Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
502/19.5T9CBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JOÃO NOVAIS
Descritores: DETENÇÃO DE ARMA PROIBIDA
ARMA BRANCA
LÂMINA METÁLICA AFIADA NA PONTA
Data do Acordão: 12/16/2020
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COIMBRA (JUÍZO LOCAL CRIMINAL DE COIMBRA - J1)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS. 2.º, N.º 1, AL. M), E 86.º, N.º 1, AL. D), DA LEI N.º 5/2006, DE 23-02
Sumário: Perante a definição de «arma branca» dada pelo art. 2.º, n.º 1, al. m) do Regime Jurídico das Armas e suas Munições (Lei 5/2006, de 23-12), não integra a previsão do art. 86.º, n.º 1, al. d), do dito Regime a detenção de uma «lâmina metálica afiada na ponta, com 7 (sete) cm de comprimento».
Decisão Texto Integral:      





I -  Relatório

1.1.   F. interpôs o presente recurso da sentença proferida pelo Juízo Local Criminal de Coimbra - Juiz 1 do Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra, que o condenou pela prática de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo art.º 86.º, n.º 1, al. d), da Lei n.º 5/2006, de 23/02 (doravante, RJAM), por referência ao artigo 3.º, n.º 2, al. f), da mesma lei, na pena de quatro meses de prisão efectiva.

1.2. Apresentou as seguintes conclusões:

i. o tribunal a quo condenou o arguido pela prática de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo art.º 86.º, n.º 1, al. d), da lei n.º 5/2006, de 23/02 (doravante, RJAM), por referência ao artigo 3.º, n.º 2, al. f), da mesma lei, na pena de quatro meses de prisão, mais decidindo não suspender a execução de tal pena.

ii. para o efeito deu como provado que o arguido o tinha na sua posse, a 13/09/2018, no interior da sua cela «uma lâmina metálica afiada na ponta, com 7 cm de comprimento» a qual, no juízo proferido, constituiria arma branca e que o «arguido não justificou aposse do referido objecto».

iii. o conceito de arma branca é densificado em art.º 2.º, n.º 1, al. m), do RJAM, no mesmo não havendo hipótese normativa que permita a subsunção do objecto dos autos ao conceito de arma branca e que, portanto, o permita classificar como arma da classe a nos termos do disposto em art.º 3.º, n.º 2, al. f) do RJAM e, consequentemente, penalizar a respectiva posse por força do estatuído em art. 86º, n.º 1, d) do RJAM – normas que a decisão recorrida viola ao proceder à supra aludida incorrecta qualificação jurídica dos factos.

iv. ferindo, assim, ao proceder a tal qualificação dos factos, a sentença de ilegalidade e inconstitucionalidade por violação dos princípios da tipicidade e legalidade ínsitos em art.º 29.º, n.º 1, da CRP e artº 1.º, n.º 1, do CP, decisão que importa revogar e substituir por outra que absolva o arguido da acusação que lhe foi movida.

v. o tribunal a quo decidiu-se pela não suspensão da execução da pena de prisão de quatro meses em que condenou o arguido fundamentando a impossibilidade de formulação do juízo de prognose favorável necessário para o efeito, previsto em art..º 50.º, n.º 1, do CP- norma que resulta, pelo que infra se conclui, violada –, por força do rol de condenações que o arguido sofreu entre 08/09/2007 e 04/10/2014, ou seja, entre os seus 17 e 24, sem que do mesmo resulte qualquer condenação anterior pela prática do mesmo tipo de crime.

vi. desconsiderou o tribunal a quo – sobre a mesma não se pronunciando ou produzindo qualquer análise crítica – matéria por si dada como provada e que é pertinente para a formulação de tal juízo, designadamente:

«9. o arguido encontra-se recluído no E.P. de (...) desde 23/10/2014.»

«10. desde então, não há notícia de qualquer comportamento agressivo ou ofensivo por parte do arguido no interior do EP, seja para com os demais reclusos, seja com os guardas prisionais ou quaisquer outros trabalhadores daquele EP.»

