Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
2488/18.4T8LRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: BARATEIRO MARTINS
Descritores: SOCIEDADE COMERCIAL
EXTINÇÃO
CONTRATO DE LOCAÇÃO FINANCEIRA
RESOLUÇÃO
PROCEDIMENTO CAUTELAR DE ENTREGA JUDICIAL
Data do Acordão: 11/13/2019
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE LEIRIA – INSTÂNCIA CENTRAL
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS. 21 DL Nº 149/95 DE 24/6, ARTS.160, 162, 164 CSC, 224 CC
Sumário: 1 – Extinta uma sociedade, não se extinguem as relações jurídicas de que era titular, uma vez que as relações jurídicas, até então encabeçadas na sociedade, permanecem, agora encabeçadas na generalidade dos sócios.

2 Sendo assim – extinta uma sociedade e perdida a personalidade jurídica – tem a declaração resolutiva (dum contrato de locação financeira), para produzir efeitos, que ser dirigida e ter como destinatários os sócios.

Decisão Texto Integral:








Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

I – Relatório

“Banco (…) S.A.”, com sede (…) (...) , intentou, ao abrigo e nos termos do art. 21.º do DL n.º 149/95, de 24-06, procedimento cautelar de entrega judicial (com antecipação do juízo sobre a causa principal) contra “L (…), Lda.” (entretanto, “L (…)S.A.”), com sede na (…), (...) , pedindo que se:

a) Reconheça que, nos termos legais e contratuais, assistiu razão à requerente para resolver o contrato de locação financeira imobiliária em apreço, com fundamento no não pagamento das rendas acordadas;

b) Ordene a entrega judicial à requerente das fracções autónomas identificadas no art. 6.º (…);

c) Profira decisão sobre a antecipação do juízo, nos termos do art. 21.º/7 do DL n.º 149/95, de 24-06.

Alegou, em síntese, o estipulado num contrato de locação financeira (tendo por objecto as 2 fracções autónomas que identificou) celebrado, em 13-07-2010, com a requerida; a entrega, em execução de tal contrato, de tais fracções à requerida, na qualidade de locatária; o não pagamento das rendas estabelecidas no contrato a partir da 67.ª renda, vencida em 01/01/2016, pelo que, após inúmeras diligências infrutíferas com vista ao recebimento das rendas em atraso, remeteu, volvidos 24 meses, carta à requerida, em 19/02/2018, a operar a resolução do contrato de locação financeira; e, ainda, a não entrega pela requerida, até ao momento, não obstante intimada, das fracções objecto do referido contrato.

Efectuadas as devidas diligências, tendo em vista a citação da requerida, constatou-se, consultando o portal da justiça, que, em 23/11/2016, havia sido registada a dissolução e encerramento da liquidação da sociedade requerida.

Assim, ouvido o requerente, que solicitou que a requerida fosse citada em qualquer um dos seus 5 sócios, que identificou, foi proferido despacho em que foi determinado que os autos “prosseguissem ope legis, isto é, sem necessidade de habilitação, (…) contra os sócios identificados no requerimento do requerente; tendo sido citados, na qualidade de sócios/liquidatários da requerida:

P (…), residente (…), (...) ;

S (…), residente (…), (...) ;

A (…), residente (…) (...) ;

L (…), residente (…) (...) ; e

R (…), residente (…) (...) .

Citados, deduziram oposição, alegando, inter alia e no que aqui (para o objecto do recurso) releva, que o contrato de locação financeira não foi devidamente resolvido; razão pela qual não estão reunidos os requisitos de procedência do procedimento cautelar.

Designado e realizado o julgamento, a Exma. Juíza proferiu sentença em que julgou todo o pedido totalmente improcedente.

Inconformada com tal decisão, interpôs a requerente o presente recurso, visando a sua revogação e a sua substituição por decisão que julgue a resolução do contrato de locação operada pela Recorrente válida e eficazmente realizada e, consequentemente, de igual modo, ordene à entrega à requerente dos imóveis de sua propriedade, conforme expressamente se estabelece no Decreto Lei 149/95, de 24 de Junho, que regula o regime jurídico do contrato de locação financeira.

Terminou a sua alegação com as seguintes conclusões:

(…)

Não foi apresentada qualquer contra alegação.

Dispensados os vistos, mantendo-se a regularidade da instância, cumpre decidir.


*


II – Fundamentação de Facto

Factos indiciariamente provados

1.º O requerente incorporou, por fusão, o “T (…), S.A.” – cfr. certidão permanente com o código de acesso (...) , cujo teor dou por integralmente reproduzido.

