Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
15/22.8PFLRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ALCINA DA COSTA RIBEIRO
Descritores: CONDUÇÃO DE VEÍCULO EM ESTADO DE EMBRIAGUEZ
ALCOOLÍMETRO
PRAZO DE VALIDADE
VALIDADE DA PROVA
Data do Acordão: 11/23/2022
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: LEIRIA (JUÍZO LOCAL CRIMINAL DE LEIRIA – J3)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ART. 14.º DA LEI N.º 18/2007, DE 17-05; ARTS. 1.º, N.ºS 2 E 3, 2.º, N.ºS 1, 2 E 7, DO DL N.º 291/90, DE 20-09; ART. 5.º, 6.º, N.º 3, E 10.º DA PORTARIA N.º 1556/07, DE 1556/2007, DE 10-12
Sumário: I – O controlo metrológico dos alcoolímetros compete ao Instituto Português da Qualidade, I. P. - IPQ e compreende as seguintes operações: (i) aprovação de modelo; (ii) primeira verificação; (iii) verificação periódica; (iv) verificação extraordinária.

II – A aprovação do modelo é válida por 10 anos, salvo disposição em contrário.

III – O modelo cuja aprovação não foi renovada continua a ter aptidão para realizar medições técnicas de qualidade, desde que satisfaça as devidas operações de verificação.

Decisão Texto Integral:

ACORDAM NA 5ª SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA

I. RELATÓRIO

1. Por sentença datada de 28 de abril de 2022, foi o arguido, AA, condenado pela prática, no dia 12-04-2022, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução de veículo (automóvel) em estado de embriaguez previsto e punível nos termos do artigo 292.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 100 (cem) dias de multa, à taxa diária de € 6,50 (seis euros e cinquenta cêntimos).

Mais condenou o arguido na pena acessória de proibição de conduzir quaisquer veículos motorizados pelo período de 5 (cinco) meses, nos termos do artigo art.º 69.º nº 1 alínea a) do Código Penal;

2. Inconformado com esta decisão, interpõe o arguido o presente recurso, concluindo:

I. A utilização do aparelho da marca “DRAGER” e modelo “7110 MKIII P”, foi aprovada por despacho do IPQ n.º 11037/2007, de 24/04, publicado no D.R. II Série, n.º 109, de 06/06/2007, correspondendo-lhe o número 211.06.07.3.06, aí se estabelecendo, o prazo de validade de 10 anos, pelo que a sua autorização de uso, nos termos do disposto no art.º 6.º, n.º 3 da Portaria n.º 1556/2007, de 10/12, caducou em 23/04/2017.

II. Em 12 de abril de 2022 quando o recorrente foi submetido ao exame de pesquisa de álcool no sangue com o alcoolímetro n.º ARRL-0094, marca “DRAGER” e modelo “7110 MKIII P”, a aprovação deste tinha expirado há 5 anos.

III. De acordo com o art.º 1.º n.º 3 do DL nº 291/90 de 20 de setembro e art.º 5.º da Portaria n.º 1556/2007 de 10 de dezembro o controlo metrológico faz-se através de 4 operações: aprovação do modelo; primeira verificação; verificação periódica; e verificação extraordinária.

IV. Sendo certo que no caso dos autos em que o ora recorrente foi condenado, a convicção do Tribunal fundou-se no resultado obtido por um aparelho de cuja aprovação estava muitíssimo ultrapassada, não renovada, sem prova da sua primeira verificação, sem prova da sua verificação periódica (sendo feito apenas a sua menção com data superior a um ano, mas sem nenhum suporte probatório), sem verificação extraordinária e sem qualquer prova de bom funcionamento.

V. Ainda que assim não fosse, as verificações não podem substituir as aprovações.

VI. Resulta da sentença recorrida e do talão do alcoolímetro em análise nos autos que o arguido acusou uma TAS de pelo menos 2,30g/l, correspondente à TAS registada de 2,50 g/l, tendo a testagem dos níveis de alcoolémia do recorrente apresentado valores superiores a 2,00 g/l, o valor de erro máximo a deduzir era de 0,75 g/l (30 %), e não o de 0,2 g/l (8 %), como consta dos autos ora recorridos, pelo que não poderia ter resultado como provado que o mesmo apresentava uma TAS de 2,30 g/l, quanto muito, seria de 1,75 g/l e não o que resulta da sentença recorrida.

