Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3906/16.1T8VIS.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FONTE RAMOS
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL BANCÁRIA
CONTRATO DE INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA
RESPONSABILIDADE PRÉ–CONTRATUAL
DEVER DE INFORMAÇÃO
INDEMNIZAÇÃO
Data do Acordão: 01/16/2018
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE VISEU - VISEU - JC CÍVEL - JUIZ 3
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE
Legislação Nacional: ARTS.289, 290, 293, 304, 312, 314, 323 CVM, 74 RGICSF, 227, 563, 762, 800 CC
Sumário: 1. Embora a comercialização de produto financeiro com informação de ter capital garantido responsabilize em primeira linha a entidade emitente do produto, não significa que essa responsabilidade não se estenda ao intermediário financeiro (Banco), se no relacionamento contratual que desenvolve com o cliente assumir também o reembolso do capital investido e juros.

2. Além desta responsabilidade contratual, existe responsabilidade pré-contratual por parte do Banco, em consequência da violação dos deveres não só do exercício da sua actividade de intermediário financeiro - nomeadamente os princípios orientadores consagrados no Código dos Valores Mobiliários (CVM), como sejam os ditames da boa fé, elevado padrão de lealdade e transparência -, como também da violação dos deveres de informação, assim fazendo incorrer o Banco Réu na responsabilidade prevista no art.º 314º, n.º 1 do CVM (in casu, na redacção anterior ao DL n.º 357-A/2007, de 31.10), sendo que, não ilidida a presunção de culpa do n.º 2 do mesmo art.º, incorre por essa via, igualmente, na obrigação de indemnizar os danos causados aos clientes (AA.).

Decisão Texto Integral:            

           

            Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

            I. AA (…) e mulher AM (…)instauraram, na Comarca de Viseu, a presente acção comum contra Banco B (…) , S. A., pedindo, a título principal, a condenação do banco Réu a pagar-lhes o capital de € 50 000 acrescido de juros vencidos no montante de € 7 000 e dos juros vincendos desde a citação até integral pagamento, e ainda € 3 000 a título de compensação por danos não patrimoniais, ou, no tocante àquele primeiro pedido, a declaração de nulidade de qualquer eventual contrato de adesão subjacente à aplicação dos € 50 000 (que os AA. entregaram ao banco Réu) em obrigações subordinadas SLN 2006, condenando-se o banco Réu na restituição de tal montante, acrescido de juros vencidos e vincendos.

            Alegaram, em síntese, terem investido € 50 000 em obrigações SLN 2006, o que fizeram na qualidade de clientes do banco Réu, e por a sua gerente lhes ter garantido tratar-se de uma aplicação em tudo similar a um depósito a prazo, com capital garantido e juros disponíveis de 6 em 6 meses; nunca lhes foram fornecidas quaisquer outras informações ou explicações sobre o investimento em causa, pelo que desconheciam estarem a subscrever produtos de risco; a conduta do banco Réu colocou-os num estado de permanente preocupação e ansiedade, com o receio de não reaverem, ou de não saber quando iam reaver o seu dinheiro.

             A Ré contestou, defendendo-se, por excepção, invocando a ineptidão da petição inicial, a incompetência territorial do tribunal e a prescrição por decurso do prazo de dois anos desde a conclusão da operação em discussão (a ter existido qualquer deficiência de informação por parte dos seus funcionários foi uma negligência ou culpa leve), e, por impugnação, considerando que o produto financeiro em causa era um produto seguro à data da sua subscrição, pelo que o incumprimento resultou de circunstâncias imprevisíveis e anormais, relacionadas com a própria nacionalização do banco, e bem assim que os AA. foram exaustivamente esclarecidos sobre as condições do produto financeiro em questão, e a sua subscrição não foi sujeita a qualquer contrato de adesão. Concluiu pela improcedência da acção e consequente absolvição do pedido.

            Os AA. responderam à matéria de excepção concluindo pela sua improcedência.

            Na audiência prévia foi proferido despacho saneador que julgou improcedentes as excepções de incompetência em razão do território e de ineptidão da petição inicial, relegou para final a apreciação da prescrição, firmou o objecto do litígio e enunciou os temas da prova.

            Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal a quo, por sentença de 18.4.2017, julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou o banco Réu no pagamento aos AA. da quantia de € 57 000 (cinquenta e sete mil euros), acrescida dos respectivos juros de mora, contados desde o dia 25.7.2016 (data da citação) até integral pagamento, à taxa de 4 % ao ano, bem como da quantia de € 2 500 (dois mil e quinhentos euros) a título de indemnização de danos não patrimoniais.
Inconformada, a Ré apelou formulando as seguintes conclusões:

            (…)

            Os AA. responderam concluindo pela improcedência do recurso.

            Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa apreciar e decidir: a) impugnação da decisão sobre a matéria de facto (erro na apreciação da prova); b) decisão de mérito, cuja modificação depende, sobretudo, da eventual alteração daquela decisão.


*

            II. 1. A 1ª instância deu como provados os seguintes factos:

            1 - Os autores eram clientes do B (…), S. A. (actualmente B (…) S. A.) na sua agência de X (...) , com a conta à ordem n.º 00 (...) , onde movimentavam parte dos dinheiros, realizavam pagamentos e efectuavam poupanças, depositando os autores confiança nos funcionários e gerente do Réu.

            2 - Em Abril/2006, uma funcionária do Réu da agência de X (...) propôs aos autores uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, e com capital garantido pelo B (...) , e com rentabilidade assegurada.

            3 - A dita funcionária do Réu sabia que os autores não possuíam qualificação, ou formação técnica que lhes permitisse, à data, conhecer os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar, por isso, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente, e ainda que os autores tinham um perfil conservador quanto ao investimento do seu dinheiro que, até então, sempre aplicaram em depósitos a prazo.

            4 - Na sequência da proposta supra mencionada, e após subscrição da “comunicação de cliente” pela autora cuja cópia consta de fls. 73, € 50 000 dos autores foram colocados em obrigações SLN 2006, sem que os autores soubessem em concreto o que era, desconhecendo inclusivamente que a SLN era uma empresa.

