Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
143/14.3GDLRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: INÁCIO MONTEIRO
Descritores: ACTO PROCESSUAL
PRAZO
NOTIFICAÇÃO POR VIA POSTAL
PRESUNÇÃO
TERCEIRO
DIA ÚTIL
Data do Acordão: 04/29/2015
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE LEIRIA- INSTÂNCIA LOCAL DE LEIRIA – SECÇÃO CRIMINAL – JUIZ 1.
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ART. 113 N.º 2 DO CPP
Sumário: I - O prazo para a prática do acto processual conta-se a partir da notificação e quando esta for efectuada por via postal registada, presume-se feita no 3.º dia útil posterior ao do envio, por força do art. 113.º, n.º 2, do CPP.

II - O “terceiro dia útil”, posterior ao do envio, significa que todos os três dias posteriores ao envio têm de ser úteis e não apenas o último dia.

Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, os juízes da Secção Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra

I- Relatório

No processo supra identificado, o tribunal decidiu condenar o arguido A..., pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos art. 292.º, n.º 1 e 69.º, n.º 1, al. a), ambos do Código Penal (CP), na pena de 75 (setenta e cinco) dias de multa à taxa diária de 5 (cinco) euros, o que perfaz a multa global de 375 (trezentos e setenta e cinco) euros, na alternativa de 46 (quarenta e seis) dias de prisão subsidiária na sanção acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, pelo período de 5 (cinco) meses.


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O arguido veio requerer a substituição da multa aplicada por prestação de dias de trabalho a favor da comunidade.

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A Ex.ma juíza indeferiu a substituição da multa por prestação de trabalho a favor da comunidade, por o pedido ter sido deduzido fora do prazo legal e notificou-o para proceder ao pagamento da multa, de imediato, sob pena de conversão da mesma em prisão subsidiária.

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Não se conformando com este despacho, dele interpôs recurso o arguido, formulando as seguintes conclusões:

«I - O Recorrente foi condenado na pena de 75 (setenta e cinco) dias de multa à taxa diária de 5 (cinco) euros, o que perfaz a multa global de 375 (trezentos e setenta e cinco) euros que, caso não seja paga, será convertida em 46 (quarenta e seis) dias de prisão subsidiária.

II - Após trânsito da, aliás douta, sentença, a secretaria do tribunal recorrido notificou o Arguido para, além do mais, no prazo de 10 dias, efectuar o pagamento da multa da sua responsabilidade e anexou à notificação a respectiva cópia da conta e guia de pagamento, tendo esta como data limite de pagamento o dia 07/11/2014.

III - Nos termos do disposto no artigo 489.º, n.º 2, do CPP (o prazo de pagamento é de 15 dias a contar da notificação para o efeito), o Arguido sempre deveria ter até ao dia 14/11/2014 (uma vez que se considera notificado a data de 30/10/2014) para proceder ao pagamento da multa, só entrando em mora após tal data.

IV - Na data de 13/11/2014, o Arguido deu entrada nos autos ao requerimento mediante o qual requereu, ao abrigo do disposto nos artigos 48.° do CP e 490.° do CPP, a substituição da multa aplicada por dias de trabalho a favor da comunidade, invocando insuficiência económica.

V - Suscitou ainda a questão, no artigo 2.° do mencionado requerimento, de que a notificação para o pagamento da multa efectuada pela secretaria do Tribunal a quo concedia-lhe um prazo (de 10 dias, com termo em 07/11/2014, conforme indicado na guia de pagamento enviada) inferior ao prazo legal de 15 dias previsto no artigo 489.°, n.º 2, do CPP.

VI - Invocando ainda que tal erro ou lapso da secretaria prejudicava o Arguido ao diminuir-lhe em cinco dias o prazo para proceder ao pagamento da multa (ou requerer, nesse prazo, a sua substituição por trabalho comunitário ou até o pagamento em prestações), e, nessa medida, deveria o tribunal tomar apenas em conta o termo do prazo legal de 15 dias para o pagamento da multa, o dia 14/11/2014, e não o prazo fixado pela secretaria (tudo nos termos, desde logo, do disposto no art. 157.°, n.º 6, do CPC).

VII - Questão esta que se revelava essencial para a boa decisão do requerido, pois que, ao dar entrada ao requerimento no dia 13/11/2014, o Arguido ainda estava dentro do prazo legal, mas fora do prazo da notificação da secretaria.

VIII - O meritíssimo juiz do tribunal a quo, ao proferir o despacho em crise, não se pronunciou em concreto sobre tal questão, nem tampouco fundamentou a decisão de afastar o prazo legal de 15 dias em benefício do prazo de 10 dias concedido pela secretaria.

