Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
824/10.0TBLRA-H.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: Mª DOMINGAS SIMÕES
Descritores: INVENTÁRIO
RECLAMAÇÃO DE BENS
ARTICULADOS
PROVAS
Data do Acordão: 12/03/2013
Votação: DECISÃO SINGULAR
Tribunal Recurso:
LEIRIA - TRIBUNAL JUDICIAL - 2º JUÍZO CÍVEL
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 1344º, 1348º E 1349º DO CPC
Sumário: 1. No incidente da reclamação de bens em processo de inventário não há lugar à apresentação de um articulado de réplica à resposta da cabeça de casal.

2. Sob pena de preclusão, as provas terão que ser oferecidas nos articulados da reclamação e da resposta que pelo cabeça de casal for apresentada.

Decisão Texto Integral: *
O recurso é o próprio, tendo sido recebido no modo e com o efeito devidos.
Nada obsta ao conhecimento do respectivo mérito.
Considerando a natureza meramente jurídica das questões suscitadas e atendendo a que às mesmas vem sendo dada pelos nossos Tribunais, de forma reiterada, idêntica solução, mostram-se reunidos os pressupostos a que alude o art.º 705.º do CPC, termos em que passo a proferir decisão sumária.
                                                       *

Tópico Detalhe
I. Relatório
No 2º juízo cível do Tribunal Judicial da comarca de Leiria, corre termos processo de inventário para separação de meações, sendo requerente A... e requerido B....
Nomeada a requerente A... para o exercício do cargo de cabeça de casal, apresentou esta a relação de bens agora certificada de fls. 19 a 25 dos autos.
Notificado da relação de bens apresentada, dela reclamou o interessado B..., insurgindo-se quanto à relacionação como benfeitoria da verba n.º 1, que pretende ver relacionada como bem comum; contra a relacionação da verba n.º 2, que entende dever ser excluída, atenta a natureza de bem próprio do reclamante; acusando a omissão de relacionação dos dois imóveis que identifica e que diz terem sido adquiridos a título oneroso na constância do casamento à irmã da cabeça de casal, tratando-se de duas verbas que a esta (à sua ex-cunhada, e não ao ex-cônjuge) haviam sido adjudicadas no inventário que correu termos por óbito da mãe de ambas; mais acusando a falta de relacionação das benfeitorias realizadas e suportadas pelo casal naquela que foi a casa de morada de família e que é bem próprio da cabeça de casal; defendendo finalmente o entendimento de que deverão ser excluídas da relação de bens as verbas do passivo numeradas de 2 a 7, por se tratar de dívidas pessoais de um cônjuge ao outro e alegada dívida dos alimentos fixados aos dois filhos menores do casal, que aqui não têm a sua sede própria (als. A) a D). Com a reclamação não indicou prova.
À reclamação apresentada respondeu a cabeça de casal (articulado de resposta aqui certificado de fls. 86 a 89), afirmando a correcção da relação de bens apresentada, não tendo igualmente oferecido qualquer meio probatório.
Invocando o disposto no n.º 3 do art.º 1349.º, apresentou o reclamante novo articulado, em resposta à resposta que havia sido apresentada pela cabeça de casal, nele reiterando quanto alegara na sua reclamação, aproveitando para aditar alguns novos facto, e acusando inovadoramente a falta de relacionação de títulos PPR existentes, quer em seu nome, quer da nome do requerido, quer da cabeça de casal.
Desta feita juntou documentos, protestou juntar certidão extraída do aludido inventário que correu termos por óbito da mãe da cabeça de casal, e arrolou 12 testemunhas.
Presentes os autos à Mm.ª juíza, exarou esta o seguinte despacho (Transcrição):
“Apresentada que foi a relação de bens pela cabeça de casal a fl. 40 e ss., veio o interessado B... da mesma reclamar nos termos que resultam de fls. 101 e seguintes peticionando, ademais, que seja considerado bem comum aquele a que se refere a verba n.º 1, que seja considerado bem próprio do reclamante aquele a que se refere a verba n.º 2, e acusando a falta dos bens por si melhor identificados no art.º 3.º da sua reclamação.