            5 - O que motivou a autorização, por parte dos autores, foi o facto de lhes ter sido dito pela funcionária que o capital era garantido pelo banco Réu, com juros semestrais, e que poderia levantar o capital e respectivos juros quando assim o entendessem, bastando avisar a agência com a antecedência de três dias.

            6 - Os autores actuaram convictos de que estavam a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as características e garantia de um depósito a prazo, no convencimento de que o Réu lhes restituiria o capital e juros quando lhos solicitasse, nunca tendo pretendido comprar obrigações SLN 2006, produto de risco em que o capital não era garantido pelo B (...) .

            7 - Os autores nunca tiveram a intenção de investir em produtos de risco, como era do conhecimento do gerente e funcionários do Réu.

            8 - Daí a convicção plena com que os autores ficaram da segurança da aplicação em causa, cujos juros foram sendo semestralmente pagos, o que transmitiu segurança aos autores.

            9 - Em Novembro/2015, o banco Réu deixou de pagar os juros respectivos.

            10 - O banco Réu atribui a responsabilidade pelo pagamento à SLN, entidade que os autores nem sabiam existir, pensando que se tratava de uma mera denominação da conta a prazo que o Réu utilizava.

            11 - Os autores desconheciam que tinham adquirido uma aplicação com características diferentes de um depósito a prazo.

            12 - Os autores não foram informados pelo gerente ou funcionários do Réu nem sobre a compra das obrigações subordinadas SLN 2006, nem sobre o que eram tais obrigações.

            13 - Nunca qualquer contrato foi lido aos autores, nem explicado, nem entregue cópia que contivesse cláusulas sobre obrigações subordinadas SLN, nem que contivesse prazos de resolução unilateral pelos autores, não lhes tendo sido entregue qualquer título demonstrativo de que possuíam obrigações SLN.

            14 - O prazo de maturidade das obrigações SLN 2006 subscritas pelos autores ocorreu em Maio/2016.

            15 - Na data de vencimento contratada, o Réu não lhes restituiu o montante que os autores lhe confiaram, sendo que na agência de X (...) lhes diziam que era melhor esperar até à maturidade das obrigações.

            16 - O Réu também não tem cumprido o pagamento dos juros acordados, uma vez que contrataram uma taxa de 4,5 % ao ano ilíquida, e foram pagos juros na ordem de 1 % desde Maio de 2009 e até à maturidade.[1]

            17 - O Réu foi apresentado pelos seus funcionários como garante da aplicação financeira em causa.

            18 - As orientações e comunicações internas existentes no B (...) , e que este transmitia aos seus comerciais nos respectivos balcões (que, por sua vez, as transmitiam aos clientes), consistiam em afirmar a segurança da aplicação financeira em causa, a sua solidez, a boa rentabilidade, e em assegurar que o banco garantia o capital investido.

            19 - O Réu pretendia que os seus funcionários tivessem especial empenho na colocação destes produtos e passassem a ideia de que aos mesmos não estavam associados quaisquer riscos quanto ao reembolso do capital e juros, garantindo ele próprio a satisfação de tais encargos.

            20 - Os autores ficaram impedidos de usar o dinheiro que investiram nas obrigações SLN 2006 como bem entendessem.[2]

            22 - A actuação do Réu tem colocado os autores num permanente estado de stress, preocupação e ansiedade, com o receio de não reaverem, ou de não saber quando iam reaver o seu dinheiro, o que lhes tem provocado ansiedade, tristeza.

            23 - O negócio mencionado em 4. constituiu um acto em que o Réu intermediou a aquisição do produto financeiro em causa, cumprindo ordens dadas pelos seus clientes (os autores) no sentido da subscrição de Obrigações SLN 2006.

            24 - Os autores recebiam extractos mensais periódicos, onde apareciam discriminadas as suas aplicações financeiras.

            25 - As obrigações SLN 2006 foram emitidas pela “SLN, SGPS, S. A.”, sociedade titular de 100 % do capital social do banco Réu, até Novembro/2008, altura em que foi nacionalizada.

            26 - As obrigações SLN 2006 consistiam em valores mobiliários emitidos em representação da dívida da sociedade emitente.

            27 - Até ao ano de 2015, os funcionários do Réu asseguravam ao autor o reembolso do valor reclamado.

            2. E deu como não provados os factos dos art.ºs:

            a) - 41º e 42º (estes dois últimos apenas no segmento não transposto para a petição inicial) da petição inicial;

            b) - 20º a 23º, 25º, 26º, 33º, 34º, 37º a 47º e 50º a 72º da contestação;

            c) - 95º a 98º, 139º e 145º do articulado de resposta às excepções.

            3. Cumpre apreciar e decidir com a necessária concisão.

            a) A Ré/recorrente insurge-se contra a decisão sobre a matéria de facto, invocando a prova pessoal e documental produzida nos autos e em audiência de julgamento - olvidando porventura algumas das exigências do art.º 640º do Código de Processo Civil/CPC[3]… -, pugnando para que se dê como não provada toda a matéria indicada em II. 1. 2. a 13., 16. a 19. e 22., supra.

            Independentemente dos eventuais “desvios” a exigências claramente previstas no citado normativo da Lei Processual Civil [nomeadamente, quanto à concretização exigida na alínea c) do n.º 1 do art.º 640º - veja-se, inclusive, que a própria recorrente afirma que «não pode deixar de discordar, de uma forma generalizada (sublinhado nosso), com a matéria de facto dada como provada, mormente aquela atinente às circunstâncias em que o produto em causa foi contratado» (fls. 96)], antolha-se assim fundamental saber se outra poderia/deveria ser a decisão do Tribunal a quo quanto à factualidade em causa.

            b) Esta Relação procedeu à audição da prova pessoal produzida em audiência de julgamento, conjugando-a com a prova documental junta aos autos.

            c) Pese embora a maior dificuldade na apreciação da prova (pessoal) em 2ª instância, designadamente, em razão da não efectivação do princípio da imediação[4], afigura-se, no entanto, que, no caso em análise, tal não obstará a que reanalise, designadamente, a credibilidade das testemunhas e verifique se os depoimentos foram apreciados de forma razoável e adequada.

