Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
4978/16.4T8VIS.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARLOS MOREIRA
Descritores: OBRIGAÇÃO DE INDEMNIZAÇÃO
DANOS FUTUROS
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Data do Acordão: 07/12/2022
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Tribunal Recurso: JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE VISEU DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE VISEU
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE POR MAIORIA
Legislação Nacional: ARTIGOS 494.º, 496.º, N.º 4, E 564.º, N.º 2, TODOS DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: I - Apenas os danos futuros certos ou razoavelmente previsíveis, e não os meramente eventuais ou hipotéticos, são indemnizáveis ao abrigo do artº564º do CC.

II - No caso de mera culpa do lesante, a indemnização/compensação por danos não patrimoniais pode ser fixada, equitativamente, em montante inferior ao que corresponderia aos danos causados -  arº 494º do CC.

III - Assim, para o lesado, de remediada condição económico financeira, acusado de crimes sexuais contra a sua filha, preso preventivamente cerca de dez meses e meio, sem ter recorrido ou pedido a reapreciação da medida de coação, e depois - por inaudibilidade das declarações para memória futura da filha e da recusa desta em depor em julgamento -, ter sido foi absolvido apenas com base no princípio in dúbio pro reo, é  adequada a compensação, a tal título, de dez mil euros.

Decisão Texto Integral:
ACORDAM OS JUIZES NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA

1.

AA intentou contra o Estado Português,  representado pelo Ministério Público, ação declarativa, de condenação, sob a forma de processo comum.

Alegou:

Em .../.../2015, foi detido nos termos do artigo 257º nº 2 alíneas a), b) e c) do Código do Processo Penal e com fundamento na existência de indícios da prática dos crimes de violação (previsto e punido pelo artigo 164º Código Penal) e abuso sexual de menor dependente (previsto e punido pelo artigo 172º Código Penal).

Foi submetido a primeiro interrogatório judicial e, em 17.07.2015, foi-lhe aplicada  a medida de coação de prisão preventiva, tendo o autor nessa data sido conduzido para o Estabelecimento Prisional ... onde se manteve em reclusão ininterrupta até ao dia 03/06/2016, data da sua libertação.

Nesta data  foi proferida sentença  que julgou improcedente a acusação pública e  o absolveu dos crimes que vinha acusado, bem como, declarou extinta a medida de coação de prisão preventiva e determinou a sua libertação.

Esteve  privado da sua liberdade entre os dias .../.../2015 e 03 de junho de 2016 o que perfaz 325 dias de reclusão.

Ocorreu erro nos pressupostos que levaram à aplicação da medida de coação, designadamente as informações prestadas pelo perito médico e pela agente da policia judiciária, o que determina a obrigação do Réu Estado Português a indemnizar o Autor nos termos do artigo 225º nº 1, alínea b) do Código do Processo Penal.

A sua absolvição  resulta de absoluta ausência de prova dos factos ilícitos que lhe foram imputados e, mesmo, da demonstração de que não os praticou, pelo que, a obrigação do Réu Estado Português em indemnizar o Autor funda-se no disposto na alínea c) do nº 1 do artigo 225º, designadamente a comprovação, sem qualquer dúvida, sobre a inexistência dos crimes imputados.

Em consequência da medida de coação aplicada sofreu vários danos de natureza não patrimonial, que descrimina, contabilizando-os em € 200.000,00 (duzentos mil euros), e de natureza patrimonial, pelas perdas de rendimentos e dívidas que acumulou durante o período de reclusão, que contabiliza em € 12.815,00 (doze mil, oitocentos e quinze euros).

Peticionou:

A procedência da ação e a condenação do réu no pagamento da quantia de € 212.815,00, acrescida de juros à taxa legal desde a citação até integral pagamento.

O  Réu contestou.

Disse:

Por exceção alegou que o n.º 2 do artigo 13º da Lei 67/2007 estabelece como pressuposto do pedido de indemnização por erro judiciário a prévia revogação da decisão danosa, através de decisão transitada em julgado de tribunal hierarquicamente superior, não se verificando este pressuposto no caso dos autos.

E que a  medida de coação em causa foi posteriormente mantida por despacho judicial, que não mereceu reação do Autor, sendo a decisão recorrível, pretendendo o Autor, através desta ação, discutir os fundamentos de aplicação a medida de coação, o que nesta sede lhe está vedado pelo caso julgado formado no processo penal.

Em sede de impugnação, defende a proporcionalidade e justeza da medida de coação aplicada, face aos elementos então constantes dos autos e à gravidade dos ilícitos em causa, não se encontrando preenchidos os pressupostos exigidos pelo n.º 1 da norma legal em que o autor assenta a sua pretensão.

Mais contestou os danos invocados pelo autor.

Pediu:

A absolvição do Estado do pedido, por verificação das exceções perentórias invocadas;  se assim se não entender, que se considere o tribunal absolutamente incompetente, quer em razão da hierarquia, quer em razão da matéria, e ser o Réu absolvido da instância; assim não se entendendo, que o Réu seja absolvido da instância por força da exceção dilatória enunciada;  em todo o caso que a ação seja julgada improcedente,  por não provada, e o Estado absolvido do pedido.

O autor respondeu.

Disse que o n.º 2 do artigo 13º da Lei 67/2007 é inaplicável face ao disposto no artigo 225º do Código de Processo Penal;  

Que não pretende discutir os pressupostos da decisão danosa, antes usando da possibilidade que lhe é conferida pela alínea c) do n.º 1 do artigo 225º do Código de Processo Penal, em virtude de o acórdão absolutório proferido ter revelado ter sido injustificada a aplicação da medida de coação em causa, pugnando assim pela improcedência das exceções invocadas pelo réu.

Foi proferido despacho saneador no qual, se decidiu  absolver o réu do pedido.

O STJ confirmou a decisão.

Porém, o Tribunal Constitucional entendeu considerar que a situação dos autos se integra na previsão da norma do artigo 225.º n.º 1, al. c), do CPP, e determinou a baixa dos autos ao Tribunal de 1ª instância para que este, depois de apurar a base factual relevante em função do que foi oportunamente alegado, proferisse decisão sobre o pedido formulado pelo autor.

2.

E prosseguindo o processo os seus termos, foi, a final, prolatada sentença na qual foi decidido:

«Face ao exposto, julgo parcialmente procedente por provada a presente ação, e, em consequência:

1– Condeno o Réu, Estado Português, a pagar ao Autor a quantia de € 17.000,00 (dezassete mil euros), acrescida dos juros de mora, à taxa legal, contado desde a presente data até efetivo e integral pagamento.

2– No mais, absolvo o Réu Estado Português do Pedido.

3 – Custas da ação a cargo do Autor e do Réu, na proporção do respetivo decaimento, nos termos do artigo 527º, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário e sem prejuízo da isenção subjetiva do Réu.»

3.

Inconformadas recorreram ambas as partes, sendo que o autor subordinadamente.

3.1.

Conclusões do réu.

A) O Tribunal “a quo” julgou parcialmente procedente a ação instaurada pelo Autor e, com fundamento no disposto no artigo 225.º, n.º 1, alínea c) do C.P.Penal, condenou o Estado Português no pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais no montante de 17.000,00 €;

 B) O Réu entende que face à factualidade dada como provada o valor da indemnização por danos não patrimoniais se revela desajustado e exagerado;

C) No que concerne aos danos não patrimoniais, o principio é o de que a indemnização deve calcular-se de acordo com a equidade (artigo 496.º, n.º 4, do Código Civil);

D) Nos termos do disposto no artigo 496.º, n.º 1, do Código Civil, “na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade mereçam tutela do direito;

E) Sendo que nos termos do disposto no n.º 4 do citado artigo “o montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º; (…)”;

F) Ainda de acordo com o artigo 494.º do Código Civil, “quando a responsabilidade se fundar na mera culpa, poderá a indemnização ser fixada, equitativamente, em montante inferior ao que corresponderia aos danos causados, desde que o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso o justifiquem”;

G) Face à factualidade provada e ao período de privação sofrida pelo Autor, 325 dias de reclusão, afigura-se-nos que a quantia de 17.000,00 €, atribuída a título de indemnização por danos não patrimoniais se revela exagerada, devendo a mesma alterar-se para valor inferior de acordo com os princípios de equidade e com os critérios seguidos pela jurisprudência;

H) Ao quantificar o valor da indemnização por danos não patrimoniais no montante de 17.000,00 €, o tribunal “a quo”, violou o disposto no artigo 494.º do C.Civil;

I) Devendo de acordo com os critérios de equidade fixar-se a indemnização por danos não patrimoniais em montante que não exceda o valor de 8.000,00 €.

3.2.

Conclusões do autor:

A) o recorrente entende que a indemnização fixada pelo Tribunal “a quo” é excessiva sustentando que o juízo de equidade da Meritíssima Juiz não terá tomado em consideração a limitação da responsabilidade estabelecida no artº 494º do Código Civil.

B) para além desta alegação nenhum outro fundamento é apresentado para sustentar o excesso da indemnização ou o montante de 8.000 € que sugere ser adequado.

C) pelo, parece-nos, que o recurso apresentado pelo recorrido não apresenta fundamentos que determinem a alteração da decisão proferida, em especial a fixação do valor compensatório indicado pelo montante de 8.000 €.

