Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
5937/17.5T8VIS.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: EMÍDIO SANTOS
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
INDEMNIZAÇÃO
DANOS
DANO BIOLÓGICO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Data do Acordão: 12/10/2019
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso:
TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE VISEU - VISEU - JC CÍVEL - JUIZ 3
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE
Legislação Nacional: ARTS. 8 Nº3, 494, 496, 564, 566 CC, DL Nº 291/2007 DE 21/8
Sumário: I- É equitativa a indemnização de € 15 000 destinada a compensar um défice funcional permanente da integridade física ou psíquica, fixado em 4 pontos, no seguinte quadro: o défice funcional, embora compatível com a actividade profissional da lesada, implica esforços suplementares para ela; é de prever, atendendo à idade da lesada (34 anos), que a maior penosidade no exercício da sua actividade habitual se faça sentir durante um longo período.

II- A medida da indemnização devida pela perda da remuneração da lesada durante o período em que esteve temporariamente incapacitada para o exercício da sua actividade profissional é calculada com base na remuneração mensal líquida.

III- Não resultando dos factos provados que a remuneração mensal da lesada variava em função do número de dias úteis do mês, há que tomar em consideração, no cálculo da indemnização devida pela perda da remuneração durante o período de incapacidade temporária, a totalidade deste período e não apenas os dias úteis que lhe correspondam.

IV- A prova de que, “no futuro, as sequelas (raquialgias cervicais) se agravarão e que este agravamento exigirá acompanhamento e tratamento médicos” configura um caso de danos futuros e previsíveis, embora não determináveis. A consequência é relegar a fixação da indemnização para decisão ulterior, a proferir em incidente de liquidação.

V- É equitativa a indemnização de € 20 000, a título de danos não patrimoniais, numa situação com as seguintes características: 1) Dores avaliadas no grau 3, numa escala de 7 graus de gravidade crescente, entre a data do acidente e a cura ou consolidação das lesões; 2) Manutenção das dores, após a consolidação das lesões, apesar da toma de medicamentos; 3) Tristeza e ansiedade da lesada com as sequelas do acidente; 4) Condicionamento na realização de actos correntes da vida diária, familiar e profissional, mesmo depois da consolidação das lesões; 5) Ausência de culpa quanto à produção dos danos.

Decisão Texto Integral:

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra

C (…), residente (…) São Pedro do Sul, propôs a presente acção declarativa com processo comum contra T (…) Companhia de Seguros, S.A., com sede na Avenida da Liberdade, n.º 242, Lisboa, pedindo:
1. A condenação da ré a pagar-lhe € 84 417,85, a título de indemnização por danos patrimoniais (4 417.85) e dano biológico (€ 80 000,00);
2. A condenação da ré a pagar-lhe € 50 000,00, a título de indemnização por danos morais;
3. A condenação da ré a pagar-lhe juros legais desde a citação até ao efectivo e integral pagamento;
4. A condenação da ré a, de futuro, ministrar e/ou pagar à autora todo o tipo de tratamentos, intervenções cirúrgicas, internamentos, acompanhamento médico e medicamentoso de que a autora venha a necessitar em consequência das lesões sofridas no acidente de que ficou a sofrer bem como todas as despesas inerentes a essa assistência como deslocações.

Os montantes pedidos visavam ressarcir a autora dos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos por ela em consequência de acidente de viação ocorrido 13-11-2015, ao km 69.900 da EN 16, área do concelho de São Pedro do Sul. Segundo a autora, tal acidente foi imputável exclusivamente ao condutor de um veículo automóvel seguro na ré.

A ré contestou, pedindo que a acção fosse julgada em função da prova a produzir em audiência de julgamento.

O processo prosseguiu os seus termos e após a realização da audiência final foi proferida sentença que, julgando parcialmente procedente a acção, decidiu:
1. Condenar a ré a pagar à autora € 35 000,00 (trinta e cinco mil euros), a título de indemnização do dano biológico e dos danos não patrimoniais, acrescidos de juros vencidos e vincendos desde a decisão até ao efectivo e integral pagamento, à taxa legal de 4%;
2. Condenar a ré a pagar à autora € 2 693,49 (dois mil e seiscentos e noventa e três euros e quarenta e nove cêntimos), a título de indemnização das despesas feitas com o tratamento das lesões e da perda de rendimentos no período em que ela esteve incapacitada para o desempenho da sua actividade profissional, acrescidos de juros vencidos e vincendos desde a data da citação da ré (8/1/2018) até ao efectivo e integral pagamento, à taxa legal de 4%;
3. Condenar a ré a ministrar/pagar à autora os tratamentos, intervenções cirúrgicas, internamento, acompanhamento médico e medicamentoso de que esta venha a necessitar em consequência das lesões sofridas no acidente, incluindo as despesas inerentes a essa assistência, designadamente as deslocações, a liquidar ulteriormente;
4. Absolver a ré do demais contra si peticionado pela autora.

A ré não se conformou com a decisão e interpôs o presente recurso de apelação, pedindo a revogação dos seguintes segmentos da decisão:
1. Do que a condenou no pagamento de € 15 000,00, a título de indemnização pelo dano biológico;
2. Do que a condenou no pagamento de € 941,00, a título de indemnização do lucro cessante, ou seja, da perda de rendimentos no período em que autora esteve incapacitada para o desempenho da sua actividade profissional;
3. Do que a condenou no pagamento dos tratamentos, intervenções cirúrgicas, internamento, acompanhamento médico e medicamentoso de que esta venha a necessitar em consequência das lesões sofridas no acidente, incluindo as despesas inerentes a essa assistência, designadamente as deslocações, a liquidar ulteriormente;
4. Do que a condenou no pagamento de € 20 000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais.

Em relação ao primeiro segmento, pediu a substituição dele por decisão que fixasse o montante da indemnização em € 10 000,00.

Em relação ao segundo, pediu a substituição dele por decisão que fixasse o montante da indemnização em € 464,48.

Em relação ao terceiro, pediu a substituição dele por decisão que absolvesse a ré da obrigação de pagar à autora os tratamentos, intervenções cirúrgicas, internamento, acompanhamento médico e medicamentoso de que esta venha a necessitar em consequência das lesões sofridas no acidente, incluindo as despesas inerentes a essa assistência, designadamente as deslocações, a liquidar ulteriormente.

Em relação ao quarto, pediu a substituição dele por decisão que fixasse o montante da indemnização em € 10 000,00.

Os fundamentos do recurso consistiram em resumo:
1. Na impugnação da decisão de julgar provados os factos discriminados na sentença sob os números 6.83 e 6.85;
2. Na alegação de que a decisão recorrida ofendeu o preceituado nos artigos 342.º, 496.º, 562.º e 566.º, todos do Código Civil.

A autora respondeu, sustentando a manutenção da decisão relativa aos pontos da matéria de facto impugnados, bem como a confirmação da decisão relativa às indemnizações contestadas.


*

Síntese das questões suscitadas pelo recurso  
1. Saber se a decisão relativa à matéria de facto errou ao julgar provados os factos discriminados sob os números 6.83 e 6.85 e se a prova indicada pela recorrente impõe a alteração da decisão no sentido indicado por ela;
3. Saber se a decisão recorrida, nos segmentos impugnados, ofendeu o preceituado nos artigos 342.º, 496.º, 562.º e 566.º, todos do Código Civil.

Impugnação da decisão relativa à matéria de facto:

Considerando que a resolução das questões de facto tem precedência lógica sobre a resolução das questões de direito, iremos começar o julgamento do recurso pelo conhecimento da impugnação da decisão relativa à matéria de facto.


I)

A recorrente impugnou, em primeiro lugar, a decisão de julgar provado que as lesões de que ficou a padecer a autora em consequência do acidente exigem acompanhamento médico, tratamentos, eventual cirurgia, internamento e medicação [ponto n.º 6.83 dos factos considerados provados].

Para o efeito alegou que, do relatório médico, referido na fundamentação da decisão de facto, e que era o único elemento de prova a debruçar-se sobre a matéria, não decorriam os factos que foram julgados provados.

Em consequência pediu se julgue não provada a matéria em causa.

A recorrida pugnou pela manutenção da decisão recorrida com a alegação:
1. Que o marido da autora, N (…) reproduziu a opinião de vários especialistas consultados quanto à necessidade futura, mais tarde ou mais cedo, de uma cirurgia e quanto aos tratamentos que ela vem efectuando, para controlar as dores;
2. Que a testemunha apresentada pela ré admitiu que as dores esporádicas inerentes à hérnia discal deviam ser controladas simplesmente com a toma de analgésicos;
3. Que era um facto notório que, quem padecia de uma hérnia discal, condenada a um agravamento dessa lesão, que lhe vinha causando dores, salvo um milagre que não vinha alegado, necessitaria de tratamentos e acompanhamentos médicos futuros.

