Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
222/18.8T9ACB.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ALCINA DA COSTA RIBEIRO
Descritores: VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
PRISÃO EFECTIVA
PENA ACESSÓRIA DE PROIBIÇÃO DE CONTACTO COM A VÍTIMA
APLICAÇÃO SIMULTÂNEA
Data do Acordão: 04/15/2020
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: LEIRIA (JUÍZO LOCAL CRIMINAL DE ALCOBAÇA)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGO 152.º, N.ºS 1, 3 E 4, DO CP
Sumário: IA condenação em prisão efectiva, decorrente da prática pelo arguido de um crime de violência doméstica p. e p. pelo art. 152.º, n.º 1, al. b), do CP, não obsta à imposição, em simultâneo, da pena acessória de proibição de contactos, com afastamento da residência ou do local de trabalho da vítima, contida nos n.ºs 4 e 5 do mesmo artigo.

II – De facto, se a dita pena acessória é ineficaz enquanto o condenado está num regime de real reclusão, o mesmo não sucede quando e durante o tempo em que ele está em liberdade, seja por via da sua colocação em posição de não cumprimento da pena – após o trânsito em julgado da sentença, não se entrega voluntariamente, dificulta ou impede a sua detenção – seja através de licenças de saída precária e da concessão da liberdade condicional.

Decisão Texto Integral:

I. RELATÓRIO

1. Em 19 de Novembro de 2019, por sentença proferida no âmbito do processo comum singular nº 222/18.8T9ACB.C1, foi o arguido A. condenado pela prática do crime de violência doméstica previsto punido pelo art. 152º n.º 1 al. b), do Código Penal, na pena de 2 anos de prisão e ainda na pena acessória de proibição de contactos com a vitima e afastamento mínimo de 300 metros da sua residência, local de trabalho ou qualquer outro local onde se encontre, sujeita a vigilância electrónica, pelo período de 2 anos, nos termos do disposto no artigo 152º, nº 4, e 5 do Código Penal.

(…).

2. Inconformado com esta condenação, dela recorre o Arguido, formulando as seguintes Conclusões:

(…).

4.  Discordante da condenação na pena acessória, recorre o Ministério Público deste segmento da sentença, formulando as seguintes Conclusões:

1. O arguido A. foi condenado pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea b) do Código Penal, na pena principal de dois anos de prisão efectiva e, ainda, na pena acessória de proibição de contactos com a vítima e afastamento mínimo de 300 (trezentos metros da sua residência, local de trabalho ou qualquer outro local onde se encontre, sujeita a vigilância electrónica.

2. A pena de prisão efectiva, precisamente por ser cumprida em regime de reclusão, já assegura o afastamento do agente da residência ou local de trabalho da vítima e a possibilidade deste a contactar, pelo que deixa de fazer sentido impor-lhe, adicionalmente, a proibição de contactar a vítima.

3. A razão de ser da pena acessória de proibição de contacto com a vítima de violência doméstica, prevista nos n.ºs 4 e 5 do artigo 152.º do Código Penal, prende-se com a necessidade de protecção daquela em virtude de o condenado a possibilidade a contactar, por não se encontrar confinado a estabelecimento prisional, o qual é fisicamente contentor e sujeito a controlo por guardas prisionais.

4. Tal pena acessória pressupõe que o condenado se localize fora de estabelecimento prisional, o que resulta do texto da norma prevista no n.º 2 do artigo 35.º da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro (na redacção resultante da Lei n.º 19/2013, de 21 de Fevereiro), segundo a qual o controlo à distância é efectuado «por monitorização telemática posicional, ou outra tecnologia idónea, de acordo com os sistemas tecnológicos adequados» - o que, manifestamente, não faz sentido estando o condenado encarcerado em estabelecimento prisional.

5. Embora a sentença não o explicite, afigura-se que o Tribunal a quo terá interpretado as normas previstas nos n.ºs 4 e 5 do artigo 152.º do Código Penal como prevendo a compatibilidade entre a referida pena acessória e a execução da pena de prisão efectiva, tanto assim é que graduou ambas as penas na mesma medida – mas tal interpretação, pelos fundamentos supra, afigura-se incorrecta.