VII. Uma diminuição da TAS leva, forçosamente, à redução da medida concreta da pena, devendo reduzir-se a pena aplicada ao Recorrente.

VIII. Não poderia ter o Tribunal a quo condenado o ora recorrente num valor diário de pena de multa (6,50 €), superior àquele que entendeu (6,00 €) em sede de análise dos factos e sua subsunção ao direito.

IX. O Recorrente não tem antecedentes criminais, dispõe de parcos, vive com a sua mãe, pessoa idosa, que ajuda com as deslocações do dia a dia e aquelas que a que as suas condições de saúde obrigam, sendo, que em comparação com a jurisprudência referida, a medida aplicada ao ora recorrente mostra-se excessiva.

3. O Ministério Público, na primeira e nesta instância defendem a improcedência do recurso.

4. Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2 do Código de Processo Penal, colhidos os vistos, nada obsta ao conhecimento de mérito do Recurso.

II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A primeira instância deu como provados os seguintes factos:

1. O arguido, no dia 12 de Abril de 2022, pelas 13h45, na Rua ..., ..., conduzia o veículo ligeiro de passageiros com a matrícula ..-..-TI,

2. Com uma taxa de alcoolémia no sangue de, pelo menos, 2,30 g/l (correspondente à taxa registada de 2,5 g/l, deduzido o erro máximo admissível).

3. O arguido agiu de forma livre, deliberada e consciente,

4. Bem sabendo que a quantidade de bebidas alcoólicas ingeridas em momento anterior ao exercício da condução do referido veículo, lhe determinava uma taxa de álcool no sangue superior à legalmente permitida

5. E, não obstante, não se absteve de conduzir o veículo naquele estado na via pública, o que representou,

6. Bem sabendo ser a sua conduta proibida e punida por lei penal.

7. O arguido não tem antecedentes criminais.

8. O arguido admitiu a factualidade descrita em 1) e o facto de ter ingerido bebidas alcoólicas previamente ao exercício da condução naquelas circunstâncias.

9. O arguido está reformado, auferindo pensão mensal no valor de, pelo menos, 400,00€.

10. Vive com a mãe, em casa desta, sem encargos com renda ou amortização bancária.

11. A mãe do arguido está reformada, auferindo pensão mensal no valor de cerca de 400,00€.

12. O arguido custeia uma prestação mensal para aquisição de veículo automóvel no valor de 150,00€.

13. O arguido não tem filhos.

14. O arguido tem o 6.º ano de escolaridade.

Convicção do Tribunal:

(…).

III. QUESTÕES A DECIDIR

Sabido que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões, as questões a decidir são as seguintes:

- Identificação do alcoolímetro; 

- Caducidade do prazo de validade do alcoolímetro;

- Caducidade do prazo de validade da verificação periódica;

- Erro máximo de TAS admissível;

-  Excessividade da pena.

IV. APRECIAÇÃO

Dispõe o artigo 380º nº 1, do Código de Processo Penal, que o tribunal procede, oficiosamente ou a requerimento, à correcção da sentença quando:

a) (...)

b) A sentença contiver erro, lapso, obscuridade ou ambiguidade cuja eliminação não importe modificação essencial.

Nestes casos, se houver recurso da sentença, a correcção é feita, quando possível, pelo tribunal competente para conhecer do recurso (nº 2, do citado preceito e diploma).

Pressuposto é que se verifique, de um lado, um erro ou lapso manifesto – «evidente, patente, indiscutível, captável com imediação» Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Janeiro de 2007, proferido no processo nº 3510/06, citado em anotação ao artigo 380º, no Código de Processo Civil Comentado pelos Senhores Juízes Conselheiros, Henriques Gaspar, Santos Cabral, Maia Costa, Oliveira Mendes, Pereira Madeira e Pires Henriques da Graça – e de outro que a correcção não implique uma modificação essencial.