Apreciação do tribunal:

Pelas razões a seguir expostas, há razões para altear, em parte, a decisão impugnada.

Para bem se perceber o sentido da decisão impugnada, importa ter em conta a matéria que o tribunal a quo julgou provada sob o número 6.82, ou seja, que “em consequência do acidente, a autora ficou a padecer de lesões permanentes, designadamente protusão posterior dos discos C4-C5 e C5-C6 e hérnia lateral em C6-C7, que lhe determinaram um défice funcional permanente da integridade física de 4 pontos, compatível com o exercício da sua actividade habitual, mas exigindo esforços suplementares, e sendo de admitir a existência de dano futuro”.

O tribunal a quo fundou a sua convicção na “articulação de toda a prova produzida”, dizendo que dela resultou “que as lesões de que a autora padece ao nível da coluna cervical têm tendência a agravar-se e irão exigir a sua submissão a intervenção cirúrgica e a tratamentos, como foi sendo comunicado à autora pelos vários especialistas que consultou e foi afirmado no relatório pericial junto aos autos, cujo valor probatório não foi abalado por qualquer outro meio de prova de igual ou superior valor produzido no âmbito dos presentes autos”.

Como resulta do exposto, ao passo que a recorrente ancora a sua pretensão de alteração da decisão de facto no relatório do exame médico feito à autora pelo Gabinete Médico-Legal e Forense de Dão Lafões [fls. 139 a 143], dizendo que foi o único meio de prova que se pronunciou sobre a questão, a recorrida invoca, para sustentar a manutenção da decisão, o depoimento do marido da autora (N (…)) e o da testemunha arrolada pela ré, O (…) (médico).

Sucede que a recorrida nem indicou as passagens da gravação em que se fundava para sustentar a manutenção da decisão de facto, nem procedeu à transcrição dos depoimentos que considerou importantes, como prescreve a alínea b) do n.º 2 do artigo 640.º do CPC.

Ainda que se desconsidere o cumprimento deste ónus e se aceite que a recorrida resumiu com fidelidade o que foi dito pelo marido da autora e por O (…), a verdade é que a resposta à questão de saber se o tribunal a quo errou na apreciação da prova deve ser dada especialmente pelas ilações a retirar do relatório pericial, atendendo às seguintes circunstâncias:
1. Em primeiro lugar, atendendo à presumida idoneidade, competência e imparcialidade de quem fez o exame médico e o respectivo relatório;
2. Em segundo lugar, à circunstância de os alegados especialistas consultados pela autora não terem sido inquiridos em audiência.

Posto isto, cabe dizer que o sentido da decisão proferida sob o ponto n.º 6.83 é o de que, no futuro, as lesões discriminadas sob 6.82 “exigem acompanhamento médico, tratamentos, eventual cirurgia, internamento e medicação”.

Sendo este o sentido dessa decisão, ela teria apoio no relatório médico se o perito que o elaborou tivesse declarado nele, expressa ou implicitamente, que as lesões discriminadas no ponto n.º 6.82 “exigem, no futuro, acompanhamento médico, tratamentos, eventual cirurgia, internamento e medicação”, o que não aconteceu. O relatório não inclui nenhuma afirmação com este sentido, nem ele se extrai do que o perito declarou a propósito das sequelas das lesões sofridas pela autora. No capítulo das sequelas, o perito apontou “raquialgias cervicais” e sobre a evolução das lesões e das sequelas afirmou que, tendo em conta o tipo de lesões sofridas bem como o quadro de sequelas e a sua habitual evolução, era de perspectivar a existência de dano futuro, o que podia obrigar a uma futura revisão do caso, considerando como tal exclusivamente o agravamento das sequelas que constituía uma previsão fisiopatologicamente certa e segura, por corresponder à evolução lógica, habitual e inexorável do quadro clínico.

O que se retira desta parte do relatório é que, segundo o perito, é certo e seguro o agravamento das sequelas, ou seja, o agravamento das raquialgias cervicais. O perito não se pronunciou, no entanto, sobre o momento em que se dará tal agravamento nem sobre os tratamentos médicos que ele irá requerer.

Com base no facto de as sequelas das lesões terem demandado tratamentos médicos pode dizer-se que o agravamento delas, também exigirá acompanhamento e tratamento médicos. A prova não permite, no entanto, ir mais além, especificando o tipo de acompanhamento ou de tratamentos médicos.

Em consequência, altera-se a decisão proferida sob o ponto n.º 6.83, julgando-se provado que “o agravamento, no futuro, das sequelas (raquialgias cervicais) exigirá acompanhamento e tratamento médicos”.


II)

A recorrente impugnou, em segundo lugar, a decisão de julgar provado que “à data do acidente, a autora trabalhava na T (…) S.A., onde actualmente ainda trabalha, exercendo funções de directora de serviços administrativos e financeiros em regime de comissão de serviço desde 1/10/2012, com um horário semanal de 37,5 horas, auferindo um vencimento base de € 1 568,24 à data do acidente e em 2017 de € 1 613,42, acrescido de subsídio de alimentação de € 5,00 por dia” [ponto n.º 6.85].

A recorrente pede a alteração da decisão no sentido de se julgar provado de “à data do acidente, a autora trabalhava na T (…) S.A., onde actualmente ainda trabalha, exercendo funções de directora de serviços administrativos e financeiros em regime de comissão de serviço desde 1/10/2012, com um horário semanal de 37,5 horas, auferindo um vencimento ilíquido de € 1 568,24 à data do acidente, e em 2017 de € 1 613,42, acrescido de subsídio de alimentação de e 5,00 por dia, a que correspondia um vencimento líquido em 2016, no valor de 1 085,80 e em 2017 no valor de e 1 132,81”.  

Para o efeito invocou os próprios meios de prova que serviram de fundamento à convicção do tribunal a quo, concretamente o extracto das remunerações [fls. 115 e seguintes do processo físico] e as declarações de IRS [fls. 104 a 110 do processos físico].

A recorrida respondeu, pugnando pela manutenção da decisão recorrida com a alegação de que não via razão para a troca de terminologia, de “base” para “ilíquido”, e que a inserção dos referidos vencimentos líquidos não tinha em conta, no ano de 2016, o período de baixa médica da autora, nem no ano de 2016 e 2017 tem em conta o subsídio de alimentação e os valores que são devolvidos à autora anualmente em função da liquidação do respectivo imposto.

Apreciação do tribunal:

Se compararmos a matéria julgada provada com a alteração indicada pela recorrente vê-se que ela pretende, por um lado, se julgue provado que o vencimento base julgado provado corresponde a remuneração ilíquida, e, por outro, que se adite à matéria de facto, a remuneração mensal líquida nos anos de 2016 e 2017.

Deste modo, impugnação da recorrente suscita no essencial duas questões de facto:
1. A primeira é a de saber se resulta dos meios de prova indicados por ela que o vencimento base da autora que o tribunal a quo julgou provado, por referência ao mês do acidente (13 de Novembro de 2015) e ao ano de 2017, constituía remuneração ilíquida;
2. A segunda é a de saber se resulta dos mesmos meios de prova que a tal remuneração ilíquida correspondia uma remuneração líquida mensal de € 1 085,80 no ano de 2016 e de € 1 132,81 no ano de 2017.

Tendo em conta os meios de prova indicados pela recorrente – documentos que também serviram de base à convicção do tribunal – é seguro dar resposta positiva às duas questões.  

Sobre a questão da remuneração ilíquida/líquida:

Um dos documentos que serviu de base à convicção do tribunal a quo sobre o montante mensal do vencimento foi o extracto de remunerações da autora registadas em seu nome na Segurança Social (fls. 115 a 116). Segundo tais extractos, em Novembro de 2015 (mês do acidente) e no ano de 2017, as remunerações base aí registadas foram, respectivamente, de € 1 568,24 e de € 1 613,42. Visto que, nos termos do artigo 44.º, n.º 1 Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Socia, para a determinação do montante das contribuições das entidades empregadoras e das quotizações dos trabalhadores, considera-se base de incidência contributiva a remuneração ilíquida devida em função do exercício da actividade profissional, é isento de dúvida que a remuneração que foi tida em conta foi a remuneração bruta.

Sobre a questão da remuneração líquida mensal:

Tendo em conta os rendimentos anuais constantes das declarações de rendimentos para efeitos de IRS (fls. 105 a 110), as retenções na fonte, as contribuições para a segurança social a sobretaxa (referente ano de 2016) e o facto de os rendimentos compreenderam o subsídio de férias e de Natal, conclui-se que o vencimento líquido é o indicado pela recorrente.

