Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
253/16.2T8PBL-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FALCÃO DE MAGALHÃES
Descritores: EXECUÇÃO
OPOSIÇÃO
PRAZO
AGENTE DE EXECUÇÃO
Data do Acordão: 10/17/2017
Votação: DECISÃO SINGULAR
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – JUÍZO DE EXECUÇÃO DE LEIRIA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTº 856º, Nº 1 DO NCPC.
Sumário: Sendo, no caso, de 20 dias, o prazo legal para o executado deduzir oposição à execução e à penhora (artº 856º, nº 1, do novo CPC), não deve ser indeferida, por intempestividade, a oposição à execução que o executado venha oferecer dentro desse prazo, embora quando já excedido o prazo, mais curto, que, por lapso, o Agente de Execução – que também omitiu a citação para o executado se opor à execução - indicou, para que se opusesse à penhora.
Decisão Texto Integral:








Decisão sumária (art.ºs 656º, 652º n.º 1, al c), ambos do novo Código de Processo Civil[1] - doravante NCPC, para se distinguir daquele que o precedeu, que se designará como CPC)[2].

I - Relatório:

A) - 1) - Por apenso aos autos de execução, para pagamento de quantia certa, a correr termos contra si na Instância Central - 2ª Secção de Execução - J1, da Comarca de Leiria e instaurados em 15/01/2016 por C..., tendo como título executivo sentença condenatória, já transitada em julgado, veio o Executado, A..., em 13/05/2016, opor-se à execução e à penhora, por embargos de executado.

2) - O Executado, mediante carta registada, com A/R, dirigida para a sua residência no Luxemburgo (...), havia sido notificado, em 22/03/2016, pelo Agente de Execução, nos seguintes termos:

«Nos termos do disposto nos artigos 784º e 785º do Código Processo Civil (CPC), fica pela presente notificado para, no prazo de 10 (dez) dias deduzir, querendo, oposição à penhora dos bem(s) identificado(s) em anexo, com algum dos seguintes fundamentos:

a. Inadmissibilidade da penhora dos bens concretamente apreendidos ou da extensão com que ela foi realizada;

b. Imediata penhora de bens que só subsidiariamente respondam pela dívida exequenda;

c. Incidência da penhora sobre bens que, não respondendo, nos termos do direito substantivo, pela dívida exequenda, não deviam ter sido atingidos pela diligência.

No requerimento em que se suscite o incidente e na oposição que lhe for deduzida, deve oferecer o rol de testemunhas (no máximo de cinco) e requerer os outros meios de prova (artigos 293º e 294º do CPC).

Quando a oposição se funde na existência de patrimónios separados, deve indicar logo os bens, integrados no património autónomo que responde pela dívida exequenda, que tenha em seu poder e estejam sujeitos à penhora.

Nos termos do disposto no artigo 58º do CPC, para deduzir oposição/embargos, é obrigatória a constituição de Advogado quando o valor da execução seja superior à alçada do tribunal de primeira instância (5.000,00 euros).

Nos termos do nº 3 do artigo 753º do CPC fica advertido de que, no prazo da oposição e sob pena de ser condenado como litigante de má-fé, deve indicar os direitos, ónus e encargos não registáveis que recaiam sobre os bens penhorados, bem como os respetivos titulares ou beneficiários; é-lhe ainda comunicado que pode requerer a substituição dos bens penhorados ou a substituição da penhora por caução, nas condições e nos termos do disposto na alínea a) do n.º 4 e no n.º 5 do artigo 751.º do CPC.

Nos termos da alínea a) do nº 4 do artigo 751º do CPC poderá ainda requerer ao agente de execução, no prazo da oposição à penhora, a substituição dos bens penhorados por outros que igualmente assegurem os fins da execução, desde que a isso não se oponha o exequente.

O valor em dívida (incluindo a quantia peticionada, juros e custas é provisoriamente fixado em 16.864,27Euros não estando incluídos os honorários e despesas previsíveis com o agente de execução (objeto de posterior cálculo).

