Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
515/17.1T8VIS-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ARLINDO OLIVEIRA
Descritores: PROCESSO ESPECIAL DE REVITALIZAÇÃO
PER
PLANO DE REVITALIZAÇÃO
NÃO
HOMOLOGAÇÃO
NOVO PROCESSO
PRAZO
Data do Acordão: 05/23/2017
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE VISEU, VISEU, JUÍZO DE COMÉRCIO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 17.º-G, N.º 6, E 215.º DO CIRE
Sumário: 1. O encerramento de anterior processo especial de revitalização devido à não homologação judicial do plano de revitalização aprovado pela maioria dos credores impede os devedores de instaurar novo PER pelo prazo de dois anos estabelecido no artigo 17.º-G n.º 6 do CIRE.

2. A propositura de novo PER sem a observância daquele limite temporal, em tribunal diferente do primeiro e sem fazer qualquer referência ao processo anterior, constitui violação de norma imperativa, que legítima, nos termos do artigo 215.º do CIRE, a recusa de homologação judicial do plano aprovado no âmbito deste PER.

Decisão Texto Integral:

            Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

A... A... e mulher B... B... , já identificados nos autos, intentaram o presente processo especial de revitalização, tendo em vista a promoção da respectiva revitalização através da aprovação de plano de recuperação.

Foi nomeado administrador judicial provisório, que apresentou a lista provisória de créditos a que alude o art. 17.º- D do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.

A lista foi objecto de impugnações.

Decorrido o prazo de negociações, os devedores remeteram ao tribunal o plano de recuperação, acompanhado de documento elaborado e assinado pelo administrador judicial provisório contendo o resultado da votação, bem como dos votos emitidos. Requereram a homologação do plano de recuperação aprovado.

Conclusos os autos, ao M.mo Juiz a quo, este, cf. despacho de fl.s 275, decidiu o seguinte, no que ao presente recurso interessa:

“Antes de mais, atento o disposto no n.º 3 e n.º 6 do artigo 17.º-G do CIRE, solicite ao processo n.º 1690/14.2TJCBR, certidão da decisão que lhe pôs fim, com nota de trânsito em julgado”.

Esta informação consta da certidão de fl.s 301 a 326, da qual consta o seguinte:

- cf. fl.s 302 a 303 v.º, em 09 de Dezembro de 2014, foi proferida sentença de homologação do plano de revitalização ali apresentado;

- interposto recurso desta decisão, por Acórdão deste Tribunal da Relação, de 19 de Maio de 2015 (cf. fl.s 317 a 326), foi revogada a decisão ora primeiramente referida, recusando-se a homologação do plano;

- os devedores, inconformados com tal decisão, interpuseram recurso de revista para o STJ, que, cf. Acórdão junto de fl.s 301 a 314 v.º, datado de 03 de Novembro de 2015, negou a revista, confirmando o Acórdão recorrido.

- os devedores arguiram a nulidade e solicitaram a reforma do Acórdão proferido no STJ, o que, tudo, foi julgado improcedente, cf. decisão de 19 de Abril de 2016 (cf. Acórdão de fl.s 315 e 316).

Como resulta de fl.s 39 v.º, os presentes autos de revitalização deram entrada na Secção de Comércio de Viseu, no dia 04 de Julho de 2016.

Junta aos autos a supra referida certidão, em 19 de Dezembro de 2016, foi proferido o despacho de fl.s 327, que se passa a reproduzir:

“Notifique aos devedores o teor da certidão a fl.s 301 a 326.

Mais os notifique para, em face da data do trânsito em julgado da decisão que recusou a homologação do plano que apresentaram os mesmos no processo n.º 1690/14.2TJCBR-A, se pronunciarem relativamente à possibilidade de recusa de homologação do ora apresentado por força do disposto no artigo 17.º-G, n.º 6, do CIRE.”.

Responderam os devedores/requerentes (cf. fl.s 330 a 336), defendendo que “o encerramento do processo de revitalização devido à não homologação judicial do plano de recuperação, não impedia que os mesmos instaurassem novo PER, sem a observância do limite temporal a que se reporta o n.º 6 do artigo 17.º-G, do CIRE”.

De novo, conclusos os autos ao M.mo Juiz a quo, foi proferida a decisão de fl.s 338 a 340, (aqui recorrida) que se passa a transcrever:

Nos presentes de processo especial de revitalização em que são devedores A... e B... , foi apresentado o plano de recuperação acompanhado do resultado da votação de tal plano.