            E na reapreciação do material probatório disponível por referência à factualidade em causa, releva igualmente o entendimento de que a afirmação da prova de um certo facto representa sempre o resultado da formulação de um juízo humano e, uma vez que este jamais pode basear-se numa absoluta certeza, o sistema jurídico basta-se com a verificação de uma situação que, de acordo com a natureza dos factos e/ou dos meios de prova, permita ao tribunal a formação da convicção assente em padrões de probabilidade[5], capaz de afastar a situação de dúvida razoável.

            (…)

            Tendo a Mm.ª Juíza analisado criticamente as provas e especificado os fundamentos que foram decisivos para a sua convicção (à luz dos critérios estabelecidos nos n.ºs 4 e 5 do art.º 607º), afigura-se, no entanto, que o “facto 16”, atento, principalmente, o teor da mencionada prova documental de fls. 22 a 24, 52 e 73, deverá ter o seguinte conteúdo:

            «16 - Foi contratada uma taxa de 4,5 % ao ano ilíquida no 1º semestre, uma taxa Euribor 6 meses + 1,15 % nos 2º a 10º semestres e uma taxa Euribor 6 meses + 1,50 % nos restantes semestres, tendo sido pagos os juros vencidos até Maio/2015 (9º ano) e ficando por pagar os restantes juros até à maturidade (vencidos em Novembro/2015 e Maio/2016 - 10º ano)

            Procede, pois, parcialmente a impugnação da decisão sobre a matéria de facto.

            5. Das questões enunciadas na decisão sob censura é irrecusável que a recorrente aceita a natureza do contrato (de intermediação financeira) referente a valores mobiliários celebrado entre as partes [enquadramento correcto face ao Código de Valores Mobiliários (CVM), aprovado pelo DL 486/99, de 13.11 e com sucessivas versões, mormente ao disposto nos seus art.ºs 289º, n.º 1; 290º, n.º 1, alíneas a) e b) e 293º, n.º 1, alínea a), sendo que a Ré nada objectou à factualidade do ponto II. 1. 23., supra] e também nada opôs à resposta de mérito (negativa) dada à matéria da excepção de prescrição do direito invocado pelos AA..

            Porém, a recorrente diz-se ainda inconformada quanto ao decidido a respeito - nas palavras por ela utilizadas - da “validade e violação desse contrato pelo réu, não apenas ao nível dos deveres de informação, mas também no âmbito da devolução do capital investido e seu rendimento” e dos “danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelos autores em consequência da conduta do réu”.

            6. De acordo com o art.º 800°, n.º 1, do Código Civil (CC), o devedor é responsável perante o credor pelos actos dos seus representantes legais ou das pessoas que utilize para o cumprimento da obrigação, como se tais factos fossem praticados pelo próprio devedor.

            Daqui decorre que a actuação da gerente do banco Réu vinculou aquele nos seus precisos termos, responsabilizandoo pelo inerente cumprimento.

            Tal é igualmente válido quanto à conduta pré-contratual em causa (fonte de responsabilidade também invocada pelos AA.).

            Com efeito, o caso vertente pode ser enquadrado na modalidade de responsabilidade précontratual ou culpa in contrahendo (art.º 227º do CC), desde logo porque, entre o mais, nos preliminares do contrato o Banco informou os AA. que garantia o retorno do capital (cf., sobretudo, II. 1., 2., 5., 6., 8., 17., 18. e 27., supra).[6]

            O enquadramento jurídico dos factos dados como provados deverá partir dos vulgarmente denominados deveres de informação, lealdade, cuidado com valores alheios e boa fé do banco em relação ao cliente.

            À data da subscrição das obrigações em causa as normas que convocam ao cumprimento de tais deveres reconduziam-se ao art.º 227º do CC, que nos remete para o dever pré-contratual de informação, que recai sobre a instituição financeira na formação do contrato, à luz do princípio da boa fé.

            Mais especificamente, previa o art.º 74º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF), na sua redacção original (do DL n.º 298/92, de 31.12), que “Nas relações com os clientes, os administradores e os empregados das instituições de crédito devem proceder com diligência, neutralidade, lealdade e discrição e respeito consciencioso dos interesses que lhes estão confiados.[7]

            Essencialmente decorria então do n.º 1 do art.º 75º, alusivo ao “dever de informação” que “As instituições de crédito devem informar os clientes sobre a remuneração que oferecem pelos fundos recebidos e sobre o preço dos serviços prestados e outros encargos suportados por aqueles”.[8]

            Saliente-se que a propósito do critério de diligência, dispunha o então art.º 76º que “Os membros dos órgãos de administração das instituições de crédito, bem como as pessoas que nelas exerçam cargos de direcção, gerência, chefia ou similares, devem proceder nas suas funções com a diligência de um gestor criterioso e ordenado, de acordo com o princípio da repartição de riscos e da segurança das aplicações, e tendo em conta o interesse dos depositantes, dos investidores e dos demais credores”.[9]

            Nas subsequentes alterações legislativas estes deveres de informação e lealdade foram densificados neste diploma (à semelhança do sucedido com o Código dos Valores Mobiliários/CVM), nomeadamente pela redacção conferida ao art.º 77º, em 2008 e 2015.

            7. Na verdade, (também) o Código dos Valores Mobiliários (desde a sua redacção originária conferida pelo DL n.º 486/99, de 13.11) sempre conteve várias normas de protecção ao investidor não qualificado (como os AA. - cf., por exemplo, II. 1., 3., supra), impondo ao intermediário financeiro uma multiplicidade de deveres visando permitir ao cliente formar um juízo esclarecido acerca da adequação do investimento.

