Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
503/06.3TBMLD.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MANUEL CAPELO
Descritores: SEGURO OBRIGATÓRIO AUTOMÓVEL
ESTRANGEIRO
ESTADOS MEMBROS DA CE
LEGITIMIDADE PASSIVA
DANOS PATRIMONIAIS
DANOS FUTUROS
Data do Acordão: 02/07/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA MEALHADA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTºS 7º E 20º DO D. L. Nº 522/85, DE 21/12; DEC. LEI Nº 122-A/86, DE 30/05; 566º DO C. CIVIL.
Sumário: I - De acordo com o previsto no nº 8 do artigo 20º do DL nº 522/85, de 31/12, o seguro celebrado em Espanha produz efeitos jurídicos em Portugal, como se a respectiva apólice aqui tivesse sido emitida.

II - E conforme se determina no art. 2º do Dec. Lei 122-A/86, de 30 de Maio, relativamente a sinistros ocorridos em Portugal, compete ao Gabinete Português de Certificado Internacional de Seguro (Gabinete Português de Carta Verde) a satisfação das indemnizações devidas, nos termos legais e regulamentares do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, aos lesados por acidentes causados por veículos matriculados noutros Estados membros da CE.

III - O que significa que a acção judicial destinada a obter a indemnização resultante de acidente de viação quando está em causa um veículo matriculado e segurado num país membro da CE deve ser dirigida contra o Gabinete Português da Carta Verde.

IV - Nos termos da legislação aplicável à data do acidente - art. 7º do Dec. Lei 522/85 na redacção que tinha à data de 7/8/2003 - estavam excluídos da garantia do seguro obrigatório “quaisquer danos decorrentes de lesões corporais sofridas pelo condutor do veículo seguro”.

V - Por este impositivo legal resultaria que, tendo sido apurado na acção que a autora T… era a condutora do veículo segurado, com fundamento na existência de um seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, não seria possível fixar-lhe qualquer indemnização.

VI - Porém, esta disposição legal obstativa da fixação da indemnização ao condutor do veículo segurado, não invalida que um outro seguro de natureza facultativa venha incidir sobre esses danos do condutor permitindo, então, que em caso de acidente de onde resultem danos para este tais danos possam ser ressarcidos com indemnização fixada até ao limite do valor que tenha sido contratado.

VII - O montante máximo fixado para a indemnização a atribuir aos casos de incapacidade física permanente nos termos do contrato apenas pode ser entendido como isso mesmo, uma limitação à responsabilidade da seguradora, não podendo no entanto constituir uma base sobre a qual se venha a fazer incidir qualquer proporção que tenha por fundamento a concreta percentagem de incapacidade atribuída.

VIII - A este propósito diga-se que a incapacidade parcial permanente geral traduz a ideia de uma limitação de carácter constante, irretratável e que o tempo não dissipa, razão para que tenha sido sedimentada na jurisprudência a orientação de que a incapacidade parcial permanente é de indemnizar ainda que quem a sofra não trabalhe ou, trabalhando, essa incapacidade não cause ao trabalho qualquer diminuição de proventos.

IX - É que, mesmo não havendo uma repercussão negativa no salário ou na actividade profissional do lesado - por não se estar perante uma incapacidade para a sua actividade profissional concreta - pode verificar-se uma limitação funcional geral que terá implicações na facilidade e esforços exigíveis o que integra um dano futuro previsível, segundo o desenvolvimento natural da vida, em cuja qualidade se repercute.

Decisão Texto Integral:                         Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

Relatório

No Tribunal Judicial da Mealhada, J… residente na Suíça; A… residente na Suíça, na qualidade de legal representante de sua filha menor, com ele residente, D…, nascida em …; T…, residente na Suíça, propuseram contra o Gabinete Português da Carta Verde, acção declarativa com forma de processo Ordinário pedindo a condenação da Ré a pagar ao Autor J…: a). € 7.442,40 (sete mil quatrocentos e quarenta e dois euros e quarenta cêntimos) - a título de danos patrimoniais. b). € 10.000,00 (dez mil euros) - a título de danos não patrimoniais. Com juros de mora à taxa legal, a contar da citação; à Autora D…: a). € 79.057,41 (setenta e nove mil e cinquenta e sete euros e quarenta e um cêntimos) - a título de danos patrimoniais. b). € 10.000,00 (dez mil euros) - a título de danos não patrimoniais. Com juros de mora à taxa legal, a contar da citação.

À Autora T…: a). € 3.332,14 (três mil trezentos e trinta e dois euros e catorze cêntimos) - a título de lucros cessantes ou perdas salariais b). € 106.666,42 (cento e seis mil seiscentos e sessenta e seis euros e quarenta e dois cêntimos) - a título de danos patrimoniais. c). € 15.000,00 (quinze mil euros) – a título de danos não patrimoniais. d). Deverá, ainda, o Réu suportar todas as despesas futuras com tratamentos médicos que vai necessitar de fazer ao joelho, bem como indemnizar a Autora por todos os demais danos emergentes de tais tratamentos, bem como por eventual agravamento da sua incapacidade. Com juros de mora à taxa legal, a contar da citação.