O plano de recuperação teve quorum deliberativo de 99,52% e recolheu votos favoráveis de 79,72% dos credores, sendo que mais de 50% dos credores que votaram favoravelmente tem créditos não subordinados, conforme documento o resultado da votação remetido - artigo 212.º, n.º 1, e 17.º-F, n.ºs 3 e 4, do CIRE.

O plano encontra-se, por isso, aprovado.

Cumpre apreciar se é de homologar o mesmo.

Recuando, resulta de elementos evidentes e incontestados dos autos, mormente, além dos próprios atos neles praticados e da certidão a fls. 301 e ss., que

- Previamente a estes autos, os devedores intentaram, na IC de Comércio de Coimbra, o PER com os autos de processo n.º 1690/14.2TJCBR-A;

- Nesses autos, os devedores apresentaram, a final, plano de revitalização;

- Votaram credores a que corresponde o montante global de créditos de €13.963.771,94, num universo de créditos reclamados e reconhecidos de €14.048.094,98;

- Votaram a favor os credores Instituto da Segurança Social, IP (crédito de €18.102,28), CC (crédito de €1.000,00) e I... , Inc. (crédito de €11.111.400,00);

- Votaram contra credores com créditos no montante total de € 2.862.933,47;

- Em faxe da aprovação por 79,541% dos créditos relacionados na lista definitiva de credores, foi proferida, em 1.ª instância, sentença homologatória do plano;

- Tal decisão foi sujeita a recurso interposto por um dos credores que votaram contra a aprovação do plano, o qual sustentou, além do mais, que os devedores não se encontravam em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas sim em situação de insolvência;

- Tal apelação foi julgada procedente, em decorrência do que foi revogada a sentença recorrida e recusada a homologação do plano;

- Inconformados, os devedores pediram revista extraordinária do acórdão, que lhes foi negada, por acórdão do STJ de 03/11/2015;

- Em 04/07/2016, os devedores intentaram os presentes autos.

*

Do acima relatado (seguindo de perto o relatório do acórdão do STJ aí referido), resulta que os devedores, após terem visto ser negada a homologação do seu plano de revitalização e declarado, por sentença transitada em julgado, que se encontram em situação de insolvência, sendo essa situação, precisamente, o fundamento da recusa da homologação, intentaram novo PER, precisamente os presentes autos.

Analisado o seu requerimento inicial (que aqui se dá por integralmente reproduzido), verifica-se que, para além de este novo processo ter sido intentado em tribunal diferente do primeiro, por via de mudança do domicílio que indicaram, os devedores não fazem qualquer menção ao PER anterior e ao processo de insolvência que, por força do desfecho que o mesmo teve, já então corria em Coimbra.

Os presentes autos surgem, assim, como um elemento desrespeitador da decisão de não homologação do anterior PER, desrespeito que foi conseguido, ab initio, mediante a omissão pelos requerentes de elementos que era essencial ao Tribunal conhecer aquando do proferimento do despacho liminar proferido em 06/07/2016, como seja, a existência e destino do PER anterior.

Recorrendo de novo ao acórdão do STJ proferido naqueles autos, permitimo-nos parafrasear-lhe o sumário:

I. Pese embora o processo especial de revitalização se resolver num procedimento de feição marcadamente extrajudicial, tal não significa que a liberdade e a autonomia da vontade dos intervenientes no processo não sofram limitações e não possam ser contrariadas pelo tribunal.

II. Se o processo revelar inequivocamente que o devedor se encontra numa situação de insolvência atual, o juiz deve recusar oficiosamente a homologação do plano que, ainda assim, foi aprovado.

III. Em tal situação estamos perante uma violação não negligenciável das regras procedimentais e da norma legal basilar (a que define em que situações é admitido o processo de revitalização) que permite a realização ou preenchimento do seu conteúdo. IV. Acresce que o uso ilegal e abusivo do procedimento implica a nulidade do negócio jurídico subjacente e, inclusivamente, a sua neutralização por excesso manifesto dos limites impostos pelo fim económico do direito.

Em nosso modesto ver, atenta a existência de um PER anterior, cujo plano não foi homologado por decisão judicial que entendeu estarem os requerentes em situação de insolvência, o posterior recurso a novo PER, na pendência do processo de insolvência despoletado pelo primeiro, com omissão de qualquer referencia a tais autos, configura um “uso ilegal e abusivo do procedimento(,) implica a nulidade do negócio jurídico subjacente e, inclusivamente, a sua neutralização por excesso manifesto dos limites impostos pelo fim económico do direito”

*

Termos em que, pelo exposto, não homologo o plano de recuperação apresentado.

