Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
84/13.1GAFVN.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: BELMIRO ANDRADE
Descritores: JOGO DE FORTUNA E AZAR
Data do Acordão: 03/26/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE FIGUEIRÓ DOS VINHOS
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: ALTERADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 1º, 3º, 4º, 108º, 159º, 160º, 161ºE 163º DO DEC. LEI 422/89 DE 2/12
Sumário: A exploração não autorizada de uma máquina de jogo eletrónica na qual se introduz uma moeda de € 0,50, encetando a máquina o “jogo” que consiste no acendimento, num ecrã circular, de 64 led's numerados, dos quais oito são pontuados e no caso de a luz se fixar – aleatoriamente, sem influência da perícia do jogador - num dos led`s pontuados, o jogador ganha os pontos identificados em cada um daqueles números, sendo que o único significado dos pontos ganhos é a sua conversão em nova ou novas jogadas, sempre idênticas, sem possibilidade de troca dos pontos por fichas, dinheiro ou prémios de qualquer natureza, constitui uma mera contraordenação prevista no art. 163º do DL 422/89 de 02.12.
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra:


I.
Após audiência de discussão e julgamento com exercício amplo do contraditório, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
- Condenar a arguida A..., pela prática de um crime de exploração ilícita de jogo p e p pelo artigo 108º, nº 1, do decreto-lei 422/89 de 2 de Dezembro, de 30 de Novembro, na pena de 4 meses de prisão substituída por 120 dias de multa, à taxa diária de 6 euros e na pena de 80 dias de multa à taxa diária de 6 euros. Operando o cúmulo jurídico, condenar a arguida na pena única de 200 dias de multa à taxa diária de 6 euros, perfazendo um total de 1200 euros.
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Inconformada, recorre a arguida, formulando as seguintes CONCLUSÕES (reprodução):
1. Com o presente recurso pretende a recorrente impugnar a decisão sobre a matéria de facto e de direito. Considerando incorretamente julgados, nos termos da na alínea c) do nº 3 do art. 412° do C.P.P., os números 18; 19; 20 e 21 dos factos provados e constantes da acusação.
2. Salvo o devido respeito, entendemos que o tribunal recorrido não podia, nem tinha como, dar por preenchido o tipo objectivo e subjectivo de ilícito.
3. A factualidade provada permite afastar o tipo objetivo de ilícito pela qual a arguida foi acusada, já que o tribunal a quo errou na qualificação jurídica dos factos.
4. O tribunal recorrido não podia, nem tinha como, dar por provado, quanto ao tipo subjectivo de ilícito, os números 19; 20 e 21 dos factos provados, ou seja, que a arguida sabia que aquela máquina desenvolvia temas de jogo de fortuna ou azar conhecendo as suas características de funcionamento e bem assim que não podia ser por si explorado, atuando sempre de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que tal conduta era proibida e punida por lei.
5. As declarações da arguida, prestadas no dia 13 de Agosto de 2013 conforme acta do mesmo dia, gravadas através do sistema integrado de gravação digital, em uso no Tribunal recorrido, [H@bilus Media Studio durante 00:24:36, prestado no decurso da Audiência de Julgamento decorrida no dia 13-08-2018 iniciado às 12:27:08 até às 12:51:44, constante do ficheiro nº 20130813122706_24653_64394], não infirmam a prova de tais factos, ao contrário da posição sufragada pelo tribunal recorrido.
6. Veja-se as passagens aos minutos: 05:50 a 09:02, minuto 12:07 a 13:50, onde a arguida refere em que circunstâncias recebeu a referida máquina e descreve desde quando desenvolve a atividade a que o nº 1 dos factos provados alude e atente-se que o Tribunal recorrido deu por provado o nº 16 dos factos provados, ou seja, que "a mencionada máquina electrónica era explorada pela arguida A..., que a recebeu no seu estabelecimento comercial no dia 20 de Julho de 2013 para que ai fosse explorada" e que a mesma foi apreendida à mesma no dia 25 de Julho, ou seja, passados 5 dias.