D) por outro lado, parece existir contradição na fundamentação de facto, que deverá resultar de mero lapso, que carece ser rectificado, designadamente quanto aos factos provados indicados nos pontos 1.16, 1.17 e 1.21 sobre a retribuição diária de 40€ que são, também, indicados como não provados nos pontos 2.5, 2.9 e 2.19 que devem ser eliminados.

E) acresce que, encontra-se demonstrada factualidade para fundamentar a declaração do direito a indemnização por dano de natureza patrimonial, designadamente que o recorrido auferia uma retribuição pelo seu trabalho e que estando privado da liberdade deixa de auferir tal rendimento.

F) sendo certo que, mesmo que a prestação de trabalho até ao momento da detenção do recorrido fosse irregular, não existe demonstração de que no futuro não pudesse ser diária.

G) pelo que, existindo a expectativa ou a possibilidade da prestação de trabalho de forma regular todos os dias úteis da semana e pela retribuição de 40 € diários é devido o pagamento da importância de 10.800 € (270 dias x 40 €).

H) relativamente ao dano não patrimonial o recorrido reitera no presente recurso, que a compensação económica devida deve ser adequada a atenuar o sofrimento de 325 dias de reclusão e as memórias que se irão perpetuar durante os restantes dias da sua esperança de vida.

I) considerando que a liberdade, como a vida, é um valor absoluto que, também, realiza a Dignidade Humana, principio fundamental em que assenta a Republica Portuguesa, parece-nos, que a Meritíssima Juiz “a quo” não valorizou suficientemente tais princípios, cfr. artº 1º e 27º da Constituição da República.

J) e, consequentemente, fez uma aplicação dos disposto nos artº 496º nº 1 e 4 e ultima parte do artº 494º do Código Civil que carece ser rectificada no sentido de arbitrar compensação monetária a favor do recorrente próxima do montante que foi peticionado.

K) em consequência, deve ser concedido provimento ao presente recurso e revogada a Douta Decisão recorrida no sentido de declarar o direito de indemnização do recorrente pelos valores peticionados a titulo de danos patrimoniais e não patrimoniais.

3.3.

Contra alegações do réu.

A) O Réu entende que face à factualidade dada como provada o valor da indemnização por danos não patrimoniais se revela desajustado e exagerado;

B) Por maioria de razão e pelos mesmos fundamentos considera que também o valor peticionado pelo Autor é exagerado;

C) Dando-se por reproduzidas as alegações oportunamente apresentadas;

D) No que concerne aos danos patrimoniais, designadamente ao valor dos rendimentos que deixou de auferir, não logrou o Autor provar os danos por ele alegados, e como tal não lhe foi atribuído qualquer valor a esse título;

E) Pelo que, nessa parte, nenhum reparo merece a sentença ora em apreciação;

F) Assim, para a hipótese de o Recurso Subordinado interposto pelo Autor vir a ser apreciado, deverá o mesmo ser totalmente improcedente.

4.

Sendo que, por via de regra: artºs 635º nº4 e 639º  do CPC - de que o presente caso não constitui exceção - o teor das conclusões define o objeto do recurso, a questão essencial decidenda é a seguinte:

Atendibilidade e Quantum dos danos, patrimoniais e não patrimoniais.

5.

Apreciando.

5.1.

Liminarmente.

Tal como alega o autor, os mesmos factos foram dados como provados e não provados nos pontos 1.16, 1.17 e 1.21 (factos provados), e nos pontos 2.5., 2.9 e 2.19 (factos não provados).

Tais factos tem o seguinte teor:

1.16. O Autor sofreu angustia e ansiedade pela indefinição do seu futuro.

1.17. O A. tem uma filha, BB que por sua vez tem uma filha com 7 anos de idade, familiares com quem tem grande proximidade afetiva e, durante o período da sua reclusão ficou privado de afetos da família e convívio social, passando o Natal, o carnaval e a Páscoa privado da família, dos amigos e da liberdade.

1.21. O autor desenvolve atividade profissional como trabalhador agrícola, prestando o seu trabalho a quem o solicita, auferindo a quantia de € 40,00 (quarenta euros) por cada dia inteiro de trabalho.

Existe, pois, contradição da decisão fáctica.

Não obstante o poder de anulação conferido a esta Relação pelo artº 662º nº2 al. c) do CPC, entendemos, até por razões de economia e celeridade processual, que existem nos autos elementos suficientes para sanar este vício nesta instância recursiva.

Assim.

Quanto aos factos 1.17 e 1.21 a julgadora aduziu para eles prova concreta: foram os depoimentos das testemunhas CC, que chegou a dar trabalho ao autor,  BB, filha do autor,  e DD, companheiro desta.

Tais factos foram referidos na decisão de direito, o que inculca a ideia que a Srª juíza os teve por provados.

Aliás, o teor do facto 1.17 resulta inelutável de o autor ter estado detido e, ainda, da normalidade das coisas e da experiência comum.

Destarte, estes factos devem têr-se por provados.

Já o mesmo não acontece com o facto 1.16.

Nenhuma referência probatória relativamente ao mesmo foi efetivada pela julgadora na fundamentação da decisão fática.

E em sede de apreciação jurídica foi mesmo expendido que tal facto não se provou.

Nesta conformidade, a aludida contradição quanto a este facto deve ser resolvida no sentido da sua não prova, devendo ele ser eliminado do acervo factual provado.

5.2.

Por conseguinte, os factos a considerar são os seguintes:

 (Dos factos dados como provados em sede de despacho saneador, já transitados em julgado)

1.1. Em .../.../2015, no âmbito do inquérito 71/15.... da Secção Única do DIAP ..., Comarca ..., o A. Fo detido em cumprimento de despacho de autoridade de policia criminal, com a mesma data, proferido nos termos do artigo 257º nº 2 alíneas a), b) e c) do Código do Processo Penal, e com fundamento na existência de indícios da prática dos crimes de violação (previsto e punido pelo artigo 164º Código Penal) e abuso sexual de menor dependente (previsto e punido pelo artigo 172º Código Penal).

1.2. Em 17/07/2015 o A. foi submetido a primeiro interrogatório judicial no referido processo 71/15...., distribuído pela Instância Central ..., Secção de Instrução Criminal J..., da Comarca ....

