Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
434/11.5TJCBR-D.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARLOS MOREIRA
Descritores: INSOLVÊNCIA
EXONERAÇÃO DO PASSIVO RESTANTE
PREJUÍZO
CREDOR
Data do Acordão: 01/09/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COIMBRA 1º J C
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS.238, 239 CIRE
Sumário: I -O prejuízo dos credores exigido pela al.d) do nº1 do artº 238º do CIRE que obsta à concessão da exoneração do passivo restante, não decorre automaticamente do atraso na apresentação à insolvência, mas, também, não constitui elemento autónomo e independente de tal atraso e, apenas, consistente em actos de dissipação de património ou acumulação de dívidas; antes podendo ser qualquer hipótese de redução da possibilidade de pagamento dos créditos, posto que oriunda do atraso na apresentação à insolvência e emergente dos factos apurados e/ou da interpretação que deles pode/deve ser feita.

II- Assim, é de concluir por tal prejuízo: se a situação de insolvência do impetrante da exoneração ocorre em 2004/2005; se a dívida, com créditos vencidos, ascende a quase 4 milhões de euros; se contra ele foram instauradas acções e execuções em 2005 e 2006; se um credor foi obrigado a fazer provisões pelo valor do seu crédito; e se o devedor apenas requer a insolvência cerca de seis anos após aquela situação, sendo que, neste interim, ficou desempregado e sem rendimentos.

Decisão Texto Integral: ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA

1.

J (…)apresentou-se à insolvência e peticionou a  exoneração do passivo restante.

2.

No seguimento do processo foi proferido despacho inicial no qual se concluiu e decidiu que:

«Não se vislumbrando nenhuma das circunstâncias previstas no artº 238º para o indeferimento liminar da pretensão, declaro que a exoneração será concedida uma vez observadas pelo devedor as condições previstas no artº 239º durante os cinco anos posteriores ao encerramento do processo de insolvência.»

3.

Inconformado com tal despacho dele recorreu o credor Banco (…), SA.

Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões:

1. Salvo o devido respeito, a douta decisão em apreço não fez correcta interpretação dos factos e adequada aplicação do Direito, devendo ser revogada e substituída por outra que indefira liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante do Insolvente, ora Recorrido.

2. Em 8 Fevereiro de 2011, J (…), ora Recorrido, apresentou-se à insolvência requerendo, desde logo, a exoneração do passivo restante.

3. O Banco é Credor reclamante do Insolvente J (…), do montante global de Eur.9.165,97 (nove mil, cento e sessenta e cinco euros e sessenta e sete cêntimos).

4. O valor global das dívidas da Insolvente é avultado – Eur.3.862.362,65 (três milhões, oitocentos e sessenta e dois mil, trezentos e sessenta e dois euros e sessenta e cinco cêntimos) - sobretudo, se ponderarmos que dizem respeito a uma pessoa singular.

5. De entre os requisitos do nº1, do art. 238º, do CIRE, e no que ao caso interessa, dispõe a al. d) que deve ser indeferido o pedido se "o devedor tiver incumprido o dever de apresentação à insolvência ou não estando obrigado a se apresentar, se tiver abstido dessa apresentação nos seis meses seguintes à verificação da situação de insolvência, com prejuízo em qualquer dos casos para os credores, e sabendo, ou não podendo ignorar sem culpa grave, não existir qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica".

6. O ora Recorrido, não se apresentou à Insolvência no momento legalmente devido, isto é, dentro do período de 6 meses a contar do momento da verificação da situação de impossibilidade de cumprimento das obrigações vencidas.

7. De facto, uma vez que os montantes reclamados se encontram vencidos desde, sensivelmente, 2004 e 2005, e que o Insolvente responde por esses valores pessoal e solidariamente, não poderia este ignorar que se encontrava em indubitável situação de insolvência.

8. Aquando da sua apresentação à insolvência o Insolvente J (…)já havia sido demandada no processo n.º 3685/05.8TBBRG, a correr termos na Vara de Competência Mista do Tribunal Judicial de Braga, no processo nº 709-B/2000, a correr termos no 1º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Matosinhos, no processo n.º 2852/05.9TBCBR, a correr termos na 2ª Secção da Vara Competência Mista do Tribunal Judicial de Coimbra, no processo nº 3630/06.3YYPRT, a correr termos na 2ª Secção do 2º Juízo de Execução do Tribunal Judicial do Porto e no processo n.º 156/05.6TBESP-B, a correr termos no 2º Juízo do Tribunal Judicial de Espinho.

9. Ora, o Insolvente, atento o elevado passivo de que era (e é) devedor - cerca de Eur.4.000.000,00 - não podia ignorar a inexistência de qualquer perspectiva séria de melhorar a sua situação económica de tal forma que lhe permitisse amortizar, ainda que lenta e fraccionadamente, as dívidas reclamadas.