7. Não tinha ainda o tribunal a quo como dar por provado o nº 18 dos factos provados, nomeadamente que a arguida arrecadava e geria "as quantias monetárias que ai eram introduzidas"; veja-se as declarações da arguida aos minutos 09:03 a 09:27 das declarações supra identificadas.
8. Impõe-se o reexame das declarações da arguida supra identificadas naquelas concretas passagens bem como o depoimento da testemunha Nívio José Henriques Mendes, 1 ° sargento da GNR, prestado no dia 13 de Agosto de 2013 conforme acta do mesmo dia, gravadas através do sistema integrado de gravação digital, em uso no Tribunal recorrido, [H@bilus Media Studio durante 00:09:13, prestado no decurso da Audiência de Julgamento decorrida no dia 13-08-2018 iniciado às 12:52:16 até às 13:01:13, constante do ficheiro n." 20130813125216_24653 _64394], aos minutos 05:15 a 06:22. E DAR POR NÃO PROVADOS os nºs 18; 19; 20 e 21 dos factos constantes da acusação.
9. Da prova produzida não resulta de uma forma clara e inequívoca que a arguida tinha conhecimento que estava perante uma máquina de fortuna ou azar, ou perante uma exploração ilícita de jogo, muito menos que, nas circunstâncias de tempo e lugar descritas na acusação, estava a atuar de forma livre, deliberada e consciente muito menos que arrecadasse e gerisse as quantias monetárias que eram introduzidas na máquina.
10. A sentença recorrido sofre ainda de erro na QUALIFICAÇÃO JURÍDICA DOS FACTOS, porquanto a arguida com a sua conduta não preencheu o tipo objetivo de ilícito pela qual vinha acusada.
11. Os nºs 3; 4; 5; 7; 8; 9; 10 e 11 dos factos provados descrevem o modo e funcionamento da máquina a que se reportam os autos. Tal funcionamento encontra-se ainda descrito no relatório e exame pericial à referida máquina.
12. Contrário ao entendimento do tribunal a quo que considerou estamos perante um jogo de fortuna ou azar como sendo "aqueles cujo resultado é contingente por assentar exclusiva ou fundamentalmente na sorte" nos termos do artigo 1.° do do Decreto-Lei nº 422/89 de 12 de Dezembro, entende a recorrente que a factualidade provada não integra a prática do crime de exploração ilícita de jogo por que foi condenada mas sim, quanto muito, modalidade afim, p. e p. como contra-rdenação sujeita ao regime previsto no art. 160° a 162° do mesmo diploma legal.
13. Nesse sentido, o Acórdão do STJ de Fixação de Jurisprudência nº 4/2010, publicado no DR lª Série de 8.3.2010 fixou jurisprudência no seguinte sentido de que "Constitui modalidade afim, e não jogo de fortuna ou azar, nos termos do artigo 159°, n° 1, 161°, 162° e 163° do Decreto-Lei nº 422/89 de 2 de Dezembro, na redacção do Decreto-Lei nº 10/95 de 19 de Janeiro, o jogo desenvolvido em máquina automática na qual o jogador introduz uma moeda e, rodando um manipulo, faz sair de forma aleatória uma cápsula contendo uma senha que dá direito a um prémio pecuniário, no caso de o número nela inscrito coincidir com algum dos números constantes de um cartaz exposto ao público".
14. Embora a máquina em apreço dos autos seja diferente da máquina de jogo a que se reporta aquele Acórdão, comungam ambas do facto de em qualquer dos casos de tratar de uma forma de sorteio que tem como característica o conhecimento prévio pelo jogador dos prémios a que se pode habilita.
15. Ou seja, se num caso em vez de os prémios se encontrarem anunciados em cartaz e corresponderem a determinado número ou referência existente numa bola, no outro era a própria máquina que tinha assinalados os orifícios a que correspondiam prémios, dependendo a sua atribuição de a luz parar ou não num deles.
