Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1735/16.1T8CBR-C.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FONTE RAMOS
Descritores: INSOLVÊNCIA
LIQUIDAÇÃO
VENDA
ACTO ESPECIAL DE RELEVO
CONSENTIMENTO
Data do Acordão: 05/09/2017
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA - COIMBRA - JUÍZO COMÉRCIO - JUIZ 1
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS.55, 161, 164 CIRE, 811 CPC
Sumário: 1. Cabendo ao administrador da insolvência (AI) promover a alienação dos bens que integram a massa insolvente (art.º 55º, n.º 1, a) do CIRE) a sua autonomia só fica limitada quanto à prática de actos jurídicos que assumam especial relevo para o processo de insolvência, para os quais necessita do consentimento prévio da comissão de credores ou, se esta não existir, da assembleia de credores (art.º 161º, n.ºs 1 e 2 do CIRE).

2. A escolha pelo AI de uma qualquer modalidade de venda em que a fixação dos respectivos elementos dependa do acordo que ele possa estabelecer com o potencial adquirente impõe a submissão dessa venda ao regime do art.º 161º, n.º 4 do CIRE.

3. Nos demais casos de venda, face ao preceituado no n.º 1 do referido art.º, o consentimento da comissão ou da assembleia de credores é apenas para a alienação, sendo desejável que sejam previamente informadas dos elementos possíveis do negócio (v. g., base de licitação/valor base).

4. A faculdade prevista no n.º 5 do art.º 161º do CIRE cinge-se às modalidades de venda em que a fixação dos respectivos elementos dependa do acordo entre o AI e o potencial adquirente.

5. O regime previsto no art.º 161º, do CIRE, aplica-se às insolvências em geral.

Decisão Texto Integral:





            Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

 

            I. Nos presentes autos de insolvência de pessoa singular, os insolventes, A (…) e mulher C (…), notificados do despacho de 30.11.2016 - com o seguinte teor: «Os insolventes requerem a suspensão da alineação do imóvel em curso ao Banco (…), S. A., e a convocação da assembleia de credores para prestar o seu consentimento à operação com fundamento no disposto no art.º 161º, n.º 5 do CIRE.//Alegam, para o efeito, que recepcionaram uma proposta de aquisição do imóvel de valor superior ao proposto pelo Banco (…).//A alienação de um imóvel da titularidade de uma pessoa singular insolvente não consubstancia um ´ato de especial relevo` e, como tal, a sua concretização não carece do consentimento da comissão de credores ou da assembleia de credores (cf. art.º 161º, n.ºs 1, 2 e 3 ´a contrario` do CIRE).//Por conseguinte, no caso vertente, a alienação em curso não carece do consentimento da assembleia de credores, cabendo ao administrador da insolvência a sua concretização em conformidade com os procedimentos legais aplicáveis.//Os autos não indiciam o incumprimento de qualquer um destes procedimentos.//            Assim sendo, por falta de fundamento legal, indefiro a pretensão dos insolventes no sentido de sobrestar a venda em curso.» - e dizendo-se inconformados, apelaram, formulando as seguintes conclusões:

            1ª - O imóvel relativamente ao qual os devedores/insolventes requereram o sobrestar na alienação corresponde ao ÚNICO bem imóvel que integra o activo da massa falida;

            2ª - E no arrazoado que deu origem ao despacho recorrido, os insolventes demonstraram haver uma possibilidade real e efectiva de venda do imóvel por um valor superior ao obtido pelo Administrador da Insolvência/AI (conforme única proposta, no valor de € 25 200, apresentada pelo credor hipotecário Banco (…)S. A.), nomeadamente através da proposta que anexaram ao requerimento que deu entrada nos autos em 24.11.2016, concretamente no valor de € 29 000;

            3ª - A eventual venda do imóvel ao credor hipotecário Banco (…) S. A., no montante de € 25 200, ao invés da alienação ao já referido particular (pelo valor de € 29 000), ou a outro interessado que entretanto surja com um valor de proposta igual ou superior, é efectivamente prejudicial ao demais credores e aos próprios devedores/insolventes;

            4ª - E é prejudicial para os demais credores, desde logo porque o BCP, S A, na esteira da sentença de homologação de créditos reconhecidos e da graduação dos mesmos, apresenta-se (com um crédito reclamado cifrado em € 25 850,36) a ser pago em primeiro lugar sobre o único bem que integra a massa insolvente;