10. É forçosa, portanto, a conclusão de que o devedor não se apresentou à insolvência no momento devido, nem o fez nos seis meses posteriores à consciencialização da sua calamitosa situação financeira.

11. Ao se abster de se apresentar à insolvência, recusando todas as evidências quanto ao seu colapso financeiro, o Insolvente conseguiu apenas protelar as suas dívidas, provocando um acréscimo do seu passivo, e, ainda, um maior prejuízo aos seus Credores, decorrentes dos encargos atinentes às acções executivas intentadas para recuperação dos seus créditos e que poderiam ser evitadas com a atempada apresentação à insolvência.

12. Despesas que seriam perfeitamente evitáveis e dispensáveis se o Insolvente tivesse tomado a iniciativa de se apresentar a insolvência perante a universalidade dos credores.

13. Acresce que os respectivos créditos se foram avolumando, face ao vencimento de juros e pelo, consequente avolumar do passivo global do Insolvente, assim como aumentaram os custos das diligências tendentes à recuperação dos mesmos, com a desvalorização acentuada dos bens que compunham o seu activo.

14. Acresce que, o Reclamante, como instituição bancária, está obrigado a provisionar o incumprimento, junto do Banco de Portugal (cfr. Aviso do Banco de Portugal n.º 3/95, de 30 de Junho), sendo que, mantendo-se a situação de incumprimento, não é possível libertar as provisões, com manifesto prejuízo para o desenvolvimento na sua actividade creditícia.

15. Neste sentido, urge considerar o vertido no Acórdão do Tribunal da Relação de Porto, de 15.12.2010, in www.dgsi.pt:

16. “I - Resulta da experiência comum que a falta de apresentação tempestiva à insolvência provoca o avolumar dos juros, com o consequente aumento do passivo. Acresce a necessidade de os Bancos credores provisionarem o incumprimento junto do Banco de Portugal. Com isso, ficam cativas verbas que, se não fosse esse aprovisionamento, os Bancos credores poderiam utilizar na sua actividade. Todas essas situações acarretam prejuízo para esses Bancos.

II - Inexistindo património, quanto maior o passivo, maior a dificuldade de os credores verem os seus créditos satisfeitos e maior o seu prejuízo destes.”

17. Conforme refere o Sr. Administrador de Insolvência no relatório junto aos autos, o Insolvente exercia a actividade de topógrafo.

18. O Insolvente não procurou exercer outras actividades que lhe proporcionassem mais rendimentos, não existindo, assim, qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica.

19. Atente-se que, «Ao falar em “perspectiva séria” o legislador aponta para um juízo de verosimilhança sobre a melhoria económica do insolvente, alicerçada naturalmente em indícios consistentes e não em fantasiosas construções ou optimismo compulsivo» (vide Ac. RG, de 4 de Outubro de 2007)

20. Ora, atentos os factos acima descritos, desde, pelo menos, 2005 que o Insolvente tem plena consciência que o seu passivo é muito superior ao seu activo, assim como, não tem, nem nunca teve, perspectivas sérias de aumentar os seus rendimentos, de forma a permitir-lhe pagar a totalidade das dívidas vencidas, ainda que faseadamente.

21. Tal como refere a decisão do Acordão da Relação de Lisboa de 26 de Novembro de 2006 (CJ, IV/06, pág. 97) “O pedido de exoneração deve ser indeferido liminarmente, se o devedor tiver incumprido o dever de apresentação à insolvência ou, não estando obrigado a apresentar-se, se tiver abstido dessa apresentação nos 6 meses seguintes à verificação da situação de insolvência com prejuízo, em qualquer dos casos, para os credores e sabendo (ou não podendo ignorar sem culpa) não existir qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica. Deve presumir-se o prejuízo dos credores do facto de o requerente da exoneração não se ter apresentado à insolvência, quando seja manifesto que ele, desde há vários anos, não tinha bens penhoráveis susceptíveis de satisfazer os créditos dos seus credores.”

22. O Insolvente incumpriu, assim, o dever de não se abster de se apresentar à insolvência, com prejuízo para os seus Credores, e sabendo não existir qualquer perspectiva séria de melhoria da sua condição económica, pelo que a decisão “a quo” violou a previsão da alínea d) do nº 1 do artigo 238º do CIRE, legitimando desse modo a apelação, ora deduzida.

Contra alegou o impetrante pugnando pela manutenção do decidido.

4.

Sendo que, por via de regra: artºs 684º e 685º-A do CPC - de que o presente caso não constitui excepção - o teor das conclusões define o objecto do recurso, a questão essencial decidenda é a seguinte:

(I)legalidade da decisão de recusa da homologação do plano de insolvência, por referencia ao disposto no artº 238º nº1 al.d) do CIRE.

5.

Os factos.

A sentença não é modelar – antes pelo contrário -  na especificação dos fundamentos de facto, como legalmente imposto – artº 659º nº2 do CPC.