6. Pelo que, deverá ser revogada a condenação do arguido na pena acessória de proibição de contactos com a vítima e afastamento mínimo de 300 (trezentos metros da sua residência, local de trabalho ou qualquer outro local onde se encontre, sujeita a vigilância electrónica».

5. A assistente respondeu ao Recurso interposto pelo Ministério, defendo a manutenção da sentença recorrida.

6. Nesta Relação, a Digna Procuradora – Geral Adjunto pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso deduzido pelo arguido e provimento do recurso interposto pelo Ministério Público.

7. Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2 do CPP, realizado o exame preliminar e colhidos os vistos, cumpre, agora, decidir.

II. A DECISÃO RECORRIDA

A primeira instância julgou provados os seguintes factos

«1. (…) e o arguido mantiveram entre si uma relação amorosa extraconjugal, durante cerca de 13 anos, que terminou em Fevereiro de 2016.

2. No processo comum singular n.º 120/16.0PAACB foi proferido, em 30/11/2017, despacho de acusação imputando ao arguido a prática de factos ocorridos até 19/11/2017, consubstanciados da prática de um crime de violência doméstica, previsto e punível pelo artigo 152.º, n.º 1, al. b), do Código Penal, na pessoa de (…).

3. O arguido foi notificado de tal despacho por carta remetida com prova de depósito por si indicada no TIR prestado naqueles autos, depositada em 05/12/2017.

4. A acusação foi recebida por despacho de 26/02/2018, tendo sido agendada data para realização da audiência de julgamento.

5. O arguido foi notificado de tal despacho por carta remetida com prova de depósito por si indicada no TIR prestado naqueles autos, depositada em 01/03/2018.

6. A audiência de julgamento ocorreu no dia 10/04/2018, na presença do arguido, que confessou os factos, tendo, por sentença datada de dia 18/04/2018, o arguido sido condenado pela prática de um crime de violência doméstica, previsto e punível pelo artigo 152.º, n.º 1, al. b), do Código Penal, na pessoa de (…), na pena de 2 anos de prisão, suspensa por igual período sujeita a regime de prova e ainda nas penas acessórias de proibição de contactos com a vitima e afastamento mínimo de 300 metros da sua residência, local de trabalho ou qualquer outro local em que se encontre, sujeita a vigilância eletrónica, proibição de uso e porte de armas e proibição de frequentar programas específicos de violência doméstica, todas pelo período de 1 ano. e a sentença transitado em julgado em 17/10/2018.

7. Em 14/12/2018 foram instalados os equipamentos de vigilância eletrónica para cumprimento da pena acessória de proibição de contactos com a vitima supra referida.

8. No dia 19 de Março de 2018, cerca das 12 horas, junto do estabelecimento comercial (…), em Alcobaça, dirigindo-se à assistente dizendo-lhe “puta! Andas a foder com o chulo!” e ainda “eu mato-te, dou-te um tiro” e “paga o que deves”.

9. Acto contínuo, o arguido ainda lhe tentou apertar o pescoço, o que não logrou porque a assistente se afastou, mas colocou a mão no ombro daquela, com força.

10. Em resultado da conduta do arguido, a assistente sofreu dores.

11. Em dia não concretamente apurados, mas situado após o dia 10 de Abril de 2018 e antes do dia 30 de Abril do mesmo ano, o arguido abordou a assistente e disse-lhe: “puta, paga o que deves”.

12. Em dia não concretamente apurado do mês de Abril de 2018, mas depois do dia 10, já de noite, o arguido encontrou a assistente junto à farmácia Campeão, nesta cidade e disse-lhe “eu mato-te, eu dou-te um tiro”.

13. No dia 22 de abril de 2018, junto à loja (…), o arguido disse à assistente “puta, vens de foder o chulo, puta, puta” e ainda “dou-te um tiro nos cornos puta”.

14. O arguido no dia 30 de Abril de 2018, pelas 12h25, dirigiu-se para o estabelecimento comercial (…), sito na Rua (…), Alcobaça.

15. Enquanto cedeu passagem à assistente na passadeira ali situada, gritou-lhe “Puta! Eu mato-te! Eu dou-te um tiro!”.

16. O arguido ao ver que a assistente se dirigiu para o interior do referido estabelecimento comercial, entrou no mesmo, dirigiu-se àquela e chamou-a de “puta”.