1.3. Por despacho proferido no referido ato, em 17/07/2015 foi aplicada ao A. a medida de coação de prisão preventiva, nos seguintes termos: “A detenção do arguido é legal porque efetuada ao abrigo do disposto nos arts. 254º n.º 1 al. a) e 257º, todos do Código de Processo Penal, pelo que valido a mesma. Foi dado cumprimento ao disposto no art. 259º do mesmo diploma legal. O arguido foi apresentado no prazo legal a que se reporta o art. 141º do Código de Processo Penal. Indiciam fortemente os autos que: 1 – EE nasceu em .../.../1998 e é filha de FF e do arguido AA. 2 – Entre os 8 anos e os 13 anos de idade, a EE, devido ao mau ambiente familiar dos progenitores, caraterizado por hábitos no consumo de álcool e agressões mútuas, esteve institucionalizada no Lar ..., na .... 3 – Quando perfez os 13 anos, a EE foi residir com a sua progenitora, em ..., à qual viria a ser atribuída a guarda da menor, ficando, nessa altura, o pai, ora arguido, com direito a visitas à menor, que poderiam ocorrer aos fins-de-semana (quinzenalmente) e nas férias. 4 – Entretanto, ao que tudo indica, devido ao facto de a mãe da menor continuar a beber e de negligenciar alguns cuidados com a menor, esta, em data não concretamente apurada do mês de Maio de 2014, decidiu fugir da casa da mãe, em ..., ligando para o efeito ao arguido, seu pai, para a ir  buscar, o que ele fez. 5 – Desde então, e até à data da detenção do arguido, a menor ficou a residir com ele em ..., ..., tendo tal situação sido comunicada à GNR, à CPCJ ... e ao Tribunal de Família e de Menores, para efeitos de Promoção e Proteção e eventual alteração da Regulação do Poder Paternal. 6 – Passando o arguido, também desde então, a ter a guarda e confiança efetiva da filha, assumindo inclusive o papel de encarregado de educação da EE na Escola Secundária ..., onde a mesma estudou no presente ano letivo, tendo frequentado, recentemente, um Estágio Profissional de CEF, práticas comerciais. 7 – Em data não concretamente apurada mas seguramente entre março e abril de 2015, o arguido, não obstante saber que a EE era sua filha, que tinha apenas 16 anos de idade e bem assim que estava à sua guarda e dependência, quer afetiva quer educacional e económica, confiando igualmente em si, decidiu ter relações sexuais de cópula com a mesma. 8 – Assim, em data não apurada, mas situada entre os primeiros dias do mês de março e o final do mês de abril de 2015, numa das muitas vezes que a menor o acompanhou, para o ajudar, como habitualmente fazia, nos trabalhos agrícolas que levavam a cabo numa quinta que ele cultiva, em ..., ..., afastada do aglomerado habitacional, o arguido, a dada altura, dirigiu-se a um barracão ali existente e chamou-a ao interior do mesmo. 9 – Sem desconfiar das intenções do pai, a EE entrou no barracão, tendo aquele de imediato fechado a porta. 10 – De seguida abeirou-se da filha e começou a encostar-se a ela, roçando o seu corpo no dela, começando a desapertar o cinto das calças que trazia vestidas. 11 – Depois, através da força de braços e contra a vontade e resistência da menor, que fazia força em sentido oposto, o arguido empurrou-a em direção ao chão, baixando-se ele, igualmente nessa direção, agarrando-a pelos braços no sentido de a impedir de se levantar. 12 – Após a ter assim segura no chão, deitou-se com o seu corpo por cima do da filha, começando a beijá-la na boca, não obstante a EE afastar, tanto quanto podia, a sua cara e boca da dele, pedindo-lhe, por várias vezes, para ele parar e que não queria. 13 – Porém, indiferente aos pedidos da filha, o arguido não só continuou a beijá-la, como continuou a forçá-la a ficar deitada no chão, debaixo dele, agarrando-lhe pelos braços que puxava para trás, mantendo-a assim imobilizada, ao mesmo tempo que, com lascívia, lhe dizia “ai filha… ai filha”, acabando por lhe introduzir o pénis ereto na vagina, e friccionando-o diversas vezes até estar prestes a ejacular, altura em que o retirou e ejaculou para o chão. 14 – Após o arguido sair de cima da menor, esta saiu do barracão e foi para casa, não tendo nenhum deles falado o que quer que fosse sobre o sucedido. 15 – Passados alguns dias, igualmente em data não concretamente apurada, mas situada no período de tempo atrás referido, igualmente durante o dia, numa altura em que a EE arrumava o quarto e fazia a cama dele, o arguido, que se encontrava até aí na sala, dirigiu-se àquela dependência e agarrou-a pelos braços, atirando-a sobre a cama e imobilizando-a por debaixo dele, segurando-a com as suas mãos, ora com uma ora com outra ora com ambas. 16 – De seguida, e não obstante lhe pedir que não o fizesse, o arguido indiferente e contra a vontade da filha, introduziu-lhe o pénis ereto na vagina, e aí o friccionou por diversas vezes, até estar prestes a ejacular, altura em que o retirou e ejaculou ao que tudo indica para cima da própria cama ou para o chão. 17 – Depois dessa vez, e até pelo menos à segunda semana do mês de julho de 2015, em número de vezes não concretamente apuradas, mas seguramente não inferior a dez vezes, quer na casa onde apenas os dois residiam, sita na Rua ..., ..., ..., ..., quer no barracão da quinta atrás referida, o arguido, sempre contra a vontade da filha, teve relações de cópula com a mesma, introduzindo-lhe sempre o pénis ereto na vagina que friccionava, até ejacular sempre para fora da mesma. 18 – Dessas vezes o arguido limitava-se a empurrar a filha, designadamente para cima da cama, quando isso acontecia em casa, mas já sem necessidade de a agarrar e imobilizar porque a mesma temia que ele se matasse, pois que a dada altura, não concretamente apurara, lhe passou a dizer “que se contasse a alguém desaparecia” e por isso deixou de se debater e resistir, uma vez que para ela, apesar de tudo, ele é a única pessoa com quem sempre pode contar. 19 – O arguido só não repetiu por mais vezes a conduta atrás descrita, porque em .../.../2015 alguém cuja identidade completa ainda se não apurou, denunciou à GNR do ... a suspeita de envolvimento sexual do arguido com a EE, vindo ele a saber que a filha fora ouvida pela PJ em .../.../2022. 20 – Assim, e embora não sabendo do verdadeiro motivo dessa inquirição, fê-lo refrear a sua atitude, pelo menos até à segunda semana do mês de julho de 2015, altura em que, em dia não concretamente apurado mas situado entre o dia 6 e o dia 11 de julho, ocorreu a última das situações descritas em 17 e 18, de novo no quarto do arguido. 21 - O arguido, em nenhum dos atas sexuais de cópula sexual, havidos com a menor EE e acima referenciados, usou preservativo nem ela utilizava qualquer método contracetivo. 22 – Pelo que a mesma começou a recear poder encontrar-se grávida do arguido, o que no entanto não ocorreu conforme decorre do exame médico cuja informação consta da cota elaborada a fls.111, acabando a EE, no dia 15.07.2015 por contar à sua amiga de escola, GG, o que o pai lhe fazia, amiga essa que, por a encontrar a chorar, a questionou sobre o motivo e, que nesse mesmo dia, a levou à CPCJ ..., onde aquela transmitiu a situação elaborada no relatório de ocorrência de f1s.76 23 - O arguido, com as condutas atrás descritas agiu sempre deliberada, voluntária e conscientemente. 24 - Quis, o que conseguiu sempre, satisfazer os seus instintos libidinosos, apesar de bem saber que o fazia, algumas das vezes, pelo uso da força física e sempre contra a vontade da filha, menor, e em desrespeito e com total indiferença, por ser querida a sua conduta, para o livre e harmonioso desenvolvimento da personalidade daquela na sua esfera de liberdade e de desenvolvimento sexual. 25 - Fê-lo, ainda, aproveitandose, da sua relação de ascendência familiar com a filha sabendo igualmente que a mesma, por ausência de laços afetivos com a mãe, se encontrava a seu cuidado, nele confiando. 26 - Sabia, outrossim, que todas as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal. Pelo exposto, forçoso será concluir que existem já fortes indícios de que o arguido cometeu, em autoria material, na forma consumada e em concurso efetivo, e sem prejuízo de ulterior qualificação face à investigação ainda em curso, pelo menos dois crimes de violação e em número não inferior a dez de crimes de abuso sexual de menor dependente agravado, previstos e punidos pelos artigos 164.º, n.º 1 al. a) e 172° nº 1, por referência ao art. 171º nº 2 e 177º nº 1 al. a) e nº 5, ambos do Código Penal. Os fortes indícios da prática de tais factos e das intenções do arguido, consubstancia dores dos referidos crimes resultam da seguinte prova (artigo 141.°, n.