Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
163/99.6TBCTB.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE DIAS
Descritores: PRESCRIÇÃO DA PENA
INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO
Data do Acordão: 12/09/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE CASTELO BRANCO
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: 124º,Nº1, AL. B) DO CP(VERSÃO ORIGINÁRIA)
Sumário: Não constitui causa de interrupção de prescrição da pena, conforme o disposto no artigo 124º, nº1 al.b) do CP (versão originária), o facto de terem sido emitidos por duas vezes mandados de captura contra o condenado, e ter sido decidido que os autos aguardassem por 6 meses a sua extradição, prazo que foi sucessivamente prorrogado.
Decisão Texto Integral: pág. 14
No processo supra identificado foi proferida decisão que julgou improcedente o requerimento de declaração da prescrição da pena ao arguido J.
Tendo-se ainda decidido julgar não decorrido o prazo de prescrição da pena.
Inconformado, o arguido recorre para esta Relação.
Apresenta motivação e conclusões, sendo que estas delimitam o objecto do recurso, e são do seguinte teor:
1- o acórdão transitou em julgado a 4-2-93.
2- O recorrente foi declarado contumaz em 2-12-95.
3- Em consequência da promoção de fls. 1054, que obteve despacho confirmativo, entendeu o Tribunal que em consequência da declaração de contumácia, a pena do arguido prescreveria em 4-8-15.
4- Todavia, posteriormente com o entendimento perfilhado pelo Acórdão do S.T.J. nº 5/2008 com cariz uniformizador de jurisprudência no domínio da vigência do CP de 1982 e CPP de 1987, a declaração de contumácia não constituía causa de suspensão da prescrição do procedimento criminal.
5- Este Acórdão tem inteira aplicação quanto à mesma relação entre contumácia e prescrição da pena.
6- Em consequência da publicação desse mesmo Acórdão veio o arguido ao abrigo do nº 4 do art.2 do C.P., requerer a sua aplicação ao caso concreto, com fundamento na aplicação retroactiva da lei penal mais favorável
7- O Tribunal não põe agora em crise as razões que o levaram anteriormente a entender que a pena não estava prescrita, já que vigorava a declaração de contumácia, tendo sido sempre a única razão aduzida pelo Tribunal para justificar a não prescrição da pena.
8- Todavia, este despacho de que ora se recorre e exarado pelo mesmo tribunal, vem invocar "ex novo" um preceito que até agora nunca invocara, ou seja a al. b) do nº 1 do art.124 do CP de 1982.
9- O recorrente só agora foi confrontado com esta nova argumentação, sendo que a justificação que o Tribunal sempre deu e transitada já em julgado, foi a da declaração de contumácia.
10- Não podia o Tribunal vir agora com o argumento do anterior CP e face à publicação do A.U.J., já que põe em causa o princípio da legalidade, contraditório unidade, lealdade e estabilidade jurídica das relações processuais.
11- Este tipo de argumentação provoca sensação de instabilidade incompatível com o conceito de segurança jurídica considerado tão importante como o conceito de equidade.
12- O tribunal fez errada aplicação e interpretação dos princípios jurídicos e processuais, contrários ao vertido nos art.29-4, 32-1-2-5 e 202-2 da CRP:
13- Mesmo que se entenda que é de aplicar o vertido no art. 124-1-b do CP, posteriormente eliminado, a alínea B) tem de ser interpretada no sentido de que o condenado se mostre em sítio donde não possa ser extraditado ou não possa ser alcançado.
14- A intenção do legislador quanto àquele preceito legal, será no sentido da impossibilidade legal de alcançar o condenado, nunca de ainda não ter sido capturado.
15- Apesar de os autos referirem que o condenado estará eventualmente na Zâmbia, o que se refuta, tal não seria factor impeditivo de ser extraditado.
Todavia, aquela informação não passa de informação sem "rosto" carreada aos autos.
16- Aliás é de direito básico e que assiste ao ser humano é manter a sua liberdade.
17- Os autos também não espelham que até hoje volvidos que são largos anos, quanto a algum processo de extradição accionado fosse negada a sua extradição.
Nem existe conhecimento da impossibilidade de chegarem ao mesmo.
18- Pelo que, quanto ao Recorrente este normativo legal não se pode aplicar sob pena da denegação dos próprios direitos do cidadão, e, do dever da autoridade, mesmo que seja esta a lei a mais favorável.
19- Os actos da autoridade competente para fazer executar a pena são meros actos administrativos que não poderão servir de causa de interrupção da prescrição.