Poderá, a qualquer momento, saber qual o valor atualizado da dívida e o valor devido a título de honorários e despesas, solicitando-o diretamente ao agente de execução. Para efetuar o pagamento do valor em dívida utilize as referências indicadas no quadro "pagamentos".»

3) - A primeira intervenção do Executado no processo foi mediante a petição de embargos, na qual não alegou que a sua notificação se deveria considerar como nula ou efectuada com preterição de formalidades essenciais.

B) – 1) - Mediante despacho de 28/09/2016, precedido de contraditório quanto a essa matéria, a Mma. Juiz de Execução, referindo fazê-lo “...ao abrigo do disposto no artigo 732º n.º 1, al. a) do CPC, ex vi, artigo 550º n.º 3 do CPC, ex vi, artigo 626º n.º 2 do CPC...”, indeferiu, liminarmente, a oposição à execução mediante embargos de executado e de oposição à penhora, condenando o Executado nas respectivas custas;

2) – Entre o mais, pode ler-se na fundamentação desse despacho[3]:

«[…]  bem andou o Sr. Agente de Execução ao notificar o Executado, face ao disposto no artigo 626º n.º 2 do CPC.

Porém, na esteira do referido, a notificação operada deveria ter sido efetuada com as formalidades da citação e para o Executado, querendo, deduzir, no prazo de 20 dias, embargos de executado e oposição à penhora, nos termos do n.º 2 do artigo 856º do CPC.

Qual a consequência das omissões verificadas?

Dispõe o artigo 187º, al. c), do CPC, que é nulo tudo o que se processe depois da petição inicial, salvando-se apenas esta, quando o réu não tenha sido citado.

De acordo com a al. a), do n.º 1, do artigo 188º do CPC, há falta de citação, para além do mais, quando o ato tenha sido completamente omitido.

Porém, se o réu intervier no processo sem arguir logo a falta da sua citação, considera-se sanada a nulidade – cfr. artigo 189º do CPC.

(...)

Por sua vez, a citação é nula quando não tenham sido observadas na sua realização as formalidades prescritas na lei – cfr. artigo 191º n.º 1 do CPC conjugado com os artigos 225º e ss. do CPC.

O prazo para a arguição da nulidade é o que tiver sido indicado para a contestação –cfr. n.º 2 do artigo 191º do CPC.

Subsumindo as disposições legais enunciadas ao processado nos autos.

A falta de notificação do Executado, ora Embargante, para, deduzir, querendo, embargos de executado, deveria ser arguida aquando da sua intervenção nos autos, in casu, aquando da apresentação do articulado de embargos de executado e de oposição à penhora.

O que não ocorreu - cfr. requerimento de oposição à execução mediante embargos de executado e de oposição à penhora.

Sendo que a referida intervenção do Executado - apresentação do articulado de embargos de executado e de oposição à penhora – é considerada suficiente para sanar a nulidade da falta de citação.

Termos em que, face ao disposto nos artigos 188º n.º 1, al. a) e 189º do CPC, urge considerar sanada a nulidade decorrente da falta de notificação do Executado, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 856º n.º 2 do CPC, ex vi, artigo 626º n.º 2 do CPC.

Por sua vez, a nulidade do ato de notificação – por não terem sido observadas, na sua realização, as formalidades prescritas na lei, nomeadamente, as previstas no artigo 230º, 239º e 245º do CPC - deveria ser arguida no prazo concedido ao Executado para deduzir oposição à penhora, ou seja, 10 dias.

O que não ocorreu – cfr. requerimento de oposição à execução mediante embargos de executado e de oposição à penhora.

Termos em que, face ao disposto nos artigos 191º n.º 1 e n.º 2 do CPC, urge considerar sanada, por preclusão, a nulidade decorrente da preterição das formalidades prescritas na lei para o ato de citação.

Posto isto, urge apreciar a tempestividade do requerimento de oposição à execução mediante embargos de executado e de oposição à penhora – cfr. artigo 732º n.º 1, al. a) do CPC, ex vi, artigo 551º n.º 3 do CPC.

