Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
127/10.0GASAT.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE FRANÇA
Descritores: NULIDADE INSANÁVEL
AUSÊNCIA DO ARGUIDO A ACTO PROCESSUAL
Data do Acordão: 01/20/2016
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: VISEU (SECÇÃO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA (J1) DA INSTÂNCIA LOCAL DE SÁTÃO)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ART. 119.º, AL. C), DO CPP
Sumário: A nulidade prevista na alínea c) do artigo 119.º do CPP só ocorre quando ao arguido não é concedida possibilidade de estar presente a acto em que a lei exige a sua comparência, e já não quando o próprio arguido a ele não comparece de forma voluntária ou quando, de forma pré-determinada, se coloca em posição de não ser possível transmitir-lhe a respectiva convocatória.
Decisão Texto Integral:

ACORDAM NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA

            Nos autos de processo comum (singular) que, sob o nº 127/10.0GASAT, correram termos pela Secção de Competência Genérica (J1) da Instância Local de Sátão, Comarca de Viseu, o arguido A... foi submetido a julgamento (com ele foram também julgados outros dois arguidos), sendo, a final, condenado, por sentença datada de 20/12/2012, pela prática de um crime de detenção de arma proibida, p.p. pelo artº 86º, 1, c), da Lei nº 5/06, de 23/, numa pena de 1 ano e 2 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo, sob regime de prova.

            Tendo sido notificado para julgamento, o arguido havia requerido, a fls. 374, que, ao abrigo do disposto no artº 334º, 2, do CPP, fosse dispensada a sua presença em julgamento, dada a circunstância de se encontrar a residir no estrangeiro.

            Tal requerimento foi deferido, por despacho proferido na acta de julgamento, v.g. a fls. 380.

            A encerrar o julgamento, foi lida a sentença, em sessão em que o seu Ex.mo Advogado se fez representar mediante a apresentação de substabelecimento.

Através de requerimento entrado a 10/1/2013, o arguido, na pessoa seu advogado, requereu que lhe fosse enviada cópia da sentença (fls. 407), o que foi satisfeito a fls. 408.

Por ofício da PSP, datado de 21/6/2013 (fls. 497) e da DGRS, datado de 18/7/2013, foi informado o tribunal de que o arguido se encontraria na Alemanha.

Face a tal informação, o MP (fls. 527) promoveu se averiguasse na base de dados qual o paradeiro do arguido.

Efectuada tal pesquisa, viria a apurar-se que o Cartão de Cidadão do recorrente fora emitido a 18/1/2012, dele constando uma morada em Vila Nova de Gaia (fls. 539), que da sua carta de condução constava uma outra morada, mas também em VNGaia (fls. 540) e que não foi encontrado qualquer registo, atinente ao recorrente, na base de dados da Segurança Social (fls. 541).

Por requerimento entrado em 2/10/2013, o ilustre advogado do recorrente veio renunciar ao mandato (fls. 549).

Por ofício da PSP, de 31/3/2014, é informado que o arguido não reside em S. Pedro da Afurada e que a avó do mesmo, ali residente, informou que ele se encontrava na Alemanha havia cerca de 3 anos (fls. 614).

Por despacho datado de 22/4/2014 (fls. 619) foi designado o dia 5 de Maio de 2014 para audição do ora recorrente, na presença da técnica encarregue de elaborar o plano de reinserção social, sendo ordenada a notificação daquele na morada constante do TIR. Também o Ex.mo advogado foi notificado, como pode ver-se a fls. 623.

Na data designada verificou-se que nem o arguido nem o seu advogado se encontravam presentes, tendo intervenção no acto, como defensor, o advogado de escala (fls. 639); nesse acto a referida técnica prestou declarações, afirmando que os contactados os familiares do arguido foi informada de que ele se encontraria na Alemanha, sem contudo fornecerem a sua morada ou contacto, e que ele nunca entrou em contacto com a DGRSP.

A fls. 643 foi junto aos autos CRC actualizado do arguido.

Através da promoção de fls. 658 e seg.s, o MP promoveu que se revogasse a suspensão da execução da prisão.

Despachou a M.ma Juiza, concedendo ao arguido (sendo também notificado o seu ilustre advogado) um prazo de 10 dias para se pronunciar (fls. 662).

Face ao silêncio do arguido foi proferido o despacho de fls. 670 e seg.s, datado de 19/6/2014, o qual é do seguinte teor:

«Fls. 642:

Atento o disposto na alínea q), ponto 6, da portaria n.º 175/2011, de 28 de Abril, fixo em 0,5 UC o montante a pagar à D.G.R.S.P., a adiantar pelo Instituto de Gestão Financeira e as Infra-Estruturas da Justiça, I.P., a entrar a final em regra de custas (artigo 16.º, n.º 1 alínea a), i) do Regulamento das Custas Processuais).

*-*

O arguido A... foi condenado, por sentença transitada em julgado em 6 de Fevereiro de 2013, pela prática de um crime de detenção de arma proibida, na pena de um ano e dois meses de prisão suspensa na sua execução por igual período, sujeita a regime de prova – cfr. fls. 385 a 404.

Uma vez que o arguido se ausentou para o estrangeiro, sem comunicar tal situação ao Tribunal, e não tendo sido possível à D.G.R.S.P. proceder à elaboração do plano de reinserção social, foi designada data para a sua audição, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 495.º do Código de Processo Penal.

O arguido não compareceu, nem apresentou qualquer justificação para a sua ausência.

Foram tomadas declarações à Técnica da D.G.R.S.P, as quais se encontram documentadas na acta de fls. 638 a 640.

Seguidamente, o arguido foi notificado do teor da douta promoção do Digno Magistrado do Ministério Público para querendo, e no prazo de dez dias, dizer o que tiver por conveniente, mas nada disse.

O Digno Magistrado do Ministério Público propugnou pela revogação da suspensão da pena de prisão aplicada ao arguido nos presentes autos.

Cumpre decidir.

*

Lê-se no artigo 56.º, n.º 1 do Código Penal que a suspensão da execução da pena de prisão é revogada sempre que, no seu decurso, o condenado:

a) Infringir grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano de reinserção social; ou

b) Cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas.

Deste modo, o actual regime exige os seguintes requisitos para a revogação da suspensão: a violação grosseira ou repetida de deveres ou regras de conduta impostas no plano de reinserção social, a prática de um crime durante o período da suspensão da pena, naturalmente reconhecida por sentença transitada em julgado; e, em ambos os casos, que se constate que as finalidades que estavam na base da suspensão não foram atingidas.

No caso em apreço, analisando o certificado de registo criminal consta-se que o arguido apenas sofreu a condenação dos presentes autos.

Sucede, porém que, apesar de o arguido ter tomado conhecimento do teor da sentença proferida e ter sido convocado para comparecer nos dias 22.03.2013 e 01.04.2013 nos Serviços da D.G.R.S.P., a fim de ser elaborado o plano de reinserção social, o mesmo não compareceu, nem apresentou qualquer justificação – cfr. fls. 456.

De facto, só por intermédio de terceiros veio o Tribunal, em 18.06.2013, a saber que o arguido, alegadamente, se encontra a laborar na Alemanha e não em França, como oportunamente tinha informado os autos – cfr. fls. 374 e 486.

Por várias vezes a D.G.R.S.P. tentou contactar o arguido, tendo sido sempre informada pelos seus familiares que o mesmo se encontrava a residir em morada incerta na Alemanha, não estando prevista nenhuma data para o seu regresso a território nacional – cfr. fls. 500 e 614.

Realce-se, ainda que, nunca o arguido estabeleceu qualquer contacto com a D.G.R.S.P.

Em suma, é, assim, inegável que durante o período da suspensão da execução da pena de prisão o arguido emigrou e não comunicou tal facto nem ao Tribunal, nem à D.G.R.S.P., quando sabia que a suspensão estava subordinada a regime de prova.

