta, ou guardado em casa, que compraram os prédios, os veículos e alfaias descritos nos pontos 14, 16 e 17 sendo todas as aquisições realizadas com dinheiro de ambos.

23. Por comum acordo deram de renda o imóvel descrito no ponto 14 a. dos factos provados;

24. O imóvel descrito no ponto 14 b. destinada a armazém e arrecadação era utilizada para a guarda das alfaias e produtos agrícolas do casal.

25. E os restantes prédios eram destinados a pasto para o gado e ao cultivo de produtos agrícolas.

26. Da compra dos imóveis mencionados no ponto 14, e da exploração dos mesmos, por ambos, resultou proveito para ambos, sendo o rendimento depositado em conta titulada apenas pelo réu.».

2. - E persistem julgados como não provados os seguintes factos:

«a) Após iniciarem a vida em comum, a A. obrigada, influenciada e motivada pelo R. deixou de trabalhar na D (…)

b) Os bens mencionados em 7 dos factos provados referem-se a bens destinados ao R. mas entregues à A. num momento em que aquele estava fora de casa daquela, a trabalhar no campo, estando por isso o próprio impossibilitado de as receber.

c) Os valores atribuídos aos bens imóveis e aos móveis elencados nos pontos 14, 16 e 17 dos factos provados estão absolutamente inflacionados e desconformes com o seu valor real e atual.

d) A vivência de A. e R. entre 2008 e 2028 não foi contínua nem pacífica.

e) Pelo menos por 4 ocasiões, o R. saiu de casa da A. e passou a residir em casa de sua mãe, na localidade (…)

f) Onde chegou a estar por vezes durante períodos de 6 meses.

g) A A. deixou de trabalhar na D(…) por vontade própria.

h) A A. não trabalhava habitualmente com o R. na agricultura.

i) Apenas o acompanhando nas idas ao campo de forma pontual durante cerca de 2/3 horas, uma ou duas vezes por mês.

j) Mas sem efetivar, de forma exaustiva, quaisquer trabalhos agrícolas ou de pecuária.

k) A. a maior parte do tempo a cuidar da casa e a tratar das duas filhas comuns então ambas de menor idade.

l) Era o R. que, com o seu exclusivo labor, tratava os campos e o efetivo pecuário.

m) Era com produto do exclusivo trabalho do Réu que este, providenciava pela aquisição dos necessários bens destinados à alimentação, vestuário, despesas de saúde da A. e das filhas de ambos e suportava o custo com os consumíveis despendidos na casa de residência de todos como fossem energia elétrica, gaz, água, combustíveis, impostos e telecomunicações entre outros.

n) O veículo mercedes-benz adquirido tinha a matrícula (...) , e tinha o valor de 2.000,00 e as demais características e valores dos bens móveis identificados nos pontos 16 e 17 dos factos provados.

o) Os bens mencionados nos pontos 14, 16 e 17 dos factos provados foram adquiridos com dinheiro da exclusiva propriedade do R.

p) Os bens mencionados nos pontos 14, 16 e 17 dos factos provados foram adquiridos com uma parte de dinheiro de que o réu já dispunha quando começou a viver na casa da A. na outra, fruto do seu trabalho, prestado apenas por si no exercício da atividade agrícola e pecuária e outra que, primeiro os seus pais, e depois a sua mãe, lhe foram dando ao longo do tempo.

q) Todo o património do R. foi conseguido a suas exclusivas expensas.

r) Nunca pretendeu a A. fazer qualquer partilha de algo que bem sabia não ser seu.

s) O R. nunca lhe reconheceu tal direito, pela simples razão de que nunca existiu qualquer património ou proventos comuns.

t) No período em que A. e R. viveram juntos, o R. emprestou-lhe diversas quantias em dinheiro destinadas a adquirir bens próprios, dela A., de que a mesma beneficiava de forma exclusiva e que fez integrar no seu património pessoal.

u) Assim, em 01/04/2002 emprestou-lhe a quantia de 3.491,59 € (três mil, quatrocentos e noventa e um euros e cinquenta e nove cêntimos) destinado à aquisição de um veículo automóvel marca “Fiat” modelo “Punto”, adquirido à pessoa coletiva A (…)Ldª, com sede no (...) , em (...) , que fez sua propriedade exclusiva.