Na verdade nela a Sr. Juiza limita-se a fazer um relatório do meramente alegado pelo requerente, pelo Administrador da insolvência e pelos credores – maxime o ora recorrente – quando, summo rigore, deveria  pronunciar-se,  adrede, afirmativa e inequivocamente, sobre os factos que considera provados ou suficientemente indiciados.

O que, numa perspectiva de exigência formal, poderia levar à conclusão de que ela é nula – artº 668º nº1 al.b) do CPC -, ou, pelo menos, ao chamamento do disposto no artº 712º nº4 por a mesma se apresentar deficiente e obscura, pelo menos sobre determinados pontos da matéria de facto.

Todavia, em abono da economia de meios e da celeridade processual e, determinantemente,  atentas as posições da julgadora e das partes, e numa apurada análise das mesmas – vg. a não oposição do recorrido ao factualmente invocado pela recorrente-, vislumbram-se como pacíficos os seguintes factos:

O Insolvente J (…), é devedor do montante global de Eur.3.862.362,65 (três milhões, oitocentos e sessenta e dois mil, trezentos e sessenta e dois euros e sessenta e cinco cêntimos).

O referido montante resulta de diversas operações financeiras avalizadas pelo Insolvente à sociedade “V (…), S.A.” a qual foi, igualmente, declarada insolvente a 21 de Dezembro de 2004 no Processo n.º 3213/04.2TJCBR, do 5.º Juízo Cível dos Juízos Cíveis de Coimbra.

Os montantes reclamados encontram-se vencidos desde, sensivelmente, 2004 e 2005, e o Insolvente responde por esses valores pessoal e solidariamente.

O ora recorrido apresentou-se à insolvência em  8 Fevereiro de 2011 em cujo requerimento pediu a exoneração do passivo restante.

O Banco recorrente é Credor reclamante do Insolvente no montante global de Eur.9.165,97 (nove mil, cento e sessenta e cinco euros e sessenta e sete cêntimos).

O referido montante é referente a uma garantia bancária prestada a favor da Câmara Municipal de A (...).

 O recorrente, como instituição bancária, está obrigado a provisionar o incumprimento, junto do Banco de Portugal (cfr. Aviso do Banco de Portugal n.º 3/95, de 30 de Junho), sendo que, mantendo-se a situação de incumprimento, não é possível libertar as provisões.

Aquando da sua apresentação à insolvência o Insolvente J (…) já havia sido demandado no processo n.º 3685/05.8TBBRG, a correr termos na Vara de Competência Mista do Tribunal Judicial de Braga, no processo nº 709-B/2000, a correr termos no 1º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Matosinhos, no processo n.º 2852/05.9TBCBR, a correr termos na 2ª Secção da Vara Competência Mista do Tribunal Judicial de Coimbra, no processo nº 3630/06.3YYPRT, a correr termos na 2ª Secção do 2º Juízo de Execução do Tribunal Judicial do Porto e no processo n.º 156/05.6TBESP-B, a correr termos no 2º Juízo do Tribunal Judicial de Espinho.

A dita sociedade “V (…), S.A encontra-se actualmente em fase de liquidação.

O insolvente estima que o valor por que os bens que fazem parte da sociedade serão vendidos não será suficiente para o pagamento da totalidade dos montantes por si avalizados.

Presentemente o insolvente não exerce qualquer profissão, encontrando-se desempregado e sem auferir qualquer subsídio. Normalmente desenvolve a actividade de topógrafo, sendo que actualmente se encontra desempregado, não auferindo qualquer vencimento mensal.

O insolvente não se apresentou à insolvência nos seis meses seguintes à verificação da situação da impossibilidade do cumprimento dos compromissos financeiros assumidos

6.

Apreciando.

6.1.

Nos termos do  artº 235º do CIRE: Se o devedor for uma pessoa singular, pode ser-lhe concedida a exoneração dos créditos sobre a insolvência que não forem integralmente pagos no processo de insolvência ou nos cinco anos posteriores ao encerramento deste ….

Como se expende na decisão: «A concessão da exoneração do passivo é uma medida inovadora, que o preâmbulo do DL 53/2004, de 18.03 explica: “O Código conjuga de forma inovadora o princípio fundamental do ressarcimento dos credores com a atribuição aos devedores singulares insolventes da possibilidade de se libertarem de algumas das suas dívidas, e assim lhes permitir a sua reabilitação económica. O princípio do fresh start para as pessoas singulares de boa fé incorridas em processo de insolvência…»

A exoneração representa uma excepção, ou, pelo menos, um desvio importante à ratio e teleologia que subjaz e inspira todo o regime do CIRE, qual seja, a satisfação, o mais ampla e célere possível, dos direitos dos credores.

Por outro lado: «a introdução deste mecanismo pode levar a um aumento grande do número de processos de insolvência de pessoas singulares, uma vez que se pode revelar bastante vantajoso para essas pessoas. As estatísticas tenderão, pois, a reflectir a introdução dos mecanismos da nova lei» - Assunção Cristas, Exoneração do Devedor do Passivo Restante, in Revista Themis da Faculdade de Direito da UNL, 2005, p.166.