20- Este preceito posteriormente acabou por ser eliminado, até porque o que decorre da própria lei é o dever do próprio Tribunal accionar os mecanismos para cumprir a lei sem que esses actos possam ser considerados como interruptivos da prescrição.
Aliás, mesmo na vigência do Cod. de 1995, apesar da declaração da contumácia, as autoridades têm por obrigação diligenciar pela localização do próprio arguido no sentido de o notificar e eventualmente o deter a fim de fazer cessar a contumácia.
21- O despacho naquele sentido faz errada interpretação e aplicação das normas contidas à altura na alínea b) do n.º 1 do art.124 do CP violador dos princípios constitucionais ínsitos na nossa CRP, art.27,29 e 32 e 202-2.
22- Deverá ser levantada a Declaração de Contumácia, até porque não foi objecto de contestação por parte do despacho.
Consequentemente ser declarada prescrita a pena.
Caso assim se não entenda sempre a mesma deverá ser considerada prescrita porque se não encontram reunidas as condições invocadas na al.) b do nº 1 do art. 124 do C.P. de 1982.
Foi apresentada resposta pela Magistrada do Mº Pº que conclui:
1.O arguido foi condenado nos presentes autos na pena única de 10 anos de prisão, por acórdão transitado em julgado em 04.02.1993.
2.O prazo prescricional da pena aplicada ao arguido é de 15 anos.
3.Nos termos do art. 124.°, n.º 1 do Código Penal de 1982 em vigor à data do trânsito em julgado da decisão condenatória "1- A prescrição interrompe-se: (…) b) Com a prática, pela autoridade competente, dos actos destinados a fazê-la executar, se a execução se tornar impossível por o condenado se encontrar em local donde não possa ser extraditado ou onde não possa ser alcançado."
4.Com a entrada em vigor do Código Penal de 1995, o art. 126.°, n.º 1, deixou de prever a supra mencionada causa de interrupção da prescrição
5. Conforme se retira do Ac. do STJ de 04.02.2010, disponível em www.dgsi.pt como «a prescrição natureza substantiva e processual, é de entender que as respectivas normas constituem leis processuais materiais, o que implica, no domínio da aplicação da lei no tempo, a sujeição ao princípio da lei mais favorável
6. Assim sendo teremos, que aplicar ao arguido a legislação mais favorável nos termos do art. 2.°, n.º 4 do Código Penal.
7. Atenta a data do trânsito em julgado do acórdão proferido nos autos e a inexistência de causas interruptivas ou suspensivas da pena de prisão que lhe foi aplicada, temos que concluir que a mesma se encontra prescrita e deve por isso ser declarada extinta.
Razões pelas quais entendemos dever ser dado provimento ao recurso e determinar-se a alteração da decisão recorrida.
Nesta Relação, o Ex.mº P.G.A. emitiu parecer, suscitando em questão prévia a extemporaneidade do recurso.
Foi cumprido o art. 417 nº 2 do CPP.
Foi apresentada resposta na qual o recorrente sustenta a apresentação em tempo invocando a suspensão do prazo a partir de 15 de Julho, operada pelo Dl. 35/2010 de 15-04.
Cumpre decidir:
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É do seguinte teor a decisão recorrida:
Veio o arguido J invocar a prescrição da presente da pena que lhe foi aplicada nos autos.
O Ministério Público pronunciou-se, requerendo o indeferimento da pretensão do arguido.
Cumpre decidir:
Ao arguido foi aplicada a pena única de 10 anos de prisão, pela prática do crime de tráfico de estupefacientes, reduzida a 8 anos e 6 meses, em virtude do perdão operado.
Atenta a pena aplicada ao arguido, a mesma extinguir-se-á, por efeito de prescrição, logo que sobre o trânsito em julgado da decisão que a aplica tiverem decorrido 15 anos (v. 122º n. º 1 b) do Código de Processo Penal.
