Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
311/21.1T8FIG.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: PAULA MARIA ROBERTO
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
COEFICIENTES DE INCAPACIDADE
VÍTIMA NÃO RECONVERTÍVEL QUANTO AO POSTO DE TRABALHO
BONIFICAÇÃO
Data do Acordão: 03/24/2023
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DO TRABALHO DA FIGUEIRA DA FOZ DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGO 48.º, N.º 3, AL.ª B), DA LAT, E AL.ª A) DO N.º 5 DAS INSTRUÇÕES GERAIS DA TABELA NACIONAL DE INCAPACIDADES POR ACIDENTES DE TRABALHO OU DOENÇAS PROFISSIONAIS, APROVADA PELO DECRETO-LEI N.º 352/2007, DE 23-10
Sumário: I – Nos termos previstos no ponto 5 do Anexo I da Tabela nacional de incapacidades por acidentes de trabalho ou doenças profissionais, os coeficientes de incapacidade previstos são bonificados com uma multiplicação pelo fator 1,5 se a vítima não for reconvertível em relação ao posto de trabalho.

II – Conforme jurisprudência uniformizada pelo acórdão do STJ n.º 10/2014:

<<A expressão “se a vítima não for reconvertível em relação ao posto de trabalho”, contida na alínea a) do n.º 5 das Instruções Gerais da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho ou Doenças Profissionais, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de Outubro, refere-se às situações em que o sinistrado, por virtude das lesões sofridas, não pode retomar o exercício das funções correspondentes ao concreto posto de trabalho que ocupava antes do acidente.>>

III – Encontrando-se o sinistrado afetado de IPATH, ou seja, não sendo reconvertível em relação ao posto de trabalho que ocupava na data do acidente e não resultando da matéria de facto provada que o mesmo retomou o exercício das funções correspondentes ao posto de trabalho que ocupava antes do acidente, é aplicável o fator 1,5.


(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Integral: Apelação n.º 311/21.1T8FIG.C1

_________________________________

Acordam[1] na Secção Social (6.ª Secção) do Tribunal da Relação de Coimbra:

I - Relatório

G..., SA, com sede em ...,

participou o presente acidente de trabalho, ocorrido no dia 13/07/2020, de que foi vítima AA ao serviço da entidade patronal B... Unipessoal, Ldª e que celebrou um contrato de seguro por acidente de trabalho com a participante.

                                                              *

Procedeu-se à realização de exame médico no INML e no qual foi atribuída ao sinistrado uma IPP de 52,5% (após aplicação do fator 1,5) com IPATH.

                                                             *

A seguradora responsável requereu a realização de exame por junta médica para fixação de incapacidade, ao abrigo do disposto no n.º 2, do artigo 138.º, do C.P.T..

                                                             *

Procedeu-se a exame por junta médica conforme auto de fls. 84 a 85 e no qual foi atribuída ao sinistrado uma IPP de 45% (0,30x1,5) com IPATH.

                                                             *

Foi, de seguida, proferida a sentença recorrida com o seguinte dispositivo:

Pelo exposto, decide-se:

I - Declarar que o sinistrado AA, em virtude do acidente de trabalho objeto deste processo, encontra-se afetado de uma Incapacidade Permanente Parcial de 45%, com Incapacidade Permanente Absoluta para o Trabalho Habitual, desde 20-2-2021 e, em consequência condena-se:

II - A entidade responsável/seguradora a pagar ao sinistrado:

- a pensão anual e vitalícia de € 8.129,61 (oito mil, cento e vinte e nove euros e sessenta e um cêntimos), com efeitos desde 20-2-2021, a ser paga em 1/14 até ao 3º dia de cada mês e aina os subsídios de férias e de Natal, de idêntico montante, a serem pagos em Junho e em Novembro – artigo 72º, nºs 1 e 2 da Lei nº 98/2009 de 4-9.

- um subsídio de elevada incapacidade permanente, no montante de € 4.174,14 (quatro mil, cento e setenta e quatro euros e catorze cêntimos);

- o montante de € 713,60 (setecentos e treze euros e sessenta cêntimos) a título de indemnização por incapacidades temporárias sofridas desde a data do acidente até à data da alta; e

- o montante de € 55,00 (cinquenta e cinco euros) pelas despesas de deslocações obrigatórias.