2.º Em 13-07-2010, o requerente celebrou com a sociedade requerida o “contrato de locação financeira imobiliária n.º (...) ”, que teve por objecto as fracções autónomas designadas pelas letras “A” e “B” do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o n.º 1692, da freguesia de (...) , e inscrito na respectiva matriz sob o artigo 1769 - cfr. “contrato” de fls. 6 a 28, cujo teor dou por integralmente reproduzido.

3.º A aquisição das referidas fracções autónomas encontra-se registada a favor do requerente – cfr. certidões prediais de fls. 29 e 31, cujo teor dou por integralmente reproduzido.

4.º A sociedade requerida tomou posse efectiva das fracções autónomas em 13-07-2010.

5.º Nos termos do contrato referido em 2.º, ficou estipulado que a sociedade requerida deveria liquidar o preço de aquisição dos imóveis e respectivos juros em 144 rendas mensais e sucessivas, sendo a primeira no valor de 37.602,50€ e as restantes no valor unitário de 955,39€.

6.º As partes contratualizaram ainda o pagamento de um valor residual, no montante equivalente a 15% do montante global financiado, ou seja, de 25.140,38€.

7.º A sociedade requerida não efectuou o pagamento da 67.ª renda, que se venceu em 01-01-2016, nem das subsequentes.

8.º O requerente enviou uma missiva para a morada da sede da sociedade requerida, datada de 19-02-2018, através de carta registada com aviso de recepção – cfr. documentos de fls. 33 a 36 e certidão que antecede, cujo teor dou por integralmente reproduzido.

9.º O aviso de recepção não foi assinado e a referida carta foi devolvida, com a menção de “objecto não reclamado” – cfr. mesmos documentos.

10.º A sociedade requerida não entregou os imóveis em causa.

11.º O requerente efectuou o cancelamento do registo da locação financeira – cfr. certidões prediais de fls. 123 a 130, cujo teor dou por integralmente reproduzido.

12.º Em 23-11-2016 foi registada a dissolução e encerramento da liquidação, bem como o cancelamento da matrícula da sociedade requerida - cfr. certidão permanente de fls. 47 a 52, cujo teor dou por integralmente reproduzido.


*

III – Fundamentação de Direito

São requisitos objectivos da concreta providência cautelar de entrega judicial em que nos encontramos, prevista no art. 21.º do DL 149/95, de 24-06, a resolução do contrato de locação financeira pelo locador/requerente e não haver a locatária, no seguimento de tal resolução, restituído a coisa ao locador/requerente[1]; requisitos estes de que o locador/requerente, como em qualquer outra providência cautelar, deve oferecer uma prova sumária.

É pois condição de deferimento da presente providência, a alegação e demonstração sumária da factualidade consubstanciadora do concreta incumprimento gerador do direito potestativo de resolução do contrato de locação financeira celebrado e em execução; bem assim como a demonstração sumária do correcto exercício de tal direito potestativo de resolução.

Quanto ao 1.º aspecto, em face do que consta do ponto 7.º dos factos, nenhuma dúvida ou obstáculo se suscita; situando-se a controvérsia (e o objecto da apelação) no 2.º aspecto.

Efectivamente, considerou-se na sentença recorrida:

“(…) não tendo a sociedade requerida pago a 67.ª renda e seguintes, o requerente comunicou-lhe a resolução do contrato, por carta registada com aviso de recepção enviada para a sede da sociedade requerida, que foi devolvida com a menção de “objecto não reclamado”. Verificou-se, assim, a remessa da carta para a morada da locatária financeira que era conhecida, morada essa constante do contrato que as partes assinaram.

Mas há um elemento factual essencial que inquina a aparente eficácia da resolução operada pelo requerente. A saber: aquando do envio daquela missiva, já se encontrava registada a dissolução e o encerramento da liquidação da sociedade requerida e o cancelamento da respetiva matrícula.

(…)

Concluindo, não se pode considerar por demonstrado que a carta pela qual o requerente comunicou à sociedade requerida a resolução do contrato de locação financeira celebrado entre ambos lhe tenha sido regularmente comunicada.

A resolução do contrato de locação financeira tem, em regra, na sua base uma situação de incumprimento definitivo de um dos contraentes (artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 149/95).

No caso em apreço, em face do não pagamento atempado da 67.ª renda e das subsequentes, o requerente enviou uma carta à sociedade requerida, comunicando a resolução do contrato de locação financeira.

Contudo, embora tenha enviado tal carta para a morada da sede da sociedade requerida, esta já se encontrava extinta, pelo que a resolução contratual não foi regulamente comunicada.