Alegaram para o efeito que sofreram em virtude de acidente de viação (despiste) cuja culpa atribuem ao condutor do veículo 6… conduzido pela autora T… a qual trazia como acompanhantes: N…, cidadã suiça; os seus dois filhos, o Autor J… e a menor, também Autora representada D… e, ainda, o menor T…, seu sobrinho (que faleceu neste acidente objecto desta petição). No mais invocam os danos patrimoniais e não patrimoniais que sofreram e imputam a responsabilidade ao réu por a sociedade proprietária do 6… e a referida condutora T…, por contrato de seguro celebrado em Espanha, titulado pela apólice n.º E- 1104/014262573, terem a responsabilidade sinistral transferida para a Companhia de Seguros A… ESPANHA, com sede em …, Madrid e também, por efeito desse mesmo contrato de seguro, a Autora T…, muito embora a causadora culposa do acidente, ter transferido para a mesma Seguradora, a responsabilidade dos seus danos próprios e pessoais, incluindo os físicos, patrimoniais e não patrimoniais, mesmo no caso de o acidente lhe ser atribuível por culpa.

O réu contestou, excepcionando a irregularidade de representação em juízo da menor D… (falta de suprimento da sua incapacidade judiciária), alegando que quer da legislação atinente ao seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, quer das condições contratuais da apólice de seguro que garantia a circulação do 6… decorre que estão excluídos da garantia do seguro os danos decorrentes de lesões corporais sofridos pelo condutor do veículo seguro e bem assim, quaisquer danos decorrentes de lesões materiais causados a essa pessoa, encontram-se igualmente excluídos daquela garantia quaisquer danos decorrentes de lesões materiais causados aos descendentes do condutor do veículo seguro e, no mais, impugnando, no essencial, a factualidade alegada pelos AA.

Replicando, os AA. pugnaram pela improcedência da excepção tendo a A. T…, através de requerimento que protestou apresentar e que faz fls. 84 e 85 dos autos, apresentado procuração na qualidade de legal representante da filha menor e declaração de ratificação do processado.

Proferido despacho saneador, fixados os factos assentes e elaborada a base instrutória, realizou-se julgamento e veio a ser proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, por provada e condenou o réu a pagar aos AA. as seguintes indemnizações:

1. ao Autor J… a). € 941,32 (novecentos e quarenta e um euros e trinta cêntimos) – a título de danos patrimoniais.

b). € 500,00 (quinhentos euros) - a título de danos não patrimoniais.

2. à Autora D… a). € 79.057,41 (setenta e nove mil e cinquenta e sete euros e quarenta e um cêntimos) - a título de danos patrimoniais.

b). € 8.000,00 (oito mil euros) - a título de danos não patrimoniais.

3. à Autora T… a). € 3.332,14 (três mil trezentos e trinta e dois euros e catorze cêntimos ) - a título de lucros cessantes ou perdas salariais

b). € 106.666,42 (cento e seis mil seiscentos e sessenta e seis euros e quarenta e dois cêntimos) - a título de danos patrimoniais.

c). € 10.000,00 (dez mil euros) – a título de danos não patrimoniais.

Com juros desde a citação (no que respeita às quantias atribuídas a título de indemnização por danos patrimoniais) e desde a presente sentença (no que respeita às quantias atribuídas a título de indemnização por danos não patrimoniais) até integral pagamento, à taxa legal de 4% ao ano.

No mais absolveu o Réu do pedido.

Inconformada com esta decisão dela interpôs recurso a Ré Gabinete Português de Carta Verde, concluindo que:

Termos em que deve ser reconhecido provimento ao presente recurso, como é de Justiça.

Não houve contra alegações.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

Fundamentação

O Tribunal de primeira instância deu como provada a seguinte matéria de facto:

 …

Tendo presente que o objecto dos recursos é balizado pelas conclusões das alegações do recorrente, não podendo este Tribunal criar decisões sobre matéria nova nem conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso (arts. 684º, nº3 e 690º, nºs 1 e 3, do CPCivil), a Apelação suscita as seguintes questões:

- possibilidade ou não da recorrida T… poder ser ressarcida dos danos que sofreu;

- [na resposta afirmativa à questão anterior] limites da indemnização que lhe pode ser arbitrada;

- montante indemnizatório fixado na sentença à autora D… a título de danos patrimoniais futuros.

… …

Da indemnização fixada à recorrida T...

Começando a análise desta primeira questão é importante referir a posição que o Fundo de Garantia Automóvel - Gabinete Português da Carta Verde ocupa nos autos porquanto o domínio da sua intervenção remete para a existência de um seguro celebrado no estrangeiro e referente a um veículo aí matriculado mas que foi interveniente em acidente ocorrido em Portugal.

De acordo com o previsto no nº 8 do artigo 20º do DL nº 522/85, de 31/12 – diploma que veio a ser revogado pelo DL nº291/2007, de 21/8, mas aqui aplicável dado que o acidente ocorreu na sua vigência – o seguro celebrado em Espanha produz efeitos jurídicos em Portugal, como se a respectiva apólice aqui tivesse sido emitida. E conforme se determina no art. 2º do Dec-Lei 122-A/86, de 30 de Maio, relativamente a sinistros ocorridos em Portugal, compete ao Gabinete Português de Certificado Internacional de Seguro (Gabinete Português de Carta Verde) a satisfação das indemnizações devidas, nos termos legais e regulamentares do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, aos lesados por acidentes causados por veículos matriculados noutros Estados membros da CE.