Sobre os montantes acima fixados, serão devidos juros moratórios, à taxa estabelecida ao abrigo do artigo 559º, nº 1 do Código Civil, desde o respectivo vencimento e até integral pagamento.

                                                             *

A seguradora notificada desta decisão, interpôs o presente recurso, cuja alegação concluiu da seguinte forma:

“1 – A sentença recorrida violou o preceituado na instrução 5, al. a) da tabela nacional de incapacidades, aprovada pelo DL nº 352/2007, de 23 de outubro, devendo ser revogada em conformidade;

2 – Com efeito, a ora Recorrente considera que o factor 1,5 não pode ser cumulável com a IPATH;

3 - A bonificação através do factor 1,5 tem por objectivo compensar o facto de o sinistrado passar a desempenhar as suas funções com redobrado esforço;

4 - Ora, sendo atribuída IPATH, no pressuposto de que o sinistrado está totalmente incapaz para o exercício das suas funções, não se justifica a aplicação da bonificação, pois não irá realizar o trabalho que antes fazia com redobrado esforço;

5 - A atribuição de IPATH não é, pois, cumulável com a bonificação do factor 1.5, uma vez que a primeira consome a segunda;

6 - A este propósito, vide o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 08.05.2006, disponível em www.dgsi.pt, o qual considera que “não é compatível a atribuição de uma IPATH e a bonificação do factor 1.5 sobre a IPP para as restantes profissões, porque o espaço para aplicação do factor 1.5 foi ocupado pela incapacidade de 100% para a execução do trabalho habitual do sinistrado”;

7 - Segundo o douto acórdão, o factor 1.5 está apenas previsto para os casos em que não sendo de aplicar a IPATH, o sinistrado continua a desempenhar a mesma função, mas agora com redobrado esforço, atendendo à limitação física que a lesão ou lesões lhe provocam”, sendo “este redobrado esforço que o legislador quis contemplar com a bonificação do factor 1.5”. (sublinhado nosso);

8 - Idêntica posição segue o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 08.02.2012, disponível em www.dgsi.pt, de acordo com o qual “tendo sido reconhecida ao sinistrado uma IPATH, não se justifica cumular com tal incapacidade absoluta a aplicação do factor de bonificação 1.5 à IPP”;

9 - Tal entendimento encontra fundamento no facto de, segundo o douto tribunal, existir “uma diferença de grau (quantitativo e qualitativo) entre uma e outra situação, achando-se a situação prevista na alínea a) da 5.ª Instrução Geral consumida ou absorvida por aquela, mais gravosa e global da IPATH, ao privar, em termos imediatos e definitivos, o trabalhador da possibilidade de desenvolver a profissão que até aí desempenhava, ao passo que as hipóteses contempladas pela dita Instrução Geral estão aquém de tal impossibilidade...”. (sublinhado nosso);

10 - Idêntica posição seguiu igualmente o douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 22.05.2006, disponível em www.dgsi.pt, de acordo com o qual “O factor de 1,5 previsto na Instrução 5, al. a) da Tabela Nacional de Incapacidades, é aplicável apenas à incapacidade de que está afectado o sinistrado para a sua função específica e não à incapacidade restante (conexa com outras funções compatíveis) ”, entendendo o douto tribunal que “Tal significa que se o sinistrado for incapaz a 100% para o exercício da sua função, da sua profissão, e se a IPP que lhe foi atribuída nada tem a ver com a sua profissão, não é aplicável o factor de 1,5 à IPP residual, por esta não estar relacionada com o posto de trabalho, com a concreta função exercida pelo sinistrado. E também não é de aplicar o factor de 1,5 se a incapacidade é de 100%, como é o caso de uma IPATH” (sublinhado nosso);

11 - Face ao exposto supra, facilmente se conclui que não faz qualquer sentido aplicar a citada bonificação quando foi já atribuída IPATH, pois esta consome a primeira;

12 - A ora Recorrente não desconhece que a jurisprudência tem, nos últimos tempos, adoptado entendimento diverso, louvando-se mormente no Acórdão Uniformizador nº 10/2014, de 28 de maio, mas não se conforma com este entendimento;

13 - Assim, com os fundamentos já aduzidos, sempre se terá de considerar que não há cumulação entre a IPATH e o factor de bonificação 1,5;

14 - Impondo-se a revogação da sentença recorrida com este fundamento.