Na ausência de resolução válida, a restituição dos imóveis locados não tem fundamento legal, face à improcedência do pedido de reconhecimento judicial da validade e eficácia da resolução do contrato de locação financeira que a poderia suportar. (…)

Sendo em relação a tais considerações e conclusão que se dirige toda a divergência recursiva do requerente/apelante.

Sem qualquer razão, desde já se antecipa.

Vejamos:

É indiscutível que a L (…) quando o requerente lhe enviou a missiva a declarar a resolução do contrato de locação financeira, estava já extinta há mais de 1 ano; efectivamente, a dissolução e o encerramento da liquidação (bem como o cancelamento da matrícula) foram registados em 23/11/2016 (sendo por isso pacífica a sua extinção, ex vi art.160.º/2 do CSC) e a missiva resolutiva (enviada para a sede da L(…)) tem a data de 19/02/2018.

Temos pois, não há qualquer dúvida, que o requerente declarou a resolução a quem já não tinha existência jurídica[2].

Assim, face à “unilateralidade recipienda[3] da declaração resolutiva e de esta só “se tornar eficaz quando chega ao poder do destinatário ou é dele conhecida[4], não produziu a mesma quaisquer efeitos e não resolveu/extinguiu o contrato de locação financeira existente.

Entende o requerente/apelante, para contrariar tal conclusão, “que estamos perante uma declaração (acto de resolução) que deixou de ter destinatário e/ nessa medida [se tornou] imediatamente eficaz com a mera manifestação da vontade por parte do locador/recorrente”.

Entendimento este – assim como a generalidade das asserções conclusivas da requerente/apelante – que decorre dum claro vício de raciocínio: considerar extintas as relações jurídicas que são encabeçadas por uma sociedade quando está fica liquidada/extinta.

Não é, porém, assim, uma vez que, como decorre dos arts. 162.º, 163.º e 164.º do CSC, extinta a sociedade, as relações jurídicas até então encabeçadas na sociedade, não cessam, antes permanecem, agora encabeçadas na generalidade dos sócios.

Como refere Carolina Cunha[5], estão legalmente consagradas soluções que “radicam numa ideia de sucessão dos sócios na titularidade da relação jurídica da sociedade”; e estas soluções – sucessão dos sócios – não acontecem apenas nos casos em que a liquidação/extinção ocorre na pendência duma acção.

É certo que o art. 162.º do CSC – que determina a substituição da sociedade pela generalidade dos sócios, sem necessidade de incidente de habilitação – está gizado para a hipótese da liquidação/extinção ocorrer na pendência da acção, mas tal não significa (como são exemplos o que se dispõe nos dois artigos seguintes) que, quando, como é o caso os autos, a liquidação/extinção é anterior à propositura da acção, a acção não prossiga e os sócios não substituam a sociedade.

Aliás, não se percebe o racional do que se refere nas conclusões R), S) e T). Admite-se aí que a sociedade estava extinta, sem personalidade jurídica (e, por conseguinte, sem personalidade judiciária – cfr. art. 11.º do CPC), mas sustenta-se que o presente procedimento cautelar não podia prosseguir contra os sócios por, “com a extinção da sociedade, necessariamente, perderem a qualidade de sócios”, o que, sendo assim, impõe que se pergunte: contra quem é que então, segundo o requerente/apelante, a acção prosseguiria (e, claramente, o requerente quer o seu prosseguimento)? Contra a sociedade não podia ser, uma vez que já não possuía personalidade judiciária, contra os sócios, segundo o requerente/apelante, também não podia ser/prosseguir, o que, seguindo-se o raciocínio constante das conclusões R), S) e T), levaria à conclusão absurda da acção prosseguir sem alguém do lado passivo.

“Sempre que o credor social exerce judicialmente o seu direito contra a sociedade[6] e esta se vem a extinguir na pendência da própria acção, ou já se encontrava extinta à data da respectiva propositura, levanta-se a questão de saber se deve ter lugar a absolvição da instância ou se a acção pode e deve prosseguir contra os sócios e, nesse caso, em que termos. Parece não encontrar muita expressão a tese da absolvição da instância (por excepção dilatória de falta de personalidade jurídica e judiciária)[7], mas nota-se uma clivagem jurisprudencial entre a posição que defende a necessidade da suspensão da instância e subsequente dedução de incidente de habilitação e aquela outra abordagem que postula uma mera substituição da sociedade pelos sócios”[8].