Custas a suportar pelos devedores (17.º-F, n.º 7, do CIRE).

Inconformados com tal decisão, dela interpuseram recurso, os requerentes A... e mulher, B... , o qual foi admitido como sendo de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 453), finalizando as suas alegações de recurso, com as seguintes conclusões:

A. Recusou o Tribunal “a quo” o plano aprovado, não invocando qualquer violação nos termos do art 215º do CIRE, bem sabendo lhe estaria vedada a recusa da homologação fora dos casos previstos nesse dispositivo e no art 216º do mesmo diploma.

B. Ao não homologar o plano aprovado sem recurso aos fundamentos previsto naquele dispositivo (art 215º do CIRE), viola a lei.

C. Com efeito, veio o Tribunal “a quo” recusar a homologação do plano apresentado pelo devedor, com o fundamento de os devedores se terem a presentado a novo PER na pendência de Processo de Insolvência despoletado pelo 1º PER, e por terem omitido tais autos de insolvência no novo Procedimento.

D. Contudo, não assiste razão ao Tribunal recorrido, pois a existência de um Acórdão do STJ, no âmbito do 1º PER, que veio entender que os devedores se encontravam em situação de insolvência, confirmando assim o acórdão da Relação que revogou a homologação do plano apresentado pelos devedores, não converteu, nem converte, automaticamente um PER em Processo de insolvência.

E. Em casos como o supra referido o 1º processo baixa de novo à 1ª instância e segue os seus trâmites com destino ao encerramento desse processo e eventualmente, ordena-se a distribuição dos autos como processo de insolvência, onde deve aí ser declarada a insolvência.

F. E assim aconteceu no caso dos autos, em que perante o acórdão do STJ, em 11/07/2016 foi o 1º PER dos devedores encerrado, ordenando-se em 12/07/2016 a distribuição dos autos como processo de insolvência.- Docs. 8 e 9

G. Após a referida distribuição (e no seguimento da comunicação a esses autos pelos devedores que haviam requerido o novo PER) foi essa instância suspensa, por despacho datado de 14/07/2016, nos termos do art. 17. E nº 6 do CIRE –nunca tendo, portanto, sido declarada a insolvência dos devedores- Doc 10.

H. Em suma, e uma vez que em 04/07/2017 (data da entrada do 2º PER dos devedores em juízo), não existia qualquer processo de insolvência dos devedores (pois nem sequer havia sido dado o Parecer da AJP acerca da situação económica dos devedores e muito menos encerrado este Processo), não podia o Tribunal “a quo” recusar a homologação do plano aqui apresentado, com o fundamento de que o novo PER deu entrada na pendência de qualquer processo de insolvência dos devedores.

I. Assim, o facto de não existir qualquer processo de insolvência aquando da entrada do 2º PER e por essa razão não poderem os devedores fazer menção à existência de um processo inexistente; terem sido os próprios devedores, em 07/07/2016 a informar o 1º Per da Existência do 2º; e de não terem informado no 2º Per a existência do 1º, por tal facto ser de conhecimento público: afasta a imputação de uso ilegal e abusivo do procedimento pelos devedores.

Nestes termos e nos demais de direito aplicáveis, sempre com o mui douto suprimento de V/ Exas., deverá ser dado provimento ao recurso e revogada a sentença recorrida e, em consequência, ser proferida sentença de homologação do plano apresentado pelos devedores, com as devidas consequências legais.

Assim se fazendo a sã e desejada Justiça!

Normas violadas: art, 17º-A, n.º2 e 17º -F nº 5 e 215º todos do CIRE

 

Contra alegando, os credores C... , SA e o D... , SA, pugnam pela manutenção da decisão recorrida, estribando-se nos fundamentos nesta invocados.

Dispensados os vistos legais, há que decidir.          

Tendo em linha de conta que nos termos do preceituado nos artigos 635, n.º 4 e 639, n.º 1, ambos do NCPC, as conclusões da alegação de recurso delimitam os poderes de cognição deste Tribunal e considerando a natureza jurídica da matéria versada, a questão a decidir é a de saber se o encerramento de anterior PER, devido à não homologação judicial do plano de revitalização, não impede os devedores de instaurar novo PER, sem a observância do limite temporal estabelecido no artigo 17.º-G, n.º 6, do CIRE, o que, a assim ser, acarreta a ilegalidade da decisão recorrida, por violação do disposto nos artigos 215.º e 216.º do CIRE.