A conveniência reconhecida na celebração de acordos de texto uniforme acautelando devidamente os proprietários e condutores de veículos automóveis contra os riscos de responsabilidade civil para com terceiros quando viajam em países onde seja obrigatório o seguro de tais riscos esteve na origem da criação de uma Convenção - Tipo Intergabinetes, em cuja versão de 1989 (1) (de resto, idêntica, no essencial, às versões anteriores) aquele Gabinete, enquanto Gabinete Gestor, "tem a responsabilidade no seu próprio País, da gestão e regularização de um sinistro (...) nos termos da respectiva legislação nacional" [art. 3º, al. h)].

Sinistro significa o pedido ou pedidos "ao segurado ou o seu segurador, ou ao Gabinete Gestor, de reparação dos prejuízos resultantes de um acidente (...)" ocorrido em Portugal [art. 3º, al. f)].

A pedido do "gabinete emissor", que é o do País onde foi celebrado o seguro [art. 3º, al. i)], aquele "pode confiar a gestão e a regularização dos sinistros a um correspondente", o qual "fica responsável (...) pela gestão do sinistro tendo em atenção qualquer orientação, geral ou específica, recebida do Gabinete Gestor" [art. 9º, al. b)]; este, logo que "tenha regularizado um sinistro, terá direito (...) a ser reembolsado (...)" (art.11º).

Tal significa então que a acção judicial destinada a obter a indemnização resultante de acidente de viação quando está em causa um veículo matriculado e segurado num país membro da CE deve ser dirigida contra o Gabinete Português da Carta Verde[1], posição essa que é a ocupada pela aqui recorrente.

A sentença recorrida condenou a ora recorrente a pagar à autora T…: a) € 3.332,14 (três mil trezentos e trinta e dois euros e catorze cêntimos) a título de lucros cessantes ou perdas salariais; b) € 106.666,42 (cento e seis mil seiscentos e sessenta e seis euros e quarenta e dois cêntimos) - a título de danos patrimoniais; c) € 10.000,00 (dez mil euros) – a título de danos não patrimoniais, todas as quantias acrescidas dos juros respectivos.

Em oposição a esta condenação, a recorrente sustenta que nenhuma indemnização era devida uma vez que, sendo essa autora a condutora causadora do veículo causador do acidente, estava vedado ao tribunal fixar qualquer quantia pelos danos que aquela tivesse sofrido, uma vez que “[Q]uer da legislação atinente ao seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, quer das condições contratuais da apólice de seguro que garantia a circulação do 6…, decorre que estão excluídos da garantia do seguro os danos decorrentes de lesões corporais sofridos pelo condutor do veículo e bem assim, quaisquer danos decorrentes de lesões materiais causados a essa pessoa e/ou aos restantes Autores”.

Nos termos da legislação aplicável à data do acidente - art. 7º do Dec.Lei 522/85 na redacção que tinha a essa mesma data ( 7/8/2003) estavam excluídos da garantia do seguro obrigatório “quaisquer danos decorrentes de lesões corporais sofridas pelo condutor do veículo seguro”.

Por este impositivo legal resultaria que, tendo sido apurado na acção que a autora T… era a condutora do veículo segurado, com fundamento na existência de um seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, não seria possível fixar-lhe qualquer indemnização. Porém, e como é de clara evidência, esta disposição legal obstativa da fixação da indemnização ao condutor do veículo segurado, não invalida que um outro seguro de natureza facultativa venha incidir sobre esses danos do condutor permitindo, então, que em caso de acidente de onde resultem danos para este tais danos possam ser ressarcidos com indemnização fixada até ao limite do valor que tenha sido contratado.

Consta porém dos factos provados que “[A] proprietária do veículo e a sua condutora tinham celebrado um contrato pelo qual tinham transferido a sua eventual responsabilidade civil decorrente da circulação do veículo para a “A… Compania de Seguros, SA (apólice 014262573 que faz fls. 282 a 303 dos autos e cujo teor se dá por reproduzido)”. E a análise desse contrato revela que consta dele uma cláusula segundo a qual é devida uma indemnização ao condutor do veículo segurado até um limite de 4.000.000.000 de pesetas (vinte e quatro mil e quarenta euros e quarenta e oito cêntimos) no caso de invalidez física e todas as despesas de assistência médica a efectuar durante um ano sempre que seja prestada em centros reconhecidos e até um máximo de 400.000 pesetas (dois mil quatrocentos e quatro euros e cinco cêntimos) em centros não reconhecidos (vd. fls. 292).

Significa pois este circunstancialismo de facto que a condutora do veículo beneficiava de um seguro que abrangia os danos físicos e com eles relacionados, por si sofridos, até aquele quantitativo referenciado, motivo pelo qual improcedem as conclusões de recurso quando defendiam a impossibilidade e a falta de fundamento legal de a sentença ter atribuído àquela autora qualquer indemnização.

Uma segunda questão suscitada pela recorrente é a de que, tendo sido fixada uma indemnização à autora T…, mesmo por referências ao seguro facultativo celebrado, nunca poderia ser superior a € 3.606,07 (600.00 pesetas) “[a]plicando-se, por analogia, a percentagem de incapacidade permanente geral parcial fixada - (15%) - ao previsto naquele Capítulo III, Alínea C), ponto 5.”