Nesta conformidade, considerando o aludido cariz excepcional e sendo congeminável uma actuação, pelo menos temerária, do devedor no impetramento da exoneração, importa operar uma análise cuidada e cuidadosa sobre a verificação e presença, ou não, dos requisitos legais que a tal pedido podem obviar.

Efectivamente «se o incidente não deverá reduzir-se a um “instrumento oportunística e habilidosamente empregue unicamente com o objectivo de se libertarem os devedores de avultadas dívidas, sem qualquer propósito mesmo de alcançar o seu regresso à actividade económica, no fundo o interesse social perseguido” e “sem que se divise sequer, mesmo em termos verosímeis, o almejado retorno à actividade económica do beneficiário dado que a este título nenhuma comprovação lhe é exigível”, a exoneração do passivo é uma medida de protecção ao devedor que seja pessoa singular, que tenha pautado a sua conduta passada pela correcção, transparência e boa fé nas relações, e que durante um período de prova, venha a revelar idêntica conduta. Há um tratamento diferenciado, favorável a estes devedores relativamente aos demais insolventes, a respeito dos quais o interesse social não justifica igual protecção. Daí que, no despacho inicial, seja a actuação passada e presente do devedor insolvente analisada, até para aferir da vontade e capacidade do requerente para cumprir as exigências que a lei lhe impõe, havendo de rejeitar-se o benefício quando dessa actuação se conclua que o devedor não merece beneficiar dessa protecção e que com a pretensão nada mais visa do que libertar-se das dívidas duma forma fácil e rápida (decorridos apenas cinco anos, sem esperar pelo decurso do normal prazo de prescrição)»- Ac. da Relação do Porto de 18.06. 2009, dgsi.pt. p. 3506/08.0TBSTS-A.P1, cit. na sentença.

            Na verdade: «A exoneração do passivo restante não pode ser vista como a possibilidade de o insolvente se libertar, quase automaticamente, da responsabilidade de satisfazer as obrigações para com os seus credores…» - Ac. da Relação do Porto de 10.05.2011, dgsi.pt, p. 1292/10.2TJPRT-D.P1.

Cuidado aquele tanto mais de adoptar quanto é certo que ao devedor, para obter o deferimento liminar da exoneração, basta invocar que não está abrangido por qualquer impedimento legal, e impendendo sobre o Administrador, ou qualquer credor, convencer da verificação de qualquer dos factos integrantes dos fundamentos do “indeferimento liminar” previsto no art. 238º do CIRE, já que estes têm natureza impeditiva da pretensão formulada  por aquele – cfr. artº 342º nº2 do CC e Ac. do STJ de 06.07.2011, dgsi.pt, p. 7295/08.0TBBRG.G1.S1.

Isto não obstante, e considerando o elevado grau de dificuldade de tal prova,  dado que incide sobre factos pessoais ou, porventura, praticados pelo insolvente no âmbito de uma actividade mais ou menos de cariz privado e até sigiloso, se poder perspectivar tal ónus com algum grau de mitigação e plasticidade e, eventualmente, poder exigir-se a colaboração acrescida do insolvente para  se apurar e clarificar a presença (ou não presença) dos legais requisitos impeditivos da exoneração.

6.2.

De entre as causas de indeferimento liminar, releva para o caso vertente o disposto na al.d) do nº1 do artº 238º do CIRE, a saber: ter o devedor incumprido o dever de apresentação à insolvência ou não estando obrigado a se apresentar, se tiver abstido dessa apresentação nos seis meses seguintes à verificação da situação de insolvência, com prejuízo em qualquer dos casos para os credores, e sabendo, ou não podendo ignorar sem culpa grave, não existir qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica.

Como ressumbra da sua letra, a aplicação deste segmento normativo  apenas emerge se estiverem presentes os seus três elementos constitutivos, a saber:

a) o devedor não cumpriu o dever de apresentação à insolvência ou, se não estando obrigado a tal apresentação, não o tiver feito nos seis meses seguintes à verificação da situação de insolvência;

b) existência de prejuízos para os credores decorrentes do incumprimento do dever de apresentação;

c) o conhecimento, ou desconhecimento culposo, de que não havia qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica.



A emergência e aplicação deste segmento normativo tem sido objecto de várias posições/ interpretações jurisprudenciais no que tange ao elemento “prejuízo”.