            5ª - É igualmente prejudicial para os devedores/insolventes, porquanto a venda do imóvel por um valor superior ao oferecido pelo credor hipotecário lhes será sempre mais benéfico;

            6ª - Parece-nos ser de qualificar como de especial relevo a alienação do imóvel em causa, atento o que se expôs e ao disposto no n.º 2 do art.º 161º do CIRE;

            7ª - Os devedores/insolventes cumpriram os requisitos a que alude o art.º 161º, n.º 5, do CIRE, com vista ao sobrestar na alienação ao credor hipotecário e convocar-se a assembleia de credores para prestar o seu consentimento à operação;

            8ª - A decisão recorrida violou designadamente o disposto no art.º 161º, n.ºs 1, 2, e 5, do CIRE.

            Rematam dizendo que “deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que ordene sobrestar na alienação do único bem que integra a massa falida e convoque a assembleia de credores para prestar o seu consentimento à operação/alienação”.

            Não houve resposta.

            Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa decidir se estão reunidos os pressupostos para se sobrestar a alienação e convocar uma assembleia de credores para deliberar sobre a venda.


*

            II. 1. Para a decisão do recurso releva o que se descreve no antecedente “relatório” e, ainda, o seguinte:[1]

            a) Os devedores foram declarados insolventes por sentença de 07.3.2016.

            b) Na assembleia de credores (de apreciação do relatório), realizada em 02.5.2016, foi deliberado proceder à venda dos bens dos insolventes.

            c) Procedeu-se à apreensão do prédio urbano descrito na CRP de Condeixa-a-Nova sob o n.º 278, da freguesia e concelho de Condeixa-a-Nova, inscrito na respectiva matriz predial sob o art.º 430.

            d) Em 13.9.2016, não obtida qualquer proposta para aquisição do referido imóvel, único bem apreendido, o AI informou nos autos que se encontrava “a preparar uma diligência de venda que seria agendada em breve”.

            e) Em 18.10.2016, o AI informou que “apesar das diligências e contactos efectuados (…) não se conhece qualquer potencial interessado no referido imóvel” e que havia marcado uma abertura de propostas a ter lugar no seu escritório, no dia 07.11.2016, pelas 9.30 horas, ficando estabelecido um valor mínimo de venda de € 25 200.

            f) Relativamente à referida venda, em 15.10.2016, foi publicado um anúncio num jornal nacional diário (“CM”). 

            g) Notificados pelo AI do anúncio de abertura de propostas, vieram os insolventes requerer, em 20.10.2016, que fosse “dada sem efeito a abertura de propostas designada para o próximo dia 07/11/2016, pelas 9h30”, aduzindo que “nunca foram notificados de qualquer avaliação, ou resultado da mesma, levada a cabo ao Prédio Urbano em causa, nem qualquer outro acto de determinação do valor do imóvel”, pelo que, para eventual pronúncia, deveriam ser previamente informados “do modo como foi determinado o valor mínimo de venda.

            h) Veio então o AI informar aos autos, nomeadamente, que “o valor mínimo definido para a venda agendada, numa quantia de € 25 200, foi indicado pelo credor hipotecário, Banco (…), S. A., após avaliação efectuada”; “o valor do imóvel determinado pela Autoridade Tributária e Aduaneira cifra-se em € 17 530, sendo tal avaliação datada de 2015”; “ainda que o imóvel em causa com inscrição na matriz em 1970 tenha uma área global de 92,4 m2, apenas 39,3 m2 se referem a área coberta”; “caso se venha a verificar que o valor mínimo de venda pecou por excesso, o signatário irá rever tal valor, com vista a possibilitar a liquidação do imóvel”.

            i) A pretensão dos insolventes, dita em II. 1. g), foi indeferida por despacho de 04.11.2016, por se considerar que a projectada venda não padecia de “qualquer vício ou irregularidade” e terem sido observadas as disposições legais relativas à “publicitação da venda e fixação do respectivo valor”.