            O DL n.º 357-A/2007, de 31.10, aditou ao CVM várias disposições legais que densificaram, entre outros, deveres de conduta já anteriormente previstos e que relevam no presente caso.[10]         

            Ao nível dos princípios, o art.º 304º do CVM (na redacção conferida pelo DL n.º 52/2006, de 15.3) previa que: Os intermediários financeiros devem orientar a sua actividade no sentido da protecção dos legítimos interesses dos seus clientes e da eficiência do mercado (n.º 1). Nas relações com todos os intervenientes no mercado, os intermediários financeiros devem observar os ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência (n.º 2). Na medida do que for necessário para o cumprimento dos seus deveres, o intermediário financeiro deve informar-se sobre a situação financeira dos clientes, a sua experiência em matéria de investimentos e os objectivos que prosseguem através dos serviços a prestar (n.º 3). Estes princípios e os deveres referidos nos artigos seguintes são aplicáveis aos titulares do órgão de administração do intermediário financeiro e às pessoas que efectivamente dirigem ou fiscalizam cada uma das actividades de intermediação (n.º 5).

            É também isso que resultava do art.º 312º daquele diploma, na sua redacção inicial, quando previa, a respeito dos deveres de informação: O intermediário financeiro deve prestar, relativamente aos serviços que ofereça, que lhe sejam solicitados ou que efectivamente preste, todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, incluindo nomeadamente as respeitantes a: a) Riscos especiais envolvidos pelas operações a realizar; b) Qualquer interesse que o intermediário financeiro ou as pessoas que em nome dele agem tenham no serviço prestado ou a prestar; c) Existência ou inexistência de qualquer fundo de garantia ou de protecção equivalente que abranja os serviços a prestar; d) Custo do serviço a prestar (n.º 1). A extensão e a profundidade da informação devem ser tanto maiores quanto menor for o grau de conhecimentos e de experiência do cliente (n.º 2). A circunstância de os elementos informativos serem inseridos na prestação de conselho, dado a qualquer título, ou em mensagem promocional ou publicitária não exime o intermediário financeiro da observância dos requisitos e do regime aplicáveis à informação em geral (n.º 3).

            A temática dos deveres de informação era de tal forma negligenciada na prática que o legislador teve a necessidade de, em 2007, aditar vários normativos (art.ºs 312º-A a 312º-G; 314º-A a 314º-C e 323º-A a 323º-D) especificando os múltiplos aspectos e variantes em que os mesmos se deviam concretizar.

            Também ao nível da execução de ordens no âmbito de contratos de intermediação financeira o art.º 323º, na redacção aqui aplicável (primitiva), previa que “além dos deveres a que se refere o artigo 312º, o intermediário financeiro deve informar os clientes com quem tenha celebrado contrato sobre: a) A execução e os resultados das operações que efectue por conta deles; b) A ocorrência de dificuldades especiais ou a inviabilidade de execução da operação; c) Quaisquer factos ou circunstâncias de que tome conhecimento, não sujeitos a segredo profissional, que possam justificar a modificação ou a revogação das ordens ou instruções dadas pelo cliente”.

            O próprio art.º 314º, no seu n.º 2 (redacção originária), referia em particular a violação de deveres de informação.

            8. E a doutrina também se tem debruçado sobre estas matérias desde há largos anos.

            Com pertinência para o caso em análise, importa referir, por exemplo, o expendido por Agostinho Cardoso Guedes: “Sempre que alguém se dirige a um banco para com ele celebrar um contrato (um depósito bancário, um empréstimo, a compra de títulos da sociedade proprietária do banco, um desconto, um empréstimo hipotecário, depósito de títulos etc.) e se inicie uma actividade comum dos contraentes destinada à análise e elaboração do projecto de negócio não parece restar qualquer dúvida que qualquer dos contraentes fica imediatamente vinculado aos deveres resultantes do art.º 227º e, consequentemente, o banco pode ser obrigado a prestar informações ou conselhos ou, quando tal dever não surja por força do dever de agir com boa-fé, responsabilizado, ainda assim, por informações ou conselhos inexactos (desde que, com esse comportamento, se violem outros deveres de conduta, tal como acontecia com os deveres laterais de origem contratual de que resultem danos”; “…o problema da responsabilidade por informações como problema autónomo, colocase, principalmente, quando o dador aparece, perante o destinatário, portador de qualidades específicas que o habilitam a fornecer tais informações, as quais induzem o mesmo destinatário a nelas fazer fé. No caso do banco, o cliente presume uma competência e organização, uma profissionalização específica, que os bancos objectivamente possuem”.[11]

            Em idêntico sentido, Menezes Cordeiro afirma que no caso dos bancos, atenta a sua natureza e organização específica, o dever de informação tem um carácter acentuado (intenso), visando a protecção da parte débil no contrato, sendo que “a fraqueza apurase, aqui, pela falta de conhecimento e de experiência do utente do banco ou pela ausência de liberdade” e em que a “protecção da parte fraca efectivase através de particulares deveres de informação e de esclarecimento, a cargo da parte forte”.[12]

            O referido entendimento surge como corolário da protecção do princípio da confiança que está subjacente a toda a problemática da responsabilidade por informações prestadas pelos bancos, quando contratam com os respectivos clientes ou nos preliminares de tais contratos, atento o já mencionado dever especial de diligência que sobre aqueles (bancos) impende, atentos os especiais fins que estão inerentes à sua actividade e decorrentes da sua especial orgânica e profissionalização.[13]

            E Luís Menezes Leitão acrescenta que mesmo nos casos em que o banco presta conselhos ou recomendações sobre negócios (consultoria em relação a decisão de investimento, intermediação em operações sobre valores mobiliários, etc.) mesmo neste âmbito, sempre que a informação prestada tenha um cariz objectivo, se deve presumir a culpa do banco nos termos do art.º 799 do CC, que, “como entidade especializada na matéria se compromete à prestação de informações exactas, cabendo a ele ilidir sempre essa presunção com a demonstração de que o cumprimento defeituoso não procede de culpa sua”.[14]

            9. Com vimos, já na sua versão original, o art.º 312º do CVM impunha ao intermediário financeiro que prestasse “todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada”, nomeadamente as respeitantes a riscos especiais envolvidos nas operações a realizar [anterior n.º 1, alínea a) - actual n.º 1, alínea e)].