Para uns ele decorre automaticamente do incumprimento à apresentação à insolvência –  cfr. os sgs. Acs. in dgsi.pt: TRC DE 17/12/2008, P. 1975/07.4TBFIG.C1; TRG DE 30/04/2009 P.2598/08.6TBGMR-G.G1; DO TRP DE 15.07.2009 P.6848/08.0TBMTS; DO TRG DE 31/12/2009, p.2199/08.9TBGMR.G1; DO TRP DE 19/01/2010, p.627/09.5TBOAZ-B.P1; DO TRL DE 28/01/2010 p.1013/08.OTJLSB-D.L1-8; DO TRC DE 11/02/2010, p.570/10.5TBMGR-B.C1; DO TRP DE 20/04/2010, p.1617/09.3TBPVZ-C.P; DO TRG DE 12/07/2010, 7750/08.1TBMTS-F.G1; DO TRC DE 07/09/2010, p.72/10.0TBSEI-D.C1; DO TRG DE 12/10/2010, p.2945/09.8TBBRG.G1; DO TRC DE 14/12/2010, p.326/10.5T2AVR-B.C1; DO TRP DE 15/12/2010,p. 1344/10.TBPNF-A.P1; DO TRG DE 27/01/2011,p. 6067/09.9TBBRG-G.G1; 

Aduzem, para tanto e em síntese que: «A partir do momento em que, estando em situação de insolvência, não existe qualquer perspectiva séria de melhoria da situação económica em que se encontram, a inacção dos devedores, ao não requererem tempestivamente a respectiva insolvência, redunda, em princípio, em prejuízo dos credores, pois que, para além de provocar o avolumar dos montantes em dívida a estes, por via do acumular dos juros remuneratórios e/ou moratórios, possibilita que o património se vá dissipando, diminuído, assim, a garantia que este representa para tais credores.»-  Ac. da Rel. Coimbra de14/12/2010, cit.

Para outros tal elemento é autónomo, independente e adicional, do atraso à apresentação à insolvência - cfr. os sgs. Acs., in dgsi.pt: do TRP de 11/01/2010, 347/08.8TBVCD-D.P1; do TRP de 14/01/2010, 135/09.4TBSJM.P1; do TRC de 23/02/2010 1793/09.5TBFIG-E.C1; do TRP de 19/05/2010, 1634/09.3TBGDM-B.P1; do TRP de 30/09/2010, 430/09.2TJPRT.P1; do TRC de 02/11/2010, 570/10.5TBMGR-B.C1; do TRP de 18/11/2010, 1826/09.5TJPRT-E.P1; do TRC de 23/11/2010 1293/09.3TBTMR-A.C1; do TRL de 14/12/2010, 2575/09.0TBALM-B.L1-1; do TRG de 18/01/2011, 5984/09.0TBBRG-E.G1; do TRP de 25/01/2011, 4898/09.9TBSTS-E.P1; do TRP de 08/02/2011, 754/10.6TBOAZ-E.P1; do TRP de 10/02/2011, 1241/10.8TBOAZ-B.P1;  do TRP de 15/03/2011, 2887/10.0TBGDM-E; de 24.03.2011, p. 444/10.0TBPNI-D.L1-6.

Invocam estes: «o prejuízo dos credores acresce aos demais requisitos - é um pressuposto adicional, que aporta exigências distintas das pressupostas pelos demais requisitos, não podendo por isso considerar-se preenchido com circunstâncias que já estão forçosamente contidas num dos outros requisitos. Valoriza-se aqui […] a conduta do devedor, ou seja, apurar se o seu comportamento foi pautado pela licitude, honestidade, transparência e boa fé, no que respeita à sua situação económica, devendo a exoneração ser liminarmente coarctada caso seja de concluir pela negativa.

 […] a lei não visa mais do que os comportamentos que façam diminuir o acervo patrimonial do devedor, que onerem o seu património ou mesmo aqueles comportamentos geradores de novos débitos (a acrescer àqueles que integravam o passivo que estava já impossibilitado de satisfazer).» - Ac. do TRP de 21/10/2010, p.3916/10.2TBMAI-A.P1.

Finalmente outros, considerando que o prejuízo não pode ser desligado do atraso na apresentação, entendem que ele não pode ser presumido, mas antes efectivo e decorrente de factos apurados – Cfr. entre outros, o Ac. do TRC de 25.10.2011, p. 96/11.0T2AVR-D.C1 e do  STJ de 03.11.2011, p. 85/10.1TBVCD-F.P1.S1.

Clamam estes que: «Do simples facto de o insolvente se apresentar tardiamente à insolvência não se pode presumir, sem mais, a verificação de prejuízo para os credores. Esse prejuízo, a que se alude naquela norma, terá que ser efectivo e consubstanciado ou concretizado em factos que autorizem a conclusão quanto à existência do mesmo, e tendo sempre como causa ou relação a apresentação tardia à insolvência.» (sublinhado nosso) Ac. do TRC.

Na verdade: «Em primeiro lugar…resulta da letra da lei, que liga causalmente o prejuízo ao atraso na apresentação, por referência ao prazo de seis meses. Restringir a sua aplicação às hipóteses em que o devedor contraiu novas dívidas ou dissipou o património significa encontrar outra causa do prejuízo.