Como oportunamente referido, o Executado considera-se notificado no dia 22 de Março de 2016, período temporal que coincide com férias judiciais da Páscoa que decorreram entre 20 e 28 de Março de 2016 - cfr. artigo 28º da Lei da Organização do Sistema Judiciário.

Assim, o prazo para apresentar oposição iniciou-se no dia 29 de Março, por força do disposto no artigo 138º n.º 1 e n.º 2, ex vi, n.º 3 do artigo 138º do CPC e terminou no dia 7 de Abril de 2016.

Tudo sem prejuízo do disposto nos artigos 139º n.º 5 do CPC e 140º do CPC.

Porém, o requerimento de oposição à execução mediante embargos de executado e de oposição à penhora deu entrada em juízo em 13 de Maio de 2016.

Pelo que, sem necessidade de mais considerações, ter-se-á de considerar intempestivo. […]».

II – A) - Inconformado, o Executado/Embargante recorreu desse despacho, tendo terminado as alegações desse recurso - que veio a ser admitido como Apelação, com efeito meramente devolutivo -, formulando as seguintes conclusões:

...

B) – O Exequente/Apelado, oferecendo resposta à alegação de recurso, defendeu a improcedência deste.

C) – A Mma. Juiz do Tribunal “a quo”, ao admitir o recurso, considerou, relativamente ao despacho impugnado: “...não existir qualquer nulidade, nomeadamente a pugnada oposição entre os fundamentos da decisão e esta; de igual forma, não verifico qualquer ambiguidade ou obscuridade.”.

III - As questões:

Em face do disposto nos art.ºs 635º, nºs 3 e 4, 639º, nº 1, ambos do NCPC, o objecto dos recursos delimita-se, em princípio, pelas conclusões dos recorrentes, sem prejuízo do conhecimento das questões que cumpra apreciar oficiosamente, por imperativo do art.º 608º, n.º 2, “ex vi” do art.º 663º, nº 2, do mesmo diploma legal.

Não haverá, contudo, que conhecer de questões cuja decisão se veja prejudicada pela solução que tiver sido dada a outra que antecedentemente se haja apreciado, salientando-se que, com as “questões” a resolver se não confundem os argumentos que as partes esgrimam nas respectivas alegações e que o Tribunal pode ou não abordar, consoante a utilidade que veja nisso (Cfr., entre outros, no domínio da legislação pretérita correspondente, Ac. do STJ de 13/09/2007, proc. n.º 07B2113 e Ac. do STJ de 08/11/2007, proc. n.º 07B3586 [4]).

Assim, a questão que importa solucionar no presente recurso, consiste em saber se os embargos foram deduzidos fora de prazo e, se, por isso, podiam ser indeferidos liminarmente (artº 732º, nº 1, a), do NCPC).

No exame dessa questão abordaremos, com o destaque que merecerem, as matérias da invocada nulidade do despacho recorrido e da relevância dos termos da notificação recebida pelo Executado em 22/03/2016.

IV - Fundamentação:

A) - O circunstancialismo processual e os factos a considerar na decisão a proferir são os enunciados em I - supra.

B) – Diga-se, preliminarmente, que só na aparência o Executado deduziu oposição à penhora, pois, dados os termos dos embargos, vê-se bem que não invocou qualquer ilegalidade da penhora e só pediu o levantamento desta como consequência da procedência dos embargos à execução.

Preliminarmente, também, importa adiantar que, independentemente de se definir, agora, a problemática da falta ou da nulidade de citação/notificação do Executado – falta essa contra a relevância da qual o Apelante também se insurge nas “conclusões” de recurso -, a arguição desses vícios e, consequentemente, a respectiva tempestividade, só teria razão de ser se o Executado não tivesse deduzido os embargos tempestivamente, como se verá que deduziu.

Se o Executado foi, como sucedeu, mediante notificação, chamado à execução para se defender (da penhora), dando-se-lhe, para tal, nessa notificação, um prazo mais curto que o definido na lei para o efeito e omitindo-se a sua notificação para se opor à execução, desinteressam, a irregularidade e a omissão práticas irrelevam, absolutamente, se, não obstante as mesmas, o Executado acaba por vir embargar a execução dentro do prazo que a lei estabelece para o efeito.