16. A este propósito o douto arresto proferido pelo TRC, em 02/02/11, com o nº 21/08.5FDCBR.C2 em que foi Relator o Venerando Juiz Desembargador PILAR DE OLIVEIRA é expresso quanto à qualificação jurídica a dar à maquina em reporte nos autos e na posse da arguida "a introdução de uma moeda numa máquina que inicia de imediato uma jogada, sem ser necessário pressionar qualquer botão iluminando-se um dos 64 "leds ", sendo percorridos todos os restantes, com um movimento giratório gradual até parar ao fim de 3 ou 4 voltas, fixando-se aleatoriamente num dos orifícios mencionados não merece a qualificação de jogo de fortuna ou azar não integrando a prática do crime de exploração ilícita de jogo apenas sendo susceptível de integrar a contra-ordenação prevista nos artigos 161° e 163° da Lei do Jogo".
17. Aderindo a recorrente, ponto por ponto à douta fundamentação e jurisprudência citada no mesmo, que por desnecessidade e sob pena de pleonasmo escusa citar, atenta a especial clareza da posição e entendimento ali consignado.
18. Sendo certo que a máquina em reporte nos presentes autos é igual à máquina a que se reporta o douto Acórdão tudo como melhor se infere dos factos provados e relatório pericial a fls. dos autos cujo reexame se requer.
19. Neste sentido veja-se ainda o Acórdão do TRE, Processo: 100/07.6TACCH.E1, de 31/05/2011, ou, na mesma senda, o Acórdão do TRP, Processo nº 24/1 0.9GEGDM.P1, de 19-10-2011.
20. A pena aplicada arguida, primária, sem qualquer registo criminal, que explorava o referido estabelecimento à menos de 7 meses mostra-se desproporcional quando atendemos a que o prémio oscilava entre 1 e 200 euros e o valor arriscado pelo jogador era sempre uma moeda de € 0,50, e que a lei do jogo visa proteger interesses superiores, atento os montantes e comportamentos compulsivos de apostadores em jogos de fortuna ou azar.
21. Dúvidas não temos, salvo melhor opinião, que independentemente da alteração ou não dos factos impugnados o tribunal a quo errou na qualificação jurídica dos factos, já que os mesmos não se subsumem a jogo de fortuna ou azar, pelo que se impõe a revogação da sentença recorrida por outra que a absolva do crime pela qual vinha acusada.
22. Violou a sentença recorrida, assim o disposto nos artigos 410, nº 2 al. c); 412, nº 2, al. c) do C.P.C., o disposto nos artigos 1°, 3°, 4°, nº 1, al. g) e 108°, nºs 1 e 2; 159°, 160° a 162°, todos do Decreto-Lei nº 422/89 de 12 de Dezembro.
Termos em que, deve ser dado provimento ao recurso e douta sentença recorrida, ser revogada em conformidade com as conclusões que antecedem.
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Respondeu o digno magistrado do MºPº, chamando a atenção para a falta do cumprimentos dos ónus de especificação relativamente às passagens dos depoimentos capazes de impor decisão diferente da recorrida quanto à matéria impugnada, sustentando, no mais, a improcedência do recurso.
Neste Tribunal o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no qual, acompanhando a resposta apresentada em 1ª instância na parte referente à pretensão de reapreciação da matéria fáctica, no que toca à qualificação dos factos provados, sustenta que a actuação da recorrente não é subsumível ao crime mas constitui apenas matéria contra-ordenacional pp. pelos arts. 161° e 163° do DL 422/89 de 2/12, pelas razões constantes do AFJ citado na motivação de recurso e que o Ac. desta Relação de 2/2/2011, também aí mencionado, segue. Conclui, em conformidade que deve a sentença ser revogada e condenada a recorrente em coima de valor não inferior a 1000€, tendo em conta os elementos considerados na sentença.
Corridos vistos, cumpre apreciar os fundamentos do recurso.
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II.