«Esta modificação essencial afere-se em relação ao que estava no pensamento do tribunal decidir, e não em relação ao que ficou escrito; por isso se incluem aqui os erros materiais ou de escrita. (...). Assim, se for manifesto, em face da fundamentação, que estava no pensamento do tribunal condenar em 3 anos de prisão, mas na sentença se escreveu 3 meses de prisão, será lícito corrigir a sentença, ao abrigo do n.º 1, al. b); não será, porém, lícito corrigir para coisa que não seja dizer que a condenação é em 3 anos de prisão» (Maia Gonçalves, Código de Processo Penal Anotado, 2005, pág. 756).

O pensamento do legislador tem, assim, de resultar única e exclusivamente do próprio texto da sentença.

No caso dos autos, a evidência do ponto de facto n.º 2 e da Motivação não deixam quaisquer dúvidas que, na determinação da medida da pena - página 8 da sentença recorrida -, o tribunal queria escrever TAS de 2,30 g/l, onde escreveu 2,005 g/l.

O mesmo se diga quanto à condenação do Recorrente na pena de100 dias de multa, à taxa diária de 6,50€, mencionada no Dispositivo, quando se queria escrever 6€, como resulta claramente da determinação da taxa diária da pena de multa -  página 9 (fls. 40).

Verifica-se, assim, dois lapsos de escrita que urge corrigir, nos termos do artigo 380.º, citado, o que se determina nos seguintes termos:

Na página 8 da sentença recorrida, última linha, onde se lê (2,005g/l), deve ler-se (2,30g/l),

Na página 10 da sentença, ponto A, onde se lê 6,50€ (seis euros e cinquenta cêntimos), deve ler-se 6 € (seis euros).

Corrija em conformidade.

     