Ora, os embargos à execução são liminarmente indeferidos, quando, entre outras causas que aqui não se aplicam, tiverem sido deduzidos fora do prazo (artigo 732.º, nº 1, a), do NCPC).

No âmbito do processo comum para pagamento de quantia certa, sob a forma sumária, como, “ex vi” do artº 550º, nº 1 e 2, a), do NCPC, é o caso, a lei – artº 856º, nº 1, do NCPC - determina que o Executado, feita a penhora, pode deduzir embargos e oposição à penhora no prazo de 20 dias, sendo, para o efeito, citado para a execução e, em simultâneo, notificado do acto da penhora.

Como o agente da execução não fixa a duração dos prazos para a dedução da oposição à execução e à penhora, mas apenas os transmite ao Executado mediante citação ou notificação, estando os mesmos, como vimos, fixados na lei, é irrelevante o seu erro, ou a sua omissão, nessa transmissão, se, não obstante tais vicissitudes, o executado, na sequência da citação ou notificação, acaba por vir embargar ou/e opor-se à penhora dentro do prazo que a lei estabelece para o efeito. E foi isso que sucedeu, no presente caso, como se verá.

Assente que ficou ser de 20 dias o prazo para o executado deduzir oposição à execução e à penhora, notificado que foi, no estrangeiro, por carta registada, com aviso de recepção, no dia 22/03/2016 (artºs 228 e 230, nº 1, do NCPC), para deduzir esta última oposição, o prazo legal para fazer essa oposição e deduzir embargos à execução em que esse acto de apreensão teve lugar, que começaria a correr no dia seguinte (artº 279º, b), do CC), só se iniciou, na realidade, em 29/03/2016, por força do disposto no artº 138º, nº 1, do NCPC, já no período de 20/03/2016 a 28/03/2016 decorreram as férias judiciais da Páscoa. Ao referido prazo acresce o da dilação de 30 dias (artº 245º nº 3)[5], contando-se os dois prazos como um só, como manda o artº 142º do NCPC. Assim, o aludido prazo de 20 dias, acrescido da dilação, só terminaria no dia 17/05/2016, sendo, por isso, tempestivos os embargos entrados em juízo no dia 13/05/2016.

O que se passou na decisão recorrida, afigura-se, foi que, tendo-se iniciado a contagem do prazo em 29 de Março e entendido que o mesmo terminou no dia 7 de Abril de 2016, se atendeu ao prazo de 10 dias, considerado e comunicado pelo Sr. Agente de Execução, mediante a notificação, e não ao prazo de 20 dias que a lei estabelece, não se tendo considerado, também, qualquer a dilação. Não ocorreu, pois, nulidade do despacho impugnado, mas antes, salvo o devido respeito, erro de julgamento que implica – pois que os embargos, afinal, foram deduzidos tempestivamente - a revogação daquele e a sua substituição por decisão que faça prosseguir os embargos, se outro motivo não houver que a isso obste.

V - Decisão:

Em face de tudo o exposto, na procedência da Apelação, revoga-se o despacho recorrido e determina-se que, não havendo outro motivo que a isso obste, se dê seguimento aos embargos em causa.

Custas pelo Apelado.

Coimbra, 17/10/2017

Luis José Falcão de Magalhães


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[1] Aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26/06.
[2] Na presente decisão segue-se a grafia anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, respeitando-se, em caso de transcrição, a grafia do texto original.
[3] Os sublinhados são nossos.
[4] Consultáveis na Internet, em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf?OpenDatabase, endereço este através do qual poderão ser acedidos todos os Acórdãos do STJ que abaixo se assinalarem sem referência de publicação.
[5] Não há matéria que nos leve a concluir estarmos perante as situações contempladas na alínea a) do nº 1, do artº 245º do NCPC, sendo que a aplicabilidade do nº 3 desse artigo “consome” a previsão da alínea b) do referido nº 1, não havendo, pois, aqui, que considerar mais uma dilação de 5 dias.