v) No ano de 2010 emprestou-lhe a quantia de 8.000,00 € (oito mil euros) para adquirir aos seus quatro irmãos, à razão de 2.000,00 € para cada um, a respetiva quota hereditária na parte da casa de residência dela A. para que esta ficasse só de sua propriedade.

x) Já em 06/11/2017 emprestou-lhe ainda a quantia de 2.500,00 € (dois mil e quinhentos euros) relativa à aquisição de 4 janelas, 4 portadas e 2 portas feitas à pessoa coletiva J (…) LDª com sede em (...) , do município de (...) , que colocou na sua casa de residência nas (...) .

z) A A. obrigou-se para com o R., ora reconvinte, a entregar-lhe tais quantias de forma faseada, ao longo do tempo em que vivessem juntos.

aa) Com a cessação da união de facto o R. por diversas vezes lhe solicitou o pagamento de tais quantias.».

C) Substância jurídica do recurso

Da obrigação de restituição por enriquecimento sem causa

Inalterado, no essencial, o quadro fáctico da sentença, cabe agora saber se deve alterar-se a decisão de direito, em termos de integral improcedência da ação, com revogação da sentença condenatória proferida, por ausência total de obrigação de restituição das quantias pecuniárias peticionadas, face à inexistência de enriquecimento sem causa, na sua pretendida aplicação à cessação da vida em comum, após prolongada união de facto entre A. e R..

Pretende o R./Apelante – recorde-se – que, não tendo a A. contribuído para as aquisições patrimoniais alcançadas, nada lhe é devido, antes tendo sido ele, sozinho, a suportar o esforço financeiro de tais aquisições (preços pagos exclusivamente com dinheiros seus, fosse por terem sido obtidos anteriormente ao início da vivência em comum, fosse por resultarem do seu exclusivo trabalho, fosse até por lhe haverem sido doados por seus pais, isto é, em qualquer caso, sem a menor contribuição da A./Apelada).

Para assim sustentar, fundava-se o Recorrente na sua impugnação da decisão de facto, confiado no sucesso da mesma, de molde a alcançar a almejada alteração de factos essencial à decisão da causa.

Porém, não logrou obter essa alteração, subsistindo incólume, no essencial, o factualismo julgado provado – e o não provado – do quadro fáctico da sentença em crise.

Com efeito, a alteração de pormenor operada no facto 14 do elenco provado, quanto à identidade de quem figurou como adquirente nas compras imobiliárias realizadas – matéria que logo resulta evidenciada da prova documental junta aos autos –, sem prejuízo do modo e esforço de angariação de fundos para pagamento do respetivo preço, em nada belisca a solução encontrada para o caso, sendo, pois, de sufragar, nesta parte, a fundamentação jurídica adotada na decisão recorrida.

É que, no âmbito do instituto do enriquecimento sem causa, trata-se da verificação quanto a um injusto locupletamento, por destituído de causa justificativa, de uma parte à custa do património da outra, com o decorrente dever de restituição daquilo com que injustamente se enriqueceu – compreendendo tudo quanto se obteve à custa do empobrecido ou, não sendo possível a restituição em espécie, o valor correspondente (cfr. art.ºs 473.º e 479.º, ambos do CCiv.) –, independentemente da prática de um qualquer facto culposo ([5]).

Assim, o enriquecimento sem causa depende (cumulativamente) da verificação da existência de (i) um enriquecimento, (ii) que seja obtido à custa de outrem, (iii) faltando uma causa justificativa.

Em sede de enriquecimento sem causa, é pacífico que a vantagem em que o enriquecimento ([6]) se manifesta pode traduzir-se no evitar de uma despesa – por exemplo, evitar pagar certo montante de renda de casa por se utilizar uma casa de que se não paga renda ou de que se paga uma renda abaixo do valor locativo –, mas também na aquisição de um novo direito ou no acréscimo de valor de um direito já existente – a propriedade de um bem ou “a mais-valia trazida a um prédio por trabalhos nele efectuados” ([7]).