º 4, alínea d), do Código de Processo Penal): Documental: Toda a constante dos autos, designadamente de fls. 7 e 8, 48 a 53, 56 a 66, 76 a 77, 106 a 109. Testemunhal: 1. EE, melhor id. a fls. ; 2. GG, melhor id. a fls. 15; Toda esta prova conjugada entre si, não obstante a negação dos factos por parte do arguido, permite, nesta fase, concluir com a certeza que se exige, que os factos se encontram suficientemente indiciados. Desde logo, as declarações da menor mostram-se credíveis e são compatíveis com o exame médico realizado (cfr. cota de fls. 111), sendo certo que o arguido não dá qualquer explicação para a menor ter prestado as declarações que prestou, caso as mesmas não fossem verdadeiras. Antes, pelo contrário, o que resulta dos autos é que a menor sempre tentou proteger o pai, inclusive negando toda a situação, apesar das suspeitas que já existiam, só tendo denunciado a situação agora, por desconfiar que estava grávida e não aguentar mais a situação, acabando por desabafar com uma amiga, que já foi inquirida nos autos e que corroborou a versão da ofendida. Assim, o depoimento da ofendida é credível, mostra-se já corroborado nos autos e não foi infirmado pelas declarações do arguido, que não apresenta qualquer versão ou motivo para a menor não estar a dizer a verdade, limitando-se o arguido a dizer que é tudo mentira, apesar de acrescentar que tinha uma ótima relação com a filha. Perante a mencionada factualidade, fortemente indiciada, há que aferir da necessidade de aplicar, ou não, ao arguido uma medida de coação, e em caso afirmativo qual? De acordo com o artigo 193 do CPP: "As medidas de coação e de garantia patrimonial a aplicar em concreto devem ser necessárias e adequadas às exigências cautelares que o caso requer e proporcionais à gravidade do crime e às sanções que previsivelmente venha a se aplicadas". Acrescentando o artigo 204 do mesmo diploma que: "Nenhuma medida de coação, à exceção da prevista no artigo 196, pode ser aplicada se, em concreto, se não verificar, no momento da aplicação da medida: a) Fuga ou perigo de fuga; b) Perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo, e nomeadamente, perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova; ou; c) Perigo, em razão da natureza e das circunstâncias do crime ou da personalidade do arguido, de que este continue a atividade criminosa ou perturbe gravemente a ordem e tranquilidade públicas". No artigo 193º estão consagrados quatro princípios no que tange à aplicação das medidas de coação: - O princípio da proporcionalidade; - O princípio da necessidade; - O princípio da adequação; - E o principio da proibição em excesso. O principio da proporcionalidade mais não é do que a consagração do artigo 18 da CRP e que se desdobra nos outros três princípios. Assim, de acordo com o princípio da necessidade a medida tem de ser indispensável ao fim a que se destina, de acordo com o princípio da adequação tem ainda de ser idónea a esse fim e finalmente não pode exceder esse fim. Cada medida de coação tem de ser aplicada de acordo com o caso concreto, devendo ser proporcional, necessária e adequada a essa causa, devendo acautelar os perigos que em concreto se verifiquem, sendo que nenhuma medida de coação pode ser aplicada se, em concreto não se verificar um dos perigos do artigo 204 do CPP (à exceção do TIR). No que tange ao artigo 204 o mesmo fixa os requisitos gerais para a aplicação de qualquer medida de coação, à exceção do TIR, requisitos esse que não alternativos. Os crimes em causa são punidos com pesadas penas de prisão e integram a apelidada criminalidade especialmente violenta (artigo 10, a/.l) do CPP). Os factos são gravíssimos e causadores de enorme alarme social, ainda mais que foram praticados num meio pequeno, em que a vitima e o arguido têm uma relação de parentesco, tratando-se de pai e filha, encontrando-se esta confiada àquele. Além disso, na situação concreta parece manifesto o perigo de continuação da atividade criminosa, pelos motivos a seguir mencionados. Tal perigo em nosso ver resulta desde logo da forma reiterada como os factos ocorreram e do número de vezes. O arguido, apesar da vítima ser sua filha e apenas, atualmente com 16 anos, não se inibiu de com ela se relacionar sexualmente, recorrendo à força física, o que só lhe foi permitido, precisamente por se aproveitar da relação de paternidade, da idade da menor e da sua superioridade física. Além disso, o arguido, não dá qualquer explicação para a sua atuação, nega a prática dos factos, acrescentando que a menor inventou a situação descrita nos autos, o que demonstra uma ausência de espirita crítico sobre a factualidade em causa, não obstante a sua gravidade. A forma de atuação do arguido, relatada nos factos comunicados é muito grave e não indicia a prática de atas isolados, mas de uma eventual falta de controlo do próprio arguido, que não se inibiu de ter o comportamento descrito, completamente desadequado, não só penalmente mais ainda moral e socialmente. Além disso, conforme relato da vítima quando foi inquirida pela PJ já anteriormente o arguido terá tentado abusar da filha mais velha. É assim, manifesto em concreto, atenta a personalidade do arguido o perigo de continuação da atividade criminosa. No entanto, além desse perigo existe ainda perigo de perturbação do inquérito, nomeadamente para a aquisição e conservação da prova, na medida em que o arguido, como resulta fortemente indiciado dos factos comunicados não se inibiu de usar a força física para manter relacionamento sexual com a mesma, sendo de prever que o arguido tudo fará para evitar, inclusive que a menor deponha nos autos como testemunha. Aliás, como também resulta dos factos comunicados, tudo indicia que o arguido afirmou à vitima que se ela contasse o sucedido a alguém se matava, aproveitandose da influência que tinha sobre a menor e do medo que a mesma tinha de perder o pai, pois apesar de tudo é a sua única referência, tendo passado parte da sua infância institucionalizada e, posteriormente, com a mãe, com quem tinha um mau relacionamento devido inclusive aos consumos excessivos de álcool por parte desta. Ora, para acautelar tais perigos só a prisão preventiva nos parece adequada, sendo ainda proporcional e necessária à gravidade extrema da situação. Desde logo a previsibilidade do arguido vir a ser condenado, em sede de julgamento, a prisão efetiva é muita elevada. Assim, qualquer medida de coação que não seja a prisão preventiva é manifestamente insuficiente para acautelar os perigos em causa, nomeadamente para evitar o perigo da continuação da atividade criminosa. Sem dúvida que se encontram verificados quer os pressupostos do artigo 204 do CPP, quer os do artigo 202 do mesmo diploma. Na verdade, como analisado existe perigo de continuação da atividade criminosa, de perturbação da prova e da ordem e tranquilidade pública. Os ilícitos penais que os autos indiciam fortemente que o arguido cometeu são puníveis com penas de prisão muito superiores a cinco anos. Além disso, qualquer outra medida menos gravosa não acautela tais perigos, atenta a proximidade entre a vítima e o arguido, inclusive não evita que este a procure, mesmo ordenando-se a proibição de contactos com a menor. Também, tendo em conta o tipo de crime em causa e os meios ao dispor do arguido, inclusive na sua residência para cometer factos idênticos, tornam desde logo inadequada a medida de coação de obrigação de permanência na habitação, mesmo com vigilância eletrónica. Aliás, não podemos esquecer que foi na sua residência que o arguido encetou contactos com a menor e foi aí que teve contactos de cariz sexual com a mesma. Tal como se escreve no ac. da RC de 28.2009 (in http://www.dgsi.pt/jtrc): "A medida de coação, obrigação de permanência na habitação, revela-se insuficiente e inadequada nos crimes de natureza sexual, visto poder ser cometido aliciando crianças a vir a Sua casa, dado que normalmente as vítimas são amigos, vizinhos, conhecidos OU até familiares". Não ignoramos o carater excecional da medida de coação da prisão preventiva. Contudo, atento o exposto, qualquer outra se mostra inadequada para cautelar os perigos em causa, não inibindo o arguido de, caso pretendesse, como pensamos que o faria, praticar factos idênticos e de tudo fazer para que a menor não prestasse declarações ou alterasse as mesmas. Assim, por todo o exposto decide-se: - Nos termos dos artigos 191, 192, 193, n.º1, 2 e 3, 202, n. º1, al.a) e b) e 204, al. b) e c) do CPP sujeitar o arguido à medida de coação de prisão preventiva, para além do TIR já prestado, por considerar ser tal medida a única que se revela adequada, necessária e suficiente a salvaguardar as elevadas exigências cautelares que se fazem sentir, sendo ainda proporciona', quer à gravidade dos crimes quer às sanções que previsivelmente serão de aplicar. Notifique, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 194, nº 10 do CPP. Proceda-se à emissão de mandados de condução do arguido ao EP competente. Notifique.”