Na sequência de tal reclamação veio a cabeça de casal, ao abrigo do art.º 1349, n.º 1 do CPC, pronunciar-se nos termos que constam de fls. 115 e seguintes, pugnando pela correcta relacionação dos bens na relação por si apresentada e negando a existência de outros bens comuns a partilhar.
Veio entretanto o reclamante, a fls. 119 e ss., responder à pronúncia da cabeça de casal, ao abrigo, segundo anuncia, do art.º 1349.º, n.º 3 do CPC.
Sucede que não lhe estava conferida tal faculdade.
De facto, preceitua o n.º 1 do art.º 1349.º do CPC que, quando seja deduzida reclamação contra a relação de bens, é o cabeça de casal notificado para relacionar os bens em falta ou dizer o que se lhe oferecer sobre a matéria da reclamação, no prazo de 10 dias, dispondo o n.º 3 do art.º 1349.º do mesmo diploma que se o cabeça de casal não confessar a existência dos bens cuja falta foi acusada (e, acrescentamos nós, nem aceitar as alterações à relação de bens propostas pelo reclamante), notificam-se os restantes interessados com legitimidade para se pronunciarem.
Ora, decorre de tais preceitos que ao reclamante não assiste o direito de resposta (por via de requerimento) à resposta apresentada pela cabeça de casal à reclamação feita por aquele contra a relação de bens.
De tal resulta que o requerimento de fls. 119 e ss., na parte relativa aos seus pontos A a D, não possa ser atendido nos autos, por configurar a prática de um acto que a lei não admite, não podendo também atender-se aos meios de prova aí indicados que visem a instrução da reclamação por si apresentada a fls. 101 e ss., por ser a mesma extemporânea, nos termos do art.º 1349.º, n.º 3, e 1344.º, n.º 2, ambos do CPC, posto que deveriam os mesmos ter sido indicados aquando da apresentação da reclamação (…).
Em face do exposto, determino o desentranhamento do requerimento de fls. 119 e ss., no que respeita aos seus pontos A e D e indicação dos meios de prova que visem instruir a reclamação apresentada a fls. 101 e ss.
Custas do incidente a cargo do interessado, fixando-se a taxa de justiça devida no mínimo legal”.
Inconformado com o decidido, veio o reclamante B... interpor recurso e, tendo produzido pertinentes alegações, rematou-as com as seguintes necessárias conclusões:
“1ª.- A reclamação contra a relação de bens visa, obviamente a Relação e tem como escopo o que consta do nº. 1 do artº. 1.348º do C.P.C.;
2ª.- Da leitura dos artigos 1.348º e 1.349º do C.P.C. “pressente-se”-salvo o devido respeito, mais uma discussão das partes em articulados normais, equivalentes aos que constam de um processo Ordinário, do que estarmos na presença de qualquer Incidente de Instância;
3ª.- Incidente, a existir, ocorrerá a partir do momento em que (e se) o juiz do Processo ordenar a produção de prova e o seu oferecimento;
4ª.- É a partir daqueles “articulados” – isto é: após a relação de bens, a reclamação contra a relação, a eventual não confissão do Cabeça-de-Casal e após a pronúncia dos “restantes interessados” (com exclusão óbvia, apenas do Cabeça-de-Casal) – que se inicia o verdadeiro Incidente;
5ª.- O caso é, com a devida vénia, análogo ao referido no nº. 2 do artigo 1.347º do C.P.C.;
6ª.- O artigo 1.348º, seu nº. 6, ajuda a compreender a nossa posição pois protela, sem qualquer entrave, para “posteriormente”, a faculdade de oferecer a reclamação à Relação de Bens. Exceptua-se a hipótese de aplicação de multa;
7ª.- E o conteúdo da palavra INTERESSADOS, deverá ser, a nosso ver, devidamente explicada pois:
a) ao referir-se, no plural, a interessados e a reclamações a lei parece envolver todos os interessados, com excepção do Cabeça-de-Casal, e todas as reclamações apresentadas;