Essa vantagem, auferida por um sujeito, por repercutida no seu património, tem sempre de ocorrer para que haja enriquecimento sem causa, sendo suportada por outrem, com inerente, por regra, diminuição patrimonial, a qual pode traduzir-se, por exemplo, numa renda que se não cobra. Todavia, pode até “não se verificar qualquer efectivo empobrecimento”, já que “… o instituto abrange situações em que a vantagem adquirida por uma pessoa não resulta de um correspondente sacrifício económico sofrido por outra – diminuição patrimonial ou simples privação de um aumento –, embora se haja produzido a expensas desta, à sua custa. Recordem-se, por exemplo, certos casos de uso de coisa alheia sem prejuízo algum para o proprietário” ([8]).

Ponto é que o enriquecimento – à custa de outrem – se verifique e careça de causa justificativa, ou por nunca a ter tido ou por a ter perdido ([9]), tornando-se, por isso, injusto e, como tal, inaceitável para o direito ([10]) ([11]).

Imprescindível é ainda a ausência de outro meio jurídico – se a lei não faculta ao empobrecido outro meio de ser indemnizado ou restituído –, pois que estamos perante obrigação com natureza subsidiária, como resulta do art.º 474.º do CCiv. ([12]).

A obrigação de restituir abrange, segundo o preceituado no art.º 479.º do CCiv., tudo quanto o enriquecido obteve à custa do empobrecido ou, não sendo possível a restituição em espécie, o correspondente valor em dinheiro (n.º 1), não podendo, porém, exceder-se a medida do locupletamento efetivo (n.º 2), do enriquecimento patrimonial obtido, nem o montante do empobrecimento do lesado, se inferior àquele.

Na sentença, quanto aos contornos do caso, exarou-se assim:

«Demonstrou-se que A. e R. namoraram desde data não concretamente apurada mas anterior ao ano de 2008, encontravam-se diariamente e desse relacionamento nasceram duas filhas no decurso do ano de 2003 e de 2007 e que após a morte da mãe da A, esta e o R. passaram a viver maritalmente, como se de marido e mulher se tratasse, na casa que a A. herdou de sua mãe, partilhando casa, cama e mesa, desde 18 de Agosto de 2008 até Janeiro de 2018, altura em que se separaram. (…) em determinado momento a A. começou a trabalhar na agricultura em conjunto com o R., (…) dedicando-se ainda para além deste labor na exploração agrícola, a cuidar da casa, das lides domésticas, refeições e cuidar das filhas de ambos. Acresce que se demonstrou que a autora não recebia qualquer quantia fixada como remuneração do esforço do seu trabalho, não tinha um salário, mas as despesas da vida agrícola, da vida doméstica, do casal eram satisfeitas com os rendimentos que os dois, com o seu trabalho em conjunto, retiravam dessa mesma vida agrícola, e assim pagavam todas as despesas (…). No mais apurou-se que a A. nunca teve conta conjunta com o R, nem nunca o exigiu ou reclamou, uma vez que trabalhavam em conjunto, como se de uma só pessoa se tratasse, confiando a A no Réu, até por terem em conjunto duas filhas viviam juntos desde 2008 (…).

Ademais demonstrou-se que com o dinheiro que sobrava dessa forma de vida comum e trabalho de ambos, foram adquiridos diversos bens imóveis e móveis tendo-se apurado que, no entanto, o réu procedeu ao registo dessa aquisição apenas em seu nome.

(…) os bens foram adquiridos enquanto A e R viveram em união de facto e com o dinheiro que ambos ganhavam na agricultura onde ambos trabalhavam, em conjunto, totalizando os bens imóveis o valor de € 46.190,00, sendo que as despesas do agregado familiar (…) eram pagas da conta bancária em nome do R., onde também era depositado o dinheiro que sobrava após o pagamento das despesas ou era guardado em casa. Foi com o fruto do trabalho e do dinheiro ganho por A e R, e depositado nessa conta, ou guardado em casa, que compraram os prédios, os veículos e alfaias descritos nos pontos 14, 16 e 17 sendo todas as aquisições realizadas com dinheiro de ambos. (…) Dessa aquisição e exploração, por ambos, resultou proveito para ambos, pois a A. mantinha com o réu uma relação e um projecto de vida em comum que se desmoronou em Janeiro de 2018.