            Ora, a factualidade provada nos autos permite e impõe concluir por uma manifesta e grave violação de tais deveres por parte do banco Réu (cf., designadamente, II. 1. 3., 4., 7., 10., 11., 12. e 13., supra).

            Desta violação resulta a obrigação de indemnizar os danos causados, seja ao abrigo do disposto no art.º 762º, n.º 2, do CC, donde se exige às partes que actuem de boa fé na execução do contrato, seja no âmbito de aplicação do art.º 227º, n.º 1 do CC, no momento prévio à formação do contrato, donde se exige que as partes contratantes procedam segundo as regras da boa fé.

            Nos termos do art.º 314º, do CVM (redacção primitiva, aqui aplicável) os intermediários financeiros são obrigados a indemnizar os danos causados a qualquer pessoa em consequência da violação de deveres respeitante ao exercício da sua actividade, que lhes sejam impostos por lei ou por regulamento emanado de autoridade pública (n.º 1); A culpa do intermediário financeiro presume-se quando o dano seja causado no âmbito de relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado pela violação de deveres de informação (n.º 2.

            Com efeito, a responsabilidade do intermediário financeiro a que alude o art.º 314º do CVM, apresenta-se desde logo (embora não exclusivamente) como uma responsabilidade contratual, cujos pressupostos estão definidos pelo art.º 798º do CC, sendo a causa de tal responsabilidade a violação do dever de informação a que estão obrigados os bancos, definido no citado art.º 75º, n.º 1 do RGICSF.[15]

               10. No caso vertente não é a entidade emitente quem dá a informação de capital garantido, mas antes o banco Réu, na forma que ficou demonstrada (cf., sobretudo, II. 1., 2., 17. e 18., supra).

            Tem-se entendido que embora a comercialização de produto financeiro com informação de ter capital garantido responsabilize em primeira linha a entidade emitente do produto, não significa que essa responsabilidade não se estenda também ao intermediário financeiro, se no relacionamento contratual que desenvolve com o cliente, assumir em nome desse relacionamento contratual também o reembolso do capital investido. E, além desta responsabilidade contratual, existe também responsabilidade extracontratual por parte do banco réu, em consequência da violação dos deveres, não só do exercício da sua actividade de intermediário financeiro, nomeadamente os princípios orientadores consagrados no art.º 304 do CVM, como sejam os ditames da boa fé, elevado padrão de diligência, lealdade e transparência, como também da violação dos mais elementares deveres de informação a que aludem os art.ºs 7º, n.º 1 e 312º, n.º 1, do CVM, fazendo, assim, incorrer o banco réu na responsabilidade, a que alude o art.º 314º, n.º1, do CVM, e, não ilidindo a presunção legal de culpa do n.º 2 do citado art.º 314º, incorrendo por essa via também na obrigação de indemnizar os danos causado aos AA..[16]

            11. Relativamente ao preenchimento dos pressupostos da responsabilidade contratual decorrente do acordo de garantia do capital e juros feito com o cliente, tem-se por verificada a ilicitude (atenta a violação do dever de informação e da garantia do capital e de juros) e a culpa (que se presume nos termos dos art.ºs 799º, n.º 1 do CC e 314º, n.º 2 do CVM).

            Quanto ao nexo causal entre o facto e o dano, este não só se deve ter por abrangido pela presunção do art.º 799º, n.º 1 do CC[17], como se encontra amplamente provado.

            Como tem salientado a jurisprudência, atendendo ao disposto no art.º 563º do CC, o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação e o dano causado aos AA. está demonstrado quando em face dos sobreditos factos podemos concluir que se os deveres de informação tivessem sido cumpridos, os AA. não teriam investido naquelas aplicações.[18]

            Resulta evidente que se esses deveres tivessem sido devidamente cumpridos os AA. não teriam realizado tal aplicação de capital e, assim, não teriam sofrido os riscos e prejuízos subsequentes, pelo que a causa do prejuízo não foi a nacionalização da instituição bancária (ou de forma ainda mais abrangente a crise financeira de 2008), pois o prejuízo dos AA. decorre da informação enganosa prestada.

            Assim, a inobservância dos deveres de informação pelo banco Réu na aquisição dos produtos financeiros em causa, torna-o responsável pelos prejuízos causados aos AA. (art.º 314º, n.º 1 do CVM) e o valor do dano a ressarcir será o correspondente ao capital investido (€ 50 000), que o banco Réu assegurou aos AA. que era garantido e sem risco, acrescido dos juros remuneratórios em falta, igualmente garantidos, referentes ao último ano da aplicação - é neste particular (montante/cômputo dos juros remuneratórios) que assiste razão à recorrente, atenta a modificação introduzida à matéria de facto do ponto 16. dos factos dados como provados (cf. II. 1. 9. e 14. e II. 4., in fine, supra).

            12. O banco Réu estava obrigado, a prestar informação respeitante a instrumentos financeiros, de forma completa, verdadeira, actual, clara e objectiva (art.º 7º, n.º 1, do CVM) e não o fez; estava obrigado a orientar a sua actividade no sentido da protecção dos legítimos interesses dos seus clientes, e a observar os ditames da boa fé, de acordo com elevados padrões de lealdade e transparência, o que não observou (art.º 304º, n.ºs 1 e 2, do CVM); tinha deveres de prestar todas as informações necessárias para uma tomada de decisão esclarecida e fundamentada, sobretudo perante um investidor não qualificado, e igualmente não os respeitou, nomeadamente as relativas aos riscos especiais envolvidos nas operações a realizar (art.º 312º, n.º 1, a) - alínea e) actual - e n.º 2 do CVM).