Partilhámos, pois, quanto a este último aspecto da jurisprudência firmada pelo Tribunal da Relação de Coimbra, em acórdão datado de 07.11.2012, e disponível no sítio da internet www.dgsi.pt, quando refere que “condenado um arguido a pena de prisão cuja execução lhe foi suspensa, sujeita a regime de prova, assente num plano de readaptação social de apoio e vigilância pelo organismo competente de assistência, não pode o mesmo ser autorizado a deslocar-se para o estrangeiro com fins laborais, uma vez que com a sua ausência deixaria de haver qualquer controlo sobre o arguido, nomeadamente, sobre o cumprimento ou não do plano de readaptação”.

In casu, decorrido que está um ano e dois meses após o trânsito em julgado da sentença, a execução da pena aplicada ao arguido A... nunca chegou a iniciar, por culpa exclusiva daquele.

Como realça o Digno Magistrado do Ministério Público deste Tribunal, na douta promoção que antecede, o arguido, mesmo sabendo das obrigações que sobre ele impendiam nunca procurou dar qualquer satisfação nos autos, adoptando uma conduta omissiva, apesar de a D.G.R.S.P., de forma reiterada, ter estabelecido diversos contactos com familiares, advertindo-os das possíveis consequências da sua conduta.

Chegados aqui, urge ainda referir que se diligenciou, pelas mais variadas formas, pela comparência do arguido à diligência a que se reporta o n.º 2 do artigo 495.º do Código de Processo Penal, sendo que este nunca se deslocou às instalações deste Tribunal.

Por outro lado, e residindo o arguido, ao que tudo indica, actualmente, no estrangeiro, permitiu-se que o mesmo se pronunciasse relativamente às promoções do Digno Magistrado do Ministério Público, por escrito, não apresentando este qualquer argumento que nos permitisse concluir que não foram colocadas em crise as finalidades de punição que se pretendiam salvaguardar com a aplicação de uma pena de prisão suspensa na sua execução.

Assim, é tempo de o arguido entender que a condenação em pena suspensa não é um formalismo desprovido de consequências nem representa uma forma de desculpabilização de actos criminalmente censuráveis. Bem pelo contrário, traduz solene aviso para a gravidade da conduta censurada significando que a sua conduta se encontra já num patamar elevado de censurabilidade, com a consequente advertência para a redução da tolerância da ordem jurídica para com futuros comportamentos idênticos.

No caso vertente, essa solene advertência transmitida sob a forma de pena de prisão suspensa na sua execução não evidenciou revestir o grau de dissuasão pelo contrário, revelando-se, pelo contrário, ineficaz para assegurar as finalidades apontadas às penas criminais.

Pelos argumentos expostos, considera-se estar infirmado de forma definitiva o juízo de prognose favorável efectuado na sentença, subjacente à convicção de que a suspensão da execução da pena de prisão se mostrava suficiente a acautelar as finalidades da punição e, em consequência, ao abrigo do disposto no artigo 56.º, n.º 1 alínea a) e n.º 2 do Código Penal, decidimos revogar a suspensão da pena de prisão aplicada nos presentes autos, tendo o arguido A... que cumprir um ano e dois meses de prisão, o que se determina.

Notifique, sendo o arguido para a morada constante do termo de identidade e residência, em conformidade com o AUJ n.º 6/2010, publicado no Diário da República, 1.ª série — N.º 99 — 21 de Maio de 2010.

Após o trânsito:

- comunique ao registo criminal.

- passe e entregue mandados de detenção e condução do arguido ao Estabelecimento Prisional.»

            Também este despacho foi notificado por via postal para a morada constante do TIR (fls. 683).

            Face ao despacho de fls. 758 foram levadas a cabo diversas diligências tendentes à descoberta do actual paradeiro do arguido A... , cfr. fls. 759 e seg.s.

            A fls. 771 foi determinada a emissão de mandados de detenção do arguido, os quais viriam a ser devolvidos a fls. 786, sem cumprimento, face ao desconhecimento do paradeiro do mesmo.

            Por despacho de 21/5/2015 (fls. 800, 801) foi ordenada a notificação edital do arguido para se apresentar em juízo, sob pena de ser declarado contumaz.

            Por despacho datado de 15/6/2015 (fls. 809) foi ordenada a notificação da referida renúncia à procuração ao arguido.

            A fls. 810 e seg.s, o arguido, através de requerimento subscrito pelo seu ilustre advogado, que no acto junta nova procuração passada a seu favor, formula o seguinte requerimento:

«Por no hiato que mediou a renuncia formal do mandato por parte do seu defensor constituído, o que ignorava até à data deste requerimento, não ter qualquer tipo de defesa e, pelas demais razões, requer a V. Ex.cia que lhe seja dada mais uma oportunidade de se sujeitar ao regime de prova prevista no artº 53º do CP e, consequentemente, seja decidido a revogação do despacho que decretou a suspensão da medida, conforme o previsto no artº 56º do CP.

(…)

Solicita ainda que, a ser deferida a sua pretensão, ou seja: que qualquer plano inserido no regime de prova, tenha em atenção a sua condição de emigrante, pois, dada a sua juventude (trabalhador indiferenciado) e, a situação que se conhece em matéria laboral no nosso país, dificilmente recuperará o seu emprego caso tenha de regressar por muito tempo a Portugal para o efeito.

            Todavia, se tal se impuser não lhe restará outra solução, que não conformar-se.

            Qualquer contacto deverá ser dirigido ao seu mandatário constante da procuração …

            A sua morada na Alemanha é:

x... »

Sobre tal requerimento recaiu o seguinte despacho:

«Fls. 810 e seguintes:

Veio o arguido A... requerer, além do mais, que lhe seja dada mais uma oportunidade para se sujeitar ao regime de prova e, em consequência, seja decidida em conformidade a revogação do despacho que decretou a suspensão da medida.

Para tal, e no que ora releva, alega que o advogado comunicou aos autos que renunciava ao respectivo patrocínio, sendo que nenhum defensor oficioso contactou o arguido.

Cumpre, pois, decidir.

Dispõe o artigo 47.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 4.º do Código de Processo Penal que:

“1. A revogação e a renúncia do mandato devem ter lugar no próprio processo e são notificadas, tanto ao mandatário ou ao mandante, como à parte contrária.

2. Os efeitos da revogação e da renúncia produzem-se a partir da notificação, sem prejuízo do disposto nos números seguintes; a renúncia é pessoalmente notificada ao mandante, com a advertência dos efeitos previstos no número seguinte”.

Resulta, assim, do citado normativo legal e, quanto a nós, de forma inequívoca, que a renúncia não produz qualquer efeito antes da sua notificação – pessoal – ao mandante (com excepção do plasmado no n.º 4 do artigo 47.º do Código de Processo Civil) e, como tal, “efeitos da renúncia ao mandato não dependem da vontade ou arbítrio das partes, já que a mesma não desonera de imediato do patrocínio” – cfr. neste sentido, acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, datado de 27.02.2013.

No caso dos autos, verifica-se que o Ilustre Mandatário, Exmo. Sr. Dr. B... , o mesmo subscritor aliás do requerimento identificado em epígrafe, juntou procuração a seu favor outorgada pelo arguido A... com data de 06.10.2010 (cfr. fls. 79).

Posteriormente veio o Ilustre Mandatário renunciar à procuração, em requerimento que deu entrada neste Tribunal a 02.10.2013 (cfr. fls. 549).

Esta Instância Local determinou o cumprimento da notificação a que alude o citado artigo 47.º, n.º 2 do Código de Processo Civil a 15.06.2015 (cfr. despacho com a referência n.º 74339885, junto a fls. 809). Realce-se que o referido despacho não chegou a ser cumprido – isto é, não se logrou a notificação pessoal do arguido - em virtude de o Ilustre Mandatário ter junto, logo no dia seguinte, procuração outorgada pelo arguido (cfr. fls. 810 a 865).

Durante o hiato que mediou entre a renúncia e o requerimento identificado supra foi designada data para a audição do arguido nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 495.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Penal (cfr. despacho com a referência n.º 773501, datado de 22.04.2014, junto a fls. 619).

Para a referida diligência foram validamente notificados quer o arguido (cfr. fls. 622 e 636) quer o seu Ilustre Mandatário (cfr. 623).