Explicitando, sabendo-se que o montante máximo segurado foi de € 24.040,48 e tendo presente que na al.C )1. do contrato se estabeleceu que o interesse do seguro, nesse segmento do condutor, abrangia “[I]nvalidez física permanente parcial: perda total de: um braço, 70%; uma mão, 50%; uma perna, 60%; um pé, 40%; um dedo polegar, 20%; outro dedo da mão, 10%; um dedo do pé, 5%; um olho, 30%; o ouvido, 40%; outras lesões a avaliar por analogia”, a recorrente sustenta que sendo a incapacidade parcial permanente da autora T… de 15%, do total do valor segurado apenas teria ela direito a essa percentagem e de onde resultaria o valor de € 3.606,07. Isto é, defende a recorrente que o valor da indemnização global fixado na sentença relativamente àquela autora deveria ter a dupla redução que a confinasse, primeiro, dentro dos limites do valor ressarcitório contratado e, depois, tendo este por referência, o limitasse ao correspondente à percentagem de incapacidade verifica.

Fazendo a interpretação das cláusulas do contrato acima indicadas, observando nessa interpretação as regras constantes dos arts 236 a 239 do CC, cremos que quando na C).1 se estabelece que existirá o pagamento de um capital em caso de acidente de circulação que envolva o veículo seguro quando o segurado sofra invalidez física permanente parcial, está a fixar-se um princípio indicativo do interesse segurado e que é, segundo a própria enunciação da alínea C) a morte, a invalidez permanente parcial e as despesas de assistência médica e transferências, que compõem as subalíneas no seu nº1.

O sentido normal dessas declarações, em nosso entender, apenas pode querer indicar uma enunciação que limita os tipos de danos cobertos pelo seguro, deixando de fora todos aqueles que se não reconduzam à incapacidade física permanente, à morte e, em qualquer um desses casos, à assistência médica prestada no próprio pais do acidente ou em Espanha.

Fazendo-se referência a determinado tipo de incapacidades na alínea 1.a)2. não cremos que aí se esteja a restringir a possibilidade de indemnizar apenas os casos de incapacidade parcial permanente até 70% deixando de fora, por absurdo, e sem indemnização, os que tivessem incapacidade superior, com o argumento de que essa alínea não refere incapacidades maiores que essa de 70%.

Julgamos mais correcto, numa visão interpretativa que respeite o art. 238 do CC referente aos negócios formais e à exigência de o sentido declarativo das declarações ter de ter uma correspondência no texto, considerar que o que aí se pretendeu foi simplesmente fazer constar que a invalidez física permanente parcial do segurado/condutor era um dos interesses/objecto do seguro, sendo a segunda parte da alínea, onde se referem diversos casos de incapacidade dessa natureza, meramente indicativa[2].

É precisamente por se atribuir a essa indicação de incapacidades um sentido não determinativo que imponha, por exemplo, que só essas e não outras pudessem ser indemnizadas, ou seja, que só essas concretas perdas enunciadas na alínea e nessas percentagens fixas pudessem ser ressarcidas, é por essa razão, dizíamos, que entendemos também que entre essa alínea reguladora do interesse do seguro (C.1) e a que fixa os valores seguros (C.5) não existe uma relação de dependência que determine que sobre o montante global segurado de € 24.040,48 se deva fazer repercutir a percentagem da incapacidade apurada.

Numa mesma linha de interpretação subordinada aos mesmos dispositivos legais do CC que antes referimos, basta notar que, a entender-se como a recorrente parece sustentar, as próprias perdas/percentagens enunciadas na cláusula C.1.a)2 do contrato (tendo por máximo 70%) determinariam que nunca o valor total do seguro seria possível de fixar uma vez que se o máximo de percentagem de incapacidade indemnizável fosse 70% e se era necessário fazer repercutir a percentagem nesse valor global, na lógica das conclusões, o máximo que se poderia fixar era 70% do valor da indemnização não sendo sequer isso que a recorrente queira concluir.

Em nossa opinião, sustentada com o quer ficou sumariamente dito anteriormente, cremos que não se pode nem deve estabelecer uma relação entre a enunciação do interesse do seguro, que fixa as situações indemnizáveis e aquela outra enumeração dos valores seguros, que limita o montante máximo que pode ser indemnizado, em casos de morte, de incapacidade parcial permanente e de assistência médica, concluindo-se assim que, quando o tribunal tenha considerado que a indemnização a fixar ao segurado condutor, beneficiário de um seguro como o provado nos autos, é superior ao valor máximo do contrato apenas poderá condenar na quantia correspondente a esse montante máximo, sem cuidar de fazer repercutir a percentagem apurado no valor global segurado.