Em síntese, extinta a sociedade, as relações jurídicas até então encabeçadas na sociedade passam a ser encabeçadas na generalidade dos sócios; havendo acção pendente contra sociedade extinta, a única dúvida/alternativa razoável é saber se tem que haver incidente de habilitação ou se há uma espécie de substituição automática da sociedade pelos sócios[9].

É o caso dos autos, sendo que tal dúvida/alternativa até foi decidida a favor do requerente/apelante (uma vez que se dispensou o incidente de habilitação), pelo que não se entende como é que o requerente vem dizer que “não compreende” – ressalvada a hipótese do requerente conceber que o processo pudesse correr sem alguém do lado passivo – que se haja proferido despacho em que foi determinado que os autos “prosseguissem ope legis, isto é, sem necessidade de habilitação” contra os sócios identificados no requerimento do requerente.

Em todo o caso, assim regularizada instância – passando a haver, com a prolação de tal despacho, requeridos com personalidade judiciária[10] – impõe-se reconhecer, em face da substância do litígio, que “pouco adiantava/tou” tal regularização/prosseguimento.

Como se começou por referir, um dos requisitos da presente providência cautelar traduz-se na demonstração sumária de haver sido efectuado um correcto exercício do direito potestativo de resolução, tendo em vista poder dizer-se que se intentou o procedimento cautelar com o contrato já findo por resolução.

E se a instauração da acção contra uma sociedade “morta” e sem personalidade judiciária não impedia, em termos processuais, a sua substituição (automática ou mediante incidente de habilitação) por aqueles que foram os seus sócios, outro tanto não pode acontecer quanto à demonstração sumária do correcto exercício do direito potestativo de resolução, ou seja, uma declaração resolutiva enviada a uma sociedade “morta” não vale como o seu envio aos que foram seus sócios.

Sendo receptícia a declaração resolutiva, dependendo a sua eficácia da mesma chegar ao poder do destinatário ou dele ser conhecida, estando o encerramento da liquidação da sociedade registado desde 23/11/2016, tinha a declaração resolutiva, enviada em 19/02/2018, que ser dirigida e ter como destinatários os sócios, que são quem, repete-se, extinta a sociedade, passou a encabeçar as relações jurídicas até então encabeçadas na sociedade.

Ao contrário do que se diz na conclusão W) – em que se refere que “estamos perante uma declaração (acto de resolução) que deixou de ter destinatário e nessa medida é imediatamente eficaz com a mera manifestação da vontade por parte do locador/recorrente” – não é por a sociedade se ter extinguido que a declaração resolutiva passa a declaração não receptícia, tendo, isso sim, que ser dirigida a quem passou a encabeçar as relações jurídicas até então encabeçadas na sociedade[11]; e, também ao contrário do que se refere na conclusão U), o requerente/apelante não vê assim “vedado (…) o seu legitimo direito à resolução do contrato de locação”, tendo apenas que o dirigir e declarar ao destinatário certo (e não a uma sociedade extinta)[12].

E, dir-se-á para terminar, que o não ter-se sequer dirigido a declaração resolutiva aos destinatários certos (aos sócios que passaram a encabeçar as relações jurídicas até então encabeçadas na sociedade) é algo que só por si afasta a hipótese prevista no art. 224.º/2 do C. Civil, desde logo por, em boa verdade, nunca a declaração resolutiva lhes haver sequer sido dirigida, pelo que não se poderá dizer (duma declaração que nunca lhes foi enviada) que eles tiveram culpa em não a receber oportunamente.

É verdade que a L(…) foi extinta porque não cumpriu com o dever legal de apresentação de contas, sendo-lhe assim imputável a instauração oficiosa do procedimento administrativo que culminou com o registo da sua dissolução/liquidação, mas isso não significa que a partir de tal registo – que é público, podendo qualquer pessoa pedir certidões dos actos do registo e dos documentos arquivados (cfr. art. 73.º e 74.º do C. Reg. Comercial)[13] – não passe a ser, para todos os efeitos, uma sociedade extinta, sem personalidade jurídica e judiciária, ou seja, sem personalidade para lhe serem feitas declarações negociais e/ou para ser demandada judicialmente.


*

É quanto basta para concluir que o requerente/apelante não demonstrou, ainda que sumariamente, haver resolvido/findado eficazmente, antes de intentar a providência cautelar, o contrato de locação financeira que havia celebrado com a L (…), o que significa que não demonstrou o primeiro requisito objectivo (cfr. art. 21.º/1 do DL 149/85) da presente providência cautelar[14] e que conduz à sua improcedência; assim como, não sendo decretada a providência cautelar, à improcedência do pedido de realização de juízo antecipatório sobre a causa principal.