«11. o arguido frequentou desde 31 de outubro de 2017, no E.P. onde se encontra recluso, um curso de formação profissional, electricista de instalações, EFB 3, promovido pelo CPJ, com bom desempenho e assiduidade.»

«12. encontrando-se actualmente a frequentar um outro curso que lhe irá dar equivalência ao 12º ano de escolaridade.»

«13. no E.P. onde se encontra recluso, o arguido recebe todos os fins de semana visitas da sua companheira, de seus pais, e de um filho menor, com 8 anos de idade.»

vii. a qual era essencial para o juízo a produzir, atendendo a que demonstra «no momento da elaboração da sentença, à personalidade do agente (designadamente ao seu carácter e inteligência), às condições da sua vida (inserção social, profissional e familiar, por exemplo), à sua conduta anterior e posterior ao crime (ausência ou não de antecedentes criminais e, no caso de os ter já, se são ou não da mesma natureza e tipo de penas aplicadas).

viii. ademais, a ausência de ponderação e ajuizamento – a fim de se lograr produzir uma correcta decisão – é cominada com nulidade nos termos do disposto em art.º 379.º, n.º 1, al. c) do CPP, o que se argúi para os devidos e legais efeitos.

Terminou pedindo que a decisão recorrida seja revogada e substituída por outra que:

a) absolva o arguido da prática do crime de que vem acusado atenta a inexistência de tipo legal que permita qualificar os factos apurados como crime, em concreto, o ínsito nas normas ao abrigo das quais é condenado ou, à cautela e sem conceder, ainda que assim não se entendesse,

b) declare nula, nos termos do disposto em art.º 379.º, n.º 1, al. c), do C.P.P.   a decisão de não suspensão da execução da pena de prisão em que o tribunal condena o arguido.

 

1.3. Notificado o Ministério Público do recurso interposto, veio responder   concluindo da seguinte forma:

1º- A arma em causa é proibida.

2º- Foi justa e adequadamente condenado o arguido pela prática do crime constante da douta acusação pública, não sendo de suspender a execução da pena de prisão aplicada.

1.4. No parecer a que alude o art. 416º, n.º 1, do Código de Processo Penal, o Exm.º Procurador Geral Adjunto pronunciou-se no sentido de concordar com o Ministério Público junto da 1ª instância, pugnando pela confirmação da douta sentença e o indeferimento do recurso,  nada tendo a acrescentar face à correcta subsunção dos factos ao direito efectuada na sentença em apreço e à análise critica da prova e fundamentação constante da mesma para a não suspensão da pena aplicada por, face aos pesadíssimos antecedentes criminais do arguido.


***

II - Fundamentação de Facto

 (…)

 

I. RELATÓRIO

 (…)  o Ministério Público acusa:

F. (…), actualmente detido no Estabelecimento Prisional de (...) , (…);

Imputando-lhe a prática em autoria material, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo artº 86º, nº1, al. d) da Lei 05/2006, de 23 de Fevereiro (por referência à alínea g) do nº 2 do artº3º do mesmo diploma legal).

(…).

III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

FACTOS PROVADOS

Da discussão e instrução da causa resultaram provados os seguintes factos:

1. No dia 13 de Setembro de 2018, na sequência de rusga inopinada leva a cabo à cela habitada pelo arguido, sita na Ala E do Estabelecimento Prisional de (...) , (...), o arguido detinha no interior da sua cela uma lâmina metálica afiada na ponta, com 7 cm de comprimento.

2. Tal lâmina metálica, foi elaborada pelo arguido, detendo-a o mesmo na sua cela num buraco por trás do suporte da televisão da sua cela.

3. O arguido não justificou a posse do referido objecto.

4. O arguido bem sabia que o supra-referido objecto - lâmina metálica afiada na ponta, com 7 cm de comprimento - que detinha na sua cela, é um instrumento com aptidão para ser usado como meio de agressão, não desconhecendo que a mera detenção de instrumento sem aplicação definida susceptível de ser usado como arma de agressão lhe era vedada por lei, não se coibindo de o guardar no interior da sua cela.