Por outro lado:«a consideração equilibrada do interesse dos credores – protegidos pelo processo de insolvência… – e dos devedores – que o regime da exoneração beneficia – obriga a exigir como condição deste benefício uma actuação que também objectivamente tenha acautelado os interesses daqueles, traduzida numa apresentação à insolvência em tempo oportuno. Não é suficiente que o devedor não tenha dissipado o património, contraído “mais e mais dívidas”, andado a “meter para o bolso”…; basta recordar que o pedido de exoneração pode ser indeferido mesmo que a insolvência seja apenas fortuita.»

Destarte: «Tal prejuízo deve entender-se como abrangendo qualquer hipótese de redução da possibilidade de pagamento dos créditos, provocada pelo atraso na apresentação à insolvência, desde que concretamente apurada, em cada caso.» - Ac. do STJ.(sublinhado nosso).

Propendemos para este último entendimento, o qual consideramos o mais curial porque mais equitativo na perspectivação dos interesses em confronto: o dos credores a verem-se total e o mais celeremente ressarcidos, e o do devedor em ter uma nova oportunidade de relançar a sua actividade económica.

Aliás, muitos dos arestos supra citados e atinentes às duas primeiras teses, acabam, de alguma sorte e mais ou menos assertivamente, por propugnar esta interpretação intermédia.

Temos por líquido e inequívoco que o prejuízo não é elemento autónomo e adicional do atraso, o que, efectivamente, acabaria por redundar numa nova causa impeditiva da concessão da exoneração, a qual, obviamente, não pode ser criada pelo intérprete.

Mas, por outro lado, também não pode defender-se que o atraso implica, sempre, necessária e inelutávelmente, prejuízo para os credores, ainda que se conceda que, por via de regra, tal possa acontecer.

Serão, pois, os factos apurados em cada caso concreto, e a melhor interpretação que dos mesmos deve ser feita, que podem acarretar, ou não, a conclusão de que o atraso causou prejuízo.

Interpretação esta que deve revestir-se de alguma sagacidade e ser temperada com laivos de sensatez, acolher regras da lógica, e perspectivar a própria natureza das coisas e a experiencia comum.

Podendo, em função de tais elementos, o julgador, imbuído de um sensato, mas necessário, juízo crítico, ultrapassar a aridez e aparente inocuidade dos factos adrede e inequivocamente apurados, para, dos mesmos, e sem os desvirtuar, extrair outros ou formular juízos e conclusões que sejam a sua  necessária, ou, pelo menos, normal decorrência ou consequência.

Nisto, aliás, consistindo a mais nobre, posto que exigente, função do seu munus.

6.3.

Destarte, e descendo ao caso vertente, verifica-se que a situação de insolvência do recorrido ocorreu em 2004 data em que a sociedade por ele avalizada foi declarada insolvente.

Já nessa altura o insolvente tinha uma dívida vencida  de quase 4 milhões de euros.

Tanto assim que, em 2005 e 2006 contra ele foram instauradas diversas acções judiciais, quer declarativas, quer executivas.

Não obstante ele apenas se apresentou á insolvência em Fevereiro de 2011, ou seja, cerca de seis anos após a situação de ruptura económico-financeira ter sobrevindo.

E sendo certo que ele exercia normalmente a actividade de topógrafo, encontrando-se presentemente desempregado.

Que dizer, perante tal acervo factual nuclear, e sob o manto de uma análise interpretativa imbuída dos supra referidos elementos norteadores?

Temos para nós que a conclusão mais lógica e razoável é a de  que o atraso na apresentação à insolvência acarretou prejuízo para os credores.

6.3.1.

Perscrutemos.

Ab initio , há que atentar que não nos encontramos perante um atraso qualquer, mas perante um enorme atraso, ou seja, de uma demora de cerca de seis anos.

Por outro lado importa ter presente que as dívidas já estavam vencidas em 2005.

Acresce que estamos perante valores em débito de elevada magnitude.

Sendo o próprio  insolvente  que aceita que o valor por que os bens que fazem parte da sociedade  por ele avalizada e já declarada insolvente serão vendidos não será suficiente para o pagamento da totalidade dos montantes por si avalizados.

Mas tendo tal sociedade sido declarada insolvente em 2004, é de presumir que tal insuficiência  já neste ano se verificava.

Ora sendo o insolvente avalista da firma e solidariamente responsável pelas dívidas desta, já nesse tempo ele sabia, ou era-lhe exigível que soubesse, que seria, ou poderia ser, efectivamente responsabilizado. Pelo que, e dada a elevado valor da sua própria dívida, deveria ele ter agido em conformidade, o que se admite apenas numa de duas hipóteses: ou entendia que poderia solver, imediata ou a curto ou médio prazo, e em anuência com os credores, as suas responsabilidades e, então, fá-lo-ía; ou considerava que tal não era possível, e, aqui, teria de assumir a sua insolvência e apresentar-se judicialmente à mesma.