Pelo exposto, altera-se a decisão proferida sob o ponto n.º 6.85 no seguinte sentido ”à data do acidente, a autora trabalhava na T (…) S.A., onde actualmente ainda trabalha, exercendo funções de directora de serviços administrativos e financeiros em regime de comissão de serviço desde 1/10/2012, com um horário semanal de 37,5 horas, auferindo um vencimento base ilíquido de € 1 568,24 à data do acidente, e de € 1 613,42, em 2017, acrescido de subsídio de alimentação de € 5,00 por dia, a que correspondia um vencimento líquido em 2016, no valor de 1 085,80 e em 2017 no valor de e 1 132,81”.


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Julgada a impugnação da decisão relativa à matéria de facto, consideram-se provados os seguintes factos:
1. No dia 13 de Novembro de 2015, pelas 10h ao Km 69.000 da EN 16, na área do concelho de São Pedro do Sul, ocorreu um embate no qual foram intervenientes os veículos Toyota Yaris, de matrícula PX... , propriedade da autora e por esta conduzido, e o veículo Toyota Corolla, de matrícula BE... , propriedade de C (…) e por ele conduzido (artigos 1º, 2º e 3º da petição inicial).
2. Nas circunstâncias de tempo e lugar referidas no artigo anterior, a autora conduzia o seu veículo no sentido de marcha São Pedro do Sul/Vouzela, circulando dentro da hemifaixa da direita, atento tal sentido de marcha, a uma velocidade inferior a 50 Km/h, atenta a todo o trânsito de veículos e peões envolvente (artigos 4º e 5º da petição inicial).
3. Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar, C (…)conduzia o seu veículo na Rua da Fontainha, no sentido Termas/EN16/São Pedro do Sul, pretendendo a esta aceder e aí passar a transitar (artigo 6º da petição inicial).
4. O embate ocorreu no entroncamento da EN 16 (variante) com a Rua da Fontinha, situada à direita da EN 16, atento o sentido de marcha da autora (artigo 7º da petição inicial).
5. À entrada do entroncamento referido no artigo anterior, para quem circula na Rua da Fontinha e pretende aceder e passar a circular na EN 16 (variante), existia então e ainda existe um sinal de STOP (artigo 8º da petição inicial).
6. A visibilidade à distância, à entrada do referido entroncamento, no sentido provindo do Lugar das Termas, para a faixa da EN 16, é de mais de 100 metros para cada lado (artigos 9º e 17º da petição inicial).
7. Ao chegar ao referido entroncamento da Rua da Fontinha com a EN 16 (variante), C (…) não imobilizou o seu veículo, tendo prosseguido a sua marcha de forma continuada, acedendo à EN 16, não atentando ao trânsito que aí circulava, o que sucedeu no preciso momento em que a autora passava pela zona do dito entroncamento (artigo 10º e 11º da petição inicial).
8. Ao assim proceder, o condutor do veículo de matrícula BE... colocou-o na frente do veículo conduzido pela autora de matrícula PX... , não lhe cedendo prioridade de passagem, tornando impossível à autora evitar o embate, que ocorreu entre toda a frente do seu veículo e a parte lateral esquerda, zona da frente do veículo BE... (artigos 14º e 15º da petição inicial).
9. O embate ocorreu a meio da hemifaixa de rodagem direita, atento o sentido seguido pela autora (São Pedro do Sul/Vouzela) (artigo 16º da petição inicial).
10. O tempo encontrava-se seco e o piso em bom estado (artigo 17º da petição inicial).
11. Por acordo celebrado entre o proprietário do veículo de matrícula BE... , a responsabilidade civil decorrente da sua circulação encontrava-se transferida para a ré mediante a apólice nº (...) (artigo 21º da petição inicial).
12. Em 10 de Dezembro de 2015, a ré enviou à autora a carta cuja cópia consta de fls 22, na qual, além do mais aí exarado, refere: “Reportando-nos ao sinistro em título, de cuja regularização nos estamos a ocupar, cumpre-nos informar que, de acordo com, as diligências efectuadas pelos nossos serviços técnicos, estamos a assumir a responsabilidade pela regularização dos danos decorrentes deste sinistro” (artigo 24º da petição inicial).
13. Em consequência do embate, o veículo da autora sofreu danos em toda a sua parte frontal cuja reparação foi assumida e paga pela ré (artigo 26º da petição inicial).
14. Em consequência do embate, a autora sofreu traumatismo da coluna cervical, sem TCE, tendo sido assistida no CHTV, onde realizou exames e, após, foi-lhe dada alta clínica (artigo 27º da petição inicial).
15. Em consequência do sinistro e traumatismos referidos, a autora desde então e até à data presente, sente dores no fundo da cabeça, na coluna cervical, irradiando para o braço esquerdo, padecendo ainda de limitação de mobilidade de coluna cervical (artigos 28º, 29º, 65º da petição inicial).
16. Em 30 de Novembro de 2015, a autora foi observada nos serviços clínicos da ré, onde foi constatado, ao exame objectivo, rigidez da coluna cervical, com irradiação para a escápula esquerda (artigo 30º da petição inicial).
17. A autora efectuou RNM cervical em 16/12/2015, que apresentou hérnia discal C6/C7, com possível compromisso da raiz de C7, à esquerda (artigo 31º da petição inicial).
18. Novamente observada em 21/12/2015, a autora apresentava queixas de cervico-braquialgia esquerda, tendo iniciado plano de reabilitação (artigo 32º da petição inicial).
19. Mantendo-se as dores e dormência ao nível da cabeça, coluna e braço esquerdo, a autora foi novamente observada nos serviços clínicos da ré em 11/2/2016, com queixas de parestesias do membro superior esquerdo, e realizou EMG em 12/3/2016, do qual resultou síndrome do túnel cárpico bilateral, em estádio sensitivo, de gravidade ligeira, à direita e à esquerda (artigo 33º da petição inicial).
20. Em 18/3/2016, a autora foi observada na consulta de ortopedia da ré, tendo-lhe sido atribuída alta clínica, sem desvalorização, com ausência de nexo causal para as alterações relacionadas com síndrome do túnel cárpico bilateral e ausência de lesão radicular cervical (artigo 34º da petição inicial).
21. Dada a persistência das dores e dormências na coluna e cabeça, região occipital, a autora recorreu a uma ortopedista a título particular, tendo efectuado nova ressonância magnética em 23/6/2016, em cujo relatório foi exarado, além do mais: “Incipiente protusão posterior dos discos C4-C5 e C5-C6 sem causa evidente compromisso medular ou radicular na posição de estudo. Em C6-C7 identifica-se uma pequena hérnia postero-lateral esquerda do disco que preenche o quadrante contra-lateral esquerdo do canal raquidiano deformando a face ventral do cordão medular, que desvia para trás e para a direita (estiramento e/ou compressão radicular?...)” (artigo 35º da petição inicial).
22. A autora submeteu-se a consulta de neurologia para a qual foi remetida, tendo efectuado TC crânio-encefálico, tendo-lhe sido recomendado repouso absoluto e prescritos relaxantes musculares (Diazepan e A. D. T.), os quais aliviaram a dor mas causaram sonolência marcada, tendo estado de baixa médica entre 4/7/2016 e 18/7/2016, período em que fez igualmente fisioterapia (artigo 36º da petição inicial).
23. No dia 1 de Setembro de 2016, a autora submeteu-se a “radiografia da coluna cervical – 4 incidências” e a “radiografia da coluna dorsal” (artigo 38º da petição inicial).
24. Nos dias 8, 12 e 19 de Setembro de 2016, a autora foi a três consultas com o especialista de coluna vertebral Dr. (…) (artigo 39º da petição inicial).
25. A autora manteve avaliações nos serviços clínicos da ré até 20/9/2016, mantendo dores, limitação de movimentos, tratamentos de medicina física e de reabilitação (artigo 40º da petição inicial).
26. Em 20/9/2016, a autora foi avaliada uma última vez nos serviços da ré, que emitiram o “relatório final de avaliação de dano corporal em direito civil” constante de fls 25 v e 26, considerando consolidadas as suas lesões nessa data, no qual lhe foi atribuída uma ITP de 15 dias, uma Incapacidade Temporária Geral Parcial entre 14/11/2015 e 20/9/2016, e uma Incapacidade Permanente Geral de 4 pontos, aí se referindo “A hérnia discal terá nexo com o sinistro. Não aparenta compressão radicular activa, mas estará relacionada com queixas sensitivas. Existem esforços suplementares a nível laboral, pelos posicionamentos que levam a queixas álgicas a nível cervical”, e um quantum doloris de grau 2, numa escala de 1 a 7 (artigos 41º, 42º, 43º, 45º da petição inicial, artigo 14º da contestação).
27. Em tal relatório foi negada a existência de dano futuro, estético, de prejuízo sexual e de prejuízo na afirmação pessoal (artigo 44º da petição inicial).
28. Na ocasião em que os serviços clínicos da autora lhe deram alta, comunicaram-lhe que tinha sequelas e que teria que aprender a viver com elas (artigo 46º da petição inicial).
29. Antes do acidente, a autora não sofria da hérnia discal que foi causada pelo acidente e é geradora das dores e limitações de movimentos referidas (artigos 47º e 48º da petição inicial).
30. Desde 20/9/2016, a ré deixou de prestar qualquer assistência clínica à autora (artigo 49º da petição inicial).
31. Desde essa data, a autora mantém dores, designadamente à palpação dos processos espinhosos cervicais, limitações da mobilidade cervical, cansaço no final do seu horário laboral de 5.30 horas diárias, queixas ao nível dos músculos paravertebrais à esquerda (artigo 50º da petição inicial, artigos 8º, 9ºda contestação).
32. Desde então, a autora tem recorrido a serviços clínicos particulares para avaliação e tratamento das patologias que sofre em consequência do acidente (artigo 51º da petição inicial).
33. Em 30/9/2016, a autora recorreu a uma consulta de neurocirurgia no Hospital da CUF – Viseu com o Dr. (…) (artigo 52º da petição inicial).
34. Por conselho médico, a autora começou a fazer hidroginástica e yoga (artigo 54º da petição inicial).
35. Em Outubro de 2016, a autora efectuou uma consulta com um osteopata, que a encaminhou para um dentista, na sequência do que se submeteu, em 12/11/2016, a uma consulta na Clínica (…) Ld.ª (artigos 55º e 56º da petição inicial).
36. No dia 2 de Dezembro de 2016, mediante prescrição da médica de família, a autora realizou uma ecografia aos ombros e um RX às articulações temporo-maxilares (artigo 57º da petição inicial).
37. A autora submeteu-se a 4 sessões de acupuntura, com o Dr. (…) e, por sua recomendação, consultou novamente um dentista (Clínica (…)) para ver se existia algum problema de oclusão, que não foi detectado (artigo 58º da petição inicial).
38. A autora submeteu-se a dez sessões de fisioterapia entre 23/2/2017 e 10/3/2017 nas termas de São Pedro do Sul (artigos 59º e 60º da petição inicial).
39. Os tratamentos de fisioterapia e acunpunctura fazem com que as dores da autora diminuam temporariamente, mas não desaparecem (artigo 61º da petição inicial).
40. Por vezes a autora tem que interromper o trabalho e pedir a colegas fisioterapeutas que lhe façam uma massagem na cervical (artigo 62º da petição inicial).
41. Por força das dores de que ficou a padecer, no fundo da cabeça e pescoço, e braço, com maior intensidade na zona occipital e do lado esquerdo, a autora tem dificuldades em arranjar posição para dormir, tendo dificuldades em ter noites de sono descansada, acordando, por vezes, cansada (artigos 65º, 67º, 82º, 83º da petição inicial).
42. A autora apresenta um aumento do tónus do esternocleimastóideu esquerdo, tendo-se revelado negativos os exames “Lemirthe” e “Spurling”, e apresentando a autora força muscular de grau 5, simétrica nos membros superiores (artigo 70º da petição inicial, artigo 10º, 11º, 12º da contestação).