17. O arguido dirige-se com frequência não concretamente apurada ao Estádio Municipal de Alcobaça, onde sabe que a mesma efetua caminhadas pela manhã.

18. Aí, quando a encontra apelida-a de “puta” e diz-lhe “andas a foder com chulo aí no campo”.

19. O arguido repete este comportamento de forma diária, sempre que se cruza com a assistente, nas ruas da cidade de Alcobaça.

20. O arguido, como sabe que a assistente se desloca nesta cidade maioritariamente apeada, procurou e procura colocar-se em locais, onde sabe que aquela vai passar e dessa forma dirigir-lhe as expressões já supra enunciadas.

21. Ao proferir tais expressões insultuosas sabia o arguido que formulava acerca da assistente juízos ofensivos da sua honra e consideração.

22. Agiu o arguido com o propósito, reiterado de, através das condutas supra descritas, perpetradas na pessoa da assistente, de lhe provocar medo, inquietação e a prejudicar e limitar nos seus movimentos, bem sabendo que desse modo a lesava na sua liberdade pessoal, como pretendeu e conseguiu, na medida em que a assistente, em consequência ficou a temer pela sua vida e integridade física.

23. Em consequência das suas descritas condutas, vinha o arguido molestando moral e psicologicamente a assistente e causando-lhe um estado de tristeza, humilhação, vergonha e ansiedade permanentes, na medida em que não sabia o que esperar do arguido.

24. Mais sabia o arguido que as suas condutas eram aptas a causar medo e inquietação na assistente e a prejudicar a sua liberdade de determinação, o que quis, não se abstendo de agir do modo descrito.

25. Mais agia do modo descrito sabendo que infligia maus tratos à assistente e que, assim, a molestava física, moral e psicologicamente, o que fazia com o propósito de exercer, de forma abusiva, uma relação de poder.

26. Ao agir do modo descrito em 5 sabia o arguido que causava dores no corpo da assistente, mais sabendo que a tratava de forma cruel, o que quis.

27. O arguido agiu de modo livre, voluntário e consciente, bem sabendo da censurabilidade e punibilidade da sua conduta.

28. O arguido foi condenado, por sentenças já transitadas em julgado:

a. Proferida em 19/01/2006, transitada em 06/02/2006, pela prática em 08/11/2004, de um crime de difamação agravada, na pena de 180 dias de multa;

b. Proferida em 07/07/2009, transitada em 21/09/2009, pela prática em 12/08/2008, de um crime de ofensa à integridade física simples, na pena de 70 dias de multa;

c. Proferida em 01/04/2011, transitada em 11/05/2011, pela prática em 19/06/2010, de um crime de injúria e um crime de ameaça, na pena de 200 dias de multa;

d. Proferida em 19/12/2012, transitada em 24/01/2013, pela prática em 24/11/2010, de nove crimes de ameaça, na pena de 400 dias de multa;

e. Proferida em 17/03/2015, transitada em 08/04/2016, pela prática em 04/12/2013, de um crime de injúria, na pena de dois meses de prisão suspensa por um ano;

f. Proferida em 02/03/2016, transitada em 11/01/2017, pela prática em 02/09/2013, de oito crimes de injúria agravada, oito crimes de dano e um crime de ameaça agravada, na pena de dois anos de prisão suspensa, sujeita ao dever de indemnizar o demandante;

g. Proferida em 16/06/2017, transitada em 16/06/2017, pela prática em 03/11/2015, de um crime dano, um crime de difamação agravada, um crime de injúria agravada e um crime de ameaça agravada, na pena de 15 meses de prisão sujeita a regime de prova.

h. Proferida em 18/04/2018, transitada em julgado em 17/10/2018, pela prática em 13/08/2017 de um crime de violência doméstica, na pena de 2 anos de prisão, suspensa por igual período e na pena acessória de proibição de contacto com a vitima pelo período de 1 ano e na pena acessória de proibição de uso e porte de armas pelo período de 1 ano.

(…).

Como não provados, julgou o Tribunal recorrido:

(…)

Os fundamentos da Motivação serão transcritos mais adiante.

III. DO MÉRITO DO RECURSO
1. Recurso do Arguido

(…).