IX - Assim, a decisão recorrida violou o disposto no artigo 154.°, n.º 1, do CPC, e 608.°, n.º 2, do CPC, vícios estes que consubstanciam as nulidades previstas no artigo 615.°, n.º 1, alíneas b) e d) do CPC, e no artigo 379.º, n.º 1, alínea c), do CPP, que ora expressamente se argúem para todos os efeitos legais.

X - Devendo, consequentemente, o douto despacho recorrido ser substituído por outro que aprecie a questão suscitada e, em consequência, julgue ainda o requerimento de substituição da multa aplicada por trabalho a favor da comunidade tempestivo, deferindo-se o mesmo nos termos do disposto no artigo 48.° do Código Penal, e dos artigos 489.° e 490.º, do CPP, uma vez que, o Arguido requereu a substituição da multa por trabalho a favor da comunidade dentro do prazo de pagamento de 15 dias a contar da notificação para o efeito, inexistindo qualquer fundamento de ordem processual, nomeadamente a extemporaneidade para a prática do acto, para o indeferimento.

XI - Porém, ainda que se considere, o que se faz apenas subsidiariamente e por mera cautela de patrocínio, que o Arguido apresentou o requerimento para substituição da multa por trabalho comunitário após o decurso do prazo de 15 dias a que se refere ao artigo 489.º, n.º 2, do CPP, o requerimento ainda assim deveria ser considerado, e deferido a final.

XII - Pois que, o prazo previsto no art. 490.º, n.º 1, do CPP (e que remete para o artigo 489.°, n.º 2), para requerimento da substituição da multa por dias de trabalho, não tem natureza peremptória, pelo que o seu decurso não preclude a possibilidade de vir a ser formulado mais tarde e ser deferido.

XIII - É este o entendimento que mais se coaduna com o espírito do sistema jurídico-penal vigente, e que tem sido sufragado maioritariamente pela nossa Jurisprudência superior, que dá preferência, em prol da recuperação e reinserção social (ou não desinserção social) do condenado, a penas não privativas da liberdade, atribuindo à pena de prisão um carácter de último recurso, a utilizar apenas quando as finalidades da punição não possam ser alcançadas por outra via (vd, em especial, o artigo 70.º, do Código Penal).

XIV - Por seu turno, é esta interpretação, que não foi seguida pelo tribunal recorrido, que mais harmoniosamente se conjuga com o regime normativo do artigo 49.° do Código Penal (Conversão da multa não paga em prisão subsidiária), que prevê, além do mais, no seu número 2, que o condenado pode a todo o tempo evitar, total ou parcialmente, a execução da prisão subsidiária, pagando no todo, ou em parte, a multa em que foi condenado.

XV - Ora, se o regime do artigo 49.° do CP dá a possibilidade de se pagar a multa a todo o tempo para evitar a prisão subsidiária, não se compreenderia que o condenado com recursos monetários pudesse a todo o tempo pagar a multa para evitar a prisão subsidiária e o condenado sem esses recursos, como é o caso do ora Recorrente, não pudesse evitar essa prisão disponibilizando-se a todo o tempo para prestar trabalho a favor da comunidade.

XVI - Ora, por tudo o que se expôs, e salvo o devido respeito, mal andou o Mmo Juiz a quo ao decidir como decidiu, ao indeferir o requerimento de substituição da multa por trabalho comunitário meramente por intempestividade, violando assim o disposto nos artigos 48.°, n.º 1, 49.º, n.º 2, e 70.º, do Código Penal, nos artigos 489.°, n.º 2, e 490.º, n.º 1, do CPP, e ainda o artigo 13.º, do CRP, impondo-se a revogação do Douto Despacho recorrido, e sua substituição por outro que defira o requerimento de substituição da multa aplicada ao Arguido por trabalho a favor da comunidade, nos termos requeridos, seguindo-se os demais termos para execução e aplicação dessa medida».


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Respondeu o Ministério Público na 1.ª instância ao recurso interposto, nos termos do art. 413.º, n.º 1, do CPP e pugnando pela sua improcedência, formula as seguintes conclusões:

«1. O recorrente, A... , a 13/11/2014, apresentou requerimento, pedindo a substituição da pena de multa aplicada, por prestação de trabalho, a favor da comunidade, alegando, em suma, encontrar-se impossibilitado de pagar a multa por falta de meios económicos;

2. Porém, o mesmo requerimento foi apresentado fora do prazo legal, já que o prazo de pagamento da respetiva multa havia terminado a 07/11/2014; Assim, e com fundamento no disposto nos artigos, 490.º, n.º 1, com referência ao disposto no artigo 489.º, n.º 2, ambos do Código de Processo Penal, foi indeferido tal requerimento;