b) num Inventário para partilha de bens na sequência da dissolução do casamento só há, além do Cabeça-de-Casal um interessado e a lei (secção IX, artº. 1.444º do C.P.C.) segue, sem excepções “os termos previstos nas secções anteriores”;
8ª.- Isto é: a entender-se o douto despacho de outra forma, teria este Inventário Especial de ser amputado não só do disposto no nº. 6 do artº. 1.348º do C.P.C., como de ser entendido, com restrições que não constam da lei, o disposto no nº. 3 do artº. 1.349º (pois não haveria restantes interessados) nem já haveria possibilidade de oferecer provas (ao menos testemunhais) nem, em consequência, haveria hipótese de dar oportunidade a remeter os interessados para o artigo seguinte (a parte final do nº. 3 remete para o artigo seguinte que diz respeito aos meios comuns);
9ª.- É, por isso, muito mais prudente e revela muito mais equilíbrio na protecção do “espírito que provida à génese do Inventário para partilhas de bens” a posição de Carvalho de Sá, in Partilhas Judiciais 1996, I, pág. 504 e 505 pois protege os interessados e uma distribuição igualitária dos bens, obedece à lei que permite as reclamações “posteriormente”, evita a inconsequência de se permitir a apresentação “posterior” sem permitir o oferecimento de provas (ao menos testemunhal);
10ª.- Tanto mais que, no caso presente se imporia até, não o desentranhamento do requerimento apresentado com a consequente recusa de provas (cujas implicações posteriores ao nível do caso julgado se ignoram), mas sim a remessa dos interessados (Cabeça-de-Casal e ora recorrente) para os meios comuns, atenta a complexidade das questões levantadas, questões que decorrem quase instintivamente, e sem necessidade de se produzir prova, dos requerimentos de reclamação. Duvida-se até que não haja uma certa contradição entre a ordem de desentranhamento e o consentimento de admissão de prova testemunhal no que se refere ao conteúdo da al. E do requerimento de fls...
11ª.- O mero desentranhamento do requerimento/reclamação, com o referido Rol de Testemunhas como prova, pode ter sérias implicações, de futuro, como assunto definitivamente resolvido com força de caso julgado material – duvidando-se embora se pode ser essa a consequência do mero desentranhamento;
12ª.- Violaram-se ou fez-se má interpretação de todos os artigos legais referidos nas conclusões.
Com os aludidos fundamentos, pede a final a revogação do despacho recorrido, o qual deve ser substituído por outro que admita as reclamações e a prova oferecida e, após, com ou sem produção de prova, e se disso for caso, se remetam os interessados para os meios comuns, atenta a complexidade das questões suscitadas e as óbvias maiores garantias associadas a esta tramitação.
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Sabido que pelas conclusões se delimita o objecto do recurso (art.º 684.º n.º 3 e n.º 1 do art.º 685.º-A do CPC) e que, ressalvadas as de conhecimento oficioso, não compete a este Tribunal de Recurso conhecer de matérias novas não submetidas à 1.ª instância, constitui única questão a decidir saber se ao interessado reclamante que não indicou prova com a reclamação que apresentou à relação de bens lhe é permitido fazê-lo em momento posterior, em articulado de réplica à resposta oferecida pela cabeça de casal.
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II. Fundamentação
Estando em causa inventário para partilha dos bens comuns na sequência de divórcio, atenta a data da sua instauração, rege o disposto no art.º 1404.º do CPC e, por força da remissão operada pelo n.º 3 do preceito, as regras relativas ao processo especial de inventário, de cuja tramitação se ocupa todo o Cap. XVI.
