Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
294/10.3TBTND-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FRANCISCO CAETANO
Descritores: DESPACHO SANEADOR
RECURSO
Data do Acordão: 03/09/2012
Votação: DECISÃO SINGULAR
Tribunal Recurso: TONDELA 2º J
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REJEITADA
Legislação Nacional: ART.691.º Nº 2 AL. H) DO CPC
Sumário: O despacho saneador que não conheça do mérito da causa ou que, por falta de elementos, relegue para final o conhecimento de matéria que cumpra conhecer é irrecorrível.
Decisão Texto Integral: A... e mulher B... propuseram no 2.º Juízo do TJ de Tondela acção com forma de processo ordinário contra C... e mulher D..., pedindo a condenação destes, com base em contrato de compra e venda de imóvel, a eliminação de defeitos de construção e pagamento de indemnização e cumprimento integral do acordado.

Findos os articulados foi proferido despacho a notificar os AA. para suprirem a insuficiência da matéria de facto objecto da petição inicial, após o que, acedendo ao convite, foi proferido despacho saneador nos seguintes termos:

– O tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia. O processo é o próprio, inexistindo nulidades que o invalidem. As partes, dotadas de personalidade e capacidade judiciária, são legítimas e encontram-se em juízo devidamente representadas. Não existem outras nulidades, excepções dilatórias, questões prévias ou incidentais de que cumpra conhecer.

A questão é de direito e de facto, mas depende de prova a produzir pelo que, nos termos do art.º 511.º do CPC, passo a seleccionar a matéria de facto, considerando os factos assentes e os factos controvertidos da base instrutória” – o que se seguiria.

Inconformados, recorreram os AA. em cujas conclusões das alegações sustentaram ter havido nulidade processual quando se admitiu a petição inicial corrigida com factos novos, que houve omissão de pronúncia quanto à excepção de caducidade do direito de denúncia dos defeitos, que era de conhecimento oficioso, face ao que, na procedência do recurso, deve julgar-se verificada tal excepção e os RR. absolvidos do pedido.

Em resposta, os RR. pronunciaram-se pela inadmissibilidade do recurso, nos termos da alín. h) do n.º 2 do art.º 691.º do CPC, sendo que se relegou para a decisão final o conhecimento total ou parcial dos pedidos e da excepção peremptória, como é a caducidade, nenhuma nulidade existindo.

A factualidade relevante para apreciação, desde já, da admissibilidade do recurso é a que acaba de narrar-se.

Cumpre, pois, apreciar se o despacho saneador quanto apreciou tabelarmente (não em concreto) as nulidades e excepções dilatórias e quando relegou para final o conhecimento da questão, que se afigurou ser não só de direito, mas também de facto, é recorrível.

Não é.

A Ex.ma Juíza fundou a sua admissibilidade na alín. m) do n.º 2 do art.º 691.º do CPC, que refere caber recurso de apelação das decisões cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil.

É duplamente incorrecto o seu entendimento, s. d. r.

A considerar que tal alín. rege para a situação dos autos é não atentar na jurisprudência criada em redor do anterior n.º 2 do art.º 734.º do CPC que, prevendo a subida imediata do agravo cuja retenção o tornaria absolutamente inútil, era muito restritiva, considerando-se que a eventual retenção deveria ter um resultado irreversível quanto ao recurso, não bastando uma mera inutilização de actos processuais, ainda que contrária ao princípio da economia processual, jurisprudência essa que permanece válida e é de seguir.[1]

Todavia, é antes a alín. h) do n.º 2 do art.º 691.º do CPC que regula o recurso do despacho saneador, o qual só admite recurso quando, sem pôr termo ao processo, decida do mérito da causa.

Porque se limitou a conhecer (aliás, tabelarmente) das nulidades e excepções dilatórias (o que, de resto, não forma caso julgado formal – n.º 3 do art.º 510.º do CPC) e, porque, por falta de elementos, relegou para final a decisão da matéria atinente ao mérito, decisão esta que não constitui qualquer omissão de pronúncia, mesmo que se não tivesse indicado (como devia) que se diferia igualmente para final a apreciação da caducidade enquanto excepção peremptória, é irrecorrível nos termos do n.º 4 do art.º 510.º do CPC.

Uma tal omissão só poderá verificar-se se a excepção não vier a ser apreciada na sentença final.[2]

Em suma, é irrecorrível o despacho saneador que não conheça do mérito da causa ou que, por falta de elementos, relegue para final o conhecimento de matéria que cumpra conhecer.

Face ao exposto, porque irrecorrível à luz dos mencionados n.º 4 do art.º 510.º e alín. h) do n.º 2 do art.º 691.º, do CPC e porque nos termos do n.º 5 do art.º 685.º- C do CPC a decisão da 1.ª instância de admissibilidade do recurso não vincula este tribunal, não se admite o recurso (n.º 2, alín. a) do art.º 685.º- C do CPC), ficando, assim, prejudicado o conhecimento da apelação (n.º1, alín. c) do art.º 700.º do  CPC).

Custas pelos recorrentes.


***

Francisco Caetano



[1] V. Lebre de Freitas, “CPC, Anot.”, 3.º, 2.ª ed., pág. 81.
[2] V. Ac. STJ de 16.3.00, Sumários, 39.º-39).