1. Vistas as conclusões, que definem o objecto do recurso, a recorrente impugna os pontos 18, 19 e 20 da matéria de facto dada como provada pelo tribunal recorrido, questionando, ainda, o preenchimento, pela matéria provada, dos elementos do tipo objectivo do crime e a pena concreta aplicada.
Com vista a proceder à apreciação, vejamos a matéria de facto dada como provada pelo tribunal recorrido.
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2. A Matéria de facto dada como provada pela sentença recorrida, com a motivação probatória que a suporta à a seguinte:
A) Matéria provada
Da acusação:
1. A arguida A... é a única proprietária e responsável do estabelecimento comercial café denominado " K...", sito em (...), Pedrógão Grande.
2. No dia 25 de Julho de 2013, cerca das 14.30 h., no interior do estabelecimento café " K...", explorado por A..., encontrava-se exposta uma máquina de jogo electrónica, de cor cinza, sem qualquer referência exterior quanto à origem, fabricante, número de fabrico ou de série, de pequenas dimensões, e em pleno funcionamento.
3. Tal máquina, ao centro do seu painel frontal, apresenta um círculo onde se visualizam cerca de 64 led's (diodo emissor de luz), que depois de energizados emitem luz visível, sendo que oito destes led's estão identificados no painel com as inscrições 10, 1, 50, 2, 100, 5, 20 e 200.
4. Por outro lado, no interior da circunferência encontra-se uma janela digital onde surge a pontuação obtida no decurso das jogadas efectuadas e do lado direito, mas na parte exterior da circunferência, uma janela que regista os créditos introduzidos.
5. Ainda no painel frontal e abaixo da circunferência, encontra-se um botão que permite que o jogador possa jogar os créditos obtidos em jogadas premiadas.
6. Na parede lateral visualizam-se dois parafusos metálicos que permitem fazer o reset aos créditos obtidos por um jogador no decurso das jogadas, mediante o contacto de um objecto metálico.
7. Na parede lateral direita encontra-se o mecanismo de introdução de moedas.
8. Em tal máquina, após a introdução de uma moeda de € 0,50 (cinquenta cêntimos), começam de imediato a ser iluminados os led's até que, e sem qualquer intervenção por parte do jogador, a luz se fixa num dos led's, ficando determinado qual a pontuação obtida pelo jogador.
9. Quando a luz se imobiliza num dos led's assinalados, é registado no visor a pontuação obtida.
10. Por outro lado, caso o ponto luminoso pare num dos restantes led's, sem qualquer referência a pontos, o jogador nada ganha e terá de tentar a sorte outra vez.
11. Se o jogador pretender utilizar os pontos ganhos nas jogadas efectuadas, basta pressionar um botão, sendo que por cada ponto (unidade) assinalado no visor a máquina efectua duas jogadas.
12. Acresce que a máquina aceita um número indeterminado de moedas, e que por cada moeda de € 0,50 a máquina proporciona 50 créditos.
13. Os pontos obtidos, no decorrer das jogadas são convertidos em dinheiro, na proporção de € 1,00 (um euro) por cada crédito registado em jogadas premiadas.
14. A atribuição de pontos é exclusivamente dependente da sorte, não havendo intervenção por parte do jogador, para além do acto de colocação da moeda no dispositivo de introdução de moedas.
15. Naquela data foi encontrada no interior daquela máquina a quantia de € 0,50 (cinquenta cêntimos).
16. A mencionada máquina electrónica era explorada pela arguida A..., que a recebeu no seu estabelecimento comercial no dia 20 de Julho de 2013 para que aí fosse explorada, tendo a arguida efectivamente obtido ganhos com essa exploração.
17. A colocação de tal máquina no estabelecimento comercial explorado pela arguida foi efectuada por esta com o intuito de angariar clientes que nela jogassem, com vista a conseguir desse modo receitas com a respectiva exploração.
18. Naquele circunstancialismo de tempo e lugar, A... explorava a mencionada máquina, arrecadando e gerindo as quantias monetárias que aí eram introduzidas, obtendo desta forma lucro.