Poderá afirmar-se que com este entendimento alguém que tenha 70% de incapacidade parcial permanente ou 15% de igual incapacidade receberá o mesmo montante indemnizatório desde que as indemnizações fixadas, ainda que muito distintas, ultrapassem em ambos os casos o valor global seguro. Porém, esta conclusão não impressiona pois, para além de nos negócios onerosos a interpretação das cláusulas recomendar que seja feita com o sentido que conduzir ao maior equilíbrio das prestações (art. 237 CC), na análise deste tipo de contratos tomando por referência indicativa o seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, observamos que o equilíbrio das prestações se realiza colocando, digamos assim, à disposição do segurado que pagou o respectivo prémio uma quantia que garanta, em caso de ocorrência do evento/risco previsto, uma indemnização até esse valor. E bastará pensar o que se passava antes da entrada em vigor do Dec. Lei 59/2004 de 19 de Março[3], com a limitação legal que existia no art. 508 nº1 do CC para a fixação da indemnização fundada no risco, (até ao dobro da alçada da Relação para cada pessoa) para se perceber já nesse tempo se entendia, como agora neste caso entendemos, que o montante total indemnizatório não estava sujeito a que sobre ele fosse feita incidir qualquer percentagem resultante da incapacidade física atribuída.      

O montante máximo fixado para a indemnização a atribuir aos casos de incapacidade física permanente nos termos do contrato, apenas pode ser entendido como isso mesmo, uma limitação à responsabilidade da seguradora, não podendo no entanto constituir uma base sobre a qual se venha a fazer incidir qualquer proporção que tenha por fundamento a concreta percentagem de incapacidade atribuída.

Mais explicitamente, cremos que, certificada a existência de uma incapacidade parcial permanente do segurado/condutor que lhe abra a possibilidade a que os danos daí resultantes sejam indemnizados, depois de fixar a indemnização que lhes corresponde, apenas nos teremos de preocupar em saber se o valor dessa indemnização é ou não superior ao montante máximo clausulado no contrato e, na afirmativa, condenar apenas no valor desse limite máximo que é o da responsabilidade da seguradora.

Nestes termos, observando que à autora T… e referente aos danos físicos e incapacidade que sofreu com o acidente, foi fixada pelo tribunal a quo uma indemnização superior ao valor máximo contratado (e que é de € 24.040,48) impõe-se alterar a sentença recorrida no sentido de ser a ré/recorrente condenada a pagar a esta autora a quantia de vinte e quatro mil e quarenta euros e quarenta e oito cêntimos, acrescida dos respectivos juros de mora desde a data da citação e até integral pagamento.

Os juros são contabilizados desde a data da citação uma vez que o montante da indemnização fixada pelo tribunal a título de danos patrimoniais (€ 109.998,56) e sobre o qual incidiam já juros desde a data da citação, excede em muito o valor que agora é estabelecido como condenação e por essa razão se entende que sobre a condenação agora fixada e que não tem de distinguir qual a parcela devida a titulo de danos patrimoniais e não patrimoniais, devem continuar os juros a ser contados desde a data da citação já que, sobre mais do que este montante fixado pela redução que resulta do contrato, eram devidos juros de mora desde a citação.

Da indemnização devida à autora D… a título de perda da capacidade de ganho

A recorrente defende que a sentença recorrida errou na fixação do valor do capital ressarcitório, a título de perda de capacidade de ganho da Autora/Recorrida D… porquanto “ [n]ão foram encontrados na perícia médica elementos, mormente sequelas passíveis de acarretar qualquer prejuízo de carácter anatómico-funcional ou psico-sensorial, que permitam a sua valorização em termos de incapacidade permanente geral, dano futuro, rebate profissional e prejuízo de afirmação pessoal (…)” pelo que, se esta autora iniciaria a sua vida activa aos 23 anos de idade, auferiria um salário médio líquido de 1.600€ e se ficou afectada de uma incapacidade permanente geral global de 12 pontos, o montante adequado seria o de € 20.000,00 para a indemnizar a esse título.

Neste campo decisório importa ter presente que a autora D… nasceu em 12/10/1997 e na sequência do acidente ocorrido em 7/8/2003 foi submetida a intervenção cirúrgica de ortopedia, com fixação do fémur esquerdo e atingiu cura clínica em 31.03.2004, sendo que da consolidação da fractura resultaram sequelas, as quais constituem uma incapacidade permanente geral fixável em 12 pontos, situação que dificulta e limita a sua actividade física tendo dores no joelho esquerdo nas mudanças de tempo.

Com este enquadramento fáctico, a sentença recorrida partindo da consideração de que a vida activa da autora D… começaria aos 23 anos, por aplicação de uma fórmula matemática que antes havia referido como sendo seguida maioritariamente pelos Tribunais, concluiu que seria de fixar uma indemnização a titulo de danos patrimoniais futuros por perda de capacidade de ganho no valor de € 100.000,00 reduzindo-a no entanto para os € 79.057,41 por apenas este montante ter sido peticionado.

O argumento firmado nas alegações de recurso para contrariar esta indemnização é, exclusivamente, o de que tendo a autora D… à data do acidente 5 anos de idade e tendo ficado provada apenas uma incapacidade parcial permanente geral de 12 pontos, mas sem que se possa afirmar que é uma incapacidade com rebate profissional e prejuízo de afirmação pessoal uma vez que ainda não trabalhava, a indemnização não deveria ultrapassar os € 20.000,00.  