            Todos estes princípios, derivados, obviamente, do princípio fundamental da boa fé, (como se referiu) levaram a doutrina a defender a responsabilidade civil dos bancos, nomeadamente na veste de intermediários financeiros, quando desrespeitassem tais deveres gerais.

            E o legislador por esse caminho seguiu, densificando os conceitos mais gerais, através da introdução dos correspondentes normativos, designadamente nos actuais art.ºs 312º, n.º 1, d), e 312º-E, n.ºs 1 e 2, a), do CVM (na redacção dos DL n.ºs 357-A/2007, de 31.10 e 63-A/2013, de 10.5), a propósito da informação pormenorizada relativa a instrumentos financeiros, seu tipo, sua natureza e seus riscos, incluindo risco de perda da totalidade do investimento.[19]

            13. Como vimos, a responsabilidade do banco Réu situa-se numa zona intermédia entre a responsabilidade contratual e a extracontratual, sendo que o art.º 314º do CVM não distingue quais os danos indemnizáveis, no sentido de os restringir aos patrimoniais.

            São compensáveis os danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (art.º 496º, n.º 1, do CC).  

            Os danos não patrimoniais não são por sua própria natureza passíveis de reconstituição natural e, em rigor, não são indemnizáveis mas apenas compensáveis pecuniariamente, compensação que não é o preço da dor ou de qualquer outro bem não patrimonial, mas, sim, uma satisfação concedida ao lesado para minorar o seu sofrimento ou “que contrabalance o mal sofrido”.       

            A lei remete a fixação do montante indemnizatório por estes danos para juízos de equidade, haja mera culpa ou dolo (art.º 496°, n.º 3, 1ª parte, do CC[20]), tendo em atenção os factores referidos no art.º 494°, do CC.

            Desde há muito se firmou o entendimento de que, em razão da extrema dificuldade e delicadeza da operação de “quantificação” dos danos não patrimoniais e não obstante a infinita diversidade das situações, dever-se-ão ter presentes os padrões usuais de indemnização estabelecidos pela jurisprudência corrigidos por outros factores em que se atenda à época em que os factos se passaram, à desvalorização monetária, etc.[21]

            Assim, o julgador deve ter em conta todas as regras de boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida, sem esquecer a natureza mista da reparação, pois visa-se reparar o dano e também punir a conduta.

            A indemnização por danos não patrimoniais não se destina obviamente a repor as coisas no estado anterior, mas tão-só a dar ao lesado uma compensação pelo dano sofrido, proporcionando-lhe situação ou momentos de prazer e alegria que neutralizem, quanto possível, a intensidade da dor física ou psíquica sofrida.[22]

            Para a determinação da compensação por danos não patrimoniais, o tribunal há-de assim decidir segundo a equidade, tomando em consideração a culpabilidade do agente, a dialéctica comparativa das situações económicas do lesante/responsável e do lesado[23] e as demais circunstâncias do caso, bem como as exigências do princípio da igualdade.[24]

            Ademais, na fixação do montante compensatório dos danos não patrimoniais associados à violação de certos tipos de bens pessoais (v. g., vida, integridade física, honra, personalidade moral), os ditames da equidade devem sobrepor-se à necessidade de salvaguarda da segurança jurídica.[25]

            14. Decorre dos autos que o montante em causa (€ 50 000) era uma quantia relevante no património dos AA. e, como tal, a sua falta causou-lhes transtornos (permanente estado de stress, preocupação e ansiedade, com o receio de não reaverem, ou de não saber quando iam reaver o seu dinheiro, o que lhes tem provocado ansiedade e tristeza) susceptíveis de serem ressarcidos (cf., sobretudo, II. 1. 22., supra).

            A quantia fixada em 1ª instância (€ 2 500) não é excessiva e poder-se-á considerar equitativa, razoável e ajustada à situação concreta no confronto com as situações com alguma similitude versadas nas diversas decisões dos tribunais superiores - e na plena afirmação das exigências da equidade, da proporcionalidade e da igualdade -, conferindo, pois, o devido relevo ao tipo de bem violado e à natureza, intensidade e extensão dos danos[26].

            15. Ficam assim parcialmente atendidas as demais “conclusões” da alegação de recurso.


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            III. Pelo exposto, na parcial procedência da apelação, decide-se alterar a decisão de facto conforme se indica em II. 4, in fine, supra, e, revogando nessa medida a sentença corrida, condena-se agora a Ré a pagar aos AA. a quantia de € 50 000 (cinquenta mil euros), acrescida dos respectivos juros de mora, contados desde a citação até integral pagamento, à taxa de 4 % ao ano, bem como a importância líquida dos juros remuneratórios vencidos em Novembro/2015 e Maio/2016 - com a consequente absolvição da Ré do restante pedido a título de juros remuneratórios - e a quantia de € 2 500 (dois mil e quinhentos euros), a título de compensação por danos não patrimoniais.

            Custas, nas instâncias, na proporção de 1/9 pelos AA. e 8/9 pela Ré.


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16.01.2018

Fonte Ramos ( Relator )

Maria João Areias

Alberto Ruço



[1] Cf. o ponto II. 4., infra.
[2] Por lapso manifesto, a seguir ao “facto 20” indicou-se o “facto 22” (cf. fls. 81).
[3] Diploma a que pertencem as disposições doravante citadas sem menção da origem.

[4] Vide, entre outros, Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, págs. 284 e 386 e Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, Vol. II, 4ª edição, 2004, págs. 266 e seguinte.
[5]Refere-se no acórdão da RP de 20.3.2001-processo 0120037 (publicado no “site” da dgsi): A prova, por força das exigências da vida jurisdicional e da natureza da maior parte dos factos que interessam à administração da justiça, visa apenas a certeza subjectiva, a convicção positiva do julgador. Se a prova em juízo de um facto reclamasse a certeza absoluta da verificação do facto, a actividade jurisdicional saldar-se-ia por uma constante e intolerável denegação da justiça.   

[6] Cf., entre outros, o acórdão da RC de 09.10.2012-processo 1432/09.4T2AVR.C1, publicado no “site” da dgsi.