19. A... sabia que aquela máquina desenvolvia temas de jogo de fortuna ou azar, que não possuía qualquer autorização para exploração de jogos de fortuna ou azar, nem o mencionado estabelecimento estava autorizado a essa mesma exploração, o que a arguida bem sabia.
20. Agiu com intenção de manter em actividade o referido jogo naquele estabelecimento, conhecendo as suas características de funcionamento e bem assim que não podia o mesmo ai ser explorado, visando com tal conduta a obtenção de lucros.
21. Agiu sempre de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que tal conduta era proibida e punida por lei.

Resultou ainda provado, da discussão da causa:
- a arguida é empresária e explora o café em causa nestes autos desde Janeiro de 2013;
- reside com o marido, o qual é pedreiro auferindo mensalmente a quantia de 600 euros.
- reside ainda com o filho do marido de 6 anos de idade e com uma sua filha de 8 anos de idade.
- Reside em casa própria despendendo a quantia mensal de 300 euros para a amortização do crédito contraído para a respectiva aquisição.
- A residência da arguida corresponde a uma vivenda, de tipologia T3;
- é proprietária de um veículo automóvel de marca Opel, modelo Astra,
- despende mensalmente de consumos básicos de gás, a quantia média de 30 euros, despende de 2 em 2 meses em consumos básicos de electricidade a quantia média de 100 a 120 euros;
- tem como habilitações literárias o 12º ano de escolaridade e não tem antecedentes criminais.
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3. Apreciação

3.1. Em matéria de facto, questiona a recorrente os pontos 18, 19 e 20 (em suma: “explorava a máquina, sabendo que aquela desenvolvia temas de jogo de fortuna ou azar, que não possuía qualquer autorização para exploração de jogos de fortuna ou azar, visando com tal conduta a obtenção de lucros”) com fundamento no “reexame das declarações da arguida supra identificadas naquelas concretas passagens bem como o depoimento da testemunha Nívio José Henriques Mendes, 1 ° sargento da GNR”.
Não especifica, porém “passagens” ou afirmações concretas, dos invocados depoimentos, a que a decisão recorrida pudesse ter atribuído, como suporte probatório dos factos impugnados, conteúdo diverso daquele que resulta da respectiva gravação.
Sustentando, em suma, que os depoimentos – sobre cujo conteúdo se não suscitam dúvidas - deviam ser valorados de forma diferente, na perspectiva pretendida pela recorrente, de que não sabia que se tratasse de uma máquina de jogo ilícito.
Ora, as declarações (negatórias de facto da acusação) da própria arguida não têm força probatória de “confissão”.
Por outro lado, tratando-se de factos essencialmente do foro subjectivo, resultam, por inferência lógica, da materialidade objectiva provada – quem, sendo imputável e livre de constrangimento, pratica um facto, fá-lo porque quer, assumindo as consequências normais desse acto.
Com efeito, é conhecida a clássica distinção entre prova directa e prova indirecta ou indiciária – cfr. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Curso de Processo Penal, 3ª ed., II vol., p. 99. Incidindo aquela directamente sobre o facto probando enquanto esta incide sobre factos diversos do tema de prova, mas que permitem, com o auxílio de regras da experiência, uma ilação da qual se infere o facto a provar.
Embora a nossa lei processual não faça qualquer referência a requisitos especiais em sede de demonstração dos requisitos da prova indiciária, a aceitação da sua credibilidade está dependente da convicção do julgador que, embora sendo uma convicção pessoal, terá que ser sempre objectivada e motivada. 
A apreciação da prova indirecta ou indiciária está sujeita à livre apreciação nos termos do art. 127º do CPP. No entanto a prova indirecta exige um particular cuidado na sua apreciação, sendo certo que apenas se pode extrair o facto probando do facto indiciário quando tal seja corroborado por outros elementos de prova, por forma a que sejam afastadas outras hipóteses igualmente possíveis – cfr. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, 3ª ed., II vol., p. 100/1001.