Diz-nos este processo que esta era a hipótese que, já então, efetivamente se verificava, ou, no mínimo, com muita probabilidade se perfilava. Mas o recorrido não se apresentou à insolvência, nem nos meses, nem nos anos imediatamente seguintes, mas apenas cerca de seis anos após.

E esta demora acarretou prejuízos para os credores.

6.3.1.1.

Desde logo porque resulta da matéria  fáctica apurada que aquando da declaração da insolvência e/ou nos  anos que imediatamente se lhe seguiram, ele auferiu rendimentos, pelo menos oriundos da sua actividade de topógrafo.

 Mas, presentemente, ele encontra-se desempregado.

Consequentemente, logo por aqui os credores ficaram prejudicados, pois que, se não fosse a demora, pelo menos veriam os seus créditos parcialmente solvidos pelos rendimentos do trabalho do insolvente, o que, presentemente, não pode ocorrer.

6.3.1.2.

Por outro lado, encontrando-se os montantes reclamados vencidos desde, sensivelmente, 2004 e 2005, sobre os mesmos incidiram juros de mora - arts. 804º, 805º e 806º do C. Civil.

E o decurso do largo lapso de tempo que medeou entre o vencimento e a apresentação à insolvência agravou o montante de tal dívida de juros, o que se pode considerar um prejuízo para os credores.

Alguma Jurisprudência, sufragada na argumentação plasmada no Ac. do STJ de 21-10-2010 Proc. 3850/09.9TBVLG-D.P1.S1, entende que o avolumar da dívida de juros não constitui prejuízo.

Tal argumentação sintetiza-se no seguinte:

«o regime estabelecido na primeira parte do do nº2 do artigo 151º no Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência, que estabelecia a cessação da contagem dos juros “na data da declaração de falência” deixou de existir com o Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, passando os juros a ser considerados créditos subordinados, nos termos da alínea b) do nº1 do artigo 48º deste Código.... Quer dizer, actualmente e em face do regime estabelecido no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, os créditos continuam a vencer juros após a apresentação à insolvência, pelo que o atraso desta apresentação nunca ocasionaria qualquer prejuízo aos credores.

Dito doutro modo: se no regime anterior, estabelecido no Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência se podia pôr a hipótese de quanto mais tarde o devedor se apresentasse à insolvência, mais tarde cessaria a contagem de juros, com o consequente aumento do volume da dívida, no regime actual... tal hipótese não tem cabimento, uma vez que os credores continuam a ter direito ao juros, com a consequente irrelevância do atraso da apresentação à insolvência para o avolumar da divida.»

Havendo ainda quem defenda que: «Se acaso o legislador pretendesse abarcar com tal previsão os prejuízos decorrentes da simples mora no cumprimento de obrigações pecuniárias, seria desnecessária a expressa alusão à causação de danos por força do atraso na apresentação à insolvência, bastando apenas que previsse o atraso na apresentação à insolvência para que tais danos fossem contemplados» - Ac. da Relação de Coimbra de 13.09.2011, p. 579/11.1TBVIS-D.C1. 

Salvo o devido respeito, tais discursos argumentativos não convencem.

Desde logo, e quanto a este, importa atentar que nem sempre o atraso na apresentação à insolvência coloca o devedor em mora com a consequente decorrência dos respectivos juros: basta que a prestação ainda não esteja vencida ou que, no caso de obrigações puras, o credor não efectue a devida interpelação para o pagamento.

Quanto aquele,  ele apenas poderá ser defensável se os credores das dívidas vencidas ou interpeladas que entretanto foram gerando juros, forem os únicos credores da insolvência.

Se o não forem, como normalmente sucede, é evidente que o aumento da dívida de juros e o seu exigível pagamento no processo de insolvência, posto que como crédito subordinado, vai, no caso de insuficiência de bens da insolvência para o pagamento total dos créditos reclamados, prejudicar os outros credores na satisfação dos seus créditos, maxime  se de natureza  outrossim subordinada, pois que agrava a dificuldade  do seu ressarcimento, total  ou parcial.

O que tudo ainda mais se compreende se os créditos vencidos atingirem valores elevados, pois que os respectivos juros, principalmente se reportados a largo lapso de tempo, alcançarão também números relevantes, com natural prejuízo para os demais credores – neste sentido, cfr. entre outros, o Acs. da Relação do Porto de 15.07.2009 e de 15.12.2010, dgsi.pt. p. 6848/08.0TBMTS.P1 e   1344/10.9TBPNF-A.P1 e  Acs. da Relação de Lisboa de  16.06.2011 e de 30.06.2011,  p. 23502/10.6T2SNT-B.L1-6 e p. 7523/10.1T2SNT-E.L1-7. 

É o que se verifica in casu, pois que encontramo-nos perante créditos vencidos de, pelo menos, centenas de milhares de euros, que geraram juros durante cerca de seis anos e sendo certo que existem vários credores.

6.3.1.3.