3. O prazo previsto para apresentação de requerimento para substituição da pena de multa por prestação de trabalho a favor da comunidade, de quinze dias, como consta do aludido artigo 489.º, n.º 2, é um prazo peremptório;

4. Aliás, e contrariamente ao alegado pelo recorrente, a jurisprudência tem-se manifestado sobre a aplicação, estrita, destas normas legais, no sentido de que o prazo para apresentação de requerimento para substituição de pena de multa por prestação de trabalho a favor da comunidade tem que ser apresentado, exactamente, dentro prazo do pagamento voluntário da mesma pena de multa;

5. Com efeito, “É no prazo de pagamento voluntário da pena de multa que deve ser requerida a substituição da pena de multa por trabalho a favor da comunidade” – acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 08/05/2013;

6. Por outro lado, “Salvo no caso de provar justo impedimento, o condenado não pode apresentar o requerimento para substituição da pena de multa por dias de trabalho para além do prazo (peremptório) de 15 dias previsto no artigo 489.º, n.º 2, do CPP, aplicável por remissão do artigo 490.º, n.º 1, do mesmo diploma”. - acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 22/01/2014;

7. Aliás, ainda que assim se possa entender, o certo é que no requerimento apresentado, o recorrente não alega qualquer impedimento que tenha obstado à apresentação do seu requerimento, dentro do prazo legal, para pagamento da multa aplicada e, portanto, para a pretendida substituição da mesma por prestação de trabalho a favor da comunidade;

8. Os fundamentos aduzidos pelo recorrente, designadamente, as invocadas normas do Código de Processo Civil, os artigos 154.°, n.º 1, 608.º, n.º 2, 615.°, n.º 1, alíneas b) e d), não têm, nesta sede, qualquer aplicabilidade;

9. Assim, não tem qualquer cabimento, com o devido respeito, alegar que tais normas foram violadas, pelo despacho recorrido e, portanto, que tal consubstancia, além do mais, a nulidade prevista no artigo 379.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal;

10. Também não se verifica, pois, do despacho recorrido, qualquer violação do disposto nos artigos 48.º, n.º 1, 49.º, n.º 2, e 70.º, todos do Código Penal;

11. O dito requerimento do recorrente, esse sim, apresentado fora do prazo legal, para o efeito, encontra-se em clara violação das disposições legais aplicáveis, os referidos artigos 490.º, n.º 1 e 489.º, n.º 2, ambos do Código de Processo Penal;

12. Assim, outra coisa não podia fazer o tribunal "a quo", que indeferir o requerido, como o fez, e bem, em nosso entender, encontrando-se o despacho recorrido, devidamente fundamentado, de facto e de direito;

13. Daí que o mesmo despacho não tenha violado qualquer princípio ou norma legal, designadamente, as invocadas pelo recorrente».


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Nesta instância, os autos tiveram vista do Ex.mo Senhor Procurador-geral Adjunto, para os feitos do art. 416.º, n.º 1, do CPP, o qual acompanha de perto a posição do recorrente, pugnado assim pela procedência do recurso, o que faz nos seguintes termos:

« Recurso tempestivamente interposto e por quem tem legitimidade.

Não se vê obstáculo ao seu conhecimento, sendo de manter o efeito fixado, não se enquadrando a situação no art. 408.º, do CPP de modo a que seja alterado o efeito.

No que ao mérito do recurso respeita parece-me que o recorrente tem razão na sua pretensão.

Com efeito, compulsada a notificação de fls. 51, que remete para a guia de fls. 48, verifica-se que, pese embora nesta se mencione multa penal, aquela está redigida em termos de custas processuais nos termos do art. 31.º, n.º l do RCProcessuais.

Ora, o que se verifica é que, conforme fls. 48, se trata de uma multa penal, a qual é regida pelo disposto nos art. 113.º, n.º 2, atenta a via postal registada, e 489.º, n.º 2, ambos do CPP, estando pois em prazo o requerimento de 13 de Novembro de 2014, pedindo a substituição da multa por trabalho, visto o disposto no art. 490.º, n.º 1 do mesmo diploma. Pois, tendo o registo sido expedido a 24/10/2014 - uma sexta-feira - o terceiro dia útil é 29/10. E os 15 dias subsequentes terminam a 13/11/2014, estando assim o requerimento a solicitar a substituição da multa por trabalho dentro do prazo legal, impondo-se a sua apreciação».


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Cumprido que foi o disposto no art. 417.º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, foram colhidos os vistos legais, pelo que cumpre decidir.