[7] E reza o mesmo art.º, na redacção (actual) conferida pelo DL n.º 1/2008, de 03.01: “Os administradores e os empregados das instituições de crédito devem proceder, tanto nas relações com os clientes como nas relações com outras instituições, com diligência, neutralidade, lealdade e discrição e respeito consciencioso dos interesses que lhes estão confiados.”

[8] Com o DL n.º 1/2008, de 03.01, preceitua agora o art.º em causa: Os membros dos órgãos de administração das instituições de crédito, bem como as pessoas que nelas exerçam cargos de direcção, gerência, chefia ou similares, devem proceder nas suas funções com a diligência de um gestor criterioso e ordenado, de acordo com o princípio da repartição de riscos e da segurança das aplicações e ter em conta o interesse dos depositantes, dos investidores, dos demais credores e de todos os clientes em geral.

[9] A estas regras de conduta e sua divulgação se referiam ainda os art.ºs 75º, n.º 2 e 77º, n.º 1 do mesmo Regime Jurídico, na sua redacção original.

[10] Estando em causa obrigações subscritas em 2006 importa considerar o art.º 21º, n.º 1, do DL n.º 357-A/2007, de 31.10, que entrou em vigor em 01.11.2007 (pese embora se ressalve no n.º 6 do art.º 18º daquele diploma que “Os intermediários financeiros devem prestar, a quem seja seu cliente a 1 de Novembro de 2007, a informação prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 312º do Código dos Valores Mobiliários, na redacção dada pelo presente decreto-lei”), pelo que será à redacção anterior à conferida por aquele DL que nos reportaremos, quando inexista indicação em contrário.
[11] Cf. o artigo “A Responsabilidade do banco por informações à luz do art.º 485º do Código Civil”, in Revista de Direito e Economia, Ano XIV, 1988, págs. 138 e seguintes e 147 e seguinte.
[12] In Banca, Bolsa e Crédito, Estudos de Direito Comercial e de Direito da Economia, Vol. I, Almedina, 1990, págs. 40 e seguintes.
[13] Cf. o cit. acórdão da RC de 09.10.2012-processo 1432/09.4T2AVR.C1.
[14] In Informação Bancária e Responsabilidade, Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Inocêncio Galvão Telles, Volume II, Direito Bancário, Almedina, 2002, pág. 230.
[15] Cf., entre outros, os acórdãos do STJ de 10.01.2013-processo 89/10.4TVPRT.P1.S1 [onde se afirma, designadamente: «(…) trata-se de um quadro negocial, a que seguramente não é alheio todo o relacionamento contratual de confiança existente entre a autora e o banco Réu desenvolvido ao longo dos anos e que num contexto negocial do tipo do que vem provado, à própria luz do art.º 236º n.º 1 do CPC, não pode deixar de ser interpretado como um compromisso contratual por parte do banco réu para com a autora traduzido precisamente naquele compromisso de garantir o reembolso do capital que foi aplicado na aquisição dos identificados activos financeiros.)» (…)/A confiança do cliente, investidor não qualificado, nestas informações, deve ser protegida pela ordem jurídica, sob pena de se minar o valor colectivo da segurança jurídica./Neste caso, sendo o prestador das informações um Banco, a questão da responsabilidade coloca-se com mais acuidade. O dador aparece, perante o destinatário, portador de qualidades específicas que o habilitam a fornecer tais informações e que induzem o mesmo destinatário a nelas fazer fé, pois o cliente presume uma competência e organização, uma profissionalização específica, que os bancos objectivamente possuem (Agostinho Cardoso Guedes, «A Responsabilidade do Banco por informações à luz do art. 485 do Código Civil», Revista de Direito e Economia, Ano XIV, 1988, pp. 138 e 139)” (…)/As modalidades de responsabilidade civil aqui em causa são a responsabilidade civil pré-contratual ou culpa in contrahendo (art.º 227º do CC), porque nos preliminares do contrato o Banco informou o autor que estava garantido o retorno, e a responsabilidade civil contratual porque o Banco violou o compromisso assumido no acordo feito com o cliente (garantia de restituição do capital e dos juros) e executou o contrato, violando os deveres de boa fé (art.º 76º do CC)”] e de 17.3.2016-procsso 70/13.1TBSEI.C1 [assim sumariado: “I - Embora a comercialização de produto financeiro com informação de ter capital garantido responsabilize em primeira linha a entidade emitente do produto, não significa que essa responsabilidade não se estenda também ao intermediário financeiro, se no relacionamento contratual que desenvolve com o cliente, assumir em nome desse relacionamento contratual também o reembolso do capital investido. II - Provando-se que a gerente do Banco em janeiro de 2008 propôs ao autor uma aplicação financeira mediante a aquisição de um produto (papel comercial emitido pela «CNE, S. A.») com garantia do capital investido e que o autor deu a sua anuência à concretização da aplicação, por se tratar de um produto comercializado pelo BB, SA com capital garantido, o Banco é responsável pelas obrigações assumidas no compromisso com o cliente: o reembolso do capital investido e os juros.”; constando da respectiva fundamentação, nomeadamente, que se trata “de uma modalidade de responsabilidade civil que se situa numa zona intermédia entre a responsabilidade contratual e a extracontratual, e que aqui qualificamos como responsabilidade contratual, aplicando-se em consequência o regime do art.º 799º do CC. (…) A culpa na responsabilidade contratual presume-se, nos termos do art.º 799º do CC. Esta norma, segundo Menezes Cordeiro, contém uma dupla presunção de ilicitude e de culpa. «Perante a falta de cumprimento, presume-se que: o devedor não cumpriu, violando as normas jurídicas que mandam cumprir - ilicitude; o devedor incorre no correspondente juízo jurídico de censura - culpa”» (cf. Menezes Cordeiro, Direito Bancário, 5ª Edição revista a actualizada, Almedina, Coimbra, 2014, pp. 431-432).”], publicados no “site da dgsi.
[16] Cf. o cit. acórdão do STJ de 10.01.2013-processo 89/10.4TVPRT.P1.S1.