Nestes termos, nos mais de direito e sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao recurso apresentado e ser a douta sentença revogada, assim se fazendo como sempre

JUSTIÇA

*

O sinistrado não apresentou resposta.

                                                         *

O Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que “a Apelação deve(rá) ser julgada improcedente”.

                                                             *

Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

                                                              *

II – Saneamento.

A instância mantém inteira regularidade por nada ter entretanto sobrevindo que a invalidasse.

                                                             *

III – Fundamentação.

a) - Factos provados constantes da sentença recorrida:

Os constantes do relatório que antecede.

                                                             *

b)- Discussão

Como é sabido, a apreciação e a decisão dos recursos são delimitadas pelas conclusões da alegação do recorrente (artigo 639.º, n.º 1, do C.P.C., na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 41/2013 de 28/06).

Cumpre, então, apreciar a questão suscitada pela recorrente, qual seja:

Se o fator 1,5 não pode ser cumulável com a IPATH.  

                                                             *

Alega a recorrente que o fator 1,5 não pode ser cumulável com a IPATH; a bonificação através do fator 1,5 tem por objetivo compensar o facto de o sinistrado passar a desempenhar as suas funções com redobrado esforço ora, sendo atribuída IPATH no pressuposto de que o sinistrado está totalmente incapaz para o exercício das suas funções, não se justifica a aplicação da bonificação, pois não irá realizar o trabalho que antes fazia com redobrado esforço; a atribuição de IPATH não é, pois, cumulável com a bonificação do fator 1.5, uma vez que a primeira consome a segunda; a ora Recorrente não desconhece que a jurisprudência tem, nos últimos tempos, adotado entendimento diverso, louvando-se mormente no Acórdão Uniformizador nº 10/2014, de 28 de maio, mas não se conforma com este entendimento.

Por outro lado, conforme resulta da sentença recorrida, o sinistrado encontra-se afetado de IPP de 45% com IPATH, sendo que aquela resulta da IPP de 0,30 bonificada com o fator 1,5 (0,30x1,5=45%).

Vejamos, então, se assiste razão à recorrente.

Como se decidiu no acórdão da Relação do Porto, de 09/03/2015, disponível em www.dgsi.pt, que acompanhamos:

A resposta à questão enunciada não se apresenta com linearidade e a jurisprudência que sobre a mesma se debruçou não foi consonante ao longo do tempo.

De acordo com alguns arestos, existe uma diferença de grau entre o artigo 17.º, número 1, alínea b) da LAT (que prevê a reparação da IPATH) e esta prescrição da TNI existe uma diferença de grau, achando-se a situação prevista na alínea a) da 5.ª Instrução Geral – que deve ser perspectivada relativamente ao posto de trabalho habitual que o sinistrado ocupava quando se acidentou – consumida ou absorvida por aquela, mais gravosa e global da IPATH, o que impediria a aplicação simultânea de ambos. A IPATH, que priva, em termos imediatos e definitivos, o trabalhador da possibilidade de desenvolver a profissão que até aí desempenhava, é reparada nos termos da primeira disposição. E as situações em que os sinistrados tenham perdido ou visto diminuída uma função inerente ou imprescindível ao desempenho do seu posto de trabalho, que lhes dificulta seriamente o seu exercício mas não impede a continuação no e do mesmo, ainda que noutras condições (reconversão daquele), levam à aplicação do referido factor 1,5, aplicado à IPP de que padecem. Pareceria, pois, que as hipóteses contempladas pela dita Instrução Geral estão aquém da IPATH e são reparadas de modo distinto. A haver IPATH, já não lograria aplicação aquela Instrução da TNI.