Interessando à decisão os factos, tal como se deixaram relatados em I., em causa está a interpretação a dar ao disposto no n.º 3 do artigo 1349.º, na sua articulação com o preceituado no art.º 1348.º e n.º 2 do art.º 1344.º, dispositivo para o qual remete aquele primeiro normativo, pertencendo todos os preceitos ao CPC[1] [2], na versão do DL 329-A/95, de 12/12.
Consoante prevê o n.º 1 do art.º 1348.º, apresentada a relação de bens, são os interessados notificados de que podem reclamar contra ela, no prazo de 10 dias, acusando a falta de bens que devam ser relacionados, requerendo a exclusão de bens que o tenham sido indevidamente, ou ainda arguindo qualquer inexactidão na descrição de bens que releve para a partilha.
Deduzida reclamação contra a relação de bens, é o cabeça de casal notificado para relacionar os bens em falta ou dizer o que se lhe oferecer sobre a matéria da reclamação, no prazo de 10 dias (vide n.º 1 do art.º 1349.º). Face a tal notificação, duas posições pode o cabeça de casal assumir: ou confessa a existência dos bens cuja falta foi acusada, caso em que os relaciona de imediato ou no prazo que lhe for concedido, ou não confessa. Nesta última hipótese, serão notificados os restantes interessados com legitimidade para se pronunciarem, aplicando-se o disposto no n.º 2 do art.º 1344.º e decidindo o juiz da existência dos bens ou pertinência da sua relacionação, sem prejuízo do disposto no art.º 1350.º, que previne para os casos da insuficiência de provas.
Do regime legal assim desenhado, e em contrário do que pretende o apelante, resulta claro que estamos perante um incidente, cuja tramitação, no que não estiver especificamente regulado, se rege pelas disposições dos artigos 302.º a 304.º.[3] Com efeito, basta atentar em quanto dispõe o citado art.º 1350.º, ao prevenir as hipóteses de “a complexidade da matéria de facto subjacente às questões suscitadas tornar inconveniente (…) a decisão incidental das reclamações previstas no artigo anterior”, caso em que o juiz se deve abster de decidir “e remete[r] as partes para os meios comuns”. Estamos pois, sem dúvida, perante um incidente, desde o momento em que seja oposta reclamação à relação de bens, não encontrando qualquer apoio na lei o entendimento expresso pelo apelante no sentido da instância incidental ter o seu início apenas e só quando (e se) o juiz determinar a produção de prova e o seu oferecimento.
Conforme resulta das citadas disposições legais -n.º 1 do art.º 1348.º e n.º 1 do art.º 1349.º- o assim denominado incidente da reclamação comporta duas peças processuais, o requerimento inicial e a resposta, nos quais devem ser indicadas as provas, ex vi da remissão do n.º 3 do art.º 1349.º para o n.º 2 do art.º 1344.º, e isto sob pena de preclusão[4].
Com efeito, embora a notificação a que alude o n.º 3 do art. 1349.º não se destine ao reclamante e ao cabeça-de-casal, mas aos “restantes interessados”, conforme sem dissêndio vem sendo entendido, a remissão aí feita para o n.º 2 do art. 1344.º deve considerar-se como um princípio geral, “a seguir quanto a todos os interessados, face ao salutar princípio da “igualdade de armas”[5]. Aliás, à mesma solução se chegaria por aplicação do regime dos incidentes, sendo este o ónus que o n.º 1 do art.º 303.º faz recair sobre as partes.
Pretende o apelante que lhe seria permitido o oferecimento de um terceiro articulado -de resposta à resposta da cabeça de casal- nele podendo indicar os meios de prova a produzir, uma vez que terá de se considerar igualmente interessado para os efeitos previstos no n.º 4 do citado art.º 1349.º.