Mas mesmo que assim não fosse ou não se entenda, certo é que contra o insolvente foram instauradas acções declarativas e executivas, nos anos de 2000, 2005 e 2006.

Ora, declarada a insolvência, as acções podem ser apensadas ao processo com fundamento na conveniência para os fins do mesmo – artº 85º do CIRE – e, no que tange às de índole executiva, as já interpostas ficam suspensas e queda vedado a instauração de novas execuções– artº 88º.

Destarte, no caso sub Júdice, se a apresentação tivesse ocorrido em 2004, ou, condescendendo, em 2005, como deveria ter acontecido, já que a situação de insolvência se verificou em tal período, pelo menos já a  acção executiva com o nº 3630/06.3YYPRT não seria instaurada, com os evidentes benefícios para o insolvente e, decorrentemente, para os seus credores da insolvência.

6.3.1.4.

Havendo ainda a considerar, tal como alega o recorrente, que ele teve necessidade, ex vi de imposição legal, de provisionar o incumprimento do insolvente, sendo que, mantendo-se a situação de incumprimento, não lhe foi possível libertar as provisões.

Há que convir que, por virtude do incumprimento do insolvente e do atraso na sua apresentação à insolvência, este facto é prejudicial para o Banco pois que o obriga a afectar recursos financeiros que poderiam ser disponibilizados para outros investimentos – cfr. neste sentido, o Ac. da Relação do Porto de 15.12.2010  sup. cit.   

6.3.1.5.

Finalmente importa atentar no pressuposto genérico da concessão da exoneração, qual seja o de que o devedor impetrante «tenha tido um comportamento anterior ou actual pautado pela licitude, honestidade, transparência e boa fé no que respeita à sua situação económica e aos deveres associados ao processo de insolvência» -  Assunção Cristas, ob. Cit., p.170.

Ora atentos os factos apurados e as ilações que, numa hermenêutica razoável e sensata, deles podem ser retiradas, não pode concluir-se pela verificação de tal pressuposto, pelo menos na vertente da transparência de actuação, e, até, boa fé, do insolvente, no decurso do longo hiato temporal que medeou entre a sua situação de insolvência e a apresentação à mesma.

 Antes pelo contrário se podendo concluir, ainda dentro da margem de álea em direito permitida, pois que a ciência jurídica não assume o jaez de um ciência alicerçada em premissas de rigor exacto e de cariz matemático, que tais pressupostos foram violados ou não foram cumpridos.

6.3.2.

 E entendendo-se, versus o decidido na sentença posta sub sursis, que dos factos apurados se pode concluir que o insolvente sabia, ou não podia ignorar, sem culpa grave, não existir qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica.

Está aqui em causa apurar se a não apresentação do devedor à insolvência se pode justificar por ele estar razoavelmente convicto de a sua situação económica poder melhorar em termos de não se tornar necessária a declaração de insolvência.

E ao exigir uma “perspectiva séria” o legislador aponta para um juízo de verosimilhança sobre a melhoria económica do insolvente, alicerçada naturalmente em indícios consistentes e não em fantasiosas construções ou optimismo compulsivo.

Ora nenhum facto apurado permite acobertar qualquer juízo de prognose minimamente consistente e credível sobre a melhoria da sua situação económica.

 Antes pelo contrário, pois que, nos meses que se seguiram à declaração da insolvência da sociedade avalizada, período em que a sua situação de insolvência emergiu, contra o insolvente foram instauradas várias acções judiciais, o que demonstra que não tinha cabedal económico-financeiro para honrar os seus compromissos.

Procede o recurso.

7.

Sumariando.

I -O prejuízo dos credores exigido pela al.d) do nº1 do artº 238º do CIRE que obsta à concessão da exoneração do passivo restante, não decorre automaticamente do atraso na apresentação à insolvência, mas, também, não constitui elemento autónomo e independente de tal atraso e, apenas, consistente em actos de dissipação de património ou acumulação de dívidas; antes podendo ser qualquer hipótese de redução da possibilidade de pagamento dos créditos,  posto que oriunda do atraso na apresentação à insolvência e emergente dos factos apurados e/ou da interpretação que deles pode/deve ser feita.

II- Assim, é de concluir por tal prejuízo: se a situação de insolvência do impetrante da exoneração ocorre em 2004/2005; se a dívida, com créditos vencidos, ascende a quase 4 milhões de euros; se contra ele foram instauradas acções e execuções em 2005 e 2006; se um credor foi obrigado a fazer provisões pelo valor do seu crédito; e se o devedor apenas requer a insolvência cerca de seis anos após aquela situação, sendo que, neste interim, ficou desempregado e sem rendimentos.

8.

Deliberação.

Termos em que se acorda conceder provimento ao recurso e, decorrentemente, indeferir liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante, com as legais consequências.

Custas pela massa.

Carlos Moreira (Relator)

Moreira do Carmo

Carlos Marinho