43. Em consequência da rigidez da coluna cervical, a autora tem dificuldades em cortar as unhas e em fazer a depilação (artigo 72º da petição inicial).
44. A autora tem dificuldades em realizar viagens longas, padecendo de dores e de incómodo posicional (artigos 74º e 106ºda petição inicial).
45. A autora deixou de poder usar satos altos, porque lhe causam um agravamento significativo de dores ao fundo da cabeça (artigo 75º da petição inicial).
46. A autora tem dificuldades em pegar em pesos, porque tal acção aumenta-lhe as dores (artigo 76º da petição inicial).
47. Ao nível de exercício físico, foi recomendado à autora fazer apenas natação, hidroginástica ou yoga (com proibição de posições invertidas (artigos 77º e 78º da petição inicial).
48. A nível laboral, a autora apresenta dificuldades em manter-se muito tempo seguido sentada na secretária, porquanto as dores e a rigidez vão aumentando ao longo do dia, sentindo a autora necessidade de fazer pausas regulares, de fazer exercícios de mobilização ao pescoço, caminhar um pouco ou fazer uma rápida massagem (dado que no seu local de trabalho existe serviço de massagens) (artigos 79º e 80º da petição inicial).
49. As dores de que a autora padece causam-lhe mau estar e dificuldades de concentração (artigo 81º da petição inicial).
50. A autora passou a ter dificuldades em realizar trabalhos domésticos, como lavar a louça ou aspirar, despejar lixo, pegar em bacia de roupa para a estender, pegar e transportar em garrafões de água ou comprar (artigo 84º da petição inicial).
51. A autora é mãe de A (…), nascido em 19 de Novembro de 2014 (artigo 86º da petição inicial).
52. Por força da situação física e clínica descrita, a autora passou a ter dificuldades em pegar no seu filho ao colo, necessitando de tomar cuidado com os esforços que tomar conta dele implica, os quais lhe causam dores (artigos 85º, 87º e 88º da petição inicial).
53. A ré prestou assistência médica à autora, assumindo o pagamento de algumas despesas de serviço médicos e medicamentosos prestados por terceiros, a que a autora se submeteu para tratamento das lesões derivadas do acidente (artigo 89º da petição inicial, artigo 7º da contestação).
54. A ré não pagou à autora o valor da factura nº 1602/2016 da T (…) de € 120,00 relativa a serviços de fisioterapia a que se submeteu com início em 25/1/2016 e fim em 11/2/2016 (artigo 89º da petição inicial).
55. A ré não pagou à autora o valor € 34,00 relativo à ressonância magnética a que aquela se submeteu em 23/6/2016, por prescrição do Dr. (…) (artigo 89º da petição inicial).
56. A ré não pagou à autora o valor € 7,12 relativo a medicamentos por si adquiridos para tratamento das lesões sofridas com o acidente (artigo 89º da petição inicial).
57. A ré não pagou à autora a quantia de € 15,00 por esta suportada em consulta de ortopedia do Dr. (…) a que se submeteu em 30/6/2016 (artigo 89º da petição inicial).
58. A ré não pagou à autora o valor € 36,83 por ela suportados em 2/9/2016, em RX dinâmico na CUF (artigo 89º da petição inicial).
59. A ré não pagou à autora o valor de € 90,00 por si suportado em consulta do Dr. (…), especialista da coluna em 8/9/2016 (artigo 89º da petição inicial).
60. A ré não pagou à autora o valor € 50,00 por si suportado em 12/9/2016, relativo a consulta em especialista da coluna, Dr. (…) (artigo 89º da petição inicial).
61. A ré não pagou à autora o valor € 50,00 por si suportado em 19/9/2016, relativo a consulta em especialista da coluna, Dr. (…) (artigo 89º da petição inicial).
62. A ré não pagou à autora o valor € 15,00 por si suportado em 30/9/2016, relativo a consulta de neuro-cirurgia na CUF (artigo 89º da petição inicial).
63. A ré não pagou à autora o valor € 75,00 por si suportado em 12/11/2016, relativo a consulta de dentista na Clínica (…) (artigo 89º da petição inicial).
64. A ré não pagou à autora o valor € 1,60 por si suportado em 2/12/2016, relativo a exame a articulações tempero-maxilar esquerdas (artigo 89º da petição inicial).
65. A ré não pagou à autora o valor € 1,60 por si suportado em 2/12/2016, relativo a exame a articulações tempero-maxilar direitas (artigo 89º da petição inicial).
66. A ré não pagou à autora o valor € 12,00 por si suportado em 2/12/2016, relativo a ecografia aos ombros (artigo 89º da petição inicial).
67. A ré não pagou à autora o valor € 18,00 por si suportado em 30/12/2016, relativo a consulta de Acupuntura, na Clínica (...) (artigo 89º da petição inicial).
68. A ré não pagou à autora o valor € 14,00 por si suportado em 6/1/2017, relativo a consulta de Acupuntura, na Clínica (…) (artigo 89º da petição inicial).
69. A ré não pagou à autora o valor € 14,00 por si suportado em 11/1/2017, relativo a consulta de Acupuntura, na Clínica (…) (artigo 89º da petição inicial).
70. A ré não pagou à autora o valor € 14,00 por si suportado em 23/1/2017, relativo a consulta de Acupuntura, na Clínica (…) (artigo 89º da petição inicial).
71. A ré não pagou à autora o valor € 2,42 por si suportado em 29/1/2017, relativo a medicamentos adquiridos na Farmácia (…), Ldª (artigo 89º da petição inicial).
72. A ré não pagou à autora o valor € 116,20 por si suportado em 10/3/2017, em Fisioterapia a que se submeteu na T (…) (artigo 89º da petição inicial).
73. A ré não pagou à autora o valor € 55,00 por si suportado em 8/5/2017, relativo a consulta de Neurologia na I(…)em Coimbra (artigo 89º da petição inicial).
74. A ré não pagou à autora o valor € 25,20, por si suportado em 10/5/2017, relativo a fisioterapia a que se submeteu na T (…) (artigo 89º da petição inicial).
75. A ré não pagou à autora o valor € 4,21, por si suportado em 17/7/2017, relativo a aquisição de medicamentos na Farmácia (…) (artigo 89º da petição inicial).
76. A ré não pagou à autora o valor € 4,00, por si suportado em 24/7/2017, relativo a aquisição de medicamentos na Farmácia (…) (artigo 89º da petição inicial).
77. A ré não pagou à autora o valor € 6,92, por si suportado em 29/7/2017, relativo a aquisição de medicamentos na Farmácia (…) (artigo 89º da petição inicial).
78. A ré não pagou à autora a quantia de € 260,00 por si suportada em 28/8/2017, relativa a fisioterapia a que se submeteu (artigo 89º da petição inicial).
79. A ré não pagou à autora o valor € 2,48, por si suportado em 16/9/2017, relativo a medicamentos adquiridos (artigo 89º da petição inicial).
80. A ré não pagou à autora o valor € 3,81, por si suportado em 30/10/2017, relativo a aquisição de medicamentos na Farmácia (…) (artigo 89º da petição inicial).
81. Entre 4/12/2017 e 18/2/2019, a autora suportou despesas com consultas médicas e tratamentos de fisioterapia às lesões sofridas com o acidente, tendo-se submetido: a uma consulta de MFR em 4/12/2017, no Centro (…)pela qual liquidou a quantia de € 15,00; a uma consulta de neurocirurgia em 15/12/2017 no Centro (…) pela qual liquidou € 15,00; a uma ressonância magnética da coluna vertical no centro “V (…)” em 24/1/2018, pela qual liquidou a quantia de € 34,00; a uma consulta de neurocirurgia em 2/2/2018 no Centro (…) pela qual liquidou € 15,00; a tratamentos de fisioterapia na “Clínica (…)e” pelos quais liquidou em 5/2/2018 a quantia de € 69,00 e em 21/3/2018, a quantia de € 26,00; a consulta médica de ortopedia na “Clínica (…)”, em 19/2/2018, pela qual liquidou a quantia de € 60,00; a consulta de neurocirurgia na “I(…)” em 1/3/2018, pela qual liquidou a quantia de € 15,00; a sessões de fisioterapia na “ (…)”, em 19/3/2018, 18/4/2018, 23/4/2018, 30/4/2018, 29/5/2018, 21/6/2018, 23/6/2018, 23/7/2018, 29/7/2018, 3/9/2018, 8/10/2018, 17/11, 2018, 8/12, 2018, 29/1/2018 e 18/2/2019, pelas quais suportou, respectivamente, os valores de € 35, € 30, € 30, € 30, € 30, € 30, € 30, € 40, € 20, € 30, € 30, € 30, € 30, € 30, € 30 (requerimento de ampliação do pedido de fls 173v e ss).
82. Em consequência do acidente, a autora ficou a padecer de lesões permanentes, designadamente protusão posterior dos discos C4-C5 e C5-C6 e hérnia póstero lateral em C6-C7, que lhe determinam um défice funcional permanente da integridade física de 4 pontos, compatível com o exercício da sua actividade habitual, mas exigindo esforços suplementares, e sendo de admitir a existência de dano futuro (artigos 90º, 94º, 95º, 96º da petição inicial, artigo 10º da contestação).
83. O agravamento, no futuro, das sequelas (raquialgias cervicais) exigirá acompanhamento e tratamento médicos”.
84. As lesões sofridas pela autora com o acidente consolidaram-se em 20/9/2016 (artigo 14º da contestação);
85. A autora nasceu em 18 de maio de 1982 (artigo 91º da petição inicial).
86. À data do acidente, a autora trabalhava na T (…) S.A., onde actualmente ainda trabalha, exercendo funções de directora de serviços administrativos e financeiros em regime de comissão de serviço desde 1/10/2012, com um horário semanal de 37,5 horas, auferindo um vencimento base ilíquido de € 1 568,24 à data do acidente, e de € 1 613,42, em 2017, acrescido de subsídio de alimentação de € 5,00 por dia, a que correspondia um vencimento líquido em 2016, no valor de 1 085,80 e em 2017 no valor de e 1 132,81”.
87. A autora, à data do acidente, era casada e com um filho, e executava todas as tarefas domésticas e tratava do filho (artigo 93º da petição inicial).
88. A autora passou a ter dificuldades em dormir, a acordar cansada e com dores apesar da medicação que toma, não conseguindo estar muito tempo sentada à secretária, como exige a sua profissão, tendo necessidade de fazer pausas ao longo do dia, padecendo ainda assim de dores (artigos 97º e 98º da petição inicial).
89. As dores e as pausas causam à autora perdas de concentração (artigo 99º da petição inicial).
90. Para executar as mesmas tarefas, a autora necessita de tempo e esforço acrescido (artigo 100º da petição inicial).
91. A autora passou a ter dificuldades em executar algumas tarefas domésticas, padecendo de dores de dores quando as executa, tendo ainda dificuldades em pegar no filho ao colo e dar-lhe banho (artigos 103º, 104º e 105º da petição inicial).
92. A autora passou a pedir colaboração à irmã (…) para execução de tarefas domésticas (artigo 109º da petição inicial).
93. Até à data do acidente, a autora gozava de saúde, era alegre, dinâmica, jovial e uma trabalhadora activa (artigo 112º da petição inicial).
94. Até à data do acidente, a autora vivia uma fase de estabilidade, harmonia, felicidade profissional e pessoal, tendo casado em 19/9/2014, tinha tido um filho há menos de um ano (artigo 113º da petição inicial).
95. Por força das lesões sofridas, a autora padeceu de dores situadas no grau 3, numa escala de 1 a 7 valores (artigo 33º da petição inicial).
96. A autora, por força das lesões sofridas mantém dores na cabeça, costas e braço esquerdo, que lhe provocam incómodo e mau estar (artigo 116º, 127º da petição inicial).
97. Desde o acidente que a autora tem procurado alívio para as dores de que padece junto de médicos, fisioterapeutas e outros profissionais de saúde (artigo 117º da petição inicial).
98. A autora ficou triste e ansiosa com as sequelas do acidente, lamentando ter que com elas viver para toda a vida, como lhe foi comunicado pelo perito da ré (artigos 118º, 120º, 122º, 127º).
99. As alterações de sono de que passou a padecer na sequência do acidente provocam à autora alterações de humor, diminuindo a sua capacidade de concentração (artigos 123º, 124º e 125º da petição inicial).