Não tem, contudo, claramente razão, bastando para tanto atentar na literalidade do preceito. Com efeito, depois de prever a notificação da cabeça de casal para responder à reclamação apresentada, o n.º 3 tem como destinatários outros interessados -que não o reclamante, que já se pronunciou sobre a relação de bens- e, dentre estes, apenas aqueles a quem for conferida legitimidade para se pronunciar. Com efeito, admitir que o reclamante pudesse replicar e, cumulativamente, suprir neste articulado a omissão de indicação dos meios de prova não oferecidos com a reclamação[6], seria colocá-lo em posição processual mais favorável do que os demais intervenientes, assim resultando violado o princípio da igualdade de armas, pressuposto de um processo que se quer justo e equitativo, o que a lei não permite e a letra do preceito não consente (cf. n.º 2 do art.º 9.º, este do Código Civil).
Objecta o apelante que no caso do inventário para partilha de bens comuns na sequência de divórcio, como é o caso, a não se admitir que o reclamante se possa pronunciar sobre a resposta da cabeça de casal ao abrigo do aludido n.º 3 a norma fica esvaziada de sentido, uma vez que nunca existirá mais do que um interessado. Tal objecção, contudo, não procede, e isto por duas ordens de razões fundamentais: em primeiro lugar, este processo de inventário é especialíssimo em confronto com o processo especial de inventário, donde serem de aplicar as normas deste último no que, obviamente, for aplicável; depois, não é exacto que num inventário para separação de meações não possa haver mais do que um interessado -vejam-se as hipóteses previstas no art.º 1406.º- tal como, inversamente, bem pode acontecer que num inventário destinado a pôr termo à comunhão hereditária exista, para além do cabeça de casal, apenas um outro interessado, aí se quedando igualmente sem aplicação o normativo em análise.
Por outro lado, permitindo o n.º 6 do art.º 1348º que as reclamações contra a relação de bens sejam apresentadas em momento posterior, incorrendo embora o reclamante em multa pela reclamação tardia, salvo se não houver culpa da sua parte, a aplicação deste preceito não está aqui em causa, uma vez que o recorrente reclamou em tempo, embora sem fazer indicação de qualquer meio de prova. Por assim ser, admitiu a Mm.ª Juíza -e bem- a nova reclamação acusando a falta de relacionação dos PPR’s, mas já não admitiu -também bem- a réplica à resposta da cabeça de casal (à reclamação inicial) e meios de prova só ali oferecidos mas que se destinavam a fazer prova dos factos inicialmente alegados (deixando todavia claro que seriam admitidos os que se destinassem à demonstração da matéria atinente à nova reclamação). Daí que também não assista razão ao apelante quando diz surpreender alguma contradição entre os dois segmentos da decisão, uma vez que as questões neles decididas são efectivamente distintas: no que respeita à decisão recorrida, a reclamação havia sido apresentada no momento processualmente adequado, embora sem indicação dos meios de prova; no segmento não impugnado, a Mm.ª juíza admitiu, sancionando embora o apresentante com multa nos termos do n.º 6 do art.º 1348.º, a reclamação então apresentada e prova que se destine à comprovação dos respectivos fundamentos. Nenhuma contradição, portanto.
Improcedem assim as conclusões 1.ª a 8.ª.
Finalmente, defendendo o entendimento de que, no caso em apreço, as partes deverão ser remetidas para os meios comuns dada a complexidade das questões suscitadas e que os articulados revelam, sem necessidade de produção de qualquer prova (conclusões 9.ª a 12.ª), requer seja proferida por este Tribunal decisão que tal determine.
Pois bem, já se disse que os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais, através dos quais a parte cuja posição não foi acolhida se manifesta contra o decidido. Tal é o que resulta claramente do disposto no n.º 1 do art.º 676.º, quando dispõe que “as decisões judiciais podem ser impugnadas por meio de recursos” e ainda do preceituado nos art.ºs 680.º, n.º 1, que se ocupa da legitimidade para recorrer e 684.º, n.ºs 2 e 3, que regulamenta a matéria da delimitação objectiva do recurso [artigo 684º, n.º 2 e 3, do CPC]. Se o recurso visa a impugnação de uma decisão proferida, vedado está ao recorrente servir-se deste meio de impugnação para suscitar questões novas -deduzir novos pedidos ou deduzir novos meios de defesa (ressalvados os casos, que aqui não relevam, da lei permitir ou impor o seu conhecimento oficioso).