No entanto, nenhum deles compareceu, razão pela qual foi nomeado defensor oficioso para representar o arguido aquando da tomada de declarações da técnica da D.G.R.S.P. (cfr. acta junta a fls. 639 a 640).

Na sequência da referida diligência e dos demais elementos juntos aos autos, o Digno Magistrado do Ministério Público promoveu a revogação da suspensão da pena de prisão aplicada ao arguido (cfr. 658 a 660) a qual, mais uma vez, foi notificada quer ao arguido (cfr. fls. 666e 667) quer ao ilustre mandatário (cfr. fls 665) para, querendo, se pronunciarem, nada tendo sido dito.

A 16.06.2014 foi proferido despacho a revogar a suspensão da pena de prisão do arguido, nos termos e com os fundamentos do despacho com a referência n.º 794583, junto a fls. 670 a 674, o qual foi notificado ao arguido (cfr. fls. 679 e 683) e ao seu mandatário (cfr. fls. 678).

Ora, atento o disposto no artigo 47.º, n.º 2 do Código de Processo Civil, e uma vez que nunca operou a notificação pessoal do arguido relativamente à renúncia de mandato (nem no dia de hoje, atento o explanado supra), não cessaram, pois, as funções de patrocínio que decorreram da outorga da procuração junta a fls. 549, pelo que não se poderá considerar que o arguido, ressalvo o respeito por opinião contrária, não teve defesa no âmbito dos processos, até porque a mesma estaria sempre assegurada, porque assim o impunha quer a lei processual civil quer o Estatuto da Ordem dos Advogados, pelo Ilustre Mandatário, o Exmo. Sr. Dr. B... .

Face ao exposto, improcede o peticionado.

Notifique.

Após trânsito, emita os competentes mandados de detenção.

*-*

Para além de esgotado o poder jurisdicional desta Instância Local quanto à questão da revogação da suspensão da pena de prisão, face ao explanado supra, fica prejudicado o conhecimento do demais peticionado no requerimento junto a fls. 810 a 865.

*-*

No demais, e quanto à procuração junta a fls. 865, a mesma acaba por ser redundante, atenta a já oportunamente junta