Ao instituto da prescrição tem vindo, sucessivamente, a nossa jurisprudência a reconhecer natureza substantiva, pois este traduz uma renúncia do Estado ao jus puniendi - muito embora não haja unanimidade -, é disso exemplo o Ac. da Relação do Porto de 23 de Março de 1984, in CJ IX, Tomo II, pág. 253; por isso as normas que venham regular, ex novo, as condições de prescrição do procedimento criminal ou contra-ordenacional, nomeadamente o seu prazo, se forem de conteúdo mais favorável ao arguido, são de aplicação retroactiva - Ac. da Relação do Porto de 30 de Outubro de 1996, in CJ XXI, Tomo IV, pág. 255. Seguindo-se o entendimento perfilhado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça nº 5/2008 de 13/05 onde foi decidido, com cariz uniformizador da jurisprudência que no domínio da vigência do Código Penal de 1982 e do Código de Processo Penal de 1987, nas suas versões originárias, a declaração de contumácia não constituía causa de suspensão da prescrição do procedimento criminal importa aferir se in casu se encontra prescrito o presente procedimento criminal:
Nos termos do artigo 124º do Código Penal na redacção em vigor à data do transito em julgado da decisão condenatória:
“1 - A prescrição da pena interrompe-se:
a) Com a sua execução;
b) Com a prática, pela autoridade competente, dos actos destinados a fazê-la executar, se a execução se tornar impossível por o condenado se encontrar em local donde não possa ser extraditado ou onde não possa ser alcançado.
2 - Depois de cada interrupção começa a correr novo prazo de prescrição.
3 - A prescrição da pena terá sempre lugar quando, desde o início daquela e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal. da prescrição acrescido de metade”.
Foram emitidos em 05/03/1993 mandados de detenção do arguido com vista ao cumprimento da pena aplicada, os quais não puderam ser cumpridos pois não foi encontrado o paradeiro do arguido - cfr. fls. 948 a 951 dos autos.
A fls. 945 foi informado que o arguido se encontra em Lusaca/Zambia.
Em 04/11/1994 e 21/10/1999 foi determinada a emissão de mandados de captura contra o arguido para cumprimento da pena imposta, tendo sido determinado que os autos aguardassem por 6 meses a extradição do arguido, prazo que foi sucessivamente prorrogado - cfr. fls. 980/98 e fls. 995 e seguintes.
Ao que decorre dos autos não foi possível proceder à detenção ou captura do arguido, nem, tão pouco foi decretada a sua extradição.
Desta factualidade decorre, sem margem para quaisquer dúvidas a verificação da causa de interrupção da prescrição da pena prevista no artigo 124º n.º 1 b) do Código Penal pois foram praticados em 04-11-1994 e 20/10/1999, pela autoridade competente, actos destinados a fazer executar a pena, pois a execução se tornou-se impossível por o condenado se encontrar em local donde não possa ser extraditado ou onde não possa ser alcançado.
A interrupção tem por efeito a inutilização do tempo que já correu desde que se iniciou a contagem do respectivo prazo, até que se verifica o facto interruptivo; a partir daqui inicia-se novamente a contagem do prazo de prescrição, não se aproveitando o tempo anteriormente decorrido - art.º 121º n. º 2 do Cód. Penal. Nos termos do artigo 126 n.º 3 do Cód. Penal, a prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvando o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo de prescrição acrescido de metade.
Com esta norma a lei pretende evitar um efeito indesejável, marcando um prazo limite findo o qual a prescrição, independentemente de todas as interrupções que possam ter tido lugar, se verifica.
Partindo destas premissas temos que, o prazo prescricional da presente pena será de criminal seria de vinte e dois anos e seis meses.
Contudo, a rei abre uma ressalva: o tempo da suspensão.
O instituto da suspensão da prescrição radica na ideia segundo a qual a produção de determinados eventos, que excluem a possibilidade de o procedimento se iniciar ou continuar, deve impedir o decurso do prazo de prescrição, uma vez eliminado o obstáculo, isto é cessada a causa da suspensão, o resto do prazo da prescrição deve voltar a correr. Ao contrário do que acontece na interrupção da prescrição, o prazo de prescrição que decorreu até ocorrer o facto suspensivo, não é inutilizado, mas sim somado ao tempo que venha a correr depois de cessar a suspensão, não se aproveitando o lapso de tempo durante o qual se mantiver a causa dessa mesma suspensão.
No caso não se verificou qualquer causa suspensiva do decurso do prazo de prescrição da pena.
Considerando a data do trânsito em julgado da decisão condenatória importa concluir que o prazo prescricional da pena ainda não se encontra ultrapassado.
Assim sendo, indefere-se o requerido.
Notifique a I. Defensora do arguido que, se possível, informe o seu paradeiro.
Oficie às autoridades policiais competentes solicitando informação sobre o actual paradeiro do arguido, solicite cópia da ultima requisição de B. I. do arguido, solicite à Direcção Geral de Contribuições informação acerca do domicílio Fiscal do arguido e a mesma informação ao Centro Regional de Segurança Social da área da ultima residência conhecida.
Passe novos mandatos passe mandados de detenção do arguido, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 337º/1 e 336°/2 do Código de Processo Penal a serem remetidos ao OPC para cumprimento.
