Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | MOREIRA DO CARMO | ||
Descritores: | PROCESSO DE INVENTÁRIO NOTÁRIO RECURSO | ||
Data do Acordão: | 06/20/2017 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | COIMBRA - TRIBUNAL DA RELAÇÃO - SECÇÃO CENTRAL | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | DECLARADA IMCOMPETÊNCIA DA RELAÇÃO | ||
Legislação Nacional: | ART.76 Nº2 RJPI ( LEI Nº23/2013 DE 5/3), ARTS.67, 68, 96, 97 CPC | ||
Sumário: | No processo de inventário, é da competência do tribunal de 1ª instância o recurso das decisões do Notário. | ||
Decisão Texto Integral: | I – Relatório
1. Corre Inventário, para partilha de herança, em Cartório Notarial de Leiria, que envolve os interessados A (…) e P (…). Este reclamou da relação de bens. * O Sr. Notário proferiu decisão em que deu procedência parcial à mesma. * 2. O interessado P (…) interpôs recurso, pedindo a revogação parcial do decidido, recurso que dirigiu ao Juízo Cível da Comarca de Leiria. 3. A interessada A (…) contra-alegou, pugnando pela manutenção do decidido, peça processual essa que dirigiu ao indicado Tribunal. 4. O Sr. Notário admitiu o recurso, a remeter para a Relação de Coimbra. 5. Afigurando-se que o recurso não podia ser admitido, nos termos em que o foi, para esta Relação, determinou-se a audição das partes. Só o interessado P (…) respondeu, defendendo que o recurso sobe imediata e autonomamente.
II – Factos Provados
Os factos a considerar são os que emanam do relatório supra. III – Do Direito
1. Uma vez que o âmbito objectivo dos recursos é delimitado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes (arts. 639º, nº 1, e 635º, nº 4, do NCPC), apreciaremos, apenas, as questões que ali foram enunciadas. Nesta conformidade, a única questão a resolver é a seguinte. - Incompetência do tribunal da Relação em razão da hierarquia.
2. A norma a considerar, e que foi invocada pelo Sr. Notário, é a prevista no art. 76º, n.º 2, do RJPI (Lei 23/2013, de 5.3) de acordo com o qual: E na verdade é esta a interpretação que fazemos e a conclusão a que também chegamos. Realmente, lendo todo o diploma em causa, nas suas diferentes normas que tratam do tema dos recursos e da articulação dos Srs. Notários com os Tribunais em geral (cfr. os seus artigos 3º, nº 7, 13º, nº 2, 16º, nos 4 e 5, 57º, nº 4, 66º, nos 1 e 3, 69º, 70º e 76º) nada nos permite concluir que se tenha instituído um regime legal de recursos directo das decisões do Notário para o tribunal da Relação e não, primeiro, para o tribunal da 1ª instância e, daí, depois, para a Relação, dentro das regras normais do NCPC. Claro que o legislador poderia ter introduzido esse sistema do recurso per saltum, optando, então, por libertar, quase por completo, os tribunais de comarca dos processos de inventário, passando o encargo para os tribunais da Relação. Mas se fosse essa a sua intenção, deveria tê-la formulado expressamente, dado o entorse processual que essa situação constituiria (e parece que também entorse constitucional), o que não fez. Ao invés, nem de forma implícita se extrai daquele citado diploma qualquer novidade nos recursos dos senhores Conservadores e Notários – que são interpostos, como é sabido, usualmente, em primeira linha, para os tribunais de comarca, conforme aos respectivos Códigos de Registo. Consequentemente, temos que concluir que os recursos, neste tipo de processo especial (o inventário), continuam a ser interpostos para o tribunal de comarca e não para o tribunal da Relação. Não podemos, pois, acompanhar a decisão do Sr. Notário de admitir o recurso logo para a Relação, com base no citado art. 76º, nº 2, do RJPI, pois esta não tem essa competência ab initio. Com efeito, tal normativo reporta-se a recursos para a Relação, mas das decisões proferidas pelo juiz de 1ª instância, quer a que homologa a partilha, quer outras, subindo com aquele os recursos das decisões interlocutórias proferidas ao longo do processo (aliás, mesmo que fosse de admitir que as decisões interlocutórias seriam recorríveis logo para a Relação, sem passar primeiro pelo juiz da 1ª instância, então os respectivos recursos só poderiam subir à Relação com o recurso que se interpusesse da decisão homologatória da partilha e não já, como ocorreu). Já assim era, de resto, no âmbito do anterior Regime Jurídico do Processo de Inventário, aprovado pela Lei 29/2009, de 29.6 (que acabou por não produzir efeitos, conforme decorria dos seus arts. 4º, 8º, nº 2, 18º, 60º, nº1 e 3, 62º, 64º, 72º, nº 1 e 4, e 73º). É de notar, em abono desta conclusão, que mesmo noutros casos em que a lei passou competências dos tribunais para o Ministério Público e para os Notários e Conservadores, manteve sempre a possibilidade de reapreciação pelos juízes dos tribunais judiciais da 1ª instância e, daí, para a Relação, nos termos gerais. Veja-se, por exemplo, o caso paradigmático do DL 272/2001, de 13.10, seus artigos 3º, nº 6, 4º, nº 6, 8º e 10º, nº 1 (“das decisões do conservador cabe recurso para o tribunal judicial da 1ª instância competente em razão da matéria no âmbito da circunscrição a que pertence a conservatória”). 3. Sumariando (art. 663º, nº 7, do NCPC): i) No processo de inventário, é da competência do tribunal de 1ª instância o recurso das decisões do Notário.
IV – Decisão
Pelo exposto, declara-se este tribunal da Relação incompetente, em razão da hierarquia, para conhecer do presente recurso (cabendo a mesma ao Juízo Cível da Comarca de Leiria, para onde o processo deve ser remetido). * Sem custas. Coimbra, 20.6.2017
Moreira do Carmo ( Relator ) Fonte Ramos Maria João Areias |