Factos não provados:
1. Os alegados nos artigos 35º (parcialmente), 36º (parcialmente), 37º, 46º (parcialmente), 47º (parcialmente), 5º, 59º (parcialmente), 61º (parcialmente), 63º, 64º, 65º (parcialmente), 66º, 67º (parcialmente), 68º, 69º, 73º, 76º (parcialmente), 77º (parcialmente), 81º (parcialmente), 82º (parcialmente), 83º (parcialmente), 84º (parcialmente), 89º (parcialmente), 90º (parcialmente), 94º (parcialmente), 99º (parcialmente), 101º, 102º, 103º (parcialmente), 104º (parcialmente), 105º (parcialmente), 106º (parcialmente), 110º, 113º (parcialmente), 114º, 117º (parcialmente) 118º (parcialmente), 119, 120º (parcialmente), 121º, 122º (parcialmente), 124º (parcialmente), 125º (parcialmente), 127º (parcialmente), da petição inicial, assim como as despesas de deslocação e prejuízos inerentes a ausências de serviço alegados no requerimento de ampliação do pedido
2. Os alegados nos artigos 13º da contestação.


*

Descritos os factos passemos à resolução das questões suscitadas pelo recurso.

O recurso visa, em primeiro lugar, a decisão que fixou o montante de € 15 000,00, como medida da indemnização do dano biológico.

A recorrente não põe em causa o dever de indemnizar tal dano. Com o que ela não concorda é com a medida da indemnização, censurando-a com a seguinte linha argumentativa:
1. Que não se afigura justo e conforme aos princípios da equidade que nas circunstâncias do caso se fixe uma indemnização expressivamente superior àquelas que vêm sendo atribuídas pela mais recente jurisprudência em situações em que os lesados ficam a padecer de um dano biológico de grau superior ou mesmo idêntico àquele que afecta a recorrida. Citou, para o efeito, o Acórdão do STJ datado de 19-02-2015, proferido no âmbito do processo n.º 99/12.7TCGMR, 2.ª secção, que atribui uma indemnização pelo dano biológico no valor de € 25 000,00 a um lesado de 43 anos que ficou a padecer de uma incapacidade parcial permanente de 12 pontos; e o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21.01.2016, no processo n.º 959/11.2TBSJM, que arbitrou uma indemnização de € 10 000,00 a esse mesmo título, a uma lesada, médica dentista, de 32 anos de idade que ficou a padecer de um défice funcional permanente de 5 pontos;
2. Que perante as decisões supra elencadas justificava-se a redução da medida da indemnização para um valor não superior a 10 000,00. 