A este propósito diga-se desde já que a incapacidade parcial permanente geral traduz a ideia de uma limitação de carácter constante, irretratável e que o tempo não dissipa, razão para que tenha sido sedimentada na jurisprudência[4] a orientação de que a incapacidade parcial permanente é de indemnizar ainda que quem a sofra não trabalhe ou, trabalhando, essa incapacidade não cause ao trabalho qualquer diminuição de proventos. É que, “mesmo não havendo uma repercussão negativa no salário ou na actividade profissional do lesado - por não se estar perante uma incapacidade para a sua actividade profissional concreta - pode verificar-se uma limitação funcional geral que terá implicações na facilidade e esforços exigíveis o que integra um dano futuro previsível, segundo o desenvolvimento natural da vida, em cuja qualidade se repercute”[5].

Importa ter presente que não é igual a situação de alguém que trabalhe e os danos que sofreu tenham uma incidência directa e imediata no seu trabalho, provocando uma limitação funcional que o impossibilite ou o onere com maior esforço, daquela outra de alguém que por não trabalhar não vê essa incidência repercutida. Mas é essa diferente perspectiva que leva a que se considere que um agravamento do esforço “desde que não se repercuta directa – ou indirectamente – no estatuto remuneratório profissional ou na carreira em si mesma e não se traduza, necessariamente numa perda patrimonial futura ou na frustração de um lucro, traduzir-se-á num dano moral. Isto é, o chamado dano biológico tanto pode ser ressarcido como dano patrimonial, como compensado a título de dano moral.

A situação terá de ser apreciada casuisticamente, verificando se a lesão originou, no futuro, durante o período activo do lesado ou da sua vida e, só por si, uma perda da capacidade de ganho ou se traduz, apenas, numa afectação da sua potencialidade física, psíquica ou intelectual, para além do agravamento natural resultante da idade.”[6].

Na verdade, a perda relevante de capacidades funcionais – mesmo que não imediatamente reflectida no valor dos rendimentos pecuniários auferidos pelo lesado – constitui uma verdadeira «capitis deminutio» num mercado laboral exigente, condicionando-lhe, de forma relevante e substancial, as possibilidades exercício profissional e de escolha de profissão, erigindo-se, deste modo, em fonte actual de possíveis e futuros lucros cessantes, a compensar, desde logo, como verdadeiros danos patrimoniais.

Já quanto ao valor indemnizatório foi entendido, no ac. do STJ de 12/05/94, in C.J. 1994, Tomo II, pág., 98, que a desvalorização permanente quando apenas avaliada em função de percentagem, sem ter caracterizado devidamente em que termos a actividade do lesado foi atingida, deverá ser considerada no âmbito da actividade não profissional, o que determinaria uma outra avaliação pecuniária, necessariamente menor que a que resultaria da aplicação das fórmulas matemáticas que têm o rendimento profissional do lesado por referência, sendo este o argumento da recorrente.

Cremos que a regra base de satisfação dos danos é inequivocamente a de que quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que se verificaria se não tivesse ocorrido o evento que obriga à reparação, fixável em dinheiro no caso de inviabilidade de reconstituição em espécie (artigos 562º e 566º, n.º 1, do Código Civil). Ou seja, a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal e a que teria então se não tivesse ocorrido o dano, e, não podendo ser determinado o seu valor exacto, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados (artigo 566º, n.ºs 2 e 3, do Código Civil). E este critério não muda quer o lesado tenha actividade profissional quer não a tenha seja porque não tem emprego, seja porque não tem ainda idade para ter essa actividade, como no caso da autora D...

Claro está que a avaliação da indemnização de quem tenha actividade remunerada conta com elementos mais concretos, quais sejam o valor do rendimento que aufere, por oposição aos elementos de ponderação que se devem usar relativamente ao lesado que não tenha rendimento profissional, realizando neste caso um juízo de prognóstica segurança e certeza jurídicas que permita um valor indemnizatório, sendo avisado usar de alguma parcimónia nessa prognose uma vez que estaremos a contar com elementos que apenas as preocupações de segurança e certeza sufragam.

No caso dos autos, entendeu-se que a autora D… começaria a ter actividade profissional aos 23 anos de idade e que durando até aos 65 anos, com um rendimento presuntivamente de € 2.000,00 mensais, numa projecção da fórmula utilizada, temperada com a equidade se obtinha um valor de € 100.000,00.

Que (no concreto dos autos) a incapacidade permanente é susceptível de afectar a autora D… e diminuir a sua potencialidade de ganho por via da implicação de um esforço acrescido para manter os mesmos níveis de ganho nas actividades que ainda não desenvolve mas previsivelmente virá a desenvolver, é uma certeza[7]. E que para evitar o primado do total subjectivismo se aceita com alguma unanimidade que o montante indemnizatório deva começar por ser procurado com recurso a processos objectivos, nomeadamente através de fórmulas matemáticas, cálculos financeiros, aplicação de tabelas, com vista a calcular o referido capital produtor de um rendimento vitalício para o lesado que, entregue de uma só vez, e diluído no tempo da sua vida activa, lhe proporcione o mesmo rendimento que antes auferiria se não tivesse ocorrido a lesão ou o compense pelo maior grau de esforço desenvolvido, é outra certeza que temos por pacífica.