Na avaliação da prova indiciária, mais do que em qualquer outra, intervém a inteligência e a lógica do julgador – sendo do mesmo passo, mais relevante do que em qualquer outro meio de prova mais ou menos tarifado, o contacto directo e a imediação do julgador com a sua produção, para aquilatar a sua credibilidade. Sendo tanto mais consistente quanto menores os factores externos que possam perturbar a verificação do facto probando.
Aliás a associação que a prova indiciária entre elementos de prova objectivos e regras objectivas da experiência leva alguns autores a afirmarem a sua superioridade perante outros tipos de provas, nomeadamente a prova directa testemunhal, onde também intervém um elemento que ultrapassa a racionalidade e que será mais perigoso de determinar, qual seja a credibilidade do testemunho – cfr. Mittermayer Tratado de Prueba em Processo Penal, p. 389.
Sendo que para que a prova indirecta, circunstancial ou indiciária possa ser tomada em consideração costumam exigir-se os seguintes requisitos: pluralidade de factos-base ou indícios; precisão de tais indícios estejam acreditados por prova de carácter directo; que sejam periféricos do facto a provar ou interrelacionados com esse facto; racionalidade da inferência; expressão, na motivação do tribunal de instância, de como se chegou à inferência – cfr. FRANCISCO ALCOY, ob. cit., p. 39, fazendo a síntese da doutrina e jurisprudência sobre o tema. No mesmo sentido, desenvolvidamente, cfr. CARLOS CLIMENT DURÁN, La prueba Penal, ed. Tirant Blanch p. 626 e segs., em especial p. 633.
Ora, sendo questionada a verificação, in casu, da base da presunção (que estejamos perante uma máquina de jogo ilícito) caso venha a concluir-se que não se verificam os pressupostos de natureza objectiva, cairá pela a base a presunção natural/judicial relativa ao conhecimento de tal circunstância. Pois que, caso não se verifique qualquer dos elementos objectivos do tipo, impossível se torna fundar nele um possível elemento subjectivo. Falhando a premissa, falece, por imperativo lógico, a conclusão que nela se possa fundar.
Importa, pois, aprofundar se – como questiona a recorrente e de acordo com o douto parecer – se estão verificados os elementos do tipo objectivo de crime p e p pelo art. 108º do DL 422/89. O mesmo é dizer, se o jogo desenvolvido pela máquina dos autos constitui jogo de fortuna ou azar.
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3.2. O quadro legal relativo ao jogo e à definição do jogo ilícito é constituída pelo Decreto-Lei nº 422/89, de 02 de Dezembro, com sucessivas alterações, onde se destaca a redacção dada pelo DL 10/95 de 19.01.
Constatando que “A disciplina actual do jogo consagra algumas soluções que carecem ser adaptadas às alterações de natureza sócio-económica verificadas nos últimos anos e, fundamentalmente, à função turística que o jogo é chamado a desempenhar” (cfr. § 1º do respectivo preambulo), o legislador, através do Decreto-Lei nº 422/89, de 2 de Dezembro, veio “reformular” a legislação pré-existente “com vista a instaurar um sistema mais adequado de regulamentação e de controlo da actividade” (cfr. § 2º do mesmo preâmbulo).
Consignando, entre as principias inovações (cfr. § 3 e 4) “Opera-se uma liberalização (…) nos condicionamentos a que se sujeitam os acessos às salas de jogos de fortuna ou azar, mas por outro lado, ao acentuar-se o princípio da reserva de admissão, visa-se melhorar o nível de frequência das salas de jogos”. 