Inconformado com tal despacho, o arguido dele interpôs o presente recurso, concluindo nos seguintes termos:
a) Por sentença de proferida a 20 de Dezembro de 2012, o ora recorrente foi condenado pela prática, em co-autoria material e na forma consumada de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo artigo 86.º, n.º 1, alínea c) da Lei n.º 5/06, de 23 de Fevereiro, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 17/2009 de 6 de Maio, na pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão;
b) Pena esta suspensa na sua execução por igual período, nos termos do disposto no artigo 50.º do Código Penal, sujeita a regime de prova.
c) Antes da data marcada para a audiência de julgamento o arguido/recorrente havia emigrado para França à procura de emprego que lhe assegurasse a sua sobrevivência de forma honrada, já que em Portugal viu-se-lhe fechadas todas as portas, no que teve êxito.
d) De tal informou devidamente o Tribunal a quo desse facto, isto nos termos da alínea b), do n.º 3, do artigo 196.º do C.P.P., ou seja, forneceu quer a sua morada em França, tal qual o local em Portugal onde poderia ser notificado.
e) Mediante requerimento fundamentado e provado, devido a encontrar-se ausente do país, em razão de ter emigrado para o estrangeiro para trabalhar, pediu autorização para que o julgamento fosse feito na sua ausência  nos termos  do n.º 2, do artigo 334.º do C.P.P., o que teve o devido acolhimento.
f) No julgamento o arguido foi representado pelo seu defensor constituído nos termos e para o efeito do previsto nos artigos 334.º n.º 4 e 373.º, n.º 3, do C.P.P..
g) Como já foi referido, o arguido indicou ao Tribunal e para efeito do estatuído no artigo196.º n. 2 e, n.º 3, alínea b), do C.P.P.,  a  morada  em Portugal, a qual há data  correspondia à então residência da sua mãe.
h) Por cautela, indicou, em simultâneo, ao Tribunal a quo a morada que na altura tinha em França (residência do pai).
i) Acontece, que quer o seu mandatário então constituído, tal como, ao que tudo indica o Tribunala quo que o condenou, confiantes na  presunção  ilidível a que se reporta o artigo  113.º do C.P.P.,  foram enviando para a morada da mãe do arguido,  as várias notificações , inclusive,  isto no que tange ao   Tribunal, supostamente, também   a sentença final, atento ao que dispõe o n.º 10, do artigo 113.º, do C.P.P..
j) Por vicissitude diversas a mãe do ora Recorrente, tal como terceiros com possibilidade para o fazer, não lhe encaminharam, na altura para França, as referidas notificações, inclusive a sentença, porque  o arguido/ condenado ignorou o seu conteúdo.
k) Agravou a situação o facto do seu defensor constituído ter renunciado ao mandato;
l) E, entretanto, a circunstância de também a mãe do recorrente ter emigrado para a Alemanha.
m) Então, só após a publicação do EDITAL, a que corresponde a referência do Tribunal a quo n.º 74168383, afixado em 6 de Junho de 2015, alguém contactou no estrangeiro o recorrente dando-lhe conta do seu teor.
n) Alarmado, o recorrente contactou o seu anterior mandatário a fim de se inteirar do que se passava.
o)  Foi só nesta altura e através deste, que soube o teor da sentença que o condenara e,
p) Que, entretanto o então mandatário, devido a razões diversas, havia renunciado ao mandato.
q) Discutida a situação e depois de resolvida entre arguido e ex-mandatário os diferendos que os opunham, o último aceitou reassumir o mandato.
r) Sem que antes se tivesse deslocado à Instância Local de Satão (Tribunal) a fim de se inteirar do estado do processo, o que aconteceu na manhã do dia 15 de Junho de 2015.
s) Compulsado o processo, e para surpresa sua, o de novo empossado defensor verificou que o requerimento da renúncia ao mandato (anterior) encontrava-se junto aos autos, sem que desde  essa data, ou seja durante cerca de dezoito meses a Secretaria tivesse feito os autos conclusos à Meritíssima Juíza.
t) Na mesma altura, o recorrente através do seu novo defensor constituído, deu conhecimento do incidente na Secretaria.
u) Igual informação forneceu-a à Meritíssima Juíza titular do processo, que se dignou recebê-lo, também na mesma ocasião e lugar.
v) É convencimento do recorrente que a Meritíssima Juíza titular do processo apercebendo-se do lapso, nesse mesmo dia (constatação da irregularidade processual, diga-se; para a qual não contribuiu), ordenou que os autos lhe fossem conclusos e promoveu a notificação do ora recorrente, informando-o, formalmente, da renúncia ao mandato por parte do seu defensor então constituído.
w) Constatada a NULIDADE PROCESSUAL, e passada nova procuração forense, o recorrente requereu a ALTERAÇÃO  DO DESPACHO que revogou a suspensão  da prisão efectiva, arguindo /alegando:
x) Que o arguido/condenado não tomou conhecimento do conteúdo da sentença, porque esta foi enviada para a morada da sua mãe.
y) Mais, confiara piamente que esta lhe fazia chegar às mãos toda a correspondência, onde se incluía a que tinha origem no Tribunal a quo, ou expedida pelo seu defensor constituído.
z) Teve um diferendo com a sua mãe e, ao que julga, por este motivo aquela não lhe transmitiu a correspondência, entretanto, enviada quer pelo Tribunal a quo;
aa)  Tal qual como aquela que lhe fora expedida pelo seu defensor constituído.
bb) Inclusive, também a sua mãe acabou por sair do país, não recepcionando em Portugal a correspondência que era dirigida a ele recorrente, o que só soube recentemente.
cc) Fruto disto ignorou de todo quer o teor da sentença a que foi condenado, tal como as condições a que devia obedecer para a sua suspensão.
dd) Pelo mesmo motivo nunca chegou a saber que o seu mandatário constituído havia renunciado ao mandato.
ee) Só conheceu a sentença após um amigo lhe ter comunicado o teor da notificação edital a que se reporta o documento junto com o número 2.
ff) Alarmado, contactou de imediato o seu defensor que antes havia nomeado;
gg) Só depois desta abordagem é que soube que esse advogado havia renunciado ao mandato que lhe for a confiado.
hh) Ou seja, o arguido/ condenado nunca conheceu o teor da sentença;
ii) O arguido/ condenado ignorou que a pena estava suspensa na condição de se sujeitar ao um REGIME DE PROVA.
jj) O arguido/ condenado nunca foi abordado quer em Portugal ou na sua morada em França pelos técnicos D.G.R.S.P., para o cumprimento do tal REGIME DE PROVA.
kk) Na opinião do recorrente o estatuído no artigo 113.º, números 2 e 3 do C.P.P., são meras PRESUNÇÕES ILIDÍVEIS, tanto em relação às datas em que as notificações chegaram ao conhecimento do seu destinatário.
ll) Tal qual, se efectivamente a correspondência dirigida à morada indicada chegou de facto ao conhecimento do seu destinatário, o que manifestamente neste caso não aconteceu.
mm) Ou seja; o arguido/recorrente não pode ser considerado notificado da sentença, pelo que ignorou o seu conteúdo até conhecer o teor da notificação edital – cfr. Doc.2.
nn) Também, não foi dado a conhecer ao arguido/recorrente o programa para cumprimento do REGIME DE PROVA a que se reportam os artigos 53.º e 54.º do Código Penal e 494.º do C.P.P..
oo) Pelos mesmos motivos o arguido/condenado viu-se impedido de se defender nos termos previstos no artigo 55.º do C.P. e  495.º do C.P.P..
pp)  Em súmula;
qq) O arguido/condenado não conheceu o teor da sentença; não lhe foi dado a conhecer qualquer PLANO DE REINSERÇÃO SOCIAL e, não teve possibilidade de se defender nas condições e termos previstos no artigo 55.º, do Código Penal e 495.º do C.P.P. .
rr) Com o devido respeito por opinião contrário, se outros motivos não existissem, estes bastavam para o Tribunal a quo dentro do seu prudente arbitrio, nunca deveria ter REVOGADO A SUSPENSÃO da pena de prisão, porquanto, o arguido/condenado não infringiu grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de condutas impostas ou o plano de reinserção social, a que se reporta o artigo 56.º, do C.P.;
ss) Tanto mais, porque, tal qual alega na sua motivação, não teve oportunidade de se defender, como o impõe o artigo 55.º, do C.P.,e 495.º do C.P.P. e vem sendo sufragada pela jurisprudência:
tt) “ O não cumprimento das obrigações impostas não deve despoletar necessariamente a revogação da condenação condicional. Na verdade, se se quer lutar contra a pena de prisão, e se a revogação inelutavelmente a envolve, daí resulta que tal revogação só deverá ter lugar como ultima ratio, isto é, quando estiverem esgotadas ou se revelarem de todo ineficazes as restantes providencias que este preceito contém (BMJ 148-41)
uu) (…) Mas as causas de revogação não devem ser entendidas com um critério formalista, mas antes como demonstrativas das falhas do condenado no decurso do período da suspensão. O réu deve ter demonstrado com o seu comportamento que não se cumpriram as expectativas que motivaram a concessão da suspensão da pena (…)”
vv) In Código Penal anotado, 1.º Volume, Rei dos Livros, Manuel Leal-Henriques/Manuel Simas Simas Santos, 1995.
ww) A este propósito, mesmo a entender-se que o arguido/condenado incumpriu com as condições da suspensão da pena de prisão não é despiciendo chamar à colação a doutrina:
xx) “ O incumprimento das condições não conduz sempre, segundo a lei, às mesmas consequências, podendo o tribunal escolher entre diversas medidas (art. 50.º): fazer ao condenado uma advertência; exigir-lhe garantias de cumprimento dos deveres impostos; prorrogar o período de suspensão até metade do prazo inicialmente fixado. (…) Pressuposto material comum à verificação de quaisquer destas consequências é o incumprimento das condições de da suspensão tenha ocorrido com culpa. A culpa do incumprimento, porém, sendo assim pressuposto da consequência jurídica, em nada deve influenciar a escolha da medida que o tribunal vai tomar: mesmo esta deve ser função exclusiva das probabilidades, porventura ainda subsistentes, de manter o delinquente afastado da criminalidade no futuro e, deste modo, do significado que o incumprimento assuma para o juízo de prognose que foi feito no momento da aplicação da suspensão de execução da prisão “.
yy) In O Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime – 4.ª Reimpressão – Coimbra Editora, Jorge de Figueiredo Dias, pg.s 543 e 544.
zz) Este entendimento vem sendo perfilhado pela jurisprudência quando:
aaa) “A revogação da suspensão da execução da pena por incumprimento de qualquer dever ou condição pelo condenado, só pode ocorrer se esse incumprimento se ficar a dever a culpa grosseira do mesmo.
bbb) Essa culpa não se pode presumir. Tem de resultar de factos ou elementos concretos.
ccc) “ – cfr.  Acórdão do Tribunal  da Relação de Coimbra – proc. 15/07.8 GCGRD.C2; Relator Luís Teixeira – DGSI”.
ddd) Reitera-se que o arguido, ao não conhecer as notificações que lhe foram dirigidas, sem culpa sua, obstou a que se pudesse  defender, conforme preceitua e é ratio  do artigo 55.º do C.P., e 495.º do C.P.P..
eee) Não se poderá dizer que essa defesa foi assegurada com a nomeação exclusive e ad hoc de um defensor oficioso para estar presente naquele acto à assegurar a defesa do ora recorrente, já que o mesmo, como é evidente, ignorava os motivos das várias notificações não terem chegado ao poder do arguido/condenado.
fff) Em súmula, o arguido não deixou de cumprir culposamente nenhum dos deveres ou regras de conduta impostas, pois não as conhecia.
ggg)  O mesmo se diga que nunca deixou de cumprir com quaisquer planos de reinserção, tanto mais, que nunca foi notificado de tal.
hhh) Assim sendo, salvo melhor opinião, com a qual e com o devido respeito não se concorda, o arguido/condenado não infringiu grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos;
iii) E muito menos infringiu qualquer plano de reinserção social, pois este nunca lhe foi comunicado.
jjj)  Razão porque deve ser revogado o despacho em questão e substuído por um outro que prorogue o prazo  para cumprimento do REGIME DE PROVA, conforme prevê a alínea d) do artigo 55.º, do C. Penal.
kkk) a NULIDADE  consistente na falta da nomeação obrigatória  de defensor oficioso ao arguido/condenado - cfr. Doc. N.º
lll) DA EFICÁCIA DO REQUERIMENTO DE RENÚNCIA P.P. DO DEFENSOR CONSTITUÍDO AO PATROCÍNIO.
mmm) No que concerne aos advogados estatui a Lei 15 de 2005, de 26 de Janeiro de 2005, artigo 95.º, n.º 1, alínea e) e e 2:
nnn) -“Não cessar, sem motivo justificado, o patrocínio das questões que lhe estão cometidas.
ooo) - Ainda que exista motivo justificado para a cessação do patrocínio, o advogado não deve fazê-lo por forma a impossibilitar o cliente de obter, em tempo útil, a assistência de outro advogado”.
ppp) Outrossim; citando a jurisprudência da O.A. em anotação ao mencionado artigo:
qqq) - “ O advogado está obrigado sempre a assistir ao cliente, a menos que exista uma causa legítima de recusa. Significa isso que, na renúncia ao mandato, o advogado goza de poderes discricionários (…).
rrr) - (…), O requerimento para a renúncia ao mandato não deve conter mais que o estritamente necessário para a apresentação de tal pretensão, não devendo conter qualquer fundamentação que devasse o sigilo profissional”.
sss) Ora, atento a estas prescrições o recorrente não vai invocar os motivos por que o seu anterior defensor constituído renunciou à sua defesa.
ttt) Por não ser despiciendo, sempre tendo presente que quem recorre é o arguido/condenado e não o seu anterior advogado:
uuu)  “ Mandato é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais actos jurídicos por conta da outra “- cfr. Artigo 1157.º do Código Civil”.
vvv)  “O mandato presume-se gratuito, excepto se tiver por objecto actos que o mandatário pratique por profissão; neste caso, presume-se oneroso “ – cfr. Artigo 1158.º, n.º do Código Civil”.
www) No caso específico dos advogados rege o artigo 62.º da Lei 15/2005, de 26 de Janeiro (E.A.O.)
xxx) O direito à escolha e à remuneração do trabalho encontra-se consagrado na Lei fundamental da República Portuguesa a artigos 58.º e ss, tal qual, a artigo 23.º, n.1 da Declaração Universal dos Direitos do Homem.
yyy) Por pertinente; com o devido respeito por opinião contrária, não cabe nos poderes de qualquer Tribunal português o direito de impor a um  advogado que se mantenha contra a sua vontade expressa (requerimento), que exerça  o seu trabalho, durante dezoito meses.
zzz) No presente caso, perfilhando-se o raciocínio do Tribunal a quo, esse prazo poder-se-ia prolongar até ao momento que o Tribunal lograsse notificar o arguido da renúncia.
aaaa) Ora, o advogado para exercer responsavelmente o seu mandato tem que ter condições.
bbbb) Por dever de patrocínio (deontológico), não foi fornecido aos autos os motivos da renúncia.
cccc) Então, com todo o respeito por opinião contrária, nem a lei nem a jurisprudência citada pelo Tribunal a quo, perfilham o entendimento de que o advogado (defensor) tenha que exercer o seu patrocínio até quando o Tribunal decidir nomear um defensor oficioso.
dddd) Objectivando: o artigo 4.º do C.P.P. sob a epígrafe “ INTEGRAÇÃO DE LACUNAS “ prescreve:
eeee) -“ Nos casos omissos, quando as disposições deste Código não puderem aplicar-se por analogia, observam-se as normas de do processo civil que se harmonizem com o processo penal (…)”.
ffff) Porém, estatui o artigo 64.º n.º 3 do C.P.P.: “Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, se o arguido não tiver advogado constituído nem defensor nomeado é obrigatório a nomeação de defensor quando contra ele for deduzida acusação”.
gggg) Entenda-se; como se verifica, acerca desta questão, não exista qualquer omissão por parte do C.P.P., pelo que não se aplica o seu  artigo 4.º.
hhhh) Para que não sobejem dúvidas; o C.P. Civil a artigos  47.º, n. 4 e, 51.º, n.º 3 mandam aplicar o regime das nomeações urgentes do Código Penal, passando a ser este último diploma o supletivo.
iiii) O processo penal não é um processo de partes tal como é o processo civil.
jjjj) Em súmula; após o DESPACHO DE ACUSAÇÃO e tudo o mais que se seguir (cumprimento da pena) o arguido tem direito e o Tribunal está obrigado a assegurar-lhe assistência de um defensor, o que foi postergado.
kkkk) Entenda-se; houve de facto um lapso da Secretaria do Tribunal a quo, ao não abrir conclusão nos termos do artigo 162, do C.P.C., após a recepção do requerimento de renúncia ao mandato.
llll) Ou seja: Nunca os erros e omissões dos actos praticados pela Secretaria judicial podem prejudicar o arguido/condenado, isto sim, nos termos do n.º 6, do artigo 157.º do C.P.C., p.f. do artigo 4.º do C.P.P..
mmmm) Não sendo de somenos: O defensor renunciante, sempre que recepcionou correspondência do Tribunal a quo, após ter requerido a renúncia, informava a Secretaria pelo telefone, lembrando esse facto.
nnnn) Na opinião do recorrente, cabia à Secretaria lavrar nos autos, por TERMO o incidente, o que foi descurado.
oooo) Com o devido respeito, o Douto despacho e do qual ora se recorre ao perfilhar que o arguido/condenado tinha a sua defesa assegurada pelo mandatário renunciante, lavra num erro crasso em matéria de hermenêutica jurídica.
pppp) Assim, após a renúncia do defensor constituído o Tribunal a quo estava obrigado a nomear um defensor oficioso para assegurar a defesa do arguido, o que foi postergado - artigo 64.º, n.º 3, do C.P.P., e  n.º 4, do artigo 47.º do C.P.Civil, p.f. do artigo 4.º do C.P.Penal.
qqqq) Ora, na opinião do recorrente a falta de nomeação obrigatória de um defensor ao arguido/condenado constitui a NULIDADE prevista na alínea c), do artigo 119.º, do C.P.Penal;
rrrr) Nulidade esta arguida de imediato e em acto seguido à sua constação, oralmente e confirmada através do requerimento que mereceu o Douto despacho de que neste acto se recorre – cfr. Artigo 118.º e ss, do C.P.Penal.
ssss) O que implica, não tendo sido nomeado defensor oficioso ao arguido, após decorrido prazo razoável, que se seguiu à renúncia do defensor constituído, todo o processado subsequente é nulo -  cfr artigo 122.º do C.P.Penal .
tttt) Assim sendo; são nulas todas as deliberações que seguiram à referida renúncia ao mandato, sem que tivesse sido nomeado defensor oficioso ao arguido/ condenado, onde se inclui as diligências previstas nos artigos 55.º e 56.º, do C.Penal, 494.º, 495.º do C.P.P., pelo que devem ser revogadas.
uuuu) Pois; o arguido/condenado  esteve sem defensor durante um lapso de tempo enorme.
vvvv) Facto este que só constatou no dia 15 de Junho de 2015 na sequência do mandatário subscritor se ter dirigido do Porto à Instância Local de Satão (Tribunal) a fim de ver o estado do processo, com vista a ponderar se tinha condições para, na sua opinião, reassumir defesa do arguido/condenado, á qual nos termos legais havia renunciado.
wwww) Pelo mesmo motivo deve ser REVOGADO o despacho ao requerimento do arguido onde, entre outras razões arguiu a referida NULIDADE, despacho este do qual neste acto se recorre.
xxxx) Recorde-se: aquando da realização da diligência a que se reporta o artigo 55.º, do C.Penal, foi nomeado um defensor oficioso exclusivamente para esse acto, o que corrobora que houve negligência por parte da Secretaria do Tribunal em fazer conclusão dos autos à Meritissíma Juíza, na sequência da entrada do requerimento de renúncia ao mandato – cfr.162.º e, n.º 6, do artigo 157.º do Código de Processo Civil.
yyyy) Negligência esta que, na opinião do recorrente, está na origem do facto de lhe não ter sido nomeado um defensor oficioso, logo que o constituído renunciou aom mandato.