2. Identificação do alcoolímetro
Antes de mais importa notar que o Despacho n.º 4536/2020, de 19 de março, de aprovação do modelo n.º 701.51.20.2.14 – publicado no Diário da República 2.ª Série, n.º 74, de 15 de abril – referido no auto de noticia e na sentença recorrida não corresponde ao modelo de alcoolímetro Drager Alcotest 7110 MKIIIP utilizado no teste de álcool do arguido, mas sim modelo Alcohol Countermeasure Systems (ACS), modelo SAF’IR Evolution, não se aplicando, por isso, nestes autos.
De acordo com o talão de fls. 8 e com o certificado de verificação periódica de fls. 9, a pesquisa de álcool no sangue do arguido foi realizada com o alcoolímetro, de marca Drager Alcotest 7110 MKIIIP, com o número ARR-0094, a que corresponde o despacho de aprovação n.º 211.06.97.3.50.
Defende o Recorrente que este modelo de aparelho foi aprovado pelo Despacho n.º 11037/2007 de 6 de junho e não pelo Despacho n.º 19684/2009, (mencionado no auto de noticia e na sentença recorrida).
Todavia, com o devido respeito pela opinião contrária, cremos que o objecto de ambos os despachos é o mesmo modelo de alcoolímetro, de marca, DRAGER e modelo Alcooteste 7110 MKIIIP.
Não desconhecendo a polémica jurisprudencial originada pelo lapso constante no despacho de aprovação de 27 de junho de 1996 - publicado no Diário da República, III Série, III nº 223, de 25.09.96 -  sobre a identificação do modelo (se 7110 MKIII, se 7110MIIIP), ao qual foi atribuído o nº 211.006.963.30; e o despacho de aprovação complementar de 23 de dezembro de 1997, -  publicado no D.R. III Série, nº 54, de 05/03/1998 -   rectificado através da declaração de rectificação de 17/03/98 -  publicada no D.R. III Série, nº 54, de 21/05/1998 -   ao qual foi ao qual foi atribuído o n.º 211.06.97.3.50,  certo é que o aparelho  DRAGER alcooteste MKIIIP veio a ser homologado pelo Instituto Português de Qualidade (IPQ), através do Despacho nº 11.307 publicado no DR nº 109, 2ª série, de 6 de Junho de 2007 ,   agora com o n.º 211.06.07.3.06, e, novamente aprovado no  Despacho n.º 19684/2009, de 25 de junho de 2009 – publicado no Diário da República, II Série, de 27/08/2009 -   proferido pela Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ASNR).
Ou seja, ainda que se entenda que o modelo em causa é diferente do aprovado por Despacho de 27 de junho de 1996, nenhuma dúvida subiste que, desde 2009, se encontra devidamente homologado pelo IPQ e aprovado pela ASNR, apto para ser utilizado nas operações de fiscalização de condução sob a influência de álcool no sangue.
Assim resulta da evolução dos procedimentos de homologação e aprovação do alcoolímetro em utilizado nos autos.
Recapitulando o que a este propósito tem sido consignado na jurisprudência, por todos, o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 8 de setembro de 2015 proferido no processo n.º 457/14.2GTABF.E1:
«No essencial a Direcção Geral de Viação aprovou, por despacho de 06-08-1998, a utilização do aparelho de marca Drager de modelo “MK III” após a homologação levada a cabo pelo IPQ desse mesmo aparelho por despacho nº 211.06.96.3.30, Diário da República de 25 de setembro de 1996 – vide as listas de alcoolímetros aprovados pela DGV pelos despachos nº 8.036/2003 (DR, 2º série, de 28-04-2003) e 12.594/2007 (DR, 2º série, de 21-06-2007).
Posteriormente pareceu ocorrer uma homologação pelo IPQ às alterações complementares do alcoolímetro Drager, Alcooteste 7110 MK III – despacho de aprovação complementar nº 211.06.97.3.50 de 23-12-1997 – publicado no DR, 3ª série, nº. 54, de 05-03-1998, pág. 4769 (…).
Este despacho veio a ser corrigido pela rectificação publicada no DR, 3ª série, de 21-05-1998, nos seguintes termos:
 “No despacho de aprovação do modelo nº 211.06.97.3.50 publicado no DR, 3ª série, nº 54 de 05-03-1998, na 5ª linha, rectifica-se que onde se lê “Alcooteste 7110 MK III” deve ler-se “Alcooteste 7110 MK III-P”.
Ora, se havia “alterações complementares do alcoolímetro” (o MK III-P) não se vê como se pode falar de um único aparelho. São dois, sendo o segundo, o MK III-P, o alterado. Se está alterado, as alterações têm que ser homologadas e, depois, aprovadas.
Daqui se pode deduzir que existiram dois aparelhos daquela marca, ambos homologados pelo IPQ, o primeiro em 1996, o segundo por despacho de 23-12-1997 e publicado em 1998.
O primeiro, o MK III, veio a ser aprovado para uso pela DGV em 1998 - despacho de 06-08-1998.
Mas, de facto, o segundo aparelho, o aparelho de marca Drager e modelo Alcooteste 7110 MK III-P não consta como aprovado pela DGV nos despachos de 2003 e 2007.
Aliás, ambos os despachos remetem a aprovação para a homologação do IPQ efectuada pelo Despacho nº 211.06.96.3.30, ou seja, o aparelho sem as alterações complementares, isto é, o MK III.
Portanto a DGV nunca aprovou o modelo com alterações (o MK III-P).
Tal aparelho – o MK III-P – veio de novo a ser homologado pelo IPQ pelo despacho nº 11.307 (modelo nº 211.06.07.3.06), publicado no DR nº 109, 2ª série, de 6 de junho de 2007.
E viria a ser aprovado pela Autoridade de Segurança Rodoviária pelo Despacho nº 19.684/2009, de 25 junho de 2009, mas apenas publicado em 27 de agosto de 2009 (DR nº 166, 2ª Série, de 27-08-2009).».
Pelo que, não subsistem dúvidas que o equipamento alcoolímetro quantitativo da marca Drager, modelo Alcotest 7110 MK IIIP referenciado no despacho de aprovação complementar nº 211.06.97.3.50 de 23-12-1997, com a rectificação publicada no DR, 3ª série, de 21-05-1998 – onde se lê “Alcooteste 7110 MK III” deve ler-se “Alcooteste 7110 MK III-P” – é o mesmo que obteve aprovação do IPQ (Despacho 11037/2007) e ASNR (Despacho 19684/2009), agora com o n.º 211.06.07.3.06.