   Cf., ainda, o referido acórdão da RC de 09.10.2012-processo 1432/09.4T2AVR.C1, onde se concluiu: “Se as informações prestadas por um banco são inexactas, incompletas ou falsas e foram causais da celebração de um acto ou contrato, então terá aquele de ser responsabilizado pelos danos que assim causa, quer por via contratual quer extra-contratual”.

[17] Vide Menezes Cordeiro, Manual de Direito Bancário, pág. 432.

[18] Vide, neste sentido, Sinde Monteiro, Responsabilidade Por Conselhos e Recomendações ou Informações, Almedina, 1989, pág. 49.
   Cf., ainda, de entre vários, os citados acórdãos do STJ de 10.01.2013-processo 89/10.4TVPRT.P1.S1 e da RC de 09.10.2012-processo 1432/09.4T2AVR.C1.
[19] Cf. o acórdão da RC de 12.9.2017-processo 821/16.2T8GRD.C1 (subscrito pelos aqui relator e 1ª adjunta e que teve por objecto situação idêntica), publicado no “site da dgsi.            

   Na mesma linha de entendimento, além dos já citados acórdãos do STJ de 10.01.2013-processo 89/10.4TVPRT.P1.S1 e da RC de 09.10.2012-processo 1432/09.4T2AVR.C1, cf., de entre vários, os acórdãos da RL de 15.9.2015-processo 555/12.7TVPRT.L1-7 [assim sumariado: «I. No âmbito da comercialização dos produtos financeiros, se o mediador prestar a informação de que o capital está garantido, a responsabilidade da entidade emitente do produto estende-se ao intermediário financeiro - face ao consagrado nomeadamente nos art.ºs 304º do CVM (boa fé, elevado padrão de diligência, lealdade e transparência) e bem assim atendendo aos deveres de informação a que aludem os art.ºs 7º, n.º 1 e 312º, n.º1, do CVM, estabelecendo-se, até, nestes casos, uma presunção legal de culpa (art.º 314º do CVM), implicando, por isso responsabilidade contratual e extracontratual. II. Sempre que o Banco tenha assumido perante os clientes e sem discriminação de qualquer deles que as aplicações não teriam, qualquer risco de retorno e que os valores aplicados estavam, garantidos pelo grupo, naturalmente que se torna responsável pela correspondência da informação assim veiculada para persuadir clientes, com a realidade.»], da RG de 27.4.2017-processo 2928/16.7T8GMR.G1 [constando do respectivo sumário, designadamente: «2 - O intermediário financeiro nas relações com o cliente tem de agir de acordo com padrões de diligência, lealdade e transparência superiores aos de um homem médio, o que se compreende atenta a progressiva complexidade dos produtos financeiros e a necessidade de protecção dos clientes que na maioria das vezes são a parte menos experiente na contratação. 3 - No caso em apreço, tendo o funcionário do Banco convencido o pai da A. que actuava em representação desta, a adquirir um produto financeiro, convencendo-o de que era seguro, que o capital estava garantido, não lhe explicando as características do produto e o risco envolvido na sua aquisição e não lhe entregando qualquer informação sobre as características do papel comercial que estava a adquirir, sendo o pai da A. um investidor não qualificado, pelo que a obrigação de esclarecimento que impendia sobre o intermediário era mais acentuada, conclui-se que o Banco não cumpriu as exigências impostas pela lei e nomeadamente pelo CVM, violando as exigências de boa-fé e a confiança que o cliente depositava na instituição bancária, tendo prestado informação que não era verdadeira acerca da garantia de reembolso do capital investido. 5 - A violação do dever de informação situa-se no âmbito da responsabilidade pré-contratual, não obstando a este entendimento o facto de o contrato se ter realizado e constitui o Banco na obrigação de indemnizar caso estejam verificados os pressupostos gerais dessa obrigação.»] e da RP de 30.5.2017-processo 588/11.0TVPRT.P1 [tendo-se aí concluído: «I - Demonstrado que o gerente do Banco demandado propôs ao Autor uma aplicação financeira - papel comercial - com garantia do reembolso do capital investido e juros, em função da qual este aderiu à concretização da aplicação, é o mesmo Banco responsável pelo retorno desse capital e juros. II - É de natureza extracontratual a responsabilidade do intermediário financeiro na sua estrita ligação aos deveres que lhe competem, no domínio dos seus deveres gerais de comportamento e de protecção, designadamente dos deveres de informação.»], publicados no “site” da dgsi.
[20] Redacção que se manteve, na 1ª parte do n.º 4 do mesmo art.º, na redacção conferida pela Lei n.º 23/2010, de 30.8.

[21] Vide, de entre vários, os acórdãos da RL de 20.02.1990 e da RP de 07.4.1997, in CJ, XV, 1, 188 e XXII, 2, 204, respectivamente.

[22] Vide Vaz Serra, BMJ 278º, 182.
[23] Vide Filipe Albuquerque Matos, in RLJ 143º, pág. 214 e ainda, entre outos, Pires de Lima e Antunes Varela, CC Anotado, Vol. I, 3ª edição, Coimbra Editora, 1982, pág. 474.
   Propendemos, assim, para o entendimento sufragado nas referidas anotações, de sentido contrário àquela que parece ser a posição adoptada ultimamente pelo STJ [cf., entre outros, os acórdãos de 24.4.2013-processo 198/06.TBPMS.C1.S1 e 07.5.2014-processo 436/11.1TBRGR.L1.S1, publicados no “site” da dgsi].
[24] Cf., de entre vários, o acórdão do STJ de 30.9.2010-processo 935/06.7TBPTL.G1.S1, publicado no “site” da dgsi.
[25] Cf., entre outros, o acórdão do STJ de 09.9.2014-processo 654/07.7TBCBT.G1.S1, publicado no “site” da dgsi.
[26] Vide Filipe Albuquerque Matos, in RLJ 143º, págs. 214 e seguinte.