5. O arguido bem sabia que não lhe era permitido deter o objecto supra identificado.

6. O arguido agiu livre, deliberada e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei penal. 

7. No Estabelecimento Prisional de (...) , onde o arguido se encontra recluído, é permitido aos reclusos a detenção e consumo de géneros alimentícios, designadamente, fruta, legumes, conservas e outros nas suas celas, sendo que tais géneros alimentícios podem, inclusivamente, ser adquiridos no bar do próprio EP, não providenciando o EP pelo fornecimento de géneros descascados ou cortados.

8. No EP onde se encontra recluído, ao arguido, como a outros presos, são fornecidos talheres de plástico, compostos designadamente por faca e garfo, que o mesmo guarda na sua cela, e que são substituídos quando se estragam.

(…(

FACTOS NÃO PROVADOS

Não se provaram outros factos com relevo para a decisão da causa e, nomeadamente, que:

1. O arguido detinha o objecto supra identificado em 1. dos factos provados, com o propósito de o utilizar como arma de agressão, e destinando-o a usá-lo como arma de agressão.

2. O arguido detinha tal objecto, destinando-o, exclusivamente, a descascar fruta e outros legumes, não lhe dando qualquer outro uso.

3. O EP de (...) não fornece aos reclusos quaisquer utensílios para descascar ou cortar fruta/legumes, apenas garfos e colheres de plástico. 

4. Razão pela qual, o arguido detinha tal instrumento apenas para esse fim exclusivo, de descascar fruta e outros legumes.

(…)

IV. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Dispõe o artigo 86º, nº 1, al. d) da Lei nº 5/2006, que é punido com pena de prisão até 4 anos ou com pena de multa até 480 dias o agente que, sem se encontrar autorizado, fora das condições legais ou em contrário das prescrições da autoridade competente, “detiver,  transportar, exportar, importar, transferir, guardar, reparar, desativar, comprar, adquirir a qualquer título ou por qualquer meio ou obtiver por fabrico, transformação, importação ou transferência, usar ou trouxer consigo” (…) “outras armas brancas ou engenhos ou instrumentos sem aplicação definida que possam ser usados como arma de agressão e o seu portador não justifique a sua posse (…) quaisquer engenhos ou instrumentos construídos exclusivamente com o fim de serem utilizados como arma de agressão (…)”.

No artigo 3º, do mesmo diploma legal, o legislador instituiu, “de acordo com o grau de perigosidade, o fim a que se destinam e a sua utilização”, uma classificação “das armas, munições e outros acessórios” nas classes A, B, B1, C, D, E, F e G.

Assim, e para além de outras que não interessam para o caso dos autos, pertencem à classe A, as seguintes armas: as armas brancas sem afectação ao exercício de quaisquer práticas venatórias, comerciais, agrícolas, industriais, florestais, domésticas ou desportivas, ou que pelo seu valor histórico ou artístico não sejam objecto de colecção (nº 2, al. f), quaisquer engenhos ou instrumentos construídos exclusivamente com o fim de serem utilizados como arma de agressão (al. g).

Como se sumaria no acórdão do Tribunal da Relação de Évora, em 04 de Março de 2008, in www.dgsi.pt.:

“2 - Para que a detenção ou porte de outras armas brancas a que alude a al. d) do n.º 1 do art. 86.° constitua crime, impõe o legislador que, cumulativamente, se verifiquem três requisitos:

a) Ausência de aplicação definida; b) Capacidade para o uso como arma de agressão; c) Falta de justificação para a posse.

3 - A expressão sem aplicação definida, usada na al. d) do n.º 1 do citado art. 86.°, não se restringe (…), aos instrumentos, abrangendo, por conseguinte, outras armas brancas (ali não elencadas) e os engenhos. Com efeito, o legislador inclui na classe A as armas brancas sem afectação ao exercício de quaisquer práticas venatórias, comerciais, agrícolas, industriais, florestais, domésticas ou desportivas (ou seja, as armas sem aplicação definida). E inclui também na classe A quaisquer engenhos ou instrumentos construídos exclusivamente com o fim de serem utilizados como arma de agressão - cf. al. f) e g) do nº2 do art.3º. São essas as outras armas brancas, engenhos ou instrumentos cuja aquisição, detenção, transporte ou uso se quis proibir (…)”.