Pelo que, neste particular, não assiste razão ao Recorrente.

3.  Caducidade do prazo de validade do alcoolímetro
A segunda questão suscitada pelo Recorrente traduz-se em saber se, perante a invocada caducidade da aprovação do modelo de analisador quantitativo usado no exame de alcoolemia do recorrente, o resultado do exame de fls. 8 pode servir como meio de prova, devendo, por isso, julgar-se como não provado o facto nº 2.
Vejamos se assim é, tendo em consideração a posição que temos vindo a assumir sobre esta questão, entre outros, nos Acórdãos proferidos nos Recurso Nº 45/18.4GAMDA.C1 e 259/21.0GCCVL.C1.

A fiscalização da condução sob a influência de álcool, há-de decorrer conforme os ditames do artigo 153º do Código da Estrada. Ao caso, interessa o imperativo do seu nº 1, que determina, que o exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito.

No que toca à aprovação dos equipamentos, dispõe o artigo 14º, da Lei 18/2007, de 17 de maio:

«1. Nos testes quantitativos de álcool no ar expirado só podem ser utilizados analisadores que obedeçam às características fixadas em regulamentação e cuja utilização seja aprovada por despacho do presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária.

2. A aprovação a que se refere o número anterior é precedida de homologação de modelo, a efectuar pelo Instituto Português da Qualidade, nos termos do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros.

3. (…)».

A taxa de álcool no sangue (TAS) é assim determinada através de analisadores quantitativos, um aparelho de medição sujeito a um controlo metrológico que se encontra devidamente regulamentado de modo a assegurar o rigor dos resultados das medições.

O Decreto-Lei nº 291/90, de 20 de Setembro constitui um dos diplomas legais que regulamenta controlo metrológico e «tem como objectivo fundamental a completa harmonização do regime anteriormente aplicável ao controlo metrológico com o direito comunitário, assegurando à indústria nacional de instrumentos de medição a entrada nos mercados da CEE em igualdade de circunstâncias com os fabricantes dos demais Estados membros, o que pressupõe a atribuição das marcas CEE de aprovação de modelo e de primeira verificação a que as competentes entidades portuguesas poderão passar a proceder» (Preâmbulo).
O controlo metrológico dos instrumentos previsto neste diploma, artigo 1º, nº 2), engloba quatro operações: a) aprovação do modelo; b) primeira verificação; c) verificação periódica e c) verificação extraordinária.
Releva para o caso, a aprovação do modelo definida no artigo 2º, nº 1, como sendo o «o acto que atesta a conformidade de um instrumento de medição ou de um dispositivo complementar com as especificações aplicáveis à sua categoria, devendo ser requerida pelo respectivo fabricante ou importador».
A aprovação do modelo é válida por um período de 10 anos findo o qual carece de renovação (artigo 2º, nº 2, do Decreto Lei nº 291/90), sendo que os instrumentos de medição em utilização cuja aprovação de modelo não seja renovada ou tenha sido revogada podem permanecer em utilização desde que satisfaçam as operações de verificação aplicáveis (artigo 2º, nº 7, do Decreto Lei nº 291/90).
Por outro lado, sempre que, num modelo anteriormente aprovado, sejam introduzidas, por alteração ou substituição de componente ou por adjunção de dispositivo complementar, modificações que possam influenciar os resultados das medições ou as condições regulamentares de utilização, esse modelo carece de uma aprovação complementar (artigo 2º, nº 5, do Decreto Lei nº 291/90).

Em 2007, sentida a necessidade de actualizar as regras a que o respectivo controlo metrológico deve obedecer com vista a acompanhar, tecnicamente, o que vem sendo indicado nas Recomendações da Organização Internacional de Metrologia Legal, veio a ser publicada a Portaria nº 1556/2007, de 10 de Dezembro que aprovou um Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros (RCMA), instrumentos destinados a medir a concentração mássica de álcool por unidade de volume na análise do ar alveolar expirado (artigo 2º), revogando a Portaria nº 748/94, de 3 de Outubro.