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Analisemos:
Questão prévia:
Tempestividade do recurso:
Daquele despacho foi enviada carta registada de notificação à mandatária do arguido, com data de 01-07-2010, conforme fls. 1091, que se presume recebida no terceiro dia útil seguinte ao do envio.
O terceiro dia útil seguinte foi o dia 6 de Julho, já que pelo meio houve um fim de semana.
Porém, foi publicado e entrou em vigor o Dl. 35/2010 de 15-04 que estipula no seu art. 2: “Ao período compreendido entre 15 e 31 de Julho atribui-se os mesmos efeitos previstos legalmente para as férias judiciais” o que conjugado com o art. 103 do CPP que refere que os actos processuais não se praticam no período de férias judiciais, temos que se verifica uma suspensão dos prazos que estejam a decorrer.
A lei 43/2010 de 03-09, veio revogar este Dl., mas ressalvando os efeitos já produzidos e alargando o período de férias judiciais de 16 de Julho a 31 de Agosto.
Assim, temos que o prazo de interposição do recurso se suspendeu de 15 a 31 de Agosto, pelo que apenas terminariam os 20 dias do recurso em, 12 de Setembro, Domingo, pelo que o ultimo dia do prazo era 13 de Setembro, primeiro dia útil seguinte ao do prazo terminado em Domingo.
Tendo o recurso chegado à Secretaria do Tribunal por correio electrónico no dia 13 de Setembro e dado entrada, conforme carimbo a fls. 1109, temos que o recurso foi interposto em tempo.
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Matéria do recurso:
A questão única suscitada é a da prescrição da pena aplicada ao arguido.
E aqui se discorda, desde já, com o alegado no recurso, de que na decisão recorrida se invocaram argumentos novos nunca antes tidos em conta.
É que na decisão recorrida apenas se decidiu do requerido pelo arguido e, em tais circunstâncias devem ser analisados todos os elementos. A mesma questão podendo ter mais que um fundamento de indeferimento, não têm que ser utilizados todos os argumentos.
Até porque o argumento da contumácia, face ao acórdão uniformizador, respeita a regime posterior a 1995 e o agora utilizado respeita ao regime originário do código.
Não pode o recorrente invocar um regime de prescrição e querer que se lhe apliquem as regras do regime anteriormente analisado.
Pelo que na decisão recorrida entendendo-se que havia causa de interrupção da prescrição, a mesma tem que ser aplicada.
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Nos termos do art. 122 nº 2 do CP, o prazo de prescrição da pena começa a correr no dia em que transitar em julgado a decisão que tiver aplicado a pena.
In casu, o prazo da prescrição eram 15 anos e, o trânsito em julgado da sentença condenatória ocorreu em 04-02-1993.
A causa de suspensão da prescrição – declaração de contumácia – apenas foi introduzida no CP com a alteração operada com o Dl. 48/95 de 15 de Março.
Tendo o recorrente sido declarado contumaz por despacho de 02-12-1995.
O Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº 5/2008 in DR. 1ª S. de 13-05.08 veio fixar a seguinte jurisprudência:
«No domínio da vigência do Código Penal de 1982 e do Código de Processo Penal de 1987, nas suas versões originárias, a declaração de contumácia não constituía causa de suspensão da prescrição do procedimento criminal».
Que igualmente tem aplicação no que respeita à prescrição das penas.
E, neste aspecto se encontram de acordo todos os sujeitos processuais.
E, por isso se entende como mais favorável o regime prescricional dos códigos, Penal e Processo Penal, na versão originária.
E, aplicando o regime mais favorável tem de o ser em bloco e não proceder-se ao aproveitamento de medidas mais favoráveis de um e de outro regime.
A questão in casu respeita à interpretação da al. b) do nº 1 do art. 124 do CP, redacção originária, referente a causa de interrupção da prescrição.
“1 - A prescrição da pena interrompe-se:
b) Com a prática, pela autoridade competente, dos actos destinados a fazê-la executar, se a execução se tornar impossível por o condenado se encontrar em local donde não possa ser extraditado ou onde não possa ser alcançado”.
Preenchem estes requisitos os elementos indicados no despacho recorrido?
“Foram emitidos em 05/03/1993 mandados de detenção do arguido com vista ao cumprimento da pena aplicada, os quais não puderam ser cumpridos pois não foi encontrado o paradeiro do arguido - cfr. fls. 948 a 951 dos autos.
A fls. 945 foi informado que o arguido se encontra em Lusaca/Zambia.