(…) a causa justificativa para a deslocação patrimonial operada, entretanto, deixou de existir, devido à supressão posterior desse fundamento, a união de facto e o projecto comum de vida e nessa medida impõe-se condenar o réu a restituir à autora metade do incremento patrimonial que obteve com a aquisição com dinheiro de ambos, de bens que registou apenas em seu nome pessoal.

De outro prisma embora se tenha demonstrado a aquisição de diversos bens móveis a autora não logrou provar o quantum indemnizatório a restituir quanto a estes bens, não demonstrando tão pouco a identificação cabal de vários deles.».

A única alteração efetuada pela Relação à matéria de facto disponível teve como simples efeito, quanto à aquisição dos discutidos imóveis, a supressão da expressão “em conjunto compraram”, por só o R. ter outorgado nos respetivos títulos de compra, passando a redação do facto 14 a contemplar que, no período compreendido entre 2008 e 2018 (vivência em comum), o R., com o rendimento conseguido fruto do trabalho de ambas as partes (R. e A.) e da vida conjunta que levaram, comprou os prédios, estes no dito valor/preço global de € 46.190,00.

Desconsiderados, como visto, os bens móveis, veio o R. – proprietário exclusivo dos imóveis adquiridos –, a ser condenado a satisfazer à A., por cessação da causa justificativa para a deslocação patrimonial operada, metade daquele valor, considerado correspondente à sua contribuição com trabalho para os proventos da união.

Não logrou o Apelante demonstrar – nada ressaltando dos factos provados nesse sentido – que a aquisição imobiliária, realizada em tempos de vivência a dois, tenha sido custeada com dinheiros exclusivamente de sua pertença, por ele levados para o âmbito da união de facto (fosse por já os ter obtido antes do início da vivência em comum, ou por os ter angariado sem o concurso da A., por trabalhos exclusivamente seus, ou fosse por lhe terem sido doados pelos seus pais ao longo do tempo).

Em suma, tendo o R./Recorrente vivido em união de facto com a A./Recorrida, de quem tem duas filhas menores, durante um período temporal que se prolongou por mais de nove anos, nesse tempo de vida em comum juntos contribuíram, salvo sempre o devido respeito, para a economia doméstica e para a aquisição daquele património imobiliário, compartilhando as responsabilidades financeiras do agregado, sendo que a A. logrou provar, como lhe competia ([13]), que trabalhava com ele na atividade agropecuária, para além de assegurar as lides domésticas e familiares comuns, contribuindo, assim, para o auferir de rendimentos que integravam o acervo financeiro da união, para além de assegurar sozinha a habitação onde juntos residiam, tudo no pressuposto da permanência/subsistência dessa união.

Por isso, ocorrendo enriquecimento injustificado do R./Recorrente – por cessação da dita causa justificativa para a deslocação patrimonial operada, a união de facto, que veio a dissolver-se –, tem a A. direito, por preenchimento dos pressupostos do instituto do enriquecimento sem causa, a receber dele (seu ex-companheiro de vida) metade do valor do património imobiliário alcançado por tal R. (exclusivamente por este) no tempo de vivência em comum, como concluído na sentença.

Nada, pois, a censurar, no plano jurídico, à decisão em crise, que deve ser mantida, improcedendo, por consequência, as conclusões do Apelante em contrário.

***

IV – Sumário (art.º 663.º, n.º 7, do NCPCiv.):

1. - Na união de facto, os unidos não estão juridicamente vinculados ao cumprimento dos deveres conjugais previstos na lei para o casamento (art.ºs 1672.º e segs. do CCiv.), por o regime da união de facto não o prever, não equiparando, neste âmbito, as uniões de facto ao casamento civil, nem sendo o regime específico deste aplicável àquelas.

2. - A ação por enriquecimento sem causa depende da verificação de um enriquecimento à custa de outrem, que careça de causa justificativa, por nunca a ter tido ou por a ter perdido, tornando-se, assim, injusto e inaceitável para o direito, correndo o respetivo ónus da prova contra o demandante.