Em consonância com o já estabelecido no Decreto-Lei 291/90, de 20 de setembro, também o artigo 5º, do RCMA, prevê quatro operações para o controlo metrológico dos alcoolímetros: a) aprovação de modelo; b) primeira verificação; c) Verificação periódica e d) verificação extraordinária.

Relativamente à aprovação do modelo do alcoolímetro, estabelece o artigo 6º, nº 3, que «é válida por 10 anos, salvo disposição em contrário no despacho de aprovação de modelo».

Porém, o decurso deste prazo não acarreta, salvo o devido respeito pela opinião do Recorrente, a impossibilidade de utilização do analisador por caducidade.

Desde logo, porque, como sublinha o Acórdão desta Relação proferido no processo nº 545/17.3GBCNT.C1, o esgotamento do prazo sobre a aprovação de modelo Alcotest 7110 MKIII P pelo IPQ, sem que tenha havido lugar à sua renovação, não implica que o concreto aparelho em causa deixe de dispor da qualidade metrológica exigida pela supracitada regulamentação e deixe, assim, de ser utilizável na apontada TAS»

Por outro lado, se atendermos às finalidades do Decreto-Lei nº 291/90, de 20 de Setembro, ao disposto nos seus artigos 1º, nº 3, 2º, nº 1, 3º, 4º e 5º e bem assim aos disposto nos artigos 5º a 7º, da Portaria nº 1556/2007, «o que está em causa, relativamente à aprovação do modelo, é a relação da administração nacional (enquanto Estado membro) com os fabricantes ou importadores deste tipo de instrumentos e não, exclusivamente, a fiabilidade do seu uso, a qual é assegurada mediante a sujeição dos mesmos à primeira verificação e às posteriores, sejam periódicas ou extraordinárias (…)
Daí que se possa extrair, da conjugação das normas dos referidos nºs 1, 2 e 7 daquele artº 2º, as seguintes conclusões:
- a aprovação do modelo permite que, no prazo da sua duração, o fabricante introduza no mercado respectivo o aparelho aprovado, desde que mantenha as suas características técnicas;
- se no decurso desse prazo, «introduzir alteração ou substituição de componente ou por adjunção de dispositivo complementar, modificações que possam influenciar os resultados das medições ou as condições regulamentares de utilização» nos novos aparelhos, deve sujeitar o modelo a nova aprovação complementar (artº 2º, 5);
- porque as especificações atinentes ao aparelho aprovado não podem ser alteradas sem prévia aprovação complementar, e caso esta não seja obtida, a aprovação é revogada se ocorrer desconformidade com o modelo aprovado (nº 6, a)) ou se revelar defeito que torne os aparelhos de medição impróprios para o fim a que se destinam (b)).
Ocorrendo renovação da aprovação inicial do modelo, pode o fabricante ou importador introduzir no mercado respectivo aparelhos do mesmo modelo e com as mesmas especificações pelo novo prazo de validade dessa renovação.
Não ocorrendo essa renovação, ao fabricante ou importador do modelo fica vedada a introdução de novos aparelhos no mercado, sem prejuízo de os aparelhos referentes ao modelo aprovado – e anteriormente introduzidos no mercado - poderem permanecer em utilização «desde que satisfaçam as operações de verificação aplicáveis» (artº 2º, 7); e essas operações de verificação serão, como está bom de ver, as que resultam das verificações periódicas (artº 4º) ou extraordinária (artº 5º).