1.4. Em resultado de tal decisão, em 17/07/2015 o A. foi conduzido para o Estabelecimento Prisional ... onde se manteve em reclusão ininterrupta até ao dia 03/06/2016, data da sua libertação.

1.5. A 29.7.2015 o A. apresentou recurso para o Tribunal da Relação deCoimbra da medida de coação aplicada, pugnando pela sua revogação e substituição por medida menos gravosa.

1.6. Por acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra a7.10.2015, foi julgado improcedente o recurso interposto pelo arguido, e mantida a medida de coação de prisão preventiva, constando da fundamentação do referido aresto, designadamente: “2. No despacho recorrido foi entendido estar suficientemente indiciada a prática pelo arguido de dois crimes de violação, p. e p. pelo art, 164°, nº 1, a) do C. Penal com referência ao art. 177°, n.s 1, a) e 5) do mesmo código, e de dez crimes de abuso sexual de menor dependente agravado, p. e p. pelo art, 172°, nº 1, com referência aos arts. 171°, n° 2 e 177°, nºs 1, a) e 5, todos do mesmo código, crimes dolosos, tendo a violação a moldura penal de quatro a treze anos e quatro meses de prisão e o abuso sexual de menor dependente agravado a moldura penal de um ano e quatro meses a dez anos e oito meses de prisão. Entendimento diferente tem o recorrente para quem os elementos de prova existentes no inquérito que sustentam a imputação são precários e insuficientes, uma vez que se baseiam nas declarações da ofendida e na opinião de um médico, até ao momento não fundamentada cientificamente. Vejamos. Consta do despacho recorrido que o arguido é pai da ofendida, nascida a .../.../1998, factualidade que se encontra indiciariamente provada por cópia do assento de nascimento desta, junta a fls. 22 destes autos. Consta do despacho recorrido que a ofendida viveu com a mãe, à guarda de quem se encontrava, até Maio de 2014, vindo a partir de então a viver com o arguido, situação comunicada à GNR, à CPCJ ... e ao Tribunal de Família e Menores, que passou a exercer a guarda efetiva, factualidade que se encontra indiciariamente provada pela cópia da «Informação de serviço» da GNR de 20 de Maio de 2014 a fls. 8 a 9 destes autos e cópia da cota da PJ de .../.../2015, a fls. 16 destes autos, conjugados com os depoimentos da ofendida, prestado em .../.../2015, a fls. 13 a 15 destes autos e da testemunha BB, prestado em .../.../2015, a fls. 34 destes autos, e com as declarações prestadas pelo arguido à PJ, em .../.../2015, a fls. 38 a 40 destes autos. Consta também do despacho recorrido que em dia não concretamente apurado de Março ou Abril de 2015, numa quinta situada em ..., ..., o arguido chamou a ofendida a um barracão, fechou a porta e, recorrendo à força física, empurrou-a para o chão, deitou-se sobre ela, beijou-a, e sempre contra a sua vontade, manteve com ela relação de cópula, situação que se repetiu, dias depois, já na casa do arguido, quando a ofendida lhe fazia a cama, atirando-a sobre esta, imobilizando-a debaixo de si e mantendo relação de cópula contra a sua vontade. Depois destes acontecimentos e até à segunda semana de Julho de 2015, continua o despacho, em dez distintas ocasiões, na casa do arguido ou no barracão da quinta, este, sempre contra a vontade da ofendida, com ela manteve relações de cópula, mas já sem a agarrar e imobilizar, por temer que o pai se matasse e ser ele a única pessoa com quem sempre pôde contar. A Mma. Juíza de instrução considerou fortemente indiciada esta factualidade, com base 110 depoimento da ofendida, que qualificou de credível e compatível com a informação médica constante da cota de fls, III, tendo ainda ponderado a circunstância de o arguido não ter apresentado qualquer explicação para a filha ter produzido as declarações que produziu, caso não fossem verdadeiras. Vejamos. A ofendida tinha já 16 anos de idade quando ocorreram os factos descritos e, conforme relato de diligência externa de fIs. 11 destes autos, realizada a .../.../2015, é referida pela diretora da escola que frequente a pela sua diretora de turma como uma aluna aplicada, com bom rendimento escolar, respeitada e admirada por todos os colegas com quem tem bom relacionamento. Estaremos portanto, perante uma adolescente, já préadulta, equilibrada e bem inserida. Confrontando as declarações prestadas pela ofendida em .../.../2015 e em .../.../2015 fácil é concluir que ali nega o que aqui afirma isto é, que foi violada e tem sido abusada pelo pai. O 'discurso' usado nestas últimas declarações apresenta-se estruturado e internamente coerente, revelando a ofendida ponderação e, de alguma forma, preocupação com o progenitor, o que, aliado ao afirmado temor de gravidez, ajuda a explicar a existência de dois depoimentos absolutamente opostos. Por outro lado, na cota de fls. 51 destes autos, relativa ao exame sexual a que a ofendida foi submetida no Gabinete Médico-Legal de ..., confirma-se ter a mesma tido relacionamento sexual recente mas não estar grávida. Porém, o que não é possível extrair do depoimento, posto que nunca afirmado pela ofendida [esta, aliás, disse não saber quantas vezes terá ocorrido o relacionamento], e O número de abusos sexuais, não inferior a dez, indiciariamente praticados pelo arguido, mencionado no ponto 17 dos factos indiciados no despacho recorrido, uma vez que, com a necessária certeza, do mencionado ponto conjugado com o ponto 20 dos factos indiciados, apenas se pode retirar a ocorrência de dois abusos sexuais. Por outro lado, cabe dizer que, mesmo que o arguido não tivesse apresentado qualquer justificação para a atitude da filha [ouvidas pela Relação as declarações por si prestadas no 10 interrogatório judicial de arguido detido, afirmou estar admirado com a conduta da ofendida, pois são amigos, não saber a razão das suas declarações que não correspondem à verdade, e parecer-lhe que tal se deve à mãe da filha, embora tenha reconhecido que não têm contactos], não só a tanto não estava obrigado, como a ausência da dita explicação nada permite inferir. Em suma, a ofendida surge como uma jovem estudante interessada e bem considerada no meio, sem indício de distúrbio comportamental, que produziu um segundo depoimento coerente e consistente, parcialmente corroborado pela informação médica disponível. Os crimes sexuais, na esmagadora maioria dos casos, não têm espectadores que os possam, depois, testemunhar, por isso que, face às especiais dificuldades que a sua indiciação suscita, os depoimentos das vítimas revistam sempre particular importância, ainda que, pela mesma razão, devam ser submetidos a rigoroso escrutínio probatório. Ora, o depoimento da ofendida, pelas razões supra expostas, sujeito a tal escrutínio, revelou-se credível e está. Parcialmente corroborado pela informação médica disponível pelo que, tendo em conta a fase embrionária da investigação em que ainda estamos, se concorda com a decisão recorrida quanto à existência de fortes indícios de ter o arguido praticado dois crimes de violação e dois crimes de abuso sexual de menor dependente, qualquer deles, como se viu, punível com pena de prisão de máximo superior a cinco anos. (…) 4. No despacho recorrido entendeu-se que a debelação dos perigos previstos no art. 204°, b) e c) do C. Processo Penal apenas poderia ser alcançada com a sujeição do arguido à medida de prisão preventiva, considerando-se insuficientes para assegura os efeitos cautelares requeridos as medidas coação de proibição de contactos e de obrigação de permanência na habitação. Diferente entendimento tem o recorrente para quem, invocando a 'institucionalização' da ofendida, a medida de proibição de contactos, prevista no art. 200°, n" 1, d) do C. Processo Penal, se mostra apta a assegurar as exigências cautelares ou, caso assim não se entenda, cumprirá tais exigências a medida de obrigação de permanência na habitação, prevista no art. 201° do mesmo código. Vejamos. A escolha da medida de coação deve observar os princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade (art. 193°, nº 1 do C. Processo Penal). O princípio da necessidade significa que a medida a aplicar deve ser indispensável para a satisfação das exigências cautelares. O princípio da adequação significa que a medida a aplicar deve ser a mais ajustada, amais idónea à satisfação-das exigências cautelares requeridas pelo caso concreto. O princípio da proporcionalidade significa que na ponderação da medida a aplicar deve ser considerada a gravidade do crime e a pena que previsivelmente venha a ser aplicada. No caso específico da prisão preventiva e da obrigação de permanência na habitação há ainda que observar o princípio da subsidiariedade, só devendo ser aplicadas quando nenhuma das demais medidas de coação se mostre adequada e suficiente para assegurar as exigências cautelares do caso concreto (arts. 193°, n.ºs 2, 201°, n" 1 e 202°, n" 1, do C. Processo Penal). Por outro lado, quando as exigências cautelares do caso concreto impuserem a aplicação de medida de coação privativa da liberdade, a obrigação de permanência na habitação prefere à prisão preventiva, desde que se revele suficiente para satisfazer aquelas exigências (art. 193°, n° 3, do C. Processo Penal). Os crimes a que os factos indiciariamente praticados pelo arguido conduzem têm elevada gravidade e representam grande dano social, sendo por isso necessário criar as condições necessárias para que o seu cometimento não se volte a repetir, o que passa desde logo pela necessidade de impedir de forma eficaz qualquer contacto entre pai e filha. A medida de obrigação de não contactar, por qualquer meio, com determinadas pessoas, atento o concreto circunstancialismo e, em particular, a residência comum e a indefinição da situação da ofendida, afigura-se-nos incapaz de assegurar eficazmente o efeito preventivo visado. Relativamente à obrigação de permanência na habitação estão, de facto, verificados os requisitos específicos da sua aplicação portanto, a existência de fortes indícios da prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a três anos. Acontece que, como se sustenta 110 acórdão desta Relação de 28 de Janeiro de 2009, proc. n" 664/08.7TACTB-A.CI, in www.dgsi.pt, aliás. citado no despacho recorrido, esta medida de coação pode revelar-se insuficiente e inadequada em crimes de natureza sexual, crimes onde, na esmagadora maioria dos casos, os respetivos agentes negam ou minimizam os seus comportamentos, e podem ser facilmente praticados em casa, uma vez que as vítimas são, frequentemente, conhecidos e familiares. Ora, tendo sempre presente que nos encontramos no âmbito da indiciação de factos e numa fase embrionária da investigação, é esta a situação com que deparamos nos autos. Com efeito, o arguido não assumiu os factos que tem por vítima a sua filha, então com 16 anos de idade, e que consigo vivia, tendo parte significativa dos abusos, ocorrido na residência. Por isso, sujeitar o arguido à obrigação de permanência na habitação, quando nesta residia com a ofendida, sem que esteja definitivamente afastada a possibilidade de esta aí deixar de habitar [para além do já referido acionamento de procedimento de emergência para acolhimento temporário, quanto a este aspeto, apenas consta do «Relatório de ocorrência» de fls. 25 a 26 que a ofendida recusou ir para casa da mãe ou para casa da irmã] seria um manifesto contrassenso e a negação do fim visado com a aplicação da medida de coação. Deste modo, sendo insuficiente e inadequada, atentas as exigências cautelares requeridas pelo caso, a aplicação da medida de coação de obrigação de permanência na habitação, conclui-se que, pelo menos, de momento, a prisão preventiva decretada se deve manter, com a consequente improcedência do recurso, não se mostrando inobservados os arts. 27° e 28° da Constituição da República Portuguesa [que o recorrente se limita a invocar]. III. DECISÁO Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes do Tribunal da Relação em negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmam o despacho recorrido.”

1.7. Em 03/12/2015 foi deduzida acusação pública contra o A., imputando-lhe a prática de doze crimes de violação previstos e punidos pelos arts. 164º, agravados pelo disposto no art. 177º, ambos do Código Penal – 5º PI. 8. No despacho de acusação, a final, foi promovida a manutenção da medida de coação de prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 213º, n.º 1, al. b), do CPP (reexame dos pressupostos da medida de coação), tendo por despacho judicial de 7.12.2015 sido mantida a medida de coação de prisão preventiva aplicada ao A..

1.8. Desta decisão não recorreu o Autor, ali arguido.

1.9. Em 23/05/2015 foi iniciada audiência de julgamento, sem a presença da ofendida EE, que não foi encontrada.

1.10. Com data de 01.06.2016, consta uma cota do processo comum coletivo do seguinte teor: “Contactado o técnico de informática deste tribunal – HH, foram efetuadas diligências no sentido de tornar audível as declarações da menor, não tendo sido possível recuperar a sua audição”.

1.11. Em 03/06/2016 foi proferida sentença no referido processo 71/15...., entretanto, distribuído pela Instância Central ..., Secção Criminal J... da Comarca ..., que julga improcedente a acusação pública e absolve o A. dos crimes que vinha acusado, bem como, declara extinta a medida de coação e determina a sua libertação.

1.12. O A. esteve privado da sua liberdade entre os dias .../.../2015 e 03 de Junho de 2016 o que perfaz 325 dias de reclusão.

1.13. Tanto a decisão que aplica a prisão preventiva como o acórdão da Relação de Coimbra que o confirma fundamentam-se, entre outras, nas declarações da menor ofendida e exame médico realizado, conforme transcrito.

1.14. O exame médico consta de fls. 229 do processo 71/15...., do qual foi lançada uma cota a fls. 111 que refere: “….- que a observação efetuada, nomeadamente permeabilidade da vagina, é coincidente com relações sexuais recentes e o que corrobora o relato da vitima “nada no exame físico contradiz o que foi dito pela EE”. - que na sua opinião o relato da vitima é bastante convincente e credível, quer pela firmeza das suas palavras, quer pela forma ordenada e precisa, com que descreve os factos de que foi vitima, aos quais se refere como “aquele calvário”, mostrando grande sofrimento e angustia. …”.