Termos em que:

Atento ao exaustivamente alegado:

-Deve ser considerado por esse Venerando Tribunal da Relação que o arguido/recorrente não foi notificado da sentença que o condenou.

-Porquanto a morada fornecida ao Tribunal como constituindo a sua residência em Portugal era a da sua mãe.

- Por razões diversas, esta não lhe deu conhecimento da correspondência, quer a endereçado pelo Tribunal a quo, como a dirigida pelo então seu defensor constituído.

-Razão porque não  tomou conhecimento do teor da  Douta sentença.

-Também nunca foi contactado pelos técnicos da  D.G..R.S.P..

- Fruto disto, não tomou conhecimento de qualquer plano visando o REGIME DE PROVA, que nunca o deixou de cumprir

-Ignorou até à afixação da última notificação edital que o seu anterior defensor constituído havia renunciado ao mandato.

- Atento que, na opinião do recorrente o estatuído no artigo 113.º, n.º 2, do C.P.P., represente presunção ilídivel, o que conforme se alega se fez.

- Após este reassumir o mandato e ter consultado o processo, constatou que após a sua anterior renúncia ao mandato, não lhe fora nomeado um defensor oficioso.

- Impõe a lei a artigo  64.º, do n.º 3, do C.P.P. que é obrigatório a nomeação de um defensor oficioso  quando contra ele for deduzida acusação.

- Teleologicamente, significa que a partir desse instante tem que ser assegurado um defensor ao arguido.