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II- O Direito

As conclusões formuladas pelo recorrente delimitam o âmbito do recurso.

São apenas as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar, conforme Prof. Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal” III, 2.ª Ed., pág. 335 e Ac. do STJ de 19/6/1996, in BMJ n.º 458, pág. 98, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, as quais deve conhecer e decidir sempre que os autos reúnam os elementos necessários para tal.

Questão a decidir:

Apreciar se o pedido de substituição da multa por prestação de trabalho a favor comunidade, indeferido por intempestivo, foi ou não deduzido dentro do prazo legal, depois de previamente decidir o dia em que se dá a notificação a que se refere o art. 113.º, n.º 2, do CPP e se o prazo constante dos art. 489.º, n.º 2 e 490.º, n.º 1, do mesmo diploma legal, para praticar o acto, é dilatório ou peremptório.

Apreciando:

Em 24/10/2014 foram emitidas guias em nome do arguido, com liquidação da multa no montante de 375€ (fls. 48), com nota de data de início de pagamento de 24/10/2014 e data limite de pagamento até 7/11/2014.

Na mesma data de 24/10/2014 foram enviadas notificações da conta ao arguido e ao defensor do arguido, nos termos do art. 31.º, do Regulamento das Custas Judiciais, para no prazo de 10 dias ser efectuado o pagamento da multa da responsabilidade do arguido ou para no mesmo prazo, querendo, pedir a reforma ou reclamar da conta (fls. 50 e 51).

Em 13/11/2014, veio o ilustre defensor do arguido requerer a substituição da multa aplicada por prestação de dias de trabalho a favor da comunidade.

A Ex.ma juíza, em 20/11/2014 (fls. 62), indeferiu a substituição da multa por prestação de trabalho a favor da comunidade pelo seguinte despacho:

«Fls. 59 a 62:

Indefere-se a requerida substituição da multa por PTFC porque o pedido foi deduzido fora do prazo legal (vd. fls. 48 e 59, art. 489.º e 490.º, do CPP).

Notifique, devendo o arguido proceder ao pagamento da multa, de imediato, sob pena de conversão da mesma em prisão subsidiária».

A Secretaria apesar de ter sido ordenado o pagamento de imediato notificou o arguido e defensor para pagamento da multa até ao dia 12/12/2014 (fls. 64 e 65), sob pena de conversão da mesma em prisão subsidiária.

O arguido interpôs recurso, não se conformando com aquele o despacho que indeferiu a substituição da multa por trabalho a favor da comunidade, por em seu entender estar em tempo para formular tal pretensão nos autos.

Apreciemos pois a questão suscitada.

Antes de mais diremos que o despacho não se encontra devidamente fundamentado.

E dizemos que não se encontra devidamente fundamentado, pois o arguido foi notificado, nos termos do art. 31.º, do Regulamento das Custas Judiciais, para no prazo de 10 dias ser efectuado o pagamento da multa da responsabilidade do arguido ou para no mesmo prazo, querendo, pedir a reforma ou reclamar da conta e a senhora juíza fundamenta o seu despacho ao abrigo do art. 489.º e 490.º, do CPP, aplicável ao prazo para pagamento da multa, que é de 15 dias.

A secretaria do tribunal recorrido não andou bem ao notificar o arguido para, no prazo de 10 dias, efectuar o pagamento da multa da sua responsabilidade fixando-lhe como data limite de pagamento o dia 07/11/2014.

Nos termos do art. 489.º, n.º 2, do CPP, «o prazo de pagamento é de 15 dias a contar da notificação para o efeito».

Por sua vez o art. 490.º, n.º 1, do CPP dispõe que o requerimento para substituição da multa aplicada por prestação de dias de trabalho a favor da comunidade, é apreciado no prazo previsto no n.º, do art. 489.º.

Inequivocamente que o arguido tem 15 dias para formular nos autos tal requerimento, não podendo ser comprimido para 10 dias o exercício do seu direito que legalmente lhe é atribuído, podendo assim exercê-lo independentemente da notificação errada que lhe foi feita pela secretaria.

Na contagem do prazo impera a regra da continuidade e no caso vertente estamos perante um prazo peremptório, extinguindo-se o direito da parte de praticar o acto, uma vez decorrido do prazo concedido legalmente para o efeito, nos termos dos art. 138.º, n.º 1 e 139.º, n.º1 e 3, do CPC, aplicáveis ex vi art. 104.º, n.º 1, do CPP.

O prazo para a prática do acto processual conta-se a partir da notificação e quando esta for efectuada por via postal registada, presume-se feita no 3.º dia útil posterior ao do envio, por força do art. 113.º, n.º 2, do CPP.