1.15. Os factos criminosos imputados ao arguido na acusação deduzida foram declarados não provados com os seguintes fundamentos: “Convicção do Tribunal quanto à matéria de facto: Funda-se esta no conjunto da prova produzida em audiência, salientando-se que: 1 – O arguido prestou declarações, negando de forma veemente e perentória a prática dos factos descritos na acusação pública, afirmando que as declarações acusatórias da sua filha deverão ter sido fabricadas/engendradas pela sua ex-companheira, com vista a prejudica-lo, por a menor ter entretanto vindo viver consigo, em detrimento da mãe. Descreveu ainda o arguido o percurso da menor EE até ter vindo viver a seu cargo, e esclarecendo que esta pernoitava em casa de sua irmã BB quando esteve a seu cargo. Descreveu ainda o arguido as suas condições pessoais e modo de vida. 2 - A atitude de negação (da prática dos factos imputados na acusação) do arguido não foi infirmada por qualquer meio de prova credível produzido nos autos e em sede de audiência de julgamento. Desde logo, não foi possível proceder à reprodução em audiência de julgamento e à audição do depoimento prestado pela menor (testemunha) EE antecipadamente para memória futura, por a respetiva gravação se mostrar inaudível, de forma irrecuperável, como resulta do exposto e consignado a fls, 698, 699 e 730 dos autos. Convocada a referida testemunha para prestar depoimento presencialmente, em sede de audiência de julgamento (o que sempre se determinaria, em face da prova produzida em audiência, nos termos do disposto no art. 271°, n" 8, do C.P.P., mesmo que fosse audível a aludida gravação áudio, tendo em conta a atual idade da menor), veio esta recusar-se a depor, faculdade que lhe é reconhecida pelo art. 134°, nº 1, al. a), do C.P.P., por ser filha o arguido. Ora, o modo como a testemunha se recusou a depor, e mesmo a identificar-se, de início, revelando desconforto e desagrado por lhe ser pedido novo depoimento, mesmo após repetidamente esclarecida da razão da sua convocação, suscitou sérias dúvidas ao Tribunal Coletivo sobre a seriedade de quaisquer declarações pela mesma proferidas, mesmo perante outras pessoas. Por essa razão, e considerando ainda o preceituado no ali. 129°, n° 1, do C.P.P., não Se revelou possível atribuir qualquer relevo ou credibilidade aos depoimentos das testemunhas (…), na parte em que se referiram ao que a menor EE lhes contou acerca dos pretensos atos praticados pelo seu pai, aqui arguido. E é certo que as referidas testemunhas não denotaram ter conhecimento direto de quaisquer factos que pudessem de algum modo sustentar a tese fáctica da acusação pública. 3 – Por outro lado, a testemunha BB, filha do arguido e irmã da menor EE, que com ela pernoitava e tomava grande parte das refeições, negou perentoriamente ter conhecimento de qualquer ato de abuso sexual praticado pelo arguido, seu pai, quer na pessoa da EE, quer na sua pessoa (da própria testemunha). Referiu mesmo que o seu pai sempre as tratou com total respeito, e que a EE nunca lhe falou de quaisquer atos de abuso sexual perpetrados pelo arguido, nem sequer evidenciou estar perturbada, retraída ou triste com qualquer facto ou situação. Afirmou, por isso, esta testemunha que a EE, acusando o arguido seu pai da prática de violação, está indubitavelmente a mentir. Referiu ainda esta testemunha que a EE já havia mantido vários relacionamentos sexuais com rapazes, quer na Curia, quando vivia com a mãe, quer já em ..., o que lhe foi contado pela menor e pela sua mãe. Disse ainda que o seu pai controlava de forma apertada as saídas noturnas da EE, o que a deixava desagradada. Daí que esta testemunha atribua a atitude mentirosa da menor EE a este facto, e ainda à preocupação que tinha de estar grávida. O depoimento desta testemunha foi corroborado e confirmado pelo depoimento do seu companheiro DD, que consigo vive, e já vivia na altura em que a EE pernoitava em sua casa. Negou esta testemunha ter alguma vez abusado, ou sequer tentado abusar sexualmente da menor. Os depoimentos destas testemunhas revelaram-se sérios, esclarecidos, congruentes e credíveis, abalando inapelavelmente a tese fáctica da acusação pública. 4. A testemunha II, antiga colega de escola ..., confirmou que esta manteve um relacionamento amoroso e sexual com um namorado em ..., factos que observou e a própria menor lhe confidenciou. 5. As testemunhas JJ (vizinho e amigo do arguido), KK (irmã do arguido), LL (amiga do arguido), e MM (amigo do arguido), limitaram-se a afirmar o bom relacionamento mantido pela menor EE com o seu pai, aqui arguido. 6. Como se pode observar, a prova por declaração e testemunhal não logrou sustentar minimamente a tese fática exposta na acusação pública. E é certo que tal corroboração também não é operada por intermédio da prova documental e pericial junta aos autos, sublinhando-se a este propósito que o relatório médico-legal de fls, 229 a 231 não permite afirmar a ocorrência de qualquer ato abusivo de que a menor tenha sido vítima. 7. Por conseguinte, analisando conjugadamente todos os mencionados meios de prova, e as suas insuficiências, inconsistências, contradições e incongruências, acima apontadas, não conseguiu o tribunal coletivo atribuir qualquer credibilidade ou sustentação à tese fáctica da acusação pública, pelo que tal factualidade foi dada como não provada”. Fundamentação: Relativamente aos factos provados, assenta a respetiva prova no teor dos documentos juntos aos autos, que se referem no local próprio. Os factos declarados como não provados resultam igualmente da análise da fundamentação do despacho e acórdão a que se reportam, e se reproduziram na factualidade provada, para melhor compreensão e inteligibilidade do que está em causa nos autos.

(Dos demais factos alegados na Petição Inicial)

1.16. (Eliminado).

1.17. O A. tem uma filha, BB que por sua vez tem uma filha com 7 anos de idade, familiares com quem tem grande proximidade afetiva e, durante o período da sua reclusão ficou privado de afetos da família e convívio social, passando o Natal, o carnaval e a Páscoa privado da família, dos amigos e da liberdade.

1.18. A prisão do Autor e os factos ilícitos que lhe foram imputados chegaram ao conhecimento de toda a comunidade onde se encontra inserido.

1.19. O Autor à data da detenção ficou associado à prática dos crimes que lhe foram imputados e pelos quais foi socialmente condenado.

1.20. O Autor nasceu em .../.../1963.

1.21. O autor desenvolve atividade profissional como trabalhador agrícola, prestando o seu trabalho a quem o solicita, auferindo a quantia de € 40,00 (quarenta euros) por cada dia inteiro de trabalho.

1.22. Presta o seu trabalho ocasionalmente, quando lhe é solicitado.

1.23. A filha do Autor, BB, pagou a importância de € 175.00 (centos e setenta e cinco euros) pela renda de julho de 2015 da casa de habitação que o autor tinha arrendada.

1.24. A sua filha BB semanalmente entregava ao Autor, quando o visitava, quantias variadas, em média € 20,00, tendo chegado a entregar-lhe a importância de € 40,00 para assegurar despesas correntes com artigos de higiene e tabaco.

5.3.

Dos  danos patrimoniais.

Expendeu a Julgadora:

«Conforme resultou da factualidade dada por provada, e quanto aos danos patrimoniais peticionados, apenas se logrou provar que o Autor, quando executava trabalhos, que eram ocasionais, auferia o montante de € 40,00 (quarenta dias) por cada dia de trabalho, não se tendo logrado provar que o autor trabalhava todos os dias úteis e aos sábados, nem tão pouco se logrou provar que trabalhava todo o dia, apenas tendo resultado que fazia trabalhos pontuais quando lhe era solicitado e pelo período que era necessário.»

Já o recorrente autor entende que

«sendo certo que, mesmo que a prestação de trabalho até ao momento da detenção do recorrido fosse irregular, não existe demonstração de que no futuro não pudesse ser diária.

pelo que, existindo a expectativa ou a possibilidade da prestação de trabalho de forma regular todos os dias úteis da semana e pela retribuição de 40 € diários é devido o pagamento da importância de 10.800 € (270 dias x 40 €).

Estamos, pois, no domínio do dano futuro.

Estatui o artº 564º nº 2 do CC:

 «na fixação da indemnização, pode o tribunal atender aos danos futuros desde que sejam previsíveis; se não forem  determináveis, a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior».

Para que seja  possível a condenação em indemnização por danos futuros não é imposta uma certeza absoluta quanto à sua ocorrência, mas também  não basta a prova da sua vaga, genérica ou hipotética eventualidade, antes sendo necessário, mas outrossim suficiente, que haja uma segura e adequada previsibilidade  da verificação dos mesmos.

Ou, por outras palavras, noutra perspetiva ou nuance:

« O dano futuro é previsível quando o homem médio (medianamente prudente e avisado) pode conjeturar, prognosticar, a sua ulterior verificação e tal dano futuro previsível pode ser certo, quando a sua produção se apresenta, no momento de acerca dele formar juízo, como infalível, ou eventual, quando a sua produção se apresenta, no referido momento, como meramente possível, hipotética ou incerta.

Apenas são indemnizáveis os danos futuros previsíveis certos e os danos futuros eventuais em que se possa formar o prognostico de o prejuízo vir a acontecer.» - Ac. da RG de 08.09.2020, p. 248/19.4T8PNF.P1 in dgsi.pt.

 De notar que, em termos de direito comparado, certas  jurisprudências, como a italiana, só consideram o dano futuro se este for ressarcível, certo, fundamentado e objetivamente inevitável, não podendo ser considerado se se tratar de uma simples eventualidade.