Apreciação do tribunal:

Como se vê pela exposição efectuada, a questão essencial suscitada por recurso é a de saber se a decisão que fixou a medida da indemnização do dano biológico no montante de e 15 000,00 não se apresenta conforme aos princípios da justiça, da equidade e da proporcionalidade.

Apesar de não haver norma legal que disponha expressamente neste sentido, o valor da indemnização pelo dano biológico é fixado com recurso à equidade por aplicação do n.º 3 do artigo 566.º do Código Civil.    

Vejamos.

O chamado dano biológico traduz-se numa ofensa à integridade física e psíquica da pessoa.

Apesar de tal ofensa começar por ser um dano pessoal, na medida em que atinge um bem jurídico eminentemente pessoal (a integridade física e psíquica), a jurisprudência tem afirmado de modo constante que ela é também fonte de prejuízos patrimoniais.

E é fonte de prejuízos patrimoniais, quer ela acarrete a perda de rendimentos (o que sucederá se a vítima ficar impedida de prosseguir a sua actividade profissional ou qualquer outra; se a vítima passar a exercer outras funções, ganhando menos; se a vítima passar a trabalhar a tempo parcial, ganhando menos), quer acarrete apenas esforços suplementares para desenvolver a actividade profissional habitual, sem perda de rendimentos. A título de exemplo citam-se: o acórdão do STJ de 20-10-2011, proferido no processo n.º428/07.5TBFAF; o acórdão do STJ proferido em 2-12-2003, no processo n.º 1110/97.9TVLSB; o acórdão do STJ proferido em 21-01-2016, no processo n.º 1021/11.3TBABT e o acórdão do STJ proferido em 28-01-2016, no processo n.º 7793/09.8T2SNT, todos publicados no sítio www.dgsi.pt. Na verdade, entende-se que, no mercado de trabalho e do emprego, quem tem a capacidade física e psíquica diminuída não tem tantas possibilidades/oportunidades de trabalho e de emprego (ou não tem tantas possibilidades de manter o trabalho e o emprego) como aqueles que não têm qualquer deficiência na sua integridade física e psíquica. 

Apesar de, como escreve Carlos Alberto da Mota Pinto (Teoria Geral do Direito Civil, 4ª edição por António Pinto Monteiro e Paulo Mota Pinto, Coimbra Editora, página 345), a capacidade de trabalho não fazer parte do património, constitui, no entanto, uma qualidade da pessoa que se “projecta nos resultados patrimoniais da sua vida”. Daí que a mera diminuição da capacidade de trabalho e de ganho, associada ao défice funcional permanente da integridade física e psíquica, seja considerada também dano patrimonial.

E dano patrimonial futuro, no sentido de que terá previsivelmente incidência nos resultados patrimoniais da sua vida, quer se tenha como horizonte temporal desta vida aquele que vai até à idade prevista pela lei para a reforma, quer se tenha como horizonte temporal desta vida a esperança média de vida.

Como é fácil de ver, qualquer que seja o horizonte temporal que se considere para efeitos de definição do “futuro”, não é possível averiguar com exactidão a incidência do défice permanente da integridade física e psíquica nos resultados patrimoniais do lesado.

E assim sendo, manda o n.º 3 do artigo 566º do Código Civil que o tribunal julgue “equitativamente dentro dos limites que tiver por provados”.

Julgamento equitativo que, segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, deve atender essencialmente às seguintes circunstâncias:
1. Ao grau do défice funcional permanente da integridade físico-psíquica (a tendência é a de que quanto maior for o défice maior será a indemnização);
2. À idade do lesado;
3. Ao período de vida activa do lesado;
4. À esperança média de vida;
5. À actividade profissional do lesado;
6. As qualificações profissionais do lesado;   
7. Casos já julgados pelos tribunais.

Citam-se a título de exemplo acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido em 28-01-2016, no processo n.º 7793/09.8T2SNT, o acórdão do STJ proferido em 01-03-2018, no processo n.º 773/07.0TBALR, o acórdão do STJ de 7-03-2019, processo n.º 203/14.0T2AVR, publicados no sítio www.dgsi.pt.

No caso, o défice funcional permanente da integridade física ou psíquica, que se refere “à afectação definitiva da integridade física e psíquica da pessoa, com repercussão nas actividades da via diária, incluindo familiares e sociais”, foi fixado em 4 pontos, numa escala de 100 pontos (que exprime a capacidade geral do indivíduo).

O défice funcional da autora, embora compatível com a sua actividade profissional, implica esforços suplementares. Considerando que, aquando da consolidação das lesões (20 de Setembro de 2016), tinha 34 anos, é de prever que a autora esteja sujeita a uma maior penosidade no exercício da sua actividade habitual durante um longo período.

Com este quadro, afigura-se a este tribunal que a compensação de € 15 000,00 não é desproporcionada em relação à gravidade do dano.

Contra esta conclusão não vale a alegação da recorrente de que a mencionada compensação é superior às que vêm sendo fixadas pela jurisprudência portuguesa em casos em que os lesados padecem de sequelas mais gravosas.

Em primeiro lugar se é certo que, na fixação da indemnização pelo dano biológico, os tribunais comparam o caso submetido a julgamento com outros já julgados em nome do princípio da igualdade [citam-se a título de exemplo o acórdão do STJ proferido em 4-06-2015, no processo n.º 1166/10.7TBVCD e o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido em 28-01-2016, no processo n.º 7793/09.8T2SNT], importa notar que as decisões judiciais não têm a força de precedente obrigatório e que o que é decisivo é a justiça do caso concreto.

Em segundo lugar, num dos casos citados pelo recorrente, concretamente o julgado pelo acórdão do STJ de 19/02/2015 (processo n.º 99/12.7CGMR), se é verdade que a gravidade do dano biológico que estava em causa é superior à gravidade do dano de que ficou a padecer a autora, também é verdade que a compensação que lhe foi arbitrada (€ 25 000,00) é significativamente superior à que foi fixada para o dano da autora.

Quanto ao outro caso [o decidido no acórdão do Tribunal da Relação do Porto], dando por boa a alegação da recorrente [e fazemos esta observação porque não encontrámos o acórdão publicado na base de dados do IGFEJ], é certo que foi fixada uma compensação por um défice funcional da integridade físico psíquica avaliado em 5 pontos superior à que o tribunal a quo arbitrou a favor da autora, com um défice avaliado em 4 pontos. Porém, como se escreveu acima, o que é decisivo é a justiça do caso concreto e, no caso, afigura-se a este tribunal que a compensação de € 15 000,00 é equitativa.          

 Pelo exposto, mantém-se a indemnização fixada pelo tribunal a quo.


*

O segundo segmento da sentença visado pelo recurso é constituído pela decisão que condenou a ora recorrente no pagamento de € 941,00, a título de indemnização de lucro cessante, calculado nos seguintes termos:
1. Multiplicação da remuneração base de € 1 613,42 por 14 meses;
2. Divisão do produto assim obtido por 12 meses para se apurar o valor da retribuição mensal;
3. Divisão da retribuição mensal por 30 dias, para se apurar o valor da retribuição diária;  
4. Multiplicação da retribuição diária por 15 dias.

A recorrente, embora reconheça que a autora esteve incapacitada 15 dias para o exercício da sua actividade profissional, contesta os seguintes pressupostos do cálculo efectuado pela sentença:
1. O valor da remuneração mensal (€ 1 613,42), contrapondo-lhe o de € 1 085,80;
2. O valor da remuneração diária (€ 62,74), contrapondo-lhe o de € 42,23;
3. O número de dias de incapacidade que releva para o cálculo da incapacidade (15), contrapondo-lhe o de 11, com a alegação de que o período de 15 dias inclui dois fins-de-semana.     

Pelas razões a seguir expostas é de julgar procedente em parte o recurso.

Em causa está a compensação da perda da remuneração da autora durante o período de 15 dias, em que esteve incapacidade para o exercício da sua actividade profissional.

A determinação da medida da indemnização remete-nos:
1. Para o princípio geral da obrigação de indemnização;
2. Para o n.º 1 do artigo 564.º do CC, na parte em que dispõe que o dever de indemnizar compreende os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão;
3. Para o n.º 2 do artigo 566.º do Código Civil sobre a medida da indemnização em dinheiro que estabelece que sem prejuízo do preceituado noutras disposições, a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos.