- O Tribunal a quo, após renúncia do defensor constituído não nomeou um defensor ao arguido.

- Tal, constitui a NULIDADE prevista na alínea  c), do artigo 119.º do C.P.P..

- Assim sendo, após constatação e arguição oportuna desta nulidade, os actos que se seguiram à renúncia do defensor constituído são inválidos - cfr. Artigo  122.º, n.º 1 do C.P.P.

- Assim sendo, deve-se ser considerada inválida a diligência feita pelo Tribunal a quo, e a que se reporta os artigos 55.º do C.P.,e 495.º do C.P.P., que determinou a revogação da suspensão da pena de prisão.

- Tal qual tudo quanto foi decidido no despacho de que neste acto se recorre.

-Salvaguardando entendimento contrário, o que, com o devido respeito não se concorda, a admitir que essa diligência foi válida, sempre se dirá que o arguido/condenado NÃO INFRIGIU GROSSEIRA ou REPETIDAMENTE os deveres ou regras de conduta impostas, como resulta do artigo 56.º, alínea a) do C.P., pelo que o Douto despacho proferido pelo Tribunal a quo, deve ser revogado, tal requerido, e substituído  por outro que PRORROGUE  o período de suspensão - cfr artigo 55.º, alínea d).

Mais;

- Que seja considerada válida a renúncia ao mandato forense a partir do prazo em que a Secretaria do Tribunal a quo, estava obrigada a fazer conclusão do mesmo à Meritíssima Juíza titular do processo.

Consequentemente;

- Que seja admitida a nova procuração forense, a partir da data de entrada do respectivo requerimento a solicitar a sua junção aos autos.

E assim se fazendo a habitual justiça.

O MP em primeira instância respondeu ao recurso, concluindo pelo seu não provimento, nos seguintes termos:

1.Vem o presente recurso interposto do despacho que determinou a revogação da suspensão da pena de prisão em que havia sido condenado o aqui recorrente.

2. Não se conformando com um tal despacho, vem o arguido/recorrente dela interpor recurso, submetendo-a à censura de V. Exas., alegando que se verifica uma nulidade processual consubstanciada na falta de nomeação de defensor, sendo que o recorrente nunca teve conhecimento, quer da sentença, quer do despacho que revogou a suspensão da execução da pena de prisão, mais requerendo, a final, que lhe seja concedida uma nova oportunidade para se sujeitar a regime de prova.

3. Vem, então, o recorrente alegar que o advogado comunicou aos autos que renunciava ao respectivo patrocínio, sendo que o tribunal não diligenciou no sentido de lhe nomear um defensor oficioso, pelo que não esteve devidamente representado em juízo, não tendo sido notificado dos despachos proferidos, pelo que os mesmos nunca transitaram.

4. Sucede porém que, compulsados os autos, verificamos que o arguido esteve sempre representado, inexistindo qualquer nulidade processual.

5. Considerando que nunca operou a notificação pessoal do arguido relativamente à renúncia de mandato não cessaram as funções de patrocínio que decorrem da outorga da procuração junta aos autos pelo que não se poderá considerar que o arguido não teve defesa no âmbito dos processos.

6. Consequentemente vem o recorrente requer que lhe seja agora concedida a possibilidade de se sujeitar, agora, ao regime de suspensão da pena de prisão, contudo, uma vez que, em face do entendimento supra defendido, a decisão de revogação da pena pena de prisão suspensa já transitou em julgado, fica, naturalmente, prejudicada e impossibilitada a apreciação de uma tal decisão.

Nesta Relação, o Ex.mo PGA emitiu douto parecer, no qual mostra concordância com a anterior resposta.

Ainda respondeu a recorrente, concluindo como anteriormente, nos seguintes termos:
1. A Secretaria Judicial devia concluir os autos à Mma Juíza, logo que recepcionou o requerimento do defensor constituído pelo arguido a comunicar a renúncia ao mandato, nos termos do artigo 105.º do C.P.P..
2. Após o conhecimento da renúncia, com o devido respeito por opinião contrária, o Tribunal a quo devia nomear oficiosamente um defensor, como preceitua o artigo 64.º, n.º 3 do C.P.P..
3. Não o tendo feito e sem que o arguido tivesse constituído novo defensor, entende o recorrente que estamos perante um dos vícios processuais anteriormente alegados e previstos nos artigos 119.º e ss do C.P.P.
4. Nulidades/irregularidades essas oportunamente arguidas, conforme estatuem os preceitos legais anteriormente invocados.
5. Pois, conforme prevêem os artigos 157.º, n.º 6 do C.P.C. e art.º 4 do C.P.P., nunca os erros e omissões dos actos praticados pela Secretaria Judicial podem prejudicar o arguido/recorrente.
6. Resultou desta situação e de outras vicissitudes, que no âmbito do dever de patrocínio não devem ser reveladas, que o arguido não conheceu o teor da sentença.
7. Não lhe foi dado a conhecer qualquer plano cujo cumprimento dependia a suspensão da pena de prisão a que fora condenado, nos termos dos artigos 50.º e ss do C.Penal.
8. Não existindo plano nunca o recorrente pode ser acusado de o não ter cumprido.
9. Não sendo notificado, não pôde exercer a defesa a que se reporta o artigo 495.º do C.P.P..
10. Relembre-se que o recorrente então arguido foi julgado na ausência.
11. Nessa diligência (acto) foi representado pelo seu defensor constituído,
12.  O qual, como ficou demonstrado nos autos renunciou ao mandato,
13. E deu conhecimento formal ao Tribunal a quo da sua renúncia.
14. Obs: Nunca a ordem jurídica num Estado de Direito, concebia obrigar um advogado a manter a sua actividade (processo) durante aproximadamente dezoito meses, nomeadamente, sem criar condições para que fosse assegurado o pagamento dos seus honorários; despesas, impedindo-o de suspender ou cancelar a sua inscrição na respectiva ordem profissional,
15. embora, o contrário pareça ser o entendimento do Digno Magistrado Titular da acção penal.

Termos em que:

 O arguido/ condenado requer a V. Exas para que seja substituído o Douto despacho que revogou a suspensão da aplicação da pena de prisão a que recorrente foi condenado; por outro a impor-lhe quaisquer das medidas previstas no artigo 55.º do C.P.Penal.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

DECIDINDO:

Analisadas as questões suscitadas pelo recorrente, sem qualquer preocupação de síntese, como lhe era imposto pela norma do artº 412º, 1, CPP, logo se vislumbra que são as seguintes as questões que são colocadas à nossa apreciação, tal qual se mostram delimitadas pelas conclusões com que o recorrente remata a sua motivação.

I –A questão da nulidade insanável por falta de nomeação de defensor e de intervenção do arguido no processo.

II – A questão de mérito que se prende com a bondade do despacho que revoga a suspensão da execução da pena de prisão.

            Após longo prefácio, vem o recorrente arguir a nulidade insanável constante do artº 119º, c) do CPP, pois que, na sua perspectiva, não foi assistido por advogado ou defensor no período compreendido entre 2/10/2013, data em que o seu ilustre advogado veio renunciar ao mandato (fls. 549) e 16/6/2015(fls. 810 e seg.s), data em que foi junta nova procuração passada a favor do mesmo ilustre advogado que anteriormente havia renunciado.

            Não obstante a ocorrência de tão alargado período temporal em que o referido requerimento de renúncia esteve pendente, sem decisão, cremos que, não obstante, nunca o arguido deixou de estar assistido por defensor; vejamos porquê.

            Em primeiro lugar, por razões de ordem formal.

            Não obstante ter apresentado tal requerimento, o Ex.mo advogado requerente não podia deixar de saber que o seu patrocínio se teria de manter até nomeação de novo defensor, acto de que nunca foi notificado (neste sentido apontam, com as necessárias adaptações, o artº 66º, 4, ao estatuir que «enquanto não for substituído, o defensor nomeado para um acto mantém-se para os actos subsequentes do processo» e 67º, 1 e 2, de cujas normas resulta que a intervenção do defensor no processo não é pontual, mas antes, e como regra, permanente, mantendo-se, sem hiatos, até ao início da intervenção do subsequente defensor).