2.Recurso do Ministério Público

O arguido foi condenado, pela prática de um crime de violência doméstica, na pena de 2 anos de prisão e na pena acessória de proibição de contactos com a vitima, com o afastamento mínimo de 300 metros de distância da sua residência, local de trabalho ou qualquer outro local onde se encontre, sujeita a vigilância electrónica, pelo período de 2 anos.

O Recorrente traz à colação a questão de saber se a pena acessória de proibição de contactos, com afastamento da vitima, se mostra adequada e compatível com a pena de prisão efectiva.

Para o efeito, argumenta:

A pena de prisão efectiva, porque cumprida em regime de reclusão, já assegura o afastamento do agente da residência ou local de trabalho da vitima e a possibilidade daquele a contactar, pelo que deixa de fazer sentido, a imposição adicional de proibição de contactos

A razão de ser da pena acessória prende-se com a necessidade de protecção da vitima de violência doméstica, devido ao perigo do arguido ter a possibilidade de a contactar por não se encontrar confinado a estabelecimento prisional, o qual é fisicamente contentor e sujeito a controlo pelos guardas prisionais.

Tal pena acessória pressupõe que o condenado se localize fora do estabelecimento prisional, o que resulta do artigo 35º, nº2, da Lei nº 112/2009, de 16 de Setembro, o que manifestamente, não faz sentido estando o condenado encarcerado em estabelecimento prisional.

Se o arguido beneficiar de liberdade condicional ou saídas precárias, sempre existem meios impeditivos de o afastar da vitima.

Donde, sendo aplicada a pena de prisão, cumprida em regime de reclusão, deixa de fazer sentido a pena acessória de proibição de contactos com afastamento da vitima. 

O contrário é defendido pela assistente, na Resposta ao Recurso, alegando que, nos momentos em que o arguido estiver em liberdade, continua a manter-se o perigo do arguido continuar o seu comportamento de importunar a vitima, agora, agravado, com desejos de vingança.

Cumpre decidir.

Não se questiona que, estando o arguido em reclusão, a cumprir pena de prisão efectiva está confinado ao estabelecimento prisional e, por isso, impedido de se aproximar da vitima, bem como está sujeito ao controlo dos guardas prisionais que prevenirão os contactos à distância com a assistente.

Como se mostra indiscutível que a pena acessória de proibição de contactos, com afastamento da vitima, constituem medidas de protecção desta, para os casos em que o arguido esteja em liberdade e não no cumprimento da pena de prisão em estabelecimento prisional.

Donde, o  que verdadeiramente está em causa é a questão de saber se, como defende o Recorrente, a pena acessória de proibição de contactos, com afastamento, é incompatível com a pena de prisão efectiva.

A resposta a esta questão é, a nosso ver e salvo o devido respeito pela opinião contrária, negativa.

Eis as razões.

Em primeiro lugar, porque a regra distintiva entre penas principais e penas acessórias, centra-se na dependência destas últimas das primeiras. As penas acessórias implicam necessariamente a condenação numa pena principal.

Ora, sendo a prisão a pena principal para o crime de violência doméstica [artigos 41º e 42º e 152º, nºs 1, 2 e 3) do Código Penal] e a proibição de contactos, com afastamento do arguido da vitima, uma das penas acessórias (artigo 152º, nºs 4 e 5, do Código de Processo Penal), nada impedirá, em abstracto, a aplicação de ambas.

Por outro lado, a pena acessória de proibição de contactos, com afastamento do arguido, constitui um dos mecanismos legais que tutela a segurança da vitima, protegendo-a dos perigos advindos dos contactos e presença do agressor.

O ordenamento jurídico penal, em momento algum, afasta a aplicação de tal pena acessória nos casos de condenação em pena de prisão efectiva.

O artigo 152º, nº 4, do Código Penal admitem, expressamente, a condenação da pena acessória de proibição de contactos com a vitima, nos casos previstos nos números 1, 2 e 3, do mesmo preceito, que se refere, também, à prisão efectiva, pois não a excepciona.

Complementarmente, dispõe o n.º 1 do artigo 35.º da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro (na redação dada pela Lei n.º 19/2013, de 21 de fevereiro), que

«O tribunal, com vista à aplicação das medidas e penas previstas nos artigos 52.º e 152.º do Código Penal, no artigo 281.º do Código de Processo Penal e no artigo 31.º da presente lei, deve, sempre que tal se mostre imprescindível para a proteção da vítima, determinar que o cumprimento daquelas medidas seja fiscalizado por meios técnicos de controlo à distância».