  Porém, as exigências sempre prioritárias de concretização da equidade, a partir dos elementos de facto apurados, independentemente do seu desenvolvimento no quadro das referidas fórmulas de cariz instrumental, deve estabelecer-se no âmbito de juízos de verosimilhança e de probabilidade, tendo em conta o curso normal das coisas e as particulares circunstâncias do caso. E apesar do longo período de funcionamento da previsão, bem assim, no caso que nos ocupa, da circunstância de a autora ser uma menor de idade que ainda não trabalha, a quantificação deve ser imediata, sob a atenuação da fluidez do cálculo no confronto da referida previsibilidade, no domínio da variável inatingível da trajectória futura da lesada, quanto ao tempo de vida e à eventual espécie de trabalho, por via dos referidos juízos de equidade[8].

Consideramos pois que na indemnização a fixar, segundo esta axiomática decorrente da interpretação das normas aplicáveis, teremos de observar o maior cuidado e, utilizando embora as fórmulas indicadores, no juízo final da equidade teremos de fazer pesar o grau de incerteza das variáveis, nomeadamente, quanto ao montante do vencimento mensal tipo por referência, prudência que recomenda sempre contenção pois que a certeza que se há-de retirar da incerteza constitui por imperativos de segurança um juízo por defeito.

Posto isto, na apreciação das fórmulas que podem ser utilizadas, elas são várias, desde a já aludida no ac. do STJ de 5.5.1994 e recomposta para programa informático pelo Sr. Cons. Mário Cruz, constante no ac. do STJ de 04-12-2007 in dgsi.pt, de que ele mesmo foi relator, até à produzida no Ac. da RC de 4.4.1995 (referenciada como matriz da decisão da sentença recorrida) e ainda outras, nomeadamente, a que se expressa como: C=P*((1/i)-((1+i)/(1+i)N*i))+P*(1+i)-N , e na qual P é a prestação anual ; i é a taxa de juro e N é o número de anos.

Estas fórmulas, jogando com as mesmas variáveis (v.g. idade do lesado, incapacidade, esperança de vida, taxa de juro de capitalização e taxa de inflação), conduzem no entanto a resultados diversos[9], embora próximos entre si, o que resulta do maior ou menor valor atribuído a cada um dos itens da fórmula, desde logo à taxa de juro e de inflação aceite.

Julgamos no entanto que a fórmula que resume em si mesma mais potencialidade de cumprir uma prognose eficaz é aquela que foi inicialmente utilizada pelo STJ no Acórdão de 1994.05.05 acima citado e que se mantém com adestramentos de rigor inteiramente actual.

Partindo de um factor índice obtido da conjugação matemática dos factores de taxas de juro, de inflação e tempo de esperança de vida activa, multiplica-se aquele pelo rendimento anualmente auferido à data do acidente e novamente multiplicado pela percentagem de IPP, e, assim, obtém-se o capital necessário que, diluído com os rendimentos que ele próprio for gerando, proporcione ao lesado, até à sua idade de reforma, o valor correspondente ao valor perdido.

Tomando o factor/índice de 22,70136 referente aos 42 anos de vida profissional activa estimada para a autora D… e aplicando os elementos de cálculo enunciados ao caso concreto verificamos que o resultado obtido é de 56.746,50 € .

A esta quantia haverá, no domínio do cálculo ainda, que descontar a importância que se entende que um lesado em condições normais gasta consigo, mesmo não havendo acidente, sendo esta fixável, à falta de dados objectivos que suportem melhor critério, numa percentagem que se situe entre o 1/3 e 1/4 dos rendimentos, consoante a pessoa em causa seja solteira ou casada. Ora no caso sendo a autora D… solteira poderíamos dizer que a redução se fixaria em 1/3 mas teremos de contar no juízo equitativo com a prognose de, sendo ela uma criança, será uma variável de ponderação também a circunstância de poder vir a casar, motivo que levará a equidade a não se esquecer dessa dimensão.

Assim, a frieza dos números daria um valor indemnizatório de 37.830,00 € (trinta e sete mil oitocentos e trinta euros), aproximado ao que se encontra por recurso a outras tabelas com excepção da utilizada na sentença recorrida que como vimos é a (única) que conduz a valores substancialmente diferentes, recordando que esse valor deve ser considerado sempre como um minus a ser elevado pelas regras de equidade[10].

Com esse valor objectivo apurado devemos, seguidamente, aplicar as regras de equidade que nos termos do art. 496 nº3 e 494 do CC reportam a culpa do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso. Por outro lado, deveremos notar neste domínio que o tempo contabilizado na fórmula de cálculo é a idade da reforma mas a esperança de vida das mulheres em Portugal é de 81 anos e na Suíça é de 84 anos[11] e esta circunstância impõe que se tenha em conta, mais do que a esperança média de vida activa da lesada, a esperança média de vida, uma vez que, como é óbvio, as suas necessidades básicas não cessam no dia em que deixa de trabalhar por virtude da reforma, conclusão que tem sido retirada pelos acórdãos do STJ a este respeito[12].

Em suma, na indemnização a fixar deve estar presente a álea própria de um futuro imprevisível mas que reclama a evidência de ser expectável, com alguma segurança e segundo as regras de experiência comum, que a autora D… em condições normais venha a ter uma determinada esperança de vida com um conjunto de realizações que são (ainda) as habituais a qualquer ser humano e que passam, em termos de representação social, por ter emprego (e mesmo que sem um modelo promocional garantido) que gratifique pessoalmente quem o exerce fornecendo uma base de bem estar, consciência, humanização e inserção social.