Tal entendimento é reforçado pela norma do artigo 10º da Portaria nº 1556/07, de 19/12, do qual resulta que o exame de pesquisa de álcool no sangue será válido, desde que o “alcoolímetro” utilizado se encontre em bom estado de conservação e não tenha excedido os erros máximos admissíveis na verificação periódica (anual)» (sublinhado nosso) - Acórdão desta Relação proferido nos processos nº 320/17.5 GBPMS.C1, de 24 de abril de 2018).
Em suma:
O controlo metrológico dos alcoolímetros compete ao Instituto Português da Qualidade, I. P. - IPQ e compreende as seguintes operações: a) Aprovação de modelo; b) Primeira verificação; c) Verificação periódica; e d) verificação extraordinária.
A aprovação do modelo é válida por 10 anos, salvo disposição em contrário.
O modelo, cuja aprovação não foi renovada, não deixa de ficar apto para proceder a medições técnicas de qualidade, desde que satisfaça as operações de verificação aplicável (artigo 2.º, n.º 7 e artigo 3.º do DL nº 291/90).
Do precede, se conclui que, muito embora já tenha decorrido o prazo de 10 anos sobre a publicação do Despacho de Aprovação do analisador, modelo Drager alcooteste 7110MKIIP, com o número ARAC-0094 -  através do despacho 19684/2009, de 25 de junho, ainda assim se encontra certificado, por via da verificação periódica de 13 de janeiro de 2021.

4. Caducidade do prazo de validade da verificação periódica
Advoga, ainda, o recorrente que verificação periódica realizada em 13 de janeiro de 2021 caducou em 13 de 2022, não sendo, por isso, válida à data da fiscalização em 12 de abril de 2022. 
Também aqui sem razão.
Com efeito, o artigo 7.º, n.º 2 do referido RGMA (aprovado pela Portaria n.º 1556/2007), ao estatuir que verificação periódica é anual, salvo indicação em contrário no despacho de aprovação de modelo, apenas regula o momento temporal em que se devem realizar as verificações metrológicas periódicas e a validade dos alcoolímetros, o que não sucede com a verificação extraordinária prevista no mesmo artigo 7.º, n.º 3, em que a verificação extraordinária compreende os ensaios da verificação periódica e tem a mesma validade.

Assim, e de acordo com o comando legal ínsito no artigo 4.º, n.º 5 do citado Decreto-Lei n.º 291/90, de 20 de setembro, a verificação periódica dos alcoolímetros é válida até 31 de dezembro do ano seguinte ao da sua realização [cf. Acórdãos da Relação do Porto de 6 de abril de 2011, 25 de maio de 2011 e 8 de junho de 2011, citados, no Acórdão da mesma Relação de 7 de novembro de 2011 (Relatora Elsa Paixão)].

Ou seja, o que a lei estabelece no art.º 7.º, n.º 3 da Portaria n.º 1556/2007, de 10 de dezembro, é que os alcoolímetros terão que ser sujeitos a verificação periódica uma vez em cada ano, sendo que nos termos do art.º 4.º, n.º 5 do Decreto-Lei n.º 291/90, de 20 de setembro, essa verificação periódica é válida até 31 de dezembro do ano seguinte ao da sua realização.

Salienta-se no Acórdão do Tribunal da Relação Coimbra de 6 de fevereiro de 2019 (processo N.º 72/18.1GTCBR.C1):

«A expressão “anual” tem o significado comum de aquilo que se faz, celebra, acontece ou realiza em cada ano ou num período de cada ano ou ainda todos os anos.

Ora, o termo anual usado no artigo 7.º, n.º 2 da Portaria n.º 1556/2007 não constitui Regulamento específico em contrário ao que estatui o art.4.º, n.º 5, do DL n.º 291/90, ou seja, cabe no âmbito desta última norma.

E de acordo com o disposto no art.4.º, n.º 5 do referido DL n.º 291/90, a verificação periódica é válida até 31 de dezembro do ano seguinte ao da sua realização, salvo regulamentação específica em contrário.

Ora, da letra da lei não resulta que a verificação periódica tenha de ser feita com intervalos rigorosos de 12 meses entre si, como o arguido acaba por invocar, mas sim que tal verificação tem de ser feita anualmente».
Pelo que, em 12 de abril de 2022, o alcoolímetro encontrava-se homologado, aprovado e com verificação periódica válida, tendo o exame de detecção no sangue sido realizado de acordo com as formalidades legais exigidas, cumprindo todas as exigências legais de certificação, sendo válida a leitura feita pelo mesmo, podendo, pois, ser utilizada como meio de prova.
Improcede, assim, esta pretensão do Recorrente.