A factualidade a ter em conta é a que consta do relatório que antecede.

Se o encerramento de anterior PER, devido à não homologação judicial do plano de revitalização, não impede os devedores de instaurar novo PER, sem a observância do limite temporal estabelecido no artigo 17.º-G, n.º 6, do CIRE, o que, a assim ser, acarreta a ilegalidade da decisão recorrida, por violação do disposto nos artigos 215.º e 216.º do CIRE.

No que a esta questão respeita, alegam, em súmula, os recorrentes que não invocando o tribunal qualquer violação nos termos do artigo 215.º do CIRE, teria o plano aprovado de ser homologado, até porque quando, em 04 de Julho de 2017, intentaram o presente PER, não existia qualquer processo de insolvência dos devedores.

Cumpre, desde já, referir que a questão sub judice não se prende com a existência ou inexistência de um processo de insolvência contra os ora recorrentes, aquando da interposição do presente PER mas com o limite temporal para poderem intentar novo PER, tal como deflui do disposto no artigo 17.º-G, n.º 6 do CIRE.

Conforme disposto no artigo 17.º-F, n.º 5, do CIRE, incumbe ao juiz decidir se deve homologar o plano de recuperação ou recusar a sua homologação, aplicando, com as necessárias adaptações, as regras vigentes em matéria de aprovação e homologação do plano de insolvência previstas no título IX, em especial o disposto nos artigos 215.º e 216.º (do CIRE).

Ora, nos termos do disposto no artigo 215.º do CIRE refere-se que “O juiz recusa oficiosamente a homologação do plano de insolvência aprovado em assembleia de credores no caso de violação não negligenciável de regras procedimentais ou das normas aplicáveis ao seu conteúdo, qualquer que seja a sua natureza…”.

Assim, impõe-se uma abordagem do que se deve entender por “violação não negligenciável” (e, no reverso da situação, o que se entende por violação negligenciável) dos procedimentos ou de normas substantivas aplicáveis ao plano de recuperação apresentado.

Assim, o juiz deve recusar oficiosamente a aprovação do plano sempre que exista uma violação não negligenciável de regras procedimentais ou das normas aplicáveis ao seu conteúdo, qualquer que seja a sua natureza, conforme se acha disposto no artigo 215.º do CIRE.

Como referem Carvalho Fernandes e João Labareda, in CIRE, 2.ª Edição, Quid Juris, Lisboa, 2013, de pág.s 825 a 828, o artigo 215.º do CIRE “continua a orientação do Direito anterior no sentido de conferir ao tribunal o papel de guardião da legalidade, cabendo-lhe, em consequência, sindicar o cumprimento das normas aplicáveis como requisito da homologação do plano.”.

Acrescentando que devem considerar-se “não negligenciáveis todas as violações de normas imperativas que acarretem a produção de um resultado que a lei não autoriza. Diversamente, são desconsideráveis as infracções que atinjam simplesmente regras de tutela particular que podem, todavia, ser afastadas com o consentimento do protegido.

(…)

Daí que, em sentido processual, que aqui parece especialmente apto para ser acolhido, a violação da lei, ativa ou passivamente, comporte sempre a prática de uma nulidade processual.

(…)

O que importa é, pois, sindicar se a nulidade observada é susceptível de interferir com a boa decisão da causa, o que significa valorar se interfere ou não com a justa salvaguarda dos interesses protegidos ou a proteger – nomeadamente, no que respeita à tutela devida à posição dos credores e do devedor nos diversos domínios em que se manifesta.

(…)

O que haverá então de peculiar a observar (…) é que o próprio tribunal deve, ele mesmo, agindo ex officio, relevar a nulidade, sem necessidade de arguição de quem quer que seja, o que implicará recusar a homologação do plano, à semelhança, aliás, do que sucede com outras nulidades tipificadas na lei, como se vê do que determina o art.º 196.º do C.P.Civ.”.

Também Nuno Salazar Casanova e David Sequeira Dinis, in PER, Comentário aos artigos 17.º-A a 17.º-I do CIRE, Coimbra Editora, 1.ª Edição, Março de 2014, a pág. 142, defendem que, neste caso, o tribunal se encontra “investido na posição de garante da legalidade, como aliás não poderia deixar de ser dado o impacto que o PER pode ter, especialmente sobre os credores minoritários e discordantes.”.