No caso vertente.

Apurou-se que «O autor desenvolve atividade profissional como trabalhador agrícola, prestando o seu trabalho a quem o solicita, auferindo a quantia de € 40,00 (quarenta euros) por cada dia inteiro de trabalho».

Ma também, e determinantemente, se provou que ele apenas «Presta o seu trabalho ocasionalmente, quando lhe é solicitado.»

Está  pois adrede provado que o autor não acalentava ter um trabalho regular,  ie., durante todos ou quase todos os dias úteis, mas apenas pontual,  ou seja, nalguns, poucos, dias.

E, ademais,  sem que mesmo este curto período temporal de trabalho fosse com certeza, ou com razoavelmente probabilidade, consecutido,  pois que apenas laboraria se porventura para tal fosse solicitado.

Ou seja, a simples eventualidade e forte aleatoriedade deste curto período laboral não permite subsumi-lo na previsão do aludido segmento normativo.

Pois que, como se viu, este exige mais: ou a certeza do dano, ou a forte, ou, ao menos, normal e razoável, previsibilidade, quanto à sua ocorrência.

Por outro lado e versus o defendido pelo autor, não basta que «não exista demonstração de que no futuro a prestação de trabalho não pudesse ser diária.»

Este facto negativo é, ou seria,  em si mesmo, inócuo, e inverteria as regras do ónus da prova.

Pois o que interessa é/seria apurar positivamente  factos que fundamentassem a certeza ou previsibilidade do dano.

 Ónus este que, naturalmente, impende, sobre a parte a quem tais factos aproveitam, ou seja, in casu, ele próprio.

O qual, perante os factos apurados, e como se vem de expor, não logrou cumprir.

5.3.

Dos danos não patrimoniais.

5.3.1.

Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito – artº 496º nº1 do CC.

 Efetivamente: «...os prejuízos insignificantes ou de diminuto significado, cuja compensação pecuniária não se justifica, que todos devem suportar num contexto de adequação social, cuja ressarcibilidade estimularia uma exagerada mania de processar e que, em parte, são pressupostos pela cada vez mais intensa e interactiva vida social hodierna. Assim não são indemnizáveis os diminutos incómodos, desgostos e contrariedades, embora emergentes de actos ilícitos, imputáveis a outrem e culposos» - R. Capelo de Sousa, O Direito Geral de Personalidade, Coimbra, 1995 p.555/556. (sublinhado nosso).

O dano não patrimonial não se reconduz a uma única figura, tendo vários componentes e assumindo variados modos de expressão, abrangendo o chamado quantum doloris, que sintetiza as dores físicas e morais sofridas; o “dano estético”, que simboliza, nos casos de ofensa à integridade física, o prejuízo anátomo-funcional associado às deformidades e aleijões; o “prejuízo de afirmação social”, dano indiferenciado, que respeita à inserção social do lesado, nas suas variadas vertentes (familiar, profissional, sexual, afetiva, recreativa, cultural, cívica); o prejuízo da “saúde geral e da longevidade”, em que avultam o dano da dor e o défice de bem-estar e que valoriza os danos irreversíveis na saúde e bem-estar da vítima; o pretium juventutis, que realça a especificidade da frustração do viver em pleno a chamada primavera da vida – cfr. Ac. do STJ de 18.06.2009, dgsi.pt, p. 1632/01.5SILSB.S1.

Mais do que indemnizar,  o direito por dano não patrimonial visa reparar ou compensar o lesado proporcionando-lhe benefícios de ordem material  que lhe permita obter prazeres ou distrações , porventura de ordem puramente espiritual,  que, de algum modo, atenuem o desgosto sofrido: não consiste num pretium doloris, mas antes numa compensatio doloris.

Resta sempre difícil apurar, com rigor, a adequação do montante compensatório dos danos não patrimoniais, de sorte a que com o mesmo se possam minorar as afetações negativas sofridas, operando-se, assim, com a maior aproximação possível, a justiça do caso concreto.

A gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objetivo, que tenha em conta o circunstancialismo de cada caso, e não por padrões subjetivos, resultantes de uma sensibilidade particular.

Certo é que o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, e designadamente, o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso  - arts. 496º, nº 3 e 494º do C.C.

Havendo aqui, naturalmente, que conviver e aceitar uma certa álea e relatividade das decisões judiciais, características que são inerentes a tais decisões como aliás a qualquer atividade  humana que não se estribe em premissas de cariz científico-natural ou matemático.  

Porém:

«O recurso à equidade não afasta a necessidade de observar as exigências do princípio da igualdade, o que implica a procura de uma uniformização de critérios…» -  Ac. do STJ  de 24.09.2009, p. 09B0037 in dgsi.pt.

5.3.2.

A julgadora, depois de teorizar, na sua essencialidade relevante, em consonância com o supra expendido, plasmou, para o caso concreto, nos seguintes termos:

«Pese embora resulte das regras da experiência comum que a reclusão importa danos a nível psicológico para os detidos, não resultou provado que a comunidade prisional onde o Autor foi integrado o tenha recebido de forma ofensiva, designadamente com agressões físicas e psicológicas que o fizeram temer pela sua integridade; que em resultado das agressões de que foi vitima houve necessidade de mudar o Autor de cela; que o Autor sofreu angustia e ansiedade pela indefinição do seu futuro, nem em que medida o fez. Não se provou que o Autor tenha sofrido profunda angustia e ansiedade pela injustiça da sua detenção, nem que tais sentimentos tenham sido traduzidos em emoções como insónia, agitação, nervosismo e choro espontâneo e descontrolado que se esforçava em reprimir e ocultar dos restantes reclusos.

Não se logrou provar que, durante a sua reclusão o Autor sofreu estado depressivo grave que determinou tratamento com medicamentos tranquilizantes e ansiolíticos e que muitas vezes, tenha deixado de ter controlo sobre a sua pessoa e tenha sido sujeito a diversos exames e consultas do foro psiquiátrico.

 “…muito embora lícita face aos cânones processuais cabíveis - a perduração de uma situação de privação de liberdade …é, de per si, em abstracto, e segundo qualquer padrão aferidor de carácter objectivo, como particularmente grave e de especial danosidade para a esfera jurídico-pessoal de qualquer cidadão médio …

Resultou provado que, durante o período em que durou a prisão preventiva, o Autor ficou impedido de conviver com a sua filha BB e a sua neta.

Mais se provou que, mercê da prisão preventiva a que foi sujeito, sentiu vergonha pelo facto de as pessoas da sua localidade poderem pensar que era culpado e ansiedade em relação ao seu futuro, sendo os danos em causa graves para merecerem reparação.

Aqui apenas releva a privação da liberdade e os factos referidos supra.

Atendendo aos factos dados como provados, é evidente que a prisão preventiva, causou sequelas graves a nível da saúde, honra, bom nome e reputação pelo que merece a tutela jurídica.

“A quantia será determinada pela justiça do caso concreto, pelo que terá que se ponderar a situação vivida pelo Autor, e as sequelas que dela lhe advieram, com repercussão ao nível moral, psíquico, social e familiar, e ainda a afectação do bom nome”.

O Autor vivia sozinho, fazia trabalhos ocasionais e nada resultou provado quanto à sua personalidade e imagem e respeito social.

Tendo em conta a factualidade dada por provada e não provada e os concretos danos sofridos pelo Autor, a sua forma de vida e a forma como a sua vida se alterou com a detenção e após a detenção, nos termos que em se provaram ou não provaram, resultando provados os 325 dias de privação de liberdade e o sofrimento inerente a essa privação, julga-se equitativo fixar a indemnização devida pelo Estado ao Autor, em € 17.000 (dezassete mil euros), tendo em conta a duração da detenção, quantia essa a que acrescerão os juros de mora, à taxa legal em vigor.»

Perscrutemos.

Não há dúvida que, atentas as decisões das instâncias superiores, ao autor assiste jus a compensação por danos não patrimoniais ao abrigo do artº 225º nº1 al. c) do CPP.

Resta apurar o seu quantum.

Já se viu que este é consecutido com alguma margem de prudente aleatoriedade, pois que, emerge, ou essencialmente emerge, de critérios de equidade.

Porém, como é consabido, equidade não pode equivaler a arbitrariedade, pelo que a decisão final equitativa sempre deve estar amparada e razoavelmente delimitada por factos  e critérios objetivos.

Nos termos do nº 4 do artº 496º do CC:

O montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º; no caso de morte, podem ser atendidos não só os danos não patrimoniais sofridos pela vítima, como os sofridos pelas pessoas com direito a indemnização nos termos dos números anteriores.

Por seu turno estatui o artº 494º do mesmo compêndio legislativo:

Quando a responsabilidade se fundar na mera culpa, poderá a indemnização ser fixada, equitativamente, em montante inferior ao que corresponderia aos danos causados, desde que o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso o justifiquem.

No caso vertente.

Provou-se, nuclearmente:

O autor, considerado indiciado pelos crimes de violação e de abuso sexual na pessoa de filha sua, esteve preso preventivamente durante 325 dias.

Foi absolvido com base no princípio in dúbio pro reo.

O autor tem outra filha e neta  com as quais mantém  grande proximidade afetiva e, durante o período da sua reclusão ficou privado de afetos da família e convívio social, passando o Natal, o Carnaval e a Páscoa privado da família, dos amigos e da liberdade.