5. Erro máximo admissível

Defende o recorrente que o alcoolímetro errou na determinação do erro máximo admissível, ao deduzir 8%, dos 30% previstos no quadro anexo ao artigo 8.º, da Portaria 1556/2007, de 10 de dezembro (RCMA)

Vejamos:

A concentração mássica de álcool (relevando apenas o álcool etanol) no sangue por unidade de volume na análise do ar alveolar expirado é medido pelos alcoolímetros, nos termos do artigo 2.º do RCMA.

A indicação dos alcoolímetros deve ser expressa em miligrama por litro - mg/l, de teor de álcool no ar expirado – TAE – podendo apresentar uma indicação suplementar em grama por litro - g/l, de teor de álcool no sangue – TAS - desde que evidenciem o respectivo factor de conversão (artigo 3.º, do RCMA).

No que respeita à conversão dos valores do teor de álcool no ar expirado (TAE) em teor de álcool no sangue (TAS), dita o artigo 81.º, n.º 4, do Código da Estrada, que assenta no princípio de que 1 mg de álcool por litro de ar expirado é equivalente a 2,3 g de álcool por litro de sangue.

Ou seja, 1mg /l de TAE é igual a 2,3 g /l TAS.

Os erros máximos admissíveis - EMA, variáveis em função do teor de álcool no ar expirado - TAE, são os constantes do quadro que figura no quadro anexo ao presente diploma e que dele faz parte integrante (artigo 8.º do diploma citado), a saber:

«Os erros máximos admissíveis (EMA) são limites definidos convencionalmente em função não só das características dos instrumentos, como da finalidade para que são usados, ou seja, tais valores limite, para mais ou para menos, não representam valores reais de erro, numa qualquer medição concreta, mas um intervalo dentro do qual, com toda a certeza (uma vez respeitados os procedimentos de medição) o valor da indicação se encontra.» (António Cruz, Maria do Céu Ferreira e Andreia Furtado, in A alcoolemia e o controlo metrológico dos alcoolímetros, acessível em https://www.yumpu.com/pt/document/view/14730196/ a-alcoolemia-eo-controlo-metrologico-dos-alcoolimetros-ipq).

A margem de erro dos resultados dos aparelhos, em função de teor de álcool no sangue, admitida na primeira verificação, é inferior à admitida na verificação periódica, aplicando-se, neste caso, 0,032mg/l; 8% e 30%, conforme TAE inferior a 0,400; igual a 400 até 2,000 e igual ou superior a 2,000, respectivamente.

Ou seja, se o alcoolímetro registar como registou no caso (2,50g/l), valor correspondente ao teor de álcool no sangue (TAS), é necessário converte-lo TAE, nos termos do artigo 81.º, nº 4, do Código da Estrada, obtendo-se o valor de 1,087 mg/l, do resultado do cálculo de divisão 2,50: 2,3.

O valor da TAE de 1,087 mg/l situa-se no intervalo a que corresponde um EMA de 8% -  não 30%, como defende o recorrente – valor esse que deverá ser descontado no teor de álcool no sangue registado em 2,50g/l, apurando-se assim, o valor mínimo de TAS de 2,30g/l [2,50 – (2,50 x 0,08)], valor esse tido em consideração pelo Tribunal recorrido, no ponto de facto provado sob o nº 2.

E, assim, soçobra a pretensão do Recorrente.

6.Medida da pena
(…).

7. O recorrente suportará as custas processuais, nos termos do artigo 513º, nº 1, do Código de Processo Penal e artigo 8º, nº 9, do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III anexa.

V. DECISÃO

Nestes termos e pelos fundamentos expostos acordam os juízes do Tribunal da Relação de Coimbra em julgar não provido o Recurso interposto pelo arguido AA.

Custas pelo Recorrente, com taxa de justiça que se fixa em 4 UCS.

Coimbra, 23 de novembro de 2022

Alcina da Costa Ribeiro (Relatora)

Cristina Branco (Adjunta)

Maria Alexandra Guiné (Adjunta)