No caso sub iudice, o objecto detido pelo arguido no interior da sua cela, era uma lâmina metálica, afiada na ponta, com 7 cm de comprimento.

Dadas as características do objecto em questão, e lugar em que o mesmo era detido pelo arguido, não se vê em que actividades domésticas, venatórias, comerciais, agrícolas, industriais, florestais, ou desportivas, poderia ser utilizado.

Assim e uma vez que não era destinado a qualquer actividade doméstica, venatória, comercial, agrícola, industrial, florestal, ou desportiva, e pela sua constituição e dimensão pode ser usado como arma de agressão, conclui-se que o objecto em questão não tem aplicação definida, consubstanciando uma arma branca da classe A (cfr. art. 2º, nº 1, al. f), da Lei nº 5/2006).

(…)

V. DECISÃO:

Pelo exposto, e decidindo:

1. Condeno o arguido F., pela prática em autoria material e na forma consumada, de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo artigo 86.º, n.º 1, alínea d), da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, por referência ao artigo 3.º, n.º 2, alínea f), da mesma Lei, na pena de quatro meses de prisão.

(…)

(fim da transcrição parcial da sentença recorrida)


*

3. Apreciando e decidindo

a) O objecto do recurso encontra-se limitado pelas conclusões apresentadas pelo recorrente, sem prejuízo da necessidade de conhecer oficiosamente a eventual ocorrência de qualquer um dos vícios referidos no artigo 410º do Código de Processo Penal (jurisprudência fixada pelo Acórdão do STJ n.º 7/95, publicado no DR, I Série.

b) As questões a apreciar nestes autos são essencialmente duas:

i) Saber se o tribunal a quo incorreu numa incorrecta qualificação jurídica dos factos, designadamente, ao subsumi-los ao disposto nos arts 3º, n.º 2, al. f), e ao ter por verificado o crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86º, n.º 1, d) do RJAM, o que apenas foi possível por força da errónea interpretação e aplicação do disposto em art.º 2.º, n.º 1, al. m), do RJAM em conjugação com as demais supra aludidas normas que, assim, resultam violadas pela decisão.

ii) Saber se a pena de prisão aplicada ao arguido deveria ser suspensa na sua execução.

c) Recorde-se então que o tribunal a quo condenou o arguido pela prática de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo art.º 86.º, n.º 1, al. d), da Lei n.º 5/2006, de 23/02 (Regime Jurídico de Armas e Munições, doravante, RJAM), por referência ao artigo 3.º, n.º 2, al. f), da mesma lei, na pena de quatro meses de prisão, por ter concluído “que o objecto em questão não tem aplicação definida, consubstanciando uma arma branca da classe A (cfr. art. 2º, nº 1, al. f), da Lei nº 5/2006)”.

O arguido vinha acusado da prática do mesmo crime previsto no referido 86º, mas por referência à al. g) do n.º 2 do art 3.º, da mesma lei, e não da al. f) do mesmo artigo 3º n.º 2.

A al. g) do n.º 2 do art 3º da mesma Lei, considera que “São armas, munições e acessórios da classe A (…) Quaisquer engenhos ou instrumentos construídos exclusivamente com o fim de serem utilizados como arma de agressão.

O tribunal a quo não terá considerado a qualificação jurídica do objecto apreendido como arma de classe A, à luz da al. g) do n.º 2 do art 3º como constava na acusação, por não ter resultado provado o facto constante da acusação no qual se afirmava que o “arguido detinha o objecto supra identificado em 1. dos factos provados, com o propósito de o utilizar como arma de agressão, e destinando-o a usá-lo como arma de agressão”; ou seja, tendo ficado provado que a lâmina metálica apreendida tinha sido elaborada pelo arguido, não ficou provado que, nessa mesma elaboração, o arguido tenha tido como fito que essa lâmina fosse utilizada como arma de agressão, como exigido pela citada al. g) do n.º 2 do art 3º da RJAM.