Tendo em conta esta última disposição é de reconhecer razão à recorrente quando parte da remuneração mensal líquida para calcular a medida da indemnização. Com efeito, se o que está em causa é a determinação da diferença entre duas situações patrimoniais (aquela em que estaria a autora se não fosse o acidente e aquela em que na realidade se encontra), o que conta são os ingressos no património da autora e estes são constituídos pela remuneração mensal líquida. A favor desta interpretação citam-se as seguintes decisões do STJ:
1. O acórdão de 7 de Fevereiro de 2013, proferido no processo n.º 3557/07.1TVLSB.L1.S1;
2. O acórdão de 19 de Outubro de 2016, proferido no processo n.º 1893/14.0TBVNG.P1.S1;
3. O acórdão do STJ proferido em 21-03-2019, no processo n.º 1069/09.8TVLSB, todos publicados em dgsi.pt.  

A interpretação acima está em conformidade com a 1.ª parte do n.º 7 do artigo 64.º do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto [diploma que aprovou o regime do sistema do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel], cujos termos são os seguintes: “para efeitos do apuramento do rendimento mensal do lesado no âmbito da determinação do montante da indemnização por danos patrimoniais a atribuir ao lesado, o tribunal deve basear-se nos rendimentos líquidos auferidos à data do acidente….

Já não assiste razão à recorrente quando labora com base na remuneração diária de € 44,23 e num período de incapacidade de 11 dias, pois com estes pressupostos o prejuízo da autora não é integralmente reparado. Com efeito, não resultando dos factos provados que a remuneração mensal da autora variava em função do número de dias úteis do mês e resultando do extracto de remunerações da autora registadas em seu nome na Segurança Social que a remuneração base dela é igual, independentemente do número de dias que tem os meses (por exemplo, a remuneração base de Fevereiro, que tem 28 ou 29 dias, é igual à remuneração dos meses que têm 30 ou 31 dias), não tem qualquer apoio nos factos a pretensão da recorrente de tomar como referência, para o cálculo da indemnização, o período de incapacidade de 11 dias. Para evidenciar a falta de fundamento da pretensão da recorrente atente-se na seguinte hipótese. Se a autora tivesse estado incapacitada para exercer a sua actividade profissional durante um mês, a perda de rendimentos seria igual à sua remuneração líquida mensal (€ 1 085,80) e seria este o montante da indemnização à luz das normas acima expostas. Porém, se seguíssemos o cálculo da recorrente, ser-lhe-ia devida, no entanto, indemnização inferior a tal montante. Com efeito, visto que um mês tem, em regra, 4 sábados e 4 domingos, o período de incapacidade a tomar em conta seria o de 22 dias, os quais, multiplicados por € 44,23, dariam lugar a uma indemnização de € 973,06.

O cálculo que respeita o princípio da reparação integral do prejuízo e a determinação da medida da indemnização nos termos prescritos pelo n.º 2 do artigo 566.º do Código Civil é aquele que toma em consideração a perda de rendimentos no período de 15 dias. Visto que este período corresponde a 50% do período da remuneração mensal líquida, ou seja, a € 542,90, é este o montante a fixar, acrescido de 5 euros por dia, durante 11 dias úteis (€ 55), pois está provado que à remuneração base acrescia subsídio de alimentação de € 5 euros por dia e, nos termos do n.º 2 do artigo 258.º do Código do Trabalho, “a retribuição compreende a retribuição base e outras prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie”.

Em consequência, há fundamento para alterar a decisão recorrida não no sentido pretendido pela recorrente, mas no sentido de a substituir por decisão a condenar a ré pagar à autora o montante de € 597,90 [quinhentos e noventa e sete euros e noventa cêntimos], título de indemnização pelas perdas salariais da autora durante o período da incapacidade temporária para o exercício da sua actividade profissional.


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O terceiro segmento da sentença que é visado pelo recurso é o que condenou a ré a “ministrar/pagar à autora os tratamentos, intervenções cirúrgicas, internamento, acompanhamento médico e medicamentoso que esta viesse a necessitar em consequência das lesões sofridas no acidente, incluindo as despesas inerentes a essa assistência, designadamente as deslocações, a liquidar ulteriormente”.

A recorrente contesta a decisão com a alegação de que, apesar de se ter provado que, das lesões emergentes do acidente para a autora, poderá advir dano futuro, nada se tinha provado relativamente às mesmas consequências desse dano, pelo que não se podia dizer que tais lesões exigiam o acompanhamento médico, tratamento, eventual cirurgia, internamento e medicação.

Pelas razões a seguir expostas, é de julgar procedente apenas em parte o recurso.

Não é inteiramente exacta a alegação da recorrente segundo a qual não se tinha provado nada relativamente às consequências, no futuro, das lesões que a autora sofreu no acidente e que não se podia dizer que tais lesões exigiam o acompanhamento médico, tratamento, eventual cirurgia, internamento e medicação. Com efeito, está provado o agravamento, no futuro, das sequelas (raquialgias cervicais) e que este agravamento exigirá acompanhamento e tratamento médicos.

A partir desta matéria pode afirmar-se que é previsível o agravamento, no futuro, das sequelas das lesões e que é previsível que tal agravamento exija acompanhamento e tratamento médicos.

O que não se pode indicar é o momento e a extensão do agravamento e os tratamentos médicos específicos que serão necessários para fazer face ao agravamento previsível das sequelas (raquialgias cervicais).

Porém, se as sequelas das lesões, já apuradas no processo, configuram um dano, também é configurável, como um dano, o agravamento de tais sequelas no futuro, bem como as despesas com tratamentos médicos que seja necessário fazer para acudir a tal situação de agravamento. Entre os citados danos há, no entanto, a seguinte diferença. Enquanto as sequelas das lesões já apuradas configuram um dano certo e actual, o agravamento constitui um dano futuro.

Visto, no entanto, que este dano é previsível, o mesmo é indemnizável ao abrigo da 1.ª parte do n.º 2 do artigo 564.º do CPC.

O facto de não se saber em concreto a medida do agravamento e de não se conhecerem os tratamentos médicos específicos que serão necessários para fazer face ao mesmo agravamento faz com que a situação em causa caia na 2.ª parte do n.º 2 do artigo 564.º do Código Civil: os danos são futuros e são previsíveis, mas não são determináveis. A consequência é relegar a fixação da indemnização para decisão ulterior. Decisão ulterior a proferir em incidente de liquidação.

Pelo exposto, há fundamento para alterar a decisão recorrida não no sentido pretendido pela recorrente, mas no sentido de a substituir por decisão a condenar a ré no pagamento à autora dos tratamentos médicos exigidos pelo agravamento das sequelas das lesões (raquialgias cervicais), a fixar em decisão ulterior a proferir em incidente de liquidação.


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Por último, a sentença visa o segmento da sentença que arbitrou à autora o montante de € 20 000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais.

A condenação assentou na idade da autora e nos seguintes factos discriminados na sentença sob os números 6.87, 6.86, 6.90 6.89, 6.94, 6.95, 6.97:
1. A autora passou a ter dificuldades em dormir e a acordar cansada, não consegue estar muito tempo sentada à secretária, necessitando de fazer pausas ao longo do dia;
2. A autora passou também a ter dificuldades em executar tarefas domésticas e em tratar do filho, o que constitui uma alteração relativamente à sua condição anterior ao acidente;
3. A autora, para executar as mesmas tarefas, necessita de esforço e de tempo acrescido;
4. Padeceu de dores situadas no grau 3, e mantém ainda dores que lhe provocam incómodo e mau estar;
5. A autora sente-se triste e ansiosa com as sequelas do acidente, que se consubstanciam num défice funcional permanente de 4 pontos, com o impacto apurado no que se reporta ao seu desempenho profissional e pessoal.

A recorrente contesta a decisão com a alegação de que o montante fixado era excessivo e injustificado, face a outras decisões dos tribunais, concretamente:
1. Ao que foi decidido no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 22/0172013, no âmbito do processo n.º 13492/05.2TBMAI, que fixou uma indemnização de 12.500,00€ a título de danos morais, a uma sinistrada que ficou a padecer de cervicalgia residual com contratura dos paravertebrais e trapézios, rigidez na mobilização cervical, dorsalgia residual, dificuldade na permanência prolongada no trabalho com computador, por cansaço muscular fácil, que ficou a padecer de uma IPG de 10 (dez) pontos, a que acrescem mais 2 (dois) pontos a título de dano futuro, que irá necessitar de fazer fisioterapia durante toda a vida, que sofreu um quantum doloris de grau 4/7, que passou a sofrer de tonturas, enjoos e desequilíbrios, que perdeu a capacidade de concentração, tornando-se ríspida e agressiva;
2. Ao que foi decidido no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 31/05/2012, proferido no âmbito do processo n. 1145/07.1TVLSB.L1.S1, da 7ª Secção, que fixou em € 10.000,00 a indemnização a título de danos não patrimoniais a uma lesada que sofreu fractura múltipla do braço direito, fractura do úmero, que foi sujeita a duas intervenções cirúrgicas, que teve de comparecer a diversas consultas (mais de 10) e sessões de tratamento (32 sessões de fisioterapia) e que ficou a padecer de uma incapacidade permanente geral de 8%;
3. Ao que foi decidido no acórdão do S.T.J., de 19/04/2012, proferido no âmbito do Proc. 3046/09.0TBFIG.S1, que fixou em € 15.000,00 a indemnização a título de danos não patrimoniais a um lesado de 24/25 anos, estudante, que ficou a padecer de uma IPG de 13 pontos, decorrente de lesões no punho e tornozelo esquerdo que tenderão a agravar-se no futuro, quantum doloris valorado em 4 numa escala de 7, que teve grande sofrimento físico e psíquico com a intervenção cirúrgica a que foi sujeito, e sente grandes dificuldades em nadar, andar de bicicleta e a pé.