Nesta senda, o Acórdão da Relação do Porto de 22 de Maio de 2006 (in CJ, tomo III, p. 229) decidiu que na referida Instrução da TNI está em causa a incapacidade do sinistrado relacionada com a função concretamente exercida por ele e não a incapacidade relacionada com outra ou outras funções que ele possa exercer ou vir a exercer, pelo que o factor de bonificação ali previsto teria de se aplicar à incapacidade de que está afectado o sinistrado para a sua função específica e não à incapacidade restante (conexa com outras funções compatíveis), Como ali se diz, “o factor 1,5 não pode aplicar-se à IPP residual por esta não estar relacionada com o posto de trabalho, com a concreta função exercida pelo sinistrado” e “também não é de aplicar o factor 1,5 se a incapacidade é de 100%, como é o caso de uma IPATH”. E conclui este aresto que “[o] factor 1,5 está apenas previsto para os casos em que não sendo de aplicar a IPATH, o sinistrado continua a desempenhar a mesma função, mas agora com redobrado esforço, atendendo à limitação física que a lesão ou lesões lhe provocam. E é este redobrado esforço que o legislador quis contemplar com a bonificação”, pelo que “quando o sinistrado está afectado de IPATH ao caso não é aplicável o factor 1,5 previsto na Instrução 5 da TNI” – no mesmo sentido decidiu o Acórdão da Relação de Lisboa de 2012.02.08, Processo n.º 270/03.2TTVFX.L1-4, subscrito pela ora relatora como adjunta, in www.dgsi.pt.

Apesar da logicidade deste entendimento, as indicações da letra da lei, maxime na referência que é feita na Instrução ao conceito de não reconversão em relação ao posto de trabalho[2], levaram a que se verificasse uma divisão jurisprudencial, havendo defensores da tese de que, ficando o sinistrado afectado de uma IPATH e de uma percentagem de IPP para profissão compatível, a este último grau de incapacidade deve ser aplicado, para efeitos do cálculo do valor da pensão, o factor de bonificação de 1,5 previsto no n.º 5, alínea a), das Instruções Gerais da TNI – vide o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 2012.03.26, Processo n.º 383/10.4TTOAZ.P1, in www.dgsi.pt, segundo o qual “a necessidade de majoração do grau de incapacidade e do nível de reparação das sequelas do acidente se impõe nos casos de IATH, tal como nos casos de IPP, se não por maioria, pelo menos por identidade de razão, pois o trabalhador precisará de fazer um esforço acrescido para se adaptar à nova profissão, tanto ou mais que aquele que é necessário empreender para continuar a desempenhar a mesma profissão, no exercício da qual sofreu o acidente”.

É nestas águas que tem navegado a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, revelando uniformidade – quer à luz da TNI de 1993, quer à luz da TNI de 2007 – no entendimento de que não ocorre incompatibilidade entre o estatuído na alínea b) do n.º 1 do artigo 17.º da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, e na alínea a) do n.º 5 das Instruções Gerais da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, podendo cumular-se os benefícios nelas estabelecidos – vide os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de Março de 2009, Recurso n.º 3920/08, de 29 de Março de 2012, Recurso n.º 307/09.1TTCTB.C1.S1, de 24 de Outubro de 2012, Processo n.º 383/10.4TTOAZ.P1.S1 e de 5 de Março de 2013 (este último proferido no Processo n.º 270/03.2TTVFX.1.L1.S1, tendo revogado o supra referidos Acórdão da Relação de Lisboa de 2012.02.08).

Finalmente, o Supremo Tribunal de Justiça, no seu Acórdão nº 10/2014, de 28 de Maio de 2014 (in DR, I Série, de 30 de Junho de 2014), uniformizou jurisprudência no sentido de que «[a] expressão “se a vítima não for reconvertível em relação ao posto de trabalho”, contida na alínea a) do n.º 5 das Instruções Gerais da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidente de Trabalho ou Doenças Profissionais, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de Outubro, refere-se às situações em que o sinistrado, por virtude das lesões sofridas, não pode retomar o exercício das funções correspondentes ao concreto posto de trabalho que ocupava antes do acidente.»

Na fundamentação deste aresto, o Supremo Tribunal de Justiça fez constar, além do mais, o seguinte (excluem-se as notas de rodapé):

«8 – Assim, aquele segmento normativo «não reconvertível em relação ao posto de trabalho», como pressuposto da bonificação prevista naquela alínea, refere-se às situações em que o sinistrado não pode retomar o exercício das funções correspondentes ao posto de trabalho que desempenhava antes do acidente.