3. - Tendo o réu vivido em união de facto com a autora, de quem tem duas filhas menores, durante mais de nove anos, e apurando-se que nesse tempo de vida em comum juntos contribuíram para a economia doméstica e para a aquisição de diverso património imobiliário, compartilhando as responsabilidades financeiras do agregado, trabalhando a autora com o companheiro na atividade agropecuária deste, para além de assegurar as lides domésticas e familiares comuns, concorrendo, assim, para o auferir de rendimentos que integravam o acervo financeiro da união, para além de assegurar sozinha a habitação onde juntos residiam, tudo no pressuposto da permanência/subsistência dessa união, ocorre enriquecimento injustificado do réu – por cessação da causa (união de facto) justificativa para a deslocação patrimonial operada –, se este fez exclusivamente seu tal património imobiliário.

4. - Em tal caso, não demonstrado que o preço dos imóveis adquiridos foi suportado com fundos levados pelo réu para o âmbito da união, tem a autora direito, no quadro do enriquecimento sem causa, a receber do ex-companheiro de vida metade do valor (com referência ao preço pago) desse património imobiliário, alcançado no tempo de vivência em comum.


***

V – Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente a apelação, mantendo, em consequência, a sentença recorrida.

Custas da apelação a cargo do R./Apelante.

Escrito e revisto pelo Relator – texto redigido com aplicação da grafia do (novo) Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (ressalvadas citações de textos redigidos segundo a grafia anterior).
Assinaturas eletrónicas.


Coimbra, 17/11/2020

Vítor Amaral (Relator)