Impõe-se pois confirmar a sentença recorrida, que não viola qualquer uma das normas referidas pelo apelante; e julgar o recurso totalmente improcedente.


*


IV – Decisão
Pelo exposto, julga-se improcedente a apelação e, em consequência, confirma-se a decisão recorrida.

Custas em ambas a instâncias pelo requerente/apelante.


*

Coimbra, 13/11/2019

Barateiro Martins ( Relator)

Arlindo Oliveira

Emídio Santos


[1] Ou seja, o locador não necessita de alegar, nem de demonstrar, o justificado receio da lesão grave e dificilmente reparável do seu direito: o “periculum in mora” é presumido iure et de iuris por lei.

[2] Foi como, caso o locatário fosse uma pessoa física, se tivesse declarado a resolução a alguém falecido.
[3] Cfr., Brandão Proença, a Resolução no Direito Civil, pág. 164; e
[4] Cfr., Pedro Martinez, Da Cessação do Contrato, pág. 179.
[5] Em comentário ao art. 163.º do CSC, In Código das Sociedade Comerciais em Comentário, Vol II, pág. 760.
[6] E, fora de qualquer dúvida, o pedido de entrega da coisa locada corresponde ao exercício dum direito de crédito.
[7] Em harmonia – acrescentamos – com a solução constante do art. 351.º/2/in fine do CPC, em que se pode requerer a habilitação, “ainda que o óbito seja anterior à proposição da acção”.
[8] Carolina Cunha, local citado, pág. 758.

[9] Isto mesmo já sustentámos em acórdão proferido, em 12/01/2016, na Apelação n.º 1171/13.1TBVIS-B.C1:

“(…) requerido este registo, extinta finalmente a sociedade, tal não significa e extinção das relações jurídicas em que a sociedade teve intervenção; com a extinção da sociedade, deixa apenas de existir a pessoa colectiva, que perde a sua personalidade jurídica e judiciária, mas as relações jurídicas de que a sociedade era titular não se extinguem.

É o que claramente resulta do disposto no art. 162.º do CSC, de acordo com o qual as acções pendentes em que a sociedade seja parte continuam após a extinção da sociedade, que se considera substituída – sem que haja lugar a suspensão da instância e não sendo necessária habilitação – pela generalidade dos sócios, representados pelos liquidatários; ou seja, é a generalidade dos sócios que passa a ser parte na lide, embora representados pelos liquidatários.

E continuando, é ainda o que resulta do art 163.º/1 do CSC, segundo o qual os antigos sócios respondem pelo passivo social não satisfeito ou acautelado, até ao montante que receberam na partilha, ou seja, a sua responsabilidade pessoal não excede as importâncias que hajam recebido em partilha dos bens sociais.
[10] Ou seja, do lado passivo temos apenas tais requeridos e não a L (…)r, que, repete-se, não tem personalidade judiciária e que por isso não pode ser requerida.

[11] E a hipótese resolutiva referida no art. 18.º/a) do DL 149/95 – resolução pelo locador em caso de dissolução ou liquidação da sociedade locatária – não constitui, bem ao invés, argumento no sentido da declaração resolutiva não ter destinatário (e, em tal hipótese, também o destinatário não pode ser a sociedade, uma vez que o fundamento resolutivo é justamente a sua extinção jurídica); aliás, se não existisse tal preceito, seria aplicável, quanto às pessoas colectivas, em especial sociedades, o art. 1051.º/1/d)/2.º parte do C. Civil, que prevê a caducidade contratual no caso da sua extinção, pelo que não faria sentido que o legislador haja querido substituir tal caducidade por um direito resolutivo (referido no art. 18.º/a) do DL 149/95) em que a respectiva declaração não tem destinatário.

[12] O facto do art. 17.º do DL 149/95 dizer que para a resolução basta a comunicação do locador ao locatário não autoriza que se interprete, como resulta das conclusões x), y) e z), que valem todas e quaisquer comunicações, mesmo as efectuadas a pessoas falecidas ou a sociedades extintas.

[13] Veja-se que, mal o presente procedimento cautelar entrou, logo se constatou, consultando o portal da justiça, que, em 23/11/2016, havia sido registada a dissolução e encerramento da liquidação da sociedade requerida; constatação esta que, sendo assim, era também facilmente acessível ao requerente.
[14] Requisito esse que, estando-se numa providência cautelar (e não numa causa principal), tinha que se verificar no momento da sua instauração, ou seja, não se pode dizer que a resolução produziu os seus efeitos aqui, na providência cautelar, e que é um facto jurídico constitutivo superveniente atendível.