Nessa sequência, no início da sessão agendada para a leitura da sentença (21/10/2019), o tribunal a quo comunicou e procedeu a alteração não substancial dos factos, considerando que estava em causa um crime de detenção de arma proibida já não por referência ao artigo 3.º, n.º 2, al. g), do RJAM) mas antes por referência ao artigo 3.º, n.º 2, al. f), do RJAM.

d) O tribunal recorrido seguiu assim diferente caminho da acusação, e na decisão sob recurso, após citar o artigo 86º, nº 1, al. d) da Lei nº 5/2006,  faz referência ao artigo 3º, do mesmo diploma legal,  concluindo face a esse preceito que pertencem à classe A,  “as armas brancas sem afectação ao exercício de quaisquer práticas venatórias, comerciais, agrícolas, industriais, florestais, domésticas ou desportivas, ou que pelo seu valor histórico ou artístico não sejam objecto de colecção (nº 2, al. f).

Após, o tribunal a quo descrevendo o objecto detido pelo arguido  como uma lâmina metálica, afiada na ponta, com 7 cm de comprimento, concluiu que dadas as características do objecto em questão, e lugar em que o mesmo era detido pelo arguido, (…) não se vê em que actividades domésticas, venatórias, comerciais, agrícolas, industriais, florestais, ou desportivas, poderia ser utilizado, e por isso que  o objecto em questão não tinha aplicação definida, consubstanciando uma arma branca da classe A (cfr. art. 2º, nº 1, al. f), da Lei nº 5/2006); Após constatar que o arguido não tinha justificado  a sua posse,  condenou-o então pela prática de um crime de detenção de arma proibida previsto “no art  86.º, n.º 1, alínea d), da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, por referência ao artigo 3.º, n.º 2, alínea f), da mesma Lei”.

e) Considerou assim, a decisão recorrida, que a arma apreendida ao arguido era uma arma de classe A, por se tratar de uma arma branca.

No entanto, não parece que tal objecto possa ser classificado como arma branca.

Isto porque, o art 2º, n.º 1, al. m), 1ª parte do RJAM, qualifica como «Arma branca» todo o objecto ou instrumento portátil dotado de uma lâmina ou outra superfície cortante, perfurante ou corto-contundente, de comprimento superior a 10 cm.

Ainda que a mesma norma alargue o conceito de arma branca a outros objectos com lâmina inferior a 10 cm, no caso, o objecto encontrado na posse do arguido não era uma faca borboleta, de abertura automática ou de ponta e mola de arremesso, nem ainda “estrelas de lançar ou equiparadas, os cardsharp ou cartões com lâmina dissimulada, os estiletes e todos os objetos destinados a lançar lâminas, flechas ou virotões” – cfr. 2ª parte do mesmo art 2º, n.º 1, al. m) do RJAM.

f) Em suma, a acusação pretendia que o arguido detinha uma arma de classe A; todavia, a matéria de facto provada não permitiu integrar a hipótese legal invocada pela acusação (al. al. g) do n.º 2 do art 3º da Lei nº 5/2006), e as concretas características do objecto apreendido ao arguido também não permitem a sua qualificação arma branca como se escreveu na decisão sob recurso (al. al. f) do n.º 2 do art 3º, atento o teor do art 2º, nº 1, al. m da mesma lei).

O não preenchimento do tipo, determina a absolvição do recorrente.


*

III – Dispositivo

Face ao exposto, acordam os juízes da secção criminal deste Tribunal da Relação de Coimbra, em julgar totalmente procedente o recurso interposto pelo arguido, absolvendo-o da prática de um crime de detenção e arma proibida previsto no art 86.º, n.º 1, alínea d), da Lei n.º 5/2006, de 23-2, por referência ao artigo 3.º, n.º 2, alínea f), da mesma Lei.

Sem custas.

Coimbra, 16 de Dezembro de 2020

João Novais (relator)

                         

Elisa Sales (adjunta)