Em 04/11/1994 e 21/10/1999 foi determinada a emissão de mandados de captura contra o arguido para cumprimento da pena imposta, tendo sido determinado que os autos aguardassem por 6 meses a extradição do arguido, prazo que foi sucessivamente prorrogado - cfr. fls. 980/98 e fls. 995 e seguintes.
Ao que decorre dos autos não foi possível proceder à detenção ou captura do arguido, nem, tão pouco foi decretada a sua extradição.”
Entende a recorrente que aquela alínea b) “tem de ser interpretada no sentido de que o condenado se mostre em sítio donde não possa ser extraditado ou não possa ser alcançado”, “a intenção do legislador quanto àquele preceito legal será no sentido da impossibilidade legal de alcançar o condenado, nunca de ainda não ter sido capturado”.
Maia Gonçalves em anotação ao art. 124 (versão originária) do seu CP anotado e comentado, 3ª ed. 1986 refere que, “qualquer acto da autoridade competente visando a execução da pena tem idoneidade para interromper a prescrição”.
Pensamos, no entanto que não esteve no espírito do legislador uma posição tão liberal, porque a entender-se assim, bastava a emissão do mandado de detenção ou captura, ou qualquer outro documento com vista a tentar executar a pena, ou seja, tudo era idóneo para interromper a prescrição.
Assim como a impossibilidade de extraditar o condenado ou estar em local onde não possa ser alcançado tem de ser uma impossibilidade real e concreta. Têm de ser realizadas diligências concretas das quais se verifique essa impossibilidade, não se podendo esperar que o arguido se entregue, pois como refere o recorrente, “um direito primário que assiste ao ser humano é manter-se em liberdade”.
Citando Fernando Fabião, in Prisão Preventiva, pág. 5, “o homem tem a liberdade na massa do sangue, de tal sorte que, onde ela não existe, não pode falar-se de homens. Ser livre é da essência da natureza histórica do homem. Milénios de história o documentam, testemunhando a progressiva libertação do homem das forças contrárias às múltiplas manifestações desse impulso básico, fundamental que é a liberdade”.
Para se concluir que se tornou impossível extraditar teria de haver processo de extradição que revelasse essa impossibilidade.
Para se concluir que o condenado não podia ser alcançado, teria de se saber do seu paradeiro e diligenciar pela captura.
Assim que se entenda que os actos praticados e documentados no processo não são demonstrativos da prática de actos destinados a fazer executar a pena, ou que a execução se tornou impossível por o condenado estar em paradeiro donde não pode ser extraditado, ou em local onde não possa ser alcançado.
Assim, que não se verifica causa de interrupção da prescrição da pena.
Neste sentido aponta o Ac. do STJ de 27-09-1995, in BMJ Nº 449 ANO de 1995 PAG. 84, que em situação que em caso de procura do arguido para cumprimento parcial da pena, quando detido não encontrou causa de interrupção da prescrição da pena e só a não julgou prescrita por ainda não ter decorrido o prazo.”I- Quando as datas do trânsito em julgado da sentença condenatória e do início do cumprimento da pena não coincidam e, nessa última data, ainda não estiver esgotado o prazo prescricional, o começo da execução marca a interrupção da prescrição (artigo 124, n. 1, alínea a) do Código Penal).
II- Se o prazo prescricional já estiver decorrido, não poderá iniciar-se a execução da pena”.
Essa orientação também resulta dos fundamentos da prescrição da pena, em que com o decorrer do tempo se esbate a necessidade da sua execução. Discorrendo sobre os fundamentos do instituto da prescrição, ensina o Professor Figueiredo Dias que o decurso de determinado lapso temporal faz esbater a censura comunitária traduzida no juízo de culpa, sendo que as exigências de prevenção especial tornam-se progressivamente sem sentido e podem mesmo falhar completamente os seus objectivos, e do ponto de vista da prevenção geral positiva faz com que não possa falar-se de uma estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias, já apaziguadas ou definitivamente frustradas, (Direito Penal Português, As consequências jurídicas do crime, Aequitas, 1993, página 699).
Não se tendo verificado causa de interrupção nem de suspensão do prazo de prescrição da pena em que o arguido foi condenado e, tendo já decorrido esse prazo, há-de julgar-se extinta a pena por prescrição.
Decisão:
Tendo em conta o exposto, acordam no Tribunal da Relação de Coimbra e Secção Criminal:
1-Em julgar extinta, por prescrição, a pena aplicada nestes autos ao arguido J.
2-Julgar cessada a medida cautelar de contumácia aplicada.
Sem custas.
Coimbra,
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