            No caso, o ilustre advogado nunca foi notificado dessa substituição, razão pela qual deveria ter concluído que o seu patrocínio se mantinha; isto apesar da censurável – ao tribunal - pendência do seu requerimento de renúncia por mais de 20 meses, sem despacho. Mas essa circunstância não obsta à manutenção do patrocínio, tanto mais que o ilustre advogado, notificado por diversas vezes no decurso desse hiato temporal nada disse nem alertou o tribunal para essa circunstância.

            Depois, porque nos termos do disposto no artº 47º, 2, do CPC, aqui aplicável por força do disposto no artº 4º, do CPP (as questões omissas, quando não puderem integrar-se por recurso à analogia dentro do próprio CPP, serão resolvidas através da aplicação das normas de processo civil que se harmonizem com o processo penal), «os efeitos da … renúncia produzem-se a partir da notificação», a qual não foi cumprida antes da junção da segunda procuração.

            Depois, por razões de ordem substancial.

            Após a formulação de tal requerimento de renúncia, todos os actos relevantes do processo foram notificados quer ao arguido quer ao seu ilustre advogado, sem qualquer reacção da sua parte deste:

- Por despacho datado de 22/4/2014 (fls. 619) foi designado o dia 5 de Maio de 2014 para audição do ora recorrente, na presença da técnica encarregue de elaborar o plano de reinserção social, sendo ordenada a notificação daquele na morada constante do TIR. Também o Ex.mo advogado foi notificado, como pode ver-se a fls. 623. Face à falta de ambos, interveio no acto, como defensor, o advogado de escala (fls. 639).

Através da promoção de fls. 658 e seg.s, o MP promoveu que se revogasse a suspensão da execução da prisão.

Despachou a M.ma Juiza, concedendo ao arguido (sendo também notificado o seu ilustre advogado) um prazo de 10 dias para se pronunciar (fls. 662).

Face ao silêncio do arguido foi proferido o despacho de fls. 670 e seg.s, datado de 19/6/2014, revogando essa suspensão.

            Também este despacho foi notificado ao arguido por via postal para a morada constante do TIR (fls. 683) e bem assim ao ilustre advogado (fls. 678).

            Por despacho de 21/5/2015 (fls. 800, 801) foi ordenada a notificação edital do arguido para se apresentar em juízo, sob pena de ser declarado contumaz. Despacho esse também notificado ao Ex.mo advogado (fls. 802).

            Finalmente, por despacho datado de 15/6/2015 (fls. 809) foi ordenada a notificação da referida renúncia à procuração ao arguido.

            A fls. 810 e seg.s, o arguido, através de requerimento subscrito pelo seu ilustre advogado, que no acto junta nova procuração passada a seu favor, formulou o requerimento que levou à prolação do despacho recorrido.

            Ou seja, pesem embora as vicissitudes apontadas (pendência do referido requerimento por tão largo lapso temporal sem despacho), o certo é que em momento algum o arguido se encontrou no processo desacompanhado de defensor, razão pela qual, neste pormenor, improcedem as conclusões do recorrente.

            A segunda questão a apreciar prende-se com a circunstância, também invocada pelo recorrente, de não ter tido qualquer conhecimento do processo, ou intervenção no mesmo, a partir da audiência de julgamento, pelas razões que adianta.

            Como vimos já, o arguido, sendo notificado da data designada para julgamento, veio, a fls. 374, e invocando encontrar-se a residir no estrangeiro, requerer que a audiência de julgamento tivesse lugar na sua ausência, «sendo representado pelo seu mandatário».

            Tal requerimento viria a ser deferido, na acta de julgamento, a fls. 380 (v. o artº 334º, 2, CPP).

            Daí decorre, naturalmente, que tudo se passa a partir daí, comos e o arguido se encontrasse presente, sendo «representado, para todos os efeitos possíveis, pelo defensor» (artº 334º, 4 CPP).

            Nesses “efeitos possíveis” cabe, naturalmente, a notificação da sentença. Com efeito, a partir do momento em que requere que a audiência decorra na sua ausência, o arguido sabe que tem de se manter contactável na morada fornecida para os autos e que deve obter as informações necessárias, v.g., as relativas ao decurso do julgamento, junto do seu defensor. Por outro lado, é dever deste o de o informar do conteúdo da sentença.

            Aliás, regressando ao caso concreto, tudo aponta que terá sido isso que aconteceu no caso, já que o ilustre advogado (que se fez substabelecer na sessão em que foi lida a sentença) logo de imediato veio requerer que lhe fosse enviada pelo correio cópia da sentença (v. fls. 407), o que foi satisfeito, como pode ver-se de fls. 408.

            Todas as notificações para os actos subsequentes, e porque as diligências tendentes à descoberta do paradeiro do arguido, se revelaram infrutíferas (é curioso como, no requerimento apresentado a fls. 810 e seg.s o arguido se apressou a indicar a sua actual morada, sendo que resulta do processo que antes de se fixar na Alemanha, terá passado por França) passaram a ser efectuadas para a morada constante do TIR (sendo também notificado o Ex.mo advogado).

            Dispõe o artº 495º, 2, do CPP que, tendo em vista a apreciação das circunstâncias em que ocorreu a falta de cumprimento das condições apostas à suspensão da execução da prisão, «o tribunal decide por despacho, depois de recolhida a prova, obtido parecer do Ministério Público e ouvido o condenado na presença do técnico que apoia e fiscaliza o cumprimento das condições da suspensão».

            A violação de tal imposição legal traduzir-se-á na verificação da nulidade insanável constante do artº 119º, c) do mesmo CPP, por «ausência do arguido (…) nos casos em que a lei exigir a respectiva comparência».

            Tendo em consideração que o arguido não esteve presente em alguma audiência designada para o efeito, há que averiguar se, por isso mesmo, ocorre a referida invalidade insanável.

            A exigência da prévia audição do arguido, quando está em causa a apreciação da sua culpabilidade no não cumprimento das condições ou obrigações impostas à suspensão, traduz-se na transcrição legal dos comandos constitucionais referentes à garantia de defesa em processo criminal (artº 32º, 1, CRP) e, mais directamente, com a observância do princípio do contraditório (seu nº 5). Essas garantias, no processo penal, só serão asseguradas quando a audiência respectiva decorra com a audição presencial do condenado (cit. artº 495º, 2).

            Visto que tal não aconteceu no nosso caso, à partida poderíamos prefigurar a ocorrência da referida invalidade absoluta, por ausência do arguido.

            No entanto, o nosso caso mostra-se rodeado de cambiantes que poderão determinar que, não obstante essa ausência, o vício em questão não se verifique, e, do mesmo modo se mostrem respeitadas aquelas garantias constitucionais.

            É indubitável que o arguido não foi ouvido de forma presencial, já o dissemos. No entanto, o tribunal ‘a quo’ envidou esforços prolongados e renovados no sentido de proceder à sua notificação para audição.

            O arguido, nos termos já referidos, tem de se considerar notificado da sentença, razão pela qual ele tem de saber que a execução da pena que lhe foi aplicada, de 1 ano e 2 meses de prisão, foi suspensa por igual período com submissão a regime de prova.

            Da resenha histórica atrás elaborada é possível retirar três conclusões:

a) a de que o recorrente A... se deve considerar notificado para comparência a diligência cuja finalidade anunciada era a de eventual revogação da suspensão da execução da pena de prisão a que foi condenado nos presentes autos;

b) a de que faltou a essa diligência de forma injustificada; e

c) a de que, não obstante, o tribunal, por diversas vezes procurou obter a sua localização, na tentativa de o fazer comparecer.

            A tudo acresce que face à promoção do MP no sentido da revogação daquela suspensão, o tribunal teve o cuidado de – previamente à decisão - ordenar, novamente a sua notificação e, do mesmo passo, ordenar a notificação do seu ilustre advogado.