Ora, como acima já se aludiu, dispõe o artigo 17.º-G, n.º 6, do CIRE que:

“O termo do processo especial de revitalização efectuado de harmonia com os números anteriores impede o devedor de recorrer ao mesmo pelo prazo de dois anos.”.

O artigo em referência, nos seus n.os 1 a 5, prevê a possibilidade de o devedor ou a maioria dos credores concluírem antecipadamente não ser possível alcançar acordo ou caso seja ultrapassado o prazo previsto no artigo 17.º-D, n.º 5; o devedor já se encontrar em situação de insolvência ou este pôr termo às negociações.

Como referem Nuno S. Casanova e David S. Dinis, ob. cit., a pág. 168, o objectivo do preceito em causa é o de impedir que o PER e os seus efeitos sejam instrumentalizados e abusados, atenta a limitação e a compressão dos direitos dos credores sobre o devedor e evitar que o devedor, em conluio com um credor, apresente sucessivos PER, assim impedindo que os credores exercessem os seus direitos contra o devedor.

Sucede que, como resulta do relatório acima elaborado, no anterior PER, o plano de revitalização foi aprovado, vindo a ser recusada, judicialmente, a respectiva homologação, pelo que, prima facie, poderíamos ser tentados a concluir que, ao caso em apreço, não se aplica o disposto no artigo 17.º-G, n.º 6, do CIRE, uma vez que não se verifica um caso de não aprovação do plano por parte dos credores.

Se é certo que o plano foi aprovado pela maioria dos credores, o facto é que não veio a ser homologado pelo tribunal, como resulta da certidão de fl.s 301 e seg.s, no uso das competências que lhe estão atribuídas e como se dispõe no artigo 215.º do CIRE.

Foi este o fundamento para, no âmbito do presente PER não se homologar o plano apresentado, referindo-se a fl.s 339 e 340 que foi após terem visto ser negada a homologação do plano apresentado no anterior PER, que os recorrentes intentaram novo PER em tribunal diferente do primeiro, sem lhe fazerem qualquer referência, em função do que se verifica uma situação que “implica a nulidade do negócio jurídico subjacente”, que acarreta a não homologação do plano aprovado no âmbito deste PER.

Concorda-se, em absoluto, com este entendimento, pois que, tendo transitado em julgado a decisão do STJ, que manteve a recusa de homologação do plano no anterior PER, em 19 de Abril de 2016, os recorrentes, agora, noutro Tribunal, intentaram novo PER, em 04 de Julho de 2106, estando impedidos de recorrer a novo PER, pelo prazo de dois anos, como decorre do artigo 17.º-G, n.º 6, do CIRE, o que constitui violação de norma imperativa, que legítima, nos termos do artigo 215.º do CIRE, a recusa de homologação do plano.

E a tal não obsta o facto de o plano, no anterior PER, ter sido aprovado pelos credores, dado que não chegou a ser homologado pelo tribunal.

 Como referem os autores ora, por último citados, in ob. cit., pág. 169, no caso de o plano ter sido aprovado mas não chegar a ser homologado judicialmente, fica o devedor impedido de dar início, imediatamente, a novo PER.

A assim não ser, “os credores – designadamente os credores que votaram contra o plano – poderão ficar eternamente impedidos de exercer os seus direitos, bastando que uma maioria de credores insista em aprovar planos ilegais e que o administrador da insolvência não requeira a insolvência do devedor. Seria aliás estranho que a maioria que aprova um plano ilegal pudesse sujeitar a minoria discordante a mais um PER. Assim, o n.º 6 do artigo 17.º-G terá de ser interpretado extensivamente, por forma a incluir o caso em que o plano de revitalização é aprovado, mas não homologado pelo tribunal..

Em suma, tudo se passa como se o anterior PER tivesse terminado sem aprovação do plano, em função do que tem plena aplicação o disposto no preceito ora em referência e, consequentemente, não podiam os recorrentes intentar o presente PER, estando, pois, nos termos expostos, legitimada e justificada, a não homologação do plano que subjaz aos presentes autos de revitalização.

Assim, face ao exposto, é de manter a decisão recorrida, improcedendo o presente recurso.

            Nestes termos se decide:      

            Julgar improcedente o presente recurso, mantendo-se a decisão recorrida.

Custas pelos recorrentes.

            Coimbra, 23 de Maio de 2017.

Relator:
Arlindo Oliveira

Adjuntos:

1º -
Emidio Francisco Santos
2º -
Catarina Gonçalves