No seu entender, de acordo com o conjunto da jurisprudência devia fixar-se a indemnização dos danos não patrimoniais em valor próximo dos € 10 000,00, quantia que traduziria de forma muito expressiva a gravidade das lesões da recorrida e que não ofendia os valores usualmente arbitrados em situações de gravidade substancialmente superior.

Apreciação do tribunal

A alegação da recorrente remete-nos para o quadro legal da indemnização dos danos não patrimoniais e para o papel das decisões judiciais na fixação do montante da indemnização.

O quadro legal a atender é constituído pelos n.ºs 1 e 4 do artigo 496.º do Código Civil e pelo artigo 494.º do mesmo diploma.

 O n.º 1 do artigo 496.º estabelece que, na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito

Por sua vez, o n.º 4 do artigo 496.º do Código Civil estabelece que o montante da indemnização dos danos não patrimoniais é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º.

O artigo 494.º refere como circunstâncias atendíveis o grau de culpa do agente, a situação económica deste e do lesado e quaisquer outras que se justifiquem no caso.

Apesar de a letra da lei – n.º 4 do artigo 496.º - não dizer expressamente que o montante da indemnização dos danos não patrimoniais dever ser proporcional à gravidade dos danos, a proporcionalidade entre a gravidade dos danos e o montante da indemnização tem apoio tanto neste número como no n.º 1 do mesmo preceito.

Tem apoio no n.º 1 porque, segundo esta norma, apenas são indemnizáveis os danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.

Tem apoio no n.º 4 porque, dizendo esta norma que o montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, não se concebe que haja equidade se o montante da indemnização não for proporcional à gravidade dos danos.

Como escreve Maria Manuel Veloso, Danos Não patrimoniais (Comemorações dos 35 anos do Código Civil e dos 25 anos da reforma de 1977, Volume III Direito das Obrigações, Coimbra Editora, páginas 543 e 544: “A ponderação sobre a gravidade do dano não patrimonial que se reflecte na fixação do montante da indemnização deve ter em conta uma ideia de proporcionalidade. A danos mais graves correspondem montantes mais avultados”.

Visto que o Código Civil não contém quaisquer tabelas que estabeleçam montantes de indemnização em função da gravidade dos danos e que a compensação devida pelos danos não patrimoniais prevista na Portaria n.º 377/2008, de 26 de Maio, serve para efeitos de apresentação aos lesados, por acidente automóvel, de proposta razoável para indemnização do dano corporal, por parte das seguradoras, não afastando a fixação de valores superiores aos aí previstos (n.ºs 1 e 2 do artigo 1.º da Portaria), os tribunais procuram alcançar a equidade, a proporcionalidade na fixação da indemnização, recorrendo ao que é decidido, especialmente pelo Supremo Tribunal de Justiça, em casos análogos.

Este caminho tem apoio no n.º 3 do artigo 8.º do Código Civil, que estabelece que “nas decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito”, e no princípio constitucional da igualdade dos cidadãos perante a lei (n.º 1 do artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa).

Olhando para as decisões indicadas pela recorrente é de reconhecer que, nelas, foram fixadas indemnizações por danos não patrimoniais em montante inferior ao fixado pelo tribunal a quo em situações que, como bem refere a recorrente, “de uma maneira geral são pelo menos tão gravosas” como a dos presentes autos.

Importa, no entanto, notar que as decisões judiciais não têm a força de precedente obrigatório. Como escreve Filipe Albuquerque Matos (Reparação dos danos não patrimoniais: inconstitucionalidade da relevância da situação económica do lesado, artigos 496, n.º 3, e 494º, do Código Civil, Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 142, n.º 3984, página 217), os valores fixados por decisões judiciais anteriores têm natureza meramente indicativa, e o que é decisivo é “o poder equitativo concedido ao juiz no artigo 496º, n.º 4, bem como os critérios ou circunstâncias atendíveis para o exercício do mesmo, mencionados no artigo 494º”. Foi este também o entendimento do acórdão do STJ de 17 de Janeiro de 2012, proferido no processo n.º 211/09.3TBSRT, publicado no sítio www.dgsi.pt., onde, a propósito do valor das judiciais na fixação do montante da indemnização por danos não patrimoniais, se escreveu o seguinte: “certo que os precedentes judiciários servem de critério auxiliar do julgador, de linha de orientação na fixação equitativa do quantum indemnizatório, mas importa ter sempre em atenção as semelhanças e dissemelhanças das situações factuais de cada caso, na medida em que são geralmente tais elementos que fundamentam as discrepâncias registadas. Importa, por outro lado, ter sempre presente também que, quando se trata de formular juízos equitativos, há sempre uma margem de discricionariedade, apesar da preocupação de observância do princípio da igualdade e da uniformização de critérios. Como não é desconhecido, por um lado inexiste uma medida-padrão, tudo dependendo dos contornos concretos do caso, embora pautando-se por critérios objectivos…”.

Tendo presentes as circunstâncias atendíveis para o exercício do poder equitativo do juiz, mencionados no artigo 494.º, entende este tribunal que é equitativa a indemnização de € 20 000 numa situação como a dos autos com as seguintes características:
1. Dores avaliadas no grau 3, numa escala de 7 graus de gravidade crescente, entre a data do acidente e a cura ou consolidação das lesões;
2. Manutenção das dores, após a consolidação das lesões, apesar da toma de medicamentos;
3. Tristeza e ansiedade da autora com as sequelas do acidente;
4. Condicionamento na realização de actos correntes da vida diária, familiar e profissional, mesmo depois da consolidação das lesões, como o atestam os seguintes factos: a) não consegue estar muito tempo sentada à secretária, como exige a sua profissão; b) perdas de concentração; c) dificuldade em executar algumas tarefas domésticas; d) dificuldades em pegar no filho ao colo e dar-lhe banho;  
5. Ausência de culpa quanto à produção dos danos.

Em consequente é de julgar improcedente a pretensão da autora ora em apreciação.


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Decisão:

Julga-se parcialmente procedente o recurso e em consequência:
1. Revoga-se o segmento da decisão que condenou a ré a pagar à autora a quantia de € 941,10 (novecentos e quarenta e um euros e dez cêntimos), a título de indemnização pela perda de rendimentos durante 15 dias em que esteve incapacitada para o exercício da sua actividade profissional;
2. Substitui-se essa decisão por outra a condenar a ré a pagar à autora a quantia de € 597,90 [quinhentos e noventa e sete euros e noventa cêntimos], título de indemnização pela perda de rendimentos da autora durante o período da incapacidade temporária para o exercício da sua actividade profissional.
3. Revoga-se o segmento da decisão que condenou a ré a “ministrar/pagar à autora os tratamentos, intervenções cirúrgicas, internamento, acompanhamento médico e medicamentoso que esta viesse a necessitar em consequência das lesões sofridas no acidente, incluindo as despesas inerentes a essa assistência, designadamente as deslocações, a liquidar ulteriormente”;
4. Substitui-se essa decisão por outra a condenar a ré no pagamento à autora dos tratamentos médicos exigidos pelo agravamento das sequelas das lesões (raquialgias cervicais), a fixar em decisão ulterior a proferir em incidente de liquidação.
5. Mantém-se a parte restante da decisão impugnada, concretamente a que fixou em € 10 000 a indemnização pelo dano biológico e em € 20 000 por dano não patrimoniais.


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Responsabilidade quanto a custas:

Visto o disposto na 1.ª parte do n.º 1 do artigo 527.º do CPC e o n.º 2 do mesmo preceito e o facto de a recorrente e a recorrida terem ficado vencidas, em parte, no recurso, condena-se a recorrente e a recorrida nas custas do recurso, restritas a custas de parte na proporção de, respectivamente, 95% e 5%.

Coimbra, 10 de Dezembro de 2019

Emídio Santos ( Relator)

Catarina Gonçalves

Maria João Areias