            Portanto, temos de concluir que o tribunal logrou notificar pessoalmente o arguido para comparência, sendo ele advertido da finalidade da diligência. Por isso, não pode ele falar agora em surpresa, ao tomar conhecimento do despacho impugnado. Por outro lado, foram esgotadas todas as diligências pensáveis tendentes à descoberta do paradeiro do arguido com vista à sua notificação.

            O princípio do contraditório, aqui invocado, constitui uma verdadeira garantia constitucional, que, dada essa sua natureza, é inviolável. Todavia, para que a concessão dessa garantia assuma a sua efectividade torna-se necessária alguma colaboração positiva do arguido, que, sendo-lhe facultada a possibilidade de se pronunciar pessoalmente, compareça na data designada para o efeito. O tribunal concede ao arguido a possibilidade de exercer o contraditório, não lhe pode impor, de modo algum, a obrigação de exercício efectivo desse direito.

            O contraditório é exercido mediante a mera facultação ao arguido da possibilidade desse exercício, não se exigindo, de forma alguma que esse exercício seja efectivo, deixando na disponibilidade daquele a opção a tomar, positiva ou negativa. Seria contraproducente fazer comparecer - mediante detenção - o arguido revel a uma diligência com tal finalidade, para a qual tivesse sido anteriormente notificado para comparência, e a ela faltando injustificadamente.

            Não obstante essa notificação pessoal que, pelo menos, teve a virtualidade de pôr o recorrente a par da finalidade da diligência, o tribunal desenvolveu inúmeras outras diligências no sentido de o notificar. A final, e face à impossibilidade de tal, procurou obter o respeito pelo contraditório também através da notificação do seu advogado.

            Por isso, sendo de considerar que foi facultada ao recorrente a possibilidade de exercer o direito ao contraditório, não se mostram, de forma alguma, violadas as garantias constitucionais asseguradas pelo artº 32º, 1 e 5 da CRP.

            No sentido por nós propugnado, vejam-se os seguintes acórdãos, por nós pesquisados em www.dgsi.pt:

- O ac. TRC de 9/9/2015, p.83/10.5PAVNO, assim sumariado:

I - Se antes de ser proferida a decisão de revogação da suspensão da execução da pena de prisão não foram envidados todos os esforços necessários à audição presencial do arguido e assim este não é ouvido na presença do técnico que fiscaliza o cumprimento das condições da suspensão, entendemos que o despacho de revogação incorre na nulidade prevista no art.119.º, al. c), do Código de Processo Penal.

II - Tendo sido envidados todos os esforços necessários à audição presencial do arguido e não sendo possível obter a sua comparência à diligência, a jurisprudência tem decidido que o contraditório imposto no art.495.º, n.º 2 do C.P.P. se tem como cumprido com a notificação do defensor do arguido.

(…)

- e o Ac. TRP de 29/10/2014, P.297/07.5GAETR-A, cujo seguinte pertinente extracto aqui citamos:

«De resto, ainda, a propósito do direito de audição, o prof. Figueiredo Dias, in Direito Processual Penal, 1981, I, 157/8, refere que “constitui a expressão necessária do direito do cidadão à concessão de justiça, das exigência comunitárias inscritas no Estado de Direito, da essência do Direito como tarefa do homem e, finalmente, do espírito do processo como comparticipação de todos os interessados na criação do Direito: a todo o participante processual antes de qualquer decisão que o possa afectar, dever ser dada a oportunidade através da sua audição, de influir na declaração do direito”.

A audição deve ser entendida à letra, exigindo a presença física do arguido? Ou basta-se com a simples concessão da possibilidade de exercício do contraditório, por requerimento no processo?

Seguramente que não implica a necessidade da realização de um interrogatório, de uma audição presencial, com a sua comparência física.

Nem a letra, nem o espírito da norma, inculcam tal obrigação.
Doutra forma, a ter que ser assim, a possibilidade de
revogação da suspensão da execução da pena, ficaria dependente da vontade do condenado. Ficaria na sua disponibilidade. O Tribunal ficava à mercê da sua vontade, uma vez que se não comparecesse ou se comparecesse e se remetesse ao silêncio, estava encontrado um obstáculo intransponível àquela revogação.

A ter que ser assim, estava encontrado um incentivo a que o condenado se furtasse à acção da justiça, com o propósito de inviabilizar a revogação da suspensão, cfr. neste sentido, o Ac. RE de 14.5.2002, relator Manuel Nabais, consultável no site da dgsi, que vimos seguindo de perto.

De resto, lapidarmente a este propósito – no que se pode ter como comportamento habitual dos condenados em pena de prisão suspensa na sua execução, com imposição de obrigações ou regras de conduta - o referido AUJ com o propósito de o combater, considerou a dado passo que, “…sucede que a esmagadora maioria dos arguidos que não estão dispostos a cumprir os deveres que condicionam a suspensão de execução da pena também não estão na disposição de se deixarem notificar, o que irá ter por consequência a submersão dos tribunais, e dos órgãos de policia criminal, em sucessivas e infindáveis diligências de averiguação do paradeiro de indivíduos que, mesmo após terem assumido a obrigação de informar da mudança de domicílio, e não obstante terem sido condenados em pena de multa que sabem ser seu dever pagar, votam o processo criminal aos mais absoluto desprezo.

O arguido que deu a sua residência no processo cumpriu, também, uma obrigação de informação a que o Estado vai corresponder informando-o, no mesmo local indicado, de toda a decisão que possa afectar os seus interesses. Se o arguido, sabendo que foi condicionado numa pena cuja execução foi suspensa e depois de ter sido notificado para esclarecer do não cumprimento das condições olimpicamente se ausenta do local que indicou é problema que o afecta a si única e exclusivamente como cidadão relapso.

A condenação em pena suspensa não constitui uma ‘carta de alforria que permite ao arguido proclamar que nenhum dever lhe assiste na sua relação com o Estado nem sequer a obrigação de o manter informado sob sua residência…”.

(…)

Sem embargo, do direito, genérico, de o arguido ser ouvido sempre e cada vez que o Tribunal deva tomar uma decisão que o afecte, como vimos já.

Por isso, há que concluir, de forma inequívoca que, o processado dos autos não evidencia que tenha sido cometida a apontada nulidade.

Se a arguida não foi ouvida mais uma vez – e pessoalmente, quando até nem o teria que ser - a si, tão só, o deve. Foi a sua mudança de domicílio, sem informar o Tribunal, que originou a impossibilidade de se proceder à sua notificação, por desconhecimento, desde logo, na vizinhança do seu paradeiro, que, tão pouco, se logrou obter em várias bases de dados informáticos.
Ou como se decidiu no Ac. da RC de 07/05/2003, citado no desse Tribunal de 12.10.2011, “o tribunal cumpre todas as obrigações processuais criando a condições necessárias para proferir despacho de apreciação no termos do artigo 56.° C Penal se enceta várias diligências tendentes tomar declarações ao
arguido e este não é encontrado, não só na morada que consta dos autos como em outras obtidas junto da autoridades”.»

Por isso, devemos concluir que, também nesta perspectiva, não se verifica a nulidade arguida pelo recorrente e que é a que resultaria da alínea c) do artº 119º do CPP. Esta nulidade só ocorre quando ao arguido não é concedida a possibilidade de comparência a acto a que a lei confere esse estatuto de obrigatoriedade e já não quando o próprio arguido a ele não comparece de forma voluntária ou quando, de forma pré-determinada, se coloca em posição de não ser possível transmitir-lhe a convocatória para tal comparência.

Sendo considerado que o arguido foi validamente notificado para todos os termos do processo, v.g. os posteriores à leitura da sentença, deve entender-se que não podemos aqui entrar na análise do mérito da sentença e do despacho que revogou a suspensão da execução da pena de prisão (fls. 670 e seg.s) pois que estes há muito transitaram (v. artº 411º, 1, a) e b), do CPP).

Termos em que, neste Tribunal da Relação, se acorda em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido.

O arguido pagará as custas do processo, fixando-se em 4 UC’s a taxa de justiça devida.

Coimbra, 20 de Janeiro de 2016

(Jorge França - relator)

(Elisa Sales - adjunta)