            j) Por requerimento de 08.11.2016, o AI informou aos autos, designadamente: na diligência designada para o dia anterior, “a única proposta foi apresentada pelo credor hipotecário (…) na qual se propôs a adquirir o prédio urbano apreendido por uma quantia de 25 200 euros”; “porque cumpria as condições de venda e por não haver outra proposta mais favorável, considera-se que a mesma deve ser aceite”.[2]

            k) Invocando o disposto no n.º 5 do art.º 161º do CIRE, em 24.11.2016, os insolventes formularam a pretensão objecto da decisão recorrida, alegando, além do mais, que o imóvel em causa terá um valor de mercado superior a € 25 200 e foi apresentada uma proposta por um particular directamente ao insolvente, de aquisição do imóvel sub iudice, cifrada no valor de € 29 000, pelo que a alienação ao sobredito particular, ou a outro interessado que entretanto surja com um valor de proposta igual ou superior (na sequência de uma avaliação do imóvel levada a cabo por entidade sem relação de interesse com os presentes Autos), ao invés do credor hipotecário, afigura-se mais vantajosa para a massa insolvente.

            l) Consta do documento reproduzido a fls. 17 verso que a invocada “proposta particular”, dirigida ao insolvente, é de 04.11.2016.

            m) Foram reconhecidos créditos (de Bancos e Instituições Financeiras de Crédito) no montante global de € 74 150,02, sendo o crédito hipotecário de € 25 897,86.

            n) Por sentença de 01.6.2016, o crédito hipotecário de Banco (…) S. A, foi graduado em 1º lugar; em 2º lugar ficaram os demais créditos reconhecidos “com excepção dos créditos subordinados”.

            2. Cumpre apreciar e decidir com a necessária concisão.

            Depende do consentimento da comissão de credores, ou, se esta não existir, da assembleia de credores, a prática de actos jurídicos que assumam especial relevo para o processo de insolvência (art.º 161º, n.º 1, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas/CIRE[3] - sob a epígrafe “necessidade de consentimento” -, aprovado pelo DL n.º 53/2004, de 18.3). Na qualificação de um acto como de especial relevo atende-se aos riscos envolvidos e às suas repercussões sobre a tramitação ulterior do processo, às perspectivas de satisfação dos credores da insolvência e à susceptibilidade de recuperação da empresa (n.º 2). Constituem, designadamente, actos de especial relevo: a) A venda da empresa, de estabelecimentos ou da totalidade das existências; b) A alienação de bens necessários à continuação da exploração da empresa, anteriormente ao respectivo encerramento; c) A alienação de participações noutras sociedades destinadas a garantir o estabelecimento com estas de uma relação duradoura; d) A aquisição de imóveis; e) A celebração de novos contratos de execução duradoura; f) A assunção de obrigações de terceiros e a constituição de garantias; g) A alienação de qualquer bem da empresa por preço igual ou superior a (euro) 10000 e que represente, pelo menos, 10 % do valor da massa insolvente, tal como existente à data da declaração da insolvência, salvo se se tratar de bens do activo circulante ou for fácil a sua substituição por outro da mesma natureza (n.º 3). A intenção de efectuar alienações que constituam actos de especial relevo por negociação particular bem como a identidade do adquirente e todas as demais condições do negócio deverão ser comunicadas não só à comissão de credores, se existir, como ao devedor, com a antecedência mínima de 15 dias relativamente à data da transacção (n.º 4). O juiz manda sobrestar na alienação e convoca a assembleia de credores para prestar o seu consentimento à operação, se isso lhe for requerido pelo devedor ou por um credor ou grupo de credores cujos créditos representem, na estimativa do juiz, pelo menos um quinto do total dos créditos não subordinados, e o requerente demonstrar a plausibilidade de que a alienação a outro interessado seria mais vantajosa para a massa insolvente (n.º 5).

            Transitada em julgado a sentença declaratória da insolvência e realizada a assembleia de apreciação do relatório, o administrador da insolvência procede com prontidão à venda de todos os bens apreendidos para a massa insolvente, independentemente da verificação do passivo, na medida em que a tanto se não oponham as deliberações tomadas pelos credores na referida assembleia (art.º 158º, n.º 1).

            O administrador da insolvência escolhe a modalidade da alienação dos bens, podendo optar por qualquer das que são admitidas em processo executivo ou por alguma outra que tenha por mais conveniente (art.º 164º, n.º 1). O credor com garantia real sobre o bem a alienar é sempre ouvido sobre a modalidade da alienação, e informado do valor base fixado ou do preço da alienação projectada a entidade determinada (n.º 2).

            3. Atento o disposto no art.º 161º, a prática de actos jurídicos, que assumam especial relevo para o processo de insolvência, depende do consentimento da comissão de credores, ou, se esta não existir, da assembleia de credores.