Luís Cravo

Fernando Monteiro


([1]) Datada de 30/04/2020.
([2]) Excetuando questões de conhecimento oficioso, não obviado por ocorrido trânsito em julgado.
([3]) Trata-se de seis imóveis (dois prédios urbanos e quatro rústicos), com a respetiva aquisição a ser assim enunciada:
a) Em 27 de Janeiro de 2016, o prédio urbano, destinado a casa de habitação, composta por 2 pisos, sito no Lugar (...) , limite da freguesia de (...) , inscrita na matriz da dita freguesia sob o artigo 1030, descrita na Conservatória do Registo Predial sob o nº 2715/20150625, pelo preço de € 32.140,00;
b) Em 27 de Janeiro de 2016, um prédio urbano destinado a arrecadação e arrumos, composto por 1 piso, sito no lugar do (...) , inscrito na matriz da dita freguesia sob o artigo 1312, descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o nº 2790/20160127, pelo preço de € 5.490,00;
c) Em 18 de Abril de 2013, um prédio rustico composto por terreno de lameiro e pastagem, sito no lugar de (...) , limite da freguesia de (...) , inscrito na matriz da dita freguesia sob o artigo 1953, descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o nº1205/19990617, pelo preço de 5.000,00 euros;
d) Em 2 de Junho de 2017 um prédio rustico composto por terra de regadio, vinhas e fruteiras, sita no lugar de (...) , limite da freguesia de (...) , inscrito na matriz da dita freguesia sob o artigo 2076, descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o nº 2099, pelo preço de € 330,00;
e) Em 2 de Junho de 2017, um prédio rustico composto por terreno de sequeiro, pinhal e pastagem, sito no lugar de (...) , limite da Freguesia de (...) , inscrito na matriz da dita freguesia sob o artigo 2078, descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o nº 2100/20090805, pelo preço de € 730,00.
f) Em 9 de Novembro de 2010, um prédio rustico composto por terra de regadio, pastagem, vinha e fruteiras, sito no lugar da (...) , limite da Freguesia de (...) , inscrito na matriz da dita freguesia sob o artigo 3601, descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o nº 2172/20091210, pelo preço de 2.500,00 euros.
([4]) Já a propósito dos aludidos “pontos 5 a 13” se deixara exarado na justificação da convicção:
«Pese embora o réu e a sua mãe tenham procurado convencer o Tribunal que a Autora não trabalhava de sol a sol na agricultura, não lograram alcançar tal desiderato. A Autora não se limitava esporadicamente a colaborar em tais lides, a autora fazia-o diariamente, tratava da casa, das filhas e tudo o resto, sendo julgada por qualquer aquisição que não estivesse a contento do réu, apenas podendo comprar aquilo que o réu entendia, escrutinando este cada movimento efectuado com o cartão de débito que lhe facultava para ela ir ao supermercado. A Autora num assomo de verdade explicitou quais as suas incumbências, as tarefas que realizava diariamente, o modo de vida, a organização familiar as circunstâncias que rodearam a compra do imóvel identificado em 14.a) e b) dos factos provados. E o seu depoimento foi corroborado de forma objectiva, isenta e coerente pelas testemunhas (…)vizinha, que por vezes até ficava a tomar conta das filhas da A. e R., (…), vizinha que na sua simplicidade referiu “via o andamento”, ouvia os carros a sair, ele primeiro, ela depois de arranjar as meninas e orientar a vida de casa, era “muito trabalhadora”, e recorda no tempo de mais trabalho de os ver chegar do trabalho no campo, trabalhavam ambos nos terrenos do Sr. (…). Também a testemunha (…) relatou que a autora e réu eram seus clientes, ela ia carregar rações para os animais e ele ia pagar. Atento o exposto, e na falta de qualquer prova credível quanto à versão vertida no articulado do réu tivemos por não provada a matéria vertida nas alíneas h), i), j), k),l) e m), pois na verdade resultou provado o seu contrário.».
([5]) Já, por exemplo, na obrigação indemnizatória por responsabilidade civil extracontratual está, diversamente, em causa a reparação de um dano, causado a outrem, decorrente de facto ilícito e culposo, como tal imputável ao lesante (art.º 483.º, n.º 1, do CCiv.).
([6]) Visto como um enriquecimento real ou patrimonial, traduzindo-se este último na “diferença, para mais, produzida na esfera económica do enriquecido e que resulta da comparação entre a sua situação efectiva (situação real) e aquela em que se encontraria se a deslocação se não houvesse verificado (situação hipotética)”, sendo certo que, nesta sede, “a obrigação de restituir se pauta pelo efectivo alcance das vantagens no património do enriquecido” – assim M. J. Almeida Costa, Direito das Obrigações, 11.ª ed., Almedina, Coimbra, 2008, ps. 492 e seg..  
([7]) Cfr. Almeida Costa, op. cit., p. 492.
([8]) Assim Almeida Costa, op. cit., p. 492. Também Pires de Lima e Antunes Varela aludem, neste âmbito, ao uso ou consumo de coisa alheia, como, por exemplo, a instalação em casa alheia (cfr. Código Civil Anotado, vol. I, 4.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 1987, p. 454).
([9]) Cfr., por todos, Almeida Costa, op. cit., p. 499, e Pires de Lima e Antunes Varela, op. cit., p. 454.
([10]) Cfr. ainda o Ac. STJ, de 24/10/2017, Proc. 3712/15.0T8GDM.P1.S1 (Cons. Ana Paula Boularot), em www.dgsi.pt, no sentido de, quer as relações pessoais quer as relações patrimoniais na união de facto não estão sujeitas ao regime específico que o casamento prevê quanto a esta matéria, sendo os seus efeitos a esses níveis diversos dos que provêm do casamento, ficando os patrimoniais sujeitos ao regime geral, sem prejuízo, contudo, do que as partes possam convencionar entre si (v.g, aquisição de bens em conjunto, abertura conjunta de contas bancárias e sua movimentação), sendo que as regras substantivas que regulam as relações entre os cônjuges, bem como entre estes e terceiros, são regras especiais que não compreendem aplicação analógica.
([11]) Como é também consabido, cabe ao autor do pedido de restituição, por enriquecimento sem causa, o ónus da prova dos respetivos factos integradores ou constitutivos, incluindo a falta de causa justificativa desse enriquecimento – cfr. Ac. STJ, de 24/03/2017, Proc. 1769/12.5TBCTX.E1.S1 (Cons. António Piçarra), em www.dgsi.pt.
([12]) Ver ainda Almeida Costa, op. cit., p. 501.
([13]) Cfr., inter alia, o Ac. STJ, de 20/03/2014, Proc. 2152/09.5TBBRG.G1.S1 (Cons. Nuno Cameira), em www.dgsi.pt, em cujo sumário pode ler-se: «A falta de causa do enriquecimento não se basta com a cessação da união de facto; torna-se necessário que o autor alegue e prove que as deslocações patrimoniais se verificaram no pressuposto, entretanto desaparecido, da continuação e subsistência da união de facto.».