A reconversão em relação ao posto de trabalho prevista naquela norma materializa-se no regresso do sinistrado ao desempenho das funções que tinha quando ocorreu o acidente, apesar das limitações em termos de capacidade que trabalho que do mesmo decorreram.

Pode, assim, afirmar-se que um trabalhador que foi vítima de um acidente de trabalho é reconvertido em relação ao posto de trabalho que tinha antes do acidente quando o pode retomar, apesar das limitações funcionais de que seja portador em consequência do acidente sofrido.

Quando esse regresso não seja possível, quando essa retoma não seja possível, o trabalhador não é susceptível de reconversão nesse posto de trabalho.

Aliás, já na vigência da TNI aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de Outubro, em vigor, TERESA MAGALHÃES e Outros, abordaram o conteúdo daquele segmento normativo, referindo que «em lado algum se define o conceito de reconvertível, bem assim como as circunstâncias da reconversão ou o tipo de actividade para a qual essa reconversão é considerada (para a actividade específica habitual – avaliação teórica -, ou no seu posto de trabalho – avaliação concreta? Não corresponderá antes a situação de não reconversão a um caso de IPATH?)»11.

Adite-se que na linha da jurisprudência definida nesta secção12 os casos de IPATH são situações típicas de não reconvertibilidade do sinistrado em relação ao seu anterior posto de trabalho.

Tudo para concluir que, à luz da actual redacção da alínea a) do n.º 5 da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidente de Trabalho ou Doenças Profissionais aprovada pelo Decreto-lei n.º 352/2007, de 23 de Outubro, para a aplicação do factor de bonificação 1,5, nela previsto, exige-se que a vítima não seja reconvertível em relação ao posto de trabalho, sem prejuízo das situações em que a bonificação em causa depende da idade do sinistrado.»

Mais recentemente, o Supremo Tribunal de Justiça reiterou este entendimento em dois arestos datados de 28 de Janeiro de 2015 (Processo n.º 28/12.8TTCBR.C1.S19 e Processo n.º 22956/10.5T2SNT.L1.S1 ), aí decidindo, igualmente, que não ocorre incompatibilidade entre o estatuído na alínea b) do n.º 3 do artigo 48.º da Lei n.º 98/2009, de 4 de Setembro, relativo a fixação de pensões nas situações de incapacidade absoluta para o trabalho habitual e a alínea a) do n.º 5 das Instruções Gerais da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, editada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de Outubro, podendo cumular-se os benefícios nelas estabelecidos.

Perante o teor literal dos preceitos e, particularmente tendo em atenção a evolução legislativa que se verificou – que em 2007 expurgou a alínea a) da referida Instrução da TNI das referências iniciais constantes da supra transcrita redacção de 1993 e possibilitou a aplicação do factor independentemente de se verificar perda ou diminuição de função inerente ou imprescindível ao desempenho do posto de trabalho que ocupava com carácter permanente –, não vemos razões para nos afastarmos agora desta jurisprudência, que, revendo a posição anteriormente assumida, sufragamos.

No caso vertente, resulta dos autos e mostra-se consensualmente aceite pelas partes – não tendo sido questionado por qualquer delas na apelação – que, tendo por base as sequelas que apresenta, o sinistrado ficou afectado de uma incapacidade permanente absoluta para a profissão habitual (IPATH) desde a data da alta. Embora a sentença não especifique qual a profissão habitual do sinistrado, resulta claramente dos seus termos que a Mma. Julgadora se baseou sem reservas na resposta pericial unânime e afirmou, sem que qualquer das partes o questionasse na apelação, que o sinistrado ficou afectado de IPATH.

A constatação de que o sinistrado ficou com IPATH é suficiente para que se conclua ter havido perda de função inerente e imprescindível ao desempenho do posto de trabalho que ocupava, não sendo o sinistrado reconvertível ao mesmo.