            Assim, à luz do referido art.º, terá especial relevo quer um acto relativamente ao qual se preencham os índices do n.° 2, quer um acto que se apresente como análogo àqueles que estão enunciados no n.° 3 - tanto dos índices, quanto dos casos expressamente previstos (lista, meramente enunciativa, de situações que se classificam como tal), resulta que terão especial relevo actos que influenciem decisivamente o processo de insolvência, quer porque têm especial impacto na massa insolvente, quer porque repercutem efeitos no conjunto das dívidas da insolvência.

            Relativamente ao consentimento, diz-nos n.° 4 do art.º 161º que elementos devem ser comunicados pelo AI à comissão de credores e ao devedor quando aquele tenha a intenção de efectuar alienações, que constituam actos de especial relevo, desde que a modalidade da venda seja a negociação particular.

            Quanto ao âmbito específico deste normativo e atendendo aos riscos inerentes à venda por negociação particular face a outras formas de venda, dir-se-á que o n.° 4 do art.º 161º visa aumentar as exigências de transparência e de isenção, pelo que as formalidades aí previstas constituem um plus face ao que se dispõe no n.° 1.

            Ademais, analisadas as formalidades das diversas formas de alienação que poderão estar em causa (cf., v. g., os art.ºs 811º e seguintes do Código de Processo Civil e o art.º 164º, n.º 1 do CIRE) compreende-se porque só na negociação particular é possível informar os elementos essenciais do negócio à comissão ou à assembleia de credores para que seja prestado consentimento, porquanto constitui o único tipo de venda em que o preço e outras condições são susceptíveis de fixação bilateral por AI e adquirente.

            Por isso se exige que, neste caso e para prevenir eventuais fraudes, a comissão ou a assembleia de credores e o devedor sejam informados dos termos do negócio projectado, aquelas para prestarem o seu consentimento, este para exercer a faculdade que o art.º 161º, n.º 5 lhe confere.

            Consequentemente, a escolha pelo AI de uma qualquer modalidade de venda em que a fixação dos respectivos elementos dependa do acordo que ele possa estabelecer com o potencial adquirente impõe a submissão dessa venda ao regime do art.º 161º, n.º 4.

            E nos outros casos seria desejável que a comissão ou a assembleia fossem informados dos elementos possíveis do negócio (v. g., base de licitação/valor base) antes de aqueles órgãos da insolvência prestarem o respectivo consentimento. No entanto, perante o preceituado no art.º 161º, n.º 1, assim não sucede; o consentimento é para a alienação e nada mais.

            Dir-se-á, ainda, que a previsão do n.º 5 do art.º 161º cinge-se à venda por negociação particular (com a abrangência supra referida), que poderá ser sobrestada pelo juiz havendo requerimento do devedor ou de credor relevante nesse sentido e desde que o requerente demonstre a plausibilidade de a alienação a outro interessado ser mais vantajosa para a massa insolvente.[4]

            4. No âmbito dos procedimentos de liquidação da massa insolvente, cabe ao AI determinar a modalidade da venda - a decisão quanto à escolha é cometida, em exclusivo, ao AI, segundo o seu critério e tendo em conta o que entenda ser mais conveniente para os interesses dos credores, podendo optar por qualquer das que são admitidas em processo executivo ou por alguma outra que tenha por mais conveniente (art.º 164º, n.º 1).[5]

            O AI, por sua própria iniciativa, poderá solicitar a colaboração da comissão de credores ou da própria assembleia de credores, solicitando-lhes que se pronunciem sobre a modalidade ou modalidades da venda a adoptar, e deverá sempre ouvir previamente os credores que tenham garantia real sobre os bens a alienar acerca do meio pelo qual devem ser vendidos (cf. o n.º 2 do mesmo art.º).

            Cabendo ao AI promover a alienação dos bens que integram a massa insolvente [art.º 55º, n.º 1, a)] a sua autonomia só fica limitada quanto à prática de actos jurídicos que assumam especial relevo para o processo de insolvência, para os quais necessita do consentimento prévio da comissão de credores ou, se esta não existir, da assembleia de credores (art.º 161º, n.ºs 1 e 2).

            5. Na perspectiva dos recorrentes, na situação em análise, deveria ser convocada a assembleia de credores para prestar o seu consentimento à operação/alienação, porquanto verificada a situação prevista nos n.ºs 4 e 5 do art.º 161º, com o preenchimento dos correspondentes requisitos adjectivos/processuais e substantivos.