A prisão do Autor e os factos ilícitos que lhe foram imputados chegaram ao conhecimento de toda a comunidade onde se encontra inserido.

O Autor à data da detenção ficou associado à prática dos crimes que lhe foram imputados e pelos quais foi socialmente condenado.

Sendo de notar que,  vg, não se provou:

O Autor sofreu angustia e ansiedade pela indefinição do seu futuro.

2.3. A comunidade prisional onde o Autor foi integrado recebeu-o de forma ofensiva, designadamente com agressões físicas e psicológicas que o fizeram temer pela sua integridade.

2.4. Em resultado das agressões de que foi vitima houve necessidade de mudar o Autor de cela.

2.5. O Autor sofreu angustia e ansiedade pela indefinição do seu futuro.

2.6. O Autor sofreu, igualmente, profunda angustia e ansiedade pela injustiça da sua detenção.

2.7. Tais sentimentos foram traduzidos em emoções como insónia, agitação, nervosismo e choro espontâneo e descontrolado que se esforçava em reprimir e ocultar dos restantes reclusos.

2.8. Durante a sua reclusão o Autor sofreu estado depressivo grave que determinou tratamento com medicamentos tranquilizantes e ansiolíticos.

2.11. Perante tais circunstâncias considerou por termo à vida, o que foi percebido pela sua filha BB e serviços do Estabelecimento Prisional.

2.12. A prisão do Autor e os factos ilícitos que lhe foram imputados teve divulgação nacional através da comunicação social chegando ao conhecimento de milhares de pessoas.

2.13. O Autor tenha ficado, após a sua absolvição, associado à prática dos crimes que lhe foram imputados e pelos quais foi socialmente condenado e é tido como seu autor.

2.15. A reclusão sofrida pelo Autor perpetua-se na sua mente e irá acompanhá-lo para o resto da sua vida, pelo menos, durante os próximos 27 anos.

2.16. Tal sentimento traduz-se em emoções de nervosismo, sono inquieto inesperadamente despertado pela sensação de ainda estar preso, bem como, vergonha perante os seus familiares, amigos e conterrâneos.

2.17. Cada dia que viveu privado da liberdade foi para o Autor um dia de inexistência e sofrimento e cada dia que viva no futuro será um dia de vergonha, inquietação, incertezas e memórias dolorosas.

Por outro lado, é ainda relevante ter-se provado que:

 O Autor não recorreu da decisão proferida em  7.12.2015  na qual foi mantida a medida de coação de prisão preventiva que havia sido aplicada

Finalmente o caso subsume-se, por banda do réu Estado Português, numa atuação deste, quando muito, eivada de mera culpa ou alguma negligência.

Pelo que, nos termos do arº 494º do CC, a indemnização/compensação pode ser fixada, equitativamente, em montante inferior ao que corresponderia aos danos causados.

  Naturalmente que, atentas e razoavelmente dilucidadas as circunstâncias do caso concreto.

No caso sub judice há a considerar que o autor tem rendimentos aleatórios e de uma magnitude que o inserem num estrato sócio-económico médio-baixo.

Pelo que um valor compensatório de menor monta que, para outro lesado com mais elevado cabedal económico financeiro, pudesse não consecutir os padrões utilitaristas e hedonistas suficientes para mitigar os danos, para ele esta consecução já poderá revelar-se através de tal valor.

Acresce que urge ter em consideração a sua inação  perante a decisão de  07.12.2015 de prorrogação da medida de prisão preventiva.

Se ele dela tivesse recorrido, não é de por de parte a possibilidade de revogação da medida, e, assim, a sua libertação  quase seis meses antes, ou seja, poderia ter cumprido menos de metade da prisão preventiva.

Ademais, nesta perspetiva, e considerando os curtos prazos de revisão desta medida, também merece alguma relevância a sua inação no sentido de não ter pugnado pela sua revisão/revogação no largo período de tempo que decorreu posteriormente a Dezembro de 2015 e até à sua libertação junho de 2016.

Finalmente, the last but not the least, passe o anglicismo, não é despiciendo, antes pelo contrário, o facto de ele ter sido absolvido apenas com base no princípio in dúbio pro reo.

O que, tanto quanto se intelige, decorreu, essencial e determinantemente, do facto de as gravações para memória futura da sua filha queixosa, estranhamente, se terem tornado inaudíveis.

E de esta se ter recusado – sem se saber realmente o verdadeiro motivo para tal recusa -  a prestar depoimento em audiência de julgamento.

Ora ainda que, por deliberação do TC, este facto não tenha virtualidade para, qualitativamente, afastar a aplicação da previsão do artº 225º nº1 al. c) do CPP, ele já assume dignidade e relevância bastantes para influenciar, quantitativamente, a compensação a atingir.

Se assim não fosse, estar-se-ía a ferir o principio do respeito pela justiça relativa ou comparativa, por reporte aos casos em que tenha havido absolvição por comprovada e inequívoca inocência do arguido.

Há que convir que são situações diferentes, as quais, assim, e no atinente ao montante compensatório, têm, inelutavelmente, de merecer tratamento diferenciado.

Pois que enquanto neste caso fica provado que este não praticou o crime, naquele existem duvidas quanto à sua prática ou não prática, as quais, porém, em função do aludido princípio, beneficiam o arguido.

O que não é a mesma coisa.

Tudo visto e ponderado julga-se adequado fixar a compensação em dez mil euros.

Montante este que, como se disse, e, vg., perante a situação económico financeira relativamente modesta  do autor, não é despicienda, antes pelo contrário, pois que, inclusive, corresponde a quase mil euros por mês por reporte ao período de cerca de dez meses e meio em que esteve detido.

Valor tal que, assim, ponderadas e sagazmente interpretadas todas as circunstâncias do caso, se considera e julga, equitativamente, melhor ínsito em parâmetros e limites perspetiváveis, quiçá mais próximo do seu limite mínimo, mas  mesmo assim aceitável, atenta a faculdade concedida pelo artº 494º do CC.

Improcede o recurso do autor e procede, parcialmente, o recurso do réu.

6.

Sumariando – artº 663º nº7 do CPC.

I - Apenas os danos futuros certos ou razoavelmente previsíveis, e não os meramente eventuais ou hipotéticos, são indemnizáveis ao abrigo do artº564º do CC.

II - No caso de mera culpa do lesante, a indemnização/compensação por danos não patrimoniais pode ser fixada, equitativamente, em montante inferior ao que corresponderia aos danos causados -  arº 494º do CC.

III - Assim, para o lesado, de remediada condição económico financeira, acusado de crimes sexuais contra a sua filha, preso preventivamente cerca de dez meses e meio, sem ter recorrido ou pedido a reapreciação da medida de coação, e depois - por inaudibilidade das declarações para memória futura da filha e da recusa desta em depor em julgamento -, ter sido foi absolvido apenas com base no princípio in dúbio pro reo, é  adequada a compensação, a tal título, de dez mil euros.

7.

Deliberação.

Termos em que se acorda julgar o recurso do autor improcedente.

E mais se acorda julgar o recurso do réu parcialmente procedente e, consequentemente, agora, condenar-se o mesmo a pagar ao autor a quantia de dez mil euros como compensação a título de danos não patrimoniais.

Custas na proporção da presente sucumbência.

Coimbra, 2022.07.12.

Voto de vencido (Proc.4978/16) Discorda-se do acórdão maioritário, por várias razões. - Quanto aos factos provados/não provados e relativamente ao facto 1.16, ao contrário do afirmado no acórdão, em sede de apreciação jurídica da 1ª instância foi expendido que tal facto não se provou, sim, mas também se expendeu que se provou (basta ler). Portanto, a aludida contradição quanto a este facto não pode ser resolvida no sentido da sua não prova, sem mais, como se decidiu, sem considerar a prova produzida. - Quanto à fixação do valor dos danos morais: i) Não se afigura ter relevo diminutivo da indemnização o A. não ter recorrido da decisão proferida em 7.12.2015 na qual foi mantida a medida de coação de prisão preventiva que havia sido aplicada, porque se tratou de um mero despacho tabelar (consultar o despacho) de revisão periódica da medida de coação aplicada, estando o julgamento agendado para breve. Do despacho que aplicou a medida de coação, esse sim importante, o A. recorreu. ii) Diz-se que o A. foi absolvido apenas com base no princípio in dubio pro reo, o que não é em rigor verdadeiro, pois o que o decisão proferida no processo criminal disse, preto no branco, coisa bem diferente, é que não existiu nenhuma prova para condenar o arguido (é claro que a menção a que as gravações estavam inaudíveis e a jovem se ter recusado a depor não pode ser vista como elemento factual contra o A. !). iii) Está-se a reactivar, injustificadamente, o princípio do in dubio pro reo como alternativa à possibilidade de o arguido provar a sua inocência, o que o STJ, em voto de vencido e o T. Constitucional rejeitou abertamente. A lei não exige a comprovação positiva da inocência dos arguidos, como o TC afirmou claramente. Aliás, os arguidos podem nem sequer apresentar contestação, porque o Mº Pº é que tem o ónus da prova da acusação. Assim a importância que se dá a tal diferenciação é injustificada constitucionalmente e ordinariamente para fazer diminuir o valor da indemnização a fixar. - Em suma, manteria a condenação proferida na 1ª instância, por se apresentar como valor no limiar mínimo aceitável e julgaria improcedente o recurso do MP e do A.

Moreira do Carmo