Ora, em 24/10/2014 (6.ª feira) foram enviadas notificações ao arguido e ao defensor do arguido da conta e para pagamento da multa, não podendo ser reduzido o prazo para 10 dias, aplicável apenas à conta para feitos do art. 31.º, do Regulamento das Custas Judiciais.

Assim, ficando assente por presunção juris tantun a carta ter sido entregue ao notificando no 3.º dia útil posterior ao envio, tem-se por notificado no dia 29/10/2014 (4.ª feira).

E dizemos que que se tem notificado no “terceiro dia útil”, posterior ao envio, considerando-se que tal expressão legal, ao contrário de alguma jurisprudência, significa que todos os três dias posteriores ao envio têm de ser úteis e não apenas o último dia.

Parece-nos que a razão de ser desta nossa interpretação é aquela que melhor traduz a intenção do legislador, pois o direito não pode ser uma mera construção teórica e abstracta, mas corresponder ao normal funcionamento da realidade concreta que pretende regulamentar.

E a interpretação que fazemos é aquela que melhor se coaduna com as regras da experiência e da vida, considerando o tempo normal para presumirmos que a notificação foi feita dentro do prazo limite considerado normal que uma carta demora a chegar ao destinatário após ser enviada. 

Ora, não contando para contagem do prazo, o dia do envio e coincidindo este com uma sexta-feira, não será razoável, com cumprimento normal das regras de distribuição postal, considerar suficiente um dia útil para fazer chegar a carta ao seu destinatário em qualquer ponto do país.

Ora, considerando que dos três dias só o último tem de ser útil, é uma interpretação que não nos parece ser o espírito da lei, nem está em conformidade com a realidade concreta, pois não tem em conta por exemplo as dificuldades de distribuição postal no interior do país (neste sentido, que não acompanhamos, decidiram, entre outros, o Ac. do TRL de 27/06/2012 – Proc. 1077/07.3SFLSB.L1-3.ª secção e Ac. do STJ, de 21/05/2003, disponíveis in http://www.dgsi.pt).

Por outro, tal posição não responde à situação em se sigam três dias não úteis seguidos ao envio da carta.

Por isso, seguimos o entendimento que melhor nos parece corresponder à vontade do legislador, que não pode ser vista despida da realidade que pretende trazer para o art. 113.º, n.º 2, do CPP e que é interpretar como o “3.º dia útil posterior ao envio” deve ser entendido como o 3.º dia útil de uma série de três dias úteis a seguir ao envio da carta (Neste sentido Ac. do TRG – Proc. 532/05.2, de 4/04/2005; Ac. do TRP de 14/11/2012 e de 7/12/2011, Ac. TRL de 18/03/2013; TRE de 1/04/2004; Decisão do Vice-presidente do TRL, de 14/05/2010 – Proc. 9/09GCTVD.A.L1-3. Secção; e Decisão do Presidente do TRE, nos autos de reclamação n.º 401/04.1, em que foi relator o então Desembargador Manuel Cipriano Nabais disponíveis in http://www.dgsi.pt).

Nesta conformidade o decurso do prazo de que gozava o arguido de 15 dias, iniciou-se pois no dia 30/10/2014 e terminou em 13/11/2014.

Ora, o arguido requereu precisamente no 13/11/2014, último dia do prazo, ao abrigo do disposto nos artigos 48.° do CP e 489.º, n.º 2 e 490.°, n.º 1, do CPP, a substituição da multa aplicada por dias de trabalho a favor da comunidade, invocando insuficiência económica, o que fez pois tempestivamente.

Como atrás já referimos, o erro ou lapso em que incorreu a secretaria não pode prejudicar o exercício do direito nos termos em que lhe é concedido, encurtando-lhe o prazo para proceder ao pagamento da multa ou requerer, nesse mesmo prazo, a sua substituição por prestação de trabalho a favor da comunidade.

Nesta conformidade, por apresentado tempestivamente o requerimento do arguido, impõe-se que o tribunal a quo aprecie a pretensão formulada e decida em conformidade.


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III- Decisão:

Pelos fundamentos expostos, decidem os juízes da Secção Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra:

Conceder provimento ao recurso interposto pelo arguido e em consequência se revoga o despacho recorrido, o qual deve ser substituído por outro, que considerando o requerimento de substituição da multa por prestação de trabalho a favor da comunidade, apresentado tempestivamente, aprecie a pretensão formulada e decida em conformidade.

Sem custas.


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Coimbra, 29 de Abril -de 2015

(Inácio Monteiro - relator)



(Alice Santos - adjunta)