Verifica-se assim o condicionalismo previsto na alínea a), do n.º 5 das Instruções Gerias da TNI de 2007, pelo que, em conformidade com a citada jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, devia ter sido levado em conta o factor 1,5 na fixação do grau de incapacidade permanente para profissão compatível.

Na verdade, nos termos previstos no ponto 5 do Anexo I da Tabela nacional de incapacidades por acidentes de trabalho ou doenças profissionais, os coeficientes de incapacidade previstos são bonificados com uma multiplicação pelo fator 1,5 se a vítima não for reconvertível em relação ao posto de trabalho ou tiver 50 anos ou mais quando não tiver beneficiado da aplicação desse fator.

Por outro lado, é atribuída ao sinistrado IPATH se o mesmo estiver absoluta e permanentemente incapacitado para o trabalho habitual (artigo 48.º, n.º 3, b) da LAT)

Conforme jurisprudência uniformizada pelo acórdão do STJ n.º 10/2014:

<<A expressão “se a vítima não for reconvertível em relação ao posto de trabalho”, contida na alínea a) do n.º 5 das Instruções Gerais da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho ou Doenças Profissionais, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de Outubro, refere-se às situações em que o sinistrado, por virtude das lesões sofridas, não pode retomar o exercício das funções correspondentes ao concreto posto de trabalho que ocupava antes do acidente.>>

Ora, resulta da matéria de facto provada, não questionada, que o sinistrado encontra-se afetado por incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual.

E, mais se provou, que o sinistrado se encontra afetado de IPP de 45%, resultante da aplicação do fator 1,5 à IPP de 30%.

Assim sendo, encontrando-se o sinistrado afetado de IPATH, ou seja, não sendo reconvertível em relação ao posto de trabalho que ocupava na data do acidente, posto que, não resulta da matéria de facto provada que o mesmo retomou o exercício das funções correspondentes ao posto de trabalho que ocupava antes do acidente, é aplicável o fator 1,5[2][3].

É o que resulta da aplicação do citado Acórdão uniformizador, sendo certo que os argumentos utilizados pela recorrente não põem em causa o que consta do mesmo.

Na verdade, os coeficientes de incapacidade previstos são bonificados com uma multiplicação pelo fator 1,5 se a vítima não for reconvertível em relação ao posto de trabalho e esta expressão refere-se às situações em que o sinistrado, por virtude das lesões sofridas, não pode retomar o exercício das funções correspondentes ao concreto posto de trabalho que ocupava antes do acidente, pelo que, facilmente se conclui que as alegações da recorrente no sentido de que a bonificação através do fator 1,5 tem por objetivo compensar o facto de o sinistrado passar a desempenhar as suas funções com redobrado esforço, de que sendo atribuída IPATH não se justifica a aplicação da bonificação pois não irá realizar o trabalho que antes fazia com redobrado esforço e de que que a atribuição de IPATH não é cumulável com a bonificação do fator 1,5, uma vez que a primeira consome a segunda, não podem proceder.

Assim sendo, tendo a IPP do sinistrado sido fixada, como devia, em 45% (30% x 1,5), com a consequente condenação da Ré no pagamento das respetivas prestações e que não foram postas em causa no presente recurso, nada mais se impõe dizer.

Improcedem, assim, todas as conclusões da recorrente.

                                                             *

                                                             *

IV – Sumário[4]

(…).

                                                                        *

                                                             *

V - DECISÃO.

Nestes termos, na total improcedência da apelação, acorda-se em manter a sentença recorrida.

                                                             *

                                                             *

Custas a cargo da recorrente.

                                                             *

                                                             *

Coimbra, 2023/03/24                                                                      

(Paula Maria Roberto)

(Mário Rodrigues da Silva)

(Felizardo Paiva)





[1] Relator – Paula Maria Roberto
  Adjuntos – Mário Rodrigues da Silva
                     Felizardo Paiva

[2] A este propósito cfr. o Acórdão do STJ, de 06/02/2019, disponível em www.dgsi.pt.
[3] No mesmo sentido, cfr. os acórdãos da Relação do Porto, de 27/02/2017, de 04/12/2017 e de 27/04/2020 e da Relação de Évora de 14/05/2015.
[4] O sumário é da responsabilidade exclusiva da relatora.