Na presença de tudo o exposto, tendo presente que a data a atender na fixação é a desta decisão, sendo que o acidente ocorreu em 2003, cremos que a quantia a título de indemnização que deverá ser fixada à autora D… é a de 50.000,00 € (cinquenta mil euros) a que devem acrescer juros de mora à taxa legal desde a data desta decisão.

Em síntese e perante o que ficou apreciado deve a presente Apelação merecer parcial procedência no sentido de ser a Ré ora recorrente condenada:

- a pagar à autora D… a quantia de € 50.000,00 (cinquenta mil euros ) a título de danos patrimoniais acrescidos de juros de mora desde a data desta decisão até integral pagamento à taxa legal, que é neste momento de 4% ao ano, mantendo no mais e quanto a esta autora a restante condenação (a título de danos não patrimoniais)

- a pagar à autora T… a quantia total de € 24.040,48 (vinte e quatro mil e quarenta euros e quarenta e oito cêntimos) e juros de mora desde a data da citação até integral pagamento à taxa legal e que é neste momento de 4% ao ano.

            … …

Decisão

Pelo exposto acorda-se em julgar parcialmente procedente a Apelação e, em consequência, altera-se a decisão recorrida, condenando a Ré Gabinete Português da Carta Verde a pagar à autora D… a quantia de € 50.000,00 (cinquenta mil euros) a título de danos patrimoniais acrescidos de juros de mora desde a data desta decisão até integral pagamento à taxa legal, que é neste momento de 4% ao ano, mantendo no mais e quanto a esta autora a restante condenação (a título de danos não patrimoniais); a pagar à autora T… a quantia total de € 24.040,48 (vinte e quatro mil e quarenta euros e quarenta e oito cêntimos) e juros de mora desde a data da citação até integral pagamento à taxa legal e que é neste momento de 4% ao ano.

Mantém-se no mais a decisão recorrida.

Custas por Recorrente e recorrida na proporção do respectivo decaimento.


Manuel Capelo (Relator)
Jacinto Meca
Falcão de Magalhães


[1] Vd. Garção Soares, José Maria dos Santos e Maria José Rangel de Mesquita, in Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel, 2ª ed., 2001, pág. 833
[2] Questão mais interessante, mas que nos autos não se coloca seria a de eventualmente determinar que tipo de incapacidade seria de considerar na indemnização se uma perícia médica fixasse num processo uma percentagem diferente da referida no contrato para uma das perdas aí mencionada.
[3] Legalmente é essa a data que marca o fim dessa limitação mas jurisprudencialmente a polémica em volta do art. 508 do CC que continha essa limitação, inferior ao montante do limite do seguro obrigatório, tinha começado a existir muito antes, ou seja, pouco depois da entrada em vigor no ordenamento jurídico português com o D.Lei 3/96 , a partir de 1 de Janeiro de 1996, da 2ª Directiva Automóvel (Directiva nº84/5/CEE do Conselho d 3/96 de 25/1 e 30 de Dezembro de 1983 que fixou o montante dos valores mínimos do seguro obrigatório de responsabilidade automóvel.    
[4] Vd acs. STJ de 17-5-2011, no proc. 7449/05.0TBVFR.P1.S1, in dgsi.pt, onde se refere significativamente que “A circunstância de não ter demonstrado que, no imediato, o A. tivesse sofrido qualquer redução salarial também não exclui ou faz esvaziar o seu direito à reparação, que o é de um dano futuro, que vai projectar-se ao longo de toda uma vida activa de produtividade limitada”
[5] Vd. ac. do STJ de 27/10/2009, Pº nº 560/09.0 YFLSB, in dgsi.pt
[6] Vd. ac. STJ de 27/10/2009 citado
[7] Entre muitos outros, cfr. Acs do STJ de 18/12/07, Pº 07B3715, de 17/1/08, Pº 07B4538, de 17/6/08, Pº 08A1266, de 10/7/08, Pº 082B111, e de 23/10/08, Proc. 08B2318, todos no ITIJ, bem como Cons. Sousa Diniz, “Dano Corporal em Acidentes de Viação”, CJ STJ, Ano IX, T.1, pág. 6 e segs.
[8] Vd. Vd.  Estudo Publicado na Revista “Sub Judice”, nº17, 2000, Janeiro/Março, pág.163
[9] É o caso da estabelecida no ac. RC de 4.4.95 em que os valores que com ela se obtêm são significativamente superiores aos obtidos com todas as outras fórmulas, por referência aos índices utilizados, fórmula esta que há muito que deixou de servir de referência no STJ.
[10] Vd. ac. STJ de 17/5/2011 antes citado
[11] Cfr. http://geographicae.wordpress.com/2007/10/16/esperanca-de-vida-no-mundo/

[12] Vd. acs. STJ 1283/03, 3011/03, 4282/03, 2897/04, 305/05 e 3072/05, de 27.5.03, 20.11.03, 19.2.04, 19.10.04, 7.4.05 e 15.11.05, 1564/03, 3441/03, 207/04 e 298/05 e ainda os Acs.do STJ de 10.2.98 e 25.6.02, na CJ Ano VI, I, 66, e Ano X, II, 128, ambos fazendo um ponto da situação muito completo; Ac. STJ de 5 /7/2007 no proc. 07A1818, in dgsi.pt.