            Porém, como vimos, ao AI cabia providenciar pela realização da venda conforme deliberado pela assembleia de credores; o AI informou regularmente sobre o estado da liquidação (art.º 61º, n.º 1) e deu conta, atempadamente, de todos os procedimentos tendentes à projectada e efectivada venda mediante propostas em carta fechada (cf., designadamente, II. 1. alíneas b), d) a f), h) e j), supra) e era, então, e no correspondente enquadramento adjectivo, que os insolventes poderiam e deveriam dar o seu contributo no sentido de vir a ser alcançado desfecho que consideravam mais vantajoso para a massa insolvente (quiçá, inclusive, providenciando para que a pretensa “proposta de aquisição” dita em II. 1. k) e l), supra, pudesse ser considerada).

            6. No descrito enquadramento fáctico e normativo, também não colhe a aparente oposição dos insolventes à forma como foi indicado o valor mínimo de venda, tanto mais que, tratando-se de um valor razoável/admissível, era, naturalmente, apenas, o valor mínimo de aquisição, de resto, bem superior ao valor do imóvel determinado pela Autoridade Tributária e Aduaneira, em 2015 [cf. II. 1. e) e h), supra].

            7. Ademais, sabendo-se que o preceituado no n.º 4 do art.º 161º só impõe a comunicação (dos elementos do negócio) quando a venda é efectuada na modalidade de negociação particular, e pressupondo a faculdade prevista no n.º 5 do mesmo art.º a existência dessa modalidade de venda[6], é assim irrecusável que a pretensão deduzida pelos insolventes não podia ser atendida.

            8. Por último, importa referir que o regime previsto no art.º 161º, atendendo, desde logo, à sua inserção sistemática, se aplica quer à insolvência das pessoas colectivas, quer à das pessoas singulares[7], e nenhum argumento decisivo em contrário se poderá extrair do que a título exemplificativo vem enumerado no seu n.º 3, pelo que não corroboramos a “asserção”, levada à decisão sob censura, de que a alienação de um imóvel da titularidade de uma pessoa singular insolvente não/nunca poderá consubstanciar acto de especial relevo.

            9. Soçobram, desta forma, as “conclusões” da alegação de recurso.


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            III. Face ao exposto, julga-se improcedente a apelação e confirma-se o despacho recorrido, embora com fundamentação não coincidente.
            Custas pela massa insolvente.

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09.5.2017


Fonte Ramos ( Relator )

Maria João Areias

Vítor Amaral

           



           


[1] Cf. os documentos de fls. 2 a 4, 6 verso, 8, 10, 11 verso, 15 verso, 33 verso, 35 verso e 38.

[2] Refere-se no requerimento do AI de 22.02.2017 que “não se chegou a finalizar a venda do imóvel apreendido”, aguardando-se a decisão deste recurso, após o que, sendo caso disso, se “diligenciará pela rápida transmissão do imóvel ao respectivo credor hipotecário nos termos propostos” (fls. 30 verso).
[3] Diploma a que respeitam os normativos adiante citados sem menção da origem, relevando actualmente a redacção conferida pela Lei n.º 16/2012, de 20.4 e o DL n.º 26/2015, de 06.02.
[4] Sobre todo o ponto II. 3, vide Paula Costa e Silva, A liquidação da massa insolvente/Os actos de especial relevo, in Revista da Ordem dos Advogados, 65 (2005), III e Carvalho Fernandes e João Labareda, CIRE Anotado, Quid Juris-Sociedade Editora, 2009, págs. 534 a 537.

[5] Esta faculdade de escolha de modalidades de venda não reguladas no processo executivo tem inerente a possibilidade de o administrador de insolvência escolher formas atípicas de venda e de definir ele mesmo as regras a que a modalidade escolhida deve obedecer, nada obstando a que a modalidade escolhida seja afinal uma mistura de procedimentos próprios das modalidades típicas do processo executivo – cf. o acórdão da RP de 29.5.2014-processo 615/11.1TYVNG-D.P1, publicado no “site” da dgsi.
[6] Cf., entre outros, os acórdãos da RP de 21.5.2013-processo 757/09.3TYVNG-P.P1 e 16.9.2014-processo 1040/12.2TBLSD-G.P1, publicados no “site” da dgsi.
[7] Veja-se, por exemplo, a situação objecto do acórdão da RP de 13.12.2011-processo 4700/08.9TBSTS-H.P1, publicado no “site” da dgsi.