No quadro legal constituído (no contexto do crime de violência doméstica), as medidas de proibição de contactos e afastamento (a prevista no artigo 152º nº 4 e 5º do Código Penal e a contida no artigo 52º do mesmo diploma) apresentam-se como de aplicação diferenciada consoante as circunstâncias do caso concreto, sendo que a pena acessória apenas deverá ser aplicada nas hipóteses mais graves em que as necessidades de prevenção e a proteção da vítima, exigem uma tutela penal reforçada.

O tribunal recorrido ponderou a necessidade da pena acessória de proibição de contactos com a vitima, impondo-a, como meio de por termo à reiteração criminosa do arguido.

E, se, como defende o Recorrente, a pena acessória não deve ser aplicada, quando o arguido estiver em reclusão efectiva, porque não será, nesse caso, imprescindível à protecção da vitima, o mesmo não se diga, quando e enquanto o arguido estiver em liberdade, o que pode suceder, além do mais, se o arguido se colocar em posição de não cumprir a prisão efectiva, não se entregando voluntariamente, dificultando ou fugindo da efectiva detenção, durante o tempo que mediar entre o trânsito em julgado da sentença e a efectiva reclusão, nas licenças de saída do estabelecimento prisional e liberdade condicional.

Nestas situações de liberdade, a vitima fica à mercê do arguido, podendo este contactá-la e continuar a exercer violência sobre a mesma.

Donde, a proibição de contactos e o afastamento da vitima, no mínimo de 300 metros, sujeito a vigilância electrónica, constitui um meio adequado e legal de protecção da vitima, mesmo nos casos em que seja aplicada a pena de prisão efectiva.

E, nem se diga, como faz o Recorrente, que a segurança da vitima fica salvaguardada com as medidas impostas pelos artigos 78º e 188º, do Código Execução de Penas e Medidas Privativas de Liberdade (de ora em diante designado por CEPML), para a concessão das saídas precárias e liberdade condicional.

As regras de conduta e obrigações determinadas pelo tribunal, como sejam a proibição de contactos com a vitima, com afastamento da mesma, como condição da concessão das licenças de saída do recluso e da liberdade condicional, constituem realidades distintas das penas acessórias, apresentando, ainda, diferentes consequências jurídicas na hipótese de serem incumpridas

As obrigações condicionais das licenças de saída e da liberdade condicional são decididas na fase da execução da pena de prisão, em processo que corre pelo Tribunal de Execução de Penas (artigo 138º, do CEPML), enquanto a pena acessória é aplicada na sentença, pelo Tribunal da condenação.

O incumprimento das condições fixadas nas licenças de saída, pode, nos termos do artigo 85.º, nº 1, do CEPML, dar lugar, a uma solene advertência, determinar a impossibilidade de apresentação de novo pedido durante seis meses ou revogar a licença de saída.

O incumprimento das regras de conduta e obrigações impostas na liberdade condicional conduzem à revogação desta, nos termos do artigo 64º, nº 1, do Código Penal, quando verificados os pressupostos da revogação da suspensão da execução da pena, a que se refere o artigo 56º, nº 1, do Código Penal.

Já o incumprimento das penas acessórias faz incorrer o incumpridor na prática do crime de violação de imposições, proibições ou interdições, tipificado e sancionado no artigo 353º do Código Penal.

De tudo, resulta que, salvo o devido respeito pela opinião do Recorrente, entendemos que a condenação em prisão efectiva não afasta, nem em abstracto, nem em concreto, a pena acessória de proibição de contactos, com afastamento da vitima ao mínimo de 300 metros em que o arguido foi condenado.

IV. DECISÃO

Nos termos expostos, acordam os Juízes que compõem a 5ª Secção Criminal deste Tribunal da Relação, em negar provimento aos recursos interpostos pelo Ministério Público e pelo arguido A..

O Recorrente/arguido suportará as custas do recurso que apresentou, com taxa de justiça que se fixa em 4 UCS.

Sem tributação o Recurso do Ministério Público.

Coimbra, 15 de Abril de 2020

Alcina da Costa Ribeiro (relatora)

Ana Carolina Cardoso (adjunta)