Vem tal consideração a propósito das últimas conclusões de recurso e pretensão a final formulada pelo recorrente, que não podem deixar de se considerar questões novas, uma vez que o Tribunal “a quo” delas não se ocupou nem, de resto, teria que se ter ocupado, uma vez que ainda não havia chegado o momento processualmente adequado para o efeito. Com efeito, completada a fase dos articulados -oposição e resposta- o juiz pode tomar uma de três decisões: decidir definitivamente, nos termos do n.º 1 do art.º 1326.º; abster-se de decidir e remeter as partes para os meios comuns, nos casos previstos no n.º 2 do preceito, consoante autoriza o n.º 1 do art.º 1350.º; ou proferir decisão provisória nos termos consentidos pelo n.º 3. Uma vez tomada a decisão, poderá naturalmente o agora recorrente insurgir-se contra ela caso seja desfavorável à sua pretensão, o que não pode é pretender que este Tribunal se antecipe à decisão a proferir pela 1.ª instância. Daí a improcedência das derradeiras conclusões.
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III Decisão
Em face a todo o exposto e na improcedência do recurso interposto pelo requerido B... mantenho na íntegra o despacho recorrido.
Custas a cargo do apelante.

[1] Diploma a que pertencerão as demais disposições que vierem a ser citadas sem menção da sua origem.
[2] Na versão posterior aos Decretos-Lei nºs 227/94, de 8 de Setembro, e 3/95, de 14 de Janeiro (artigo 11.º do Decreto-Lei nº 3/95, de 14 de Janeiro), sendo que as normas gerais da lei de processo aplicáveis são as emergentes da revisão operada pelo Decreto-Lei nº 329-A/95, de 12 de Dezembro).
[3] Assim, o aresto Relação de Lisboa de 5/9/2013, processo n.º 403/10.2 A.L1-6, disponível em www.dgsi.pt
[4] Acórdãos desta Relação de 25/5/2004, processo n.º 1486/04, assim sumariado: “Após a alteração ao CPC de 1995, preceitua o nº 1 do artº 1349º do CPC que quando seja deduzida reclamação contra a relação de bens, é o cabeça de casal notificado para relacionar os bens em falta ou dizer o que se lhe oferecer sobre a matéria da reclamação, no prazo de 10 dias, dispondo o nº 2 do artº 1344º do mesmo diploma que as provas são indicadas com os requerimentos e respostas. II – Não assiste ao reclamante (de bens) o direito de resposta (por via de requerimento) à resposta apresentada pelo c.c. à reclamação feita por aquele contra a relação de bens pelo último apresentada, devendo o reclamante indicar ou oferecer, com a sua reclamação, os meios de prova que entenda serem necessários para fazer valer a sua pretensão, sob pena de preclusão desse direito.” e de 8/11/2011, processo n.º 676/08.0 TBVNO-A.C1. Ainda no mesmo sentido acórdão da Relação de Évora de 20/10/2011, processo n.º 245/08-5 TBELV.A.E1, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
[5] Aresto da Rel. do Porto de 25 de Maio de 2006, processo 0632719, acessível no identificado sítio, de que se destaca o sumário “O reclamante contra a relação de bens tem o ónus de indicar as provas com o requerimento da reclamação, não o podendo fazer posteriormente, assim como o cabeça-de-casal o tem de fazer na resposta que eventualmente apresente”.
[6] Nesta hipótese, pergunta-se: seria de admitir que a cabeça de casal “treplicasse”, permitindo-lhe neste 4.º articulado que oferecesse os meios de prova? Tal não o prevê a lei em parte alguma, tal como não prevê que o juiz convide os interessados (aqui se incluindo a cabeça de casal) a apresentarem prova, solução consagrada no n.º 3 do art.º 1342.º do CPC 1961, na redacção anterior ao DL 227/94, de 8 de Setembro, mas que não passou para o regime emergente daquele diploma.