Posteriormente, em 1995, o legislador – através do DL 10/95 de 19.01 - reconhecendo que “tendo a regulamentação do jogo permanecido inalterada nos sues aspectos essenciais, é inegável que as profundas mutações da realidade sócio-económica e cultural que entretanto se fizeram sentir no País não encontraram, até agora, reflexo no quadro normativo por que se rege a actividade” (cfr. § 4º do preâmbulo do DL 10/95 de 19.01), decidiu “regular no âmbito do Decreto-Lei nº 422/89, de 2 de Dezembro a matéria relativa às modalidades afins de jogos de fortuna e azar” (cfr.§ 7 do mesmo preâmbulo).   

Resulta, com relevo, do citado Decreto-Lei nº 422/89, de 2 de Dezembro, alterado pelo DL 19/95: 
Artigo 1º: Jogos de fortuna ou azar são aqueles cujo resultado é contingente por assentar exclusiva ou fundamentalmente na sorte.
Artigo 3º: A exploração o e a prática dos jogos de fortuna e ou azar só são permitidos nos casinos existentes em zonas de jogo permanente ou temporário criadas por decreto-lei.
Artigo 4º
Tipos de jogo de fortuna e azar
1- Nos casinos é autorizada a exploração, nomeadamente, dos seguintes tipos de jogos de fortuna ou azar:
a) Jogos bancados em bancas simples ou duplas: bacará ponto e banca, banca francesa, boule, cussec, écarté bancado, roleta francesa e roleta americana com zero;
b) Jogos bancados em bancas simples: black Jack/21, chukluck e trinta e quarenta;
c) Jogos bancados em bancas duplas: bacará de banca limitada e craps;
d) Jogo ancado: Keno;
e) Jogos não bancados: bacará chemin de fer, bacará de banca aberta, écarté e bingo;
f) Jogos em máquinas pagando directamente prémios em fichas ou moedas;
g) Jogos em máquinas que, não pagando directamente prémios em fichas ou moedas, desenvolvam temas próprios dos jogos de fortuna e azar ou apresentem como resultado pontuações dependentes exclusiva ou fundamentalmente da sorte.
Artigo 108º: Quem, por qualquer forma, fizer exploração de jogos de fortuna ou azar fora dos locais legalmente autorizados, será punido com pena de prisão até dois anos e multa até 200 dias.
Artigo 159º
Modalidades afins de jogos de fortuna ou azar e outras formas de jogo
1 – Modalidades afins de jogos de fortuna ou azar são as operações oferecidas ao público em que a esperança de ganho reside conjuntamente na sorte e perícia do jogador, ou somente na sorte, e que atribuem como prémios coisas com valor económico.
2 – São abrangidos pelo disposto no número anterior, nomeadamente, rifas, tômbolas, sorteios, concursos publicitários, concursos de conhecimentos e passatempos.
3 – Sempre que qualquer modalidade afim do jogo de fortuna ou azar ou outras formas de jogo atinjam tal incremento que ponham em perigo os bons costumes, ou esteja em causa a honestidade dos resultados, o membro do Governo reponsávl pela administração interna tomará as medidas convenientes à protecção dos interesses (…).
Artigo 160º
Condicionantes
1 – A exploração de modalidades afins de jogo de fortuna ou azar e outras formas de jogo referidas no artigo anterior fica dependente de autorização do membro do Governos responsável pela administração interna, que fixará, em cada caso, as condições que tiver por convenientes e determinará o respectivo regime de fiscalização.
(…)
Artigo 161º
Proibições
(…)
3 – As modalidades afins dos jogos de fortuna e azar e outras formas de jogo referidas no artigo 159º não podem desenvolver temas característicos dos jogos de fortuna ou azar, nomeadamente o póquer, frutos, campainhas, roleta, dados, bingo, lotaria de números ou instantânea, totobola e totoloto nem substituir por dinheiro ou fichas os prémios atribuídos.

Movendo-se no descrito quadro legal, tendo em vista, especificamente os jogos em máquinas, decidiu o STJ em Acórdão Uniformizador de Jurisprudência (n.º 4/2010, publicado no DR, 1ª série, de 08.03.2010):
Constitui modalidade afim e não jogo de fortuna ou azar, nos termos dos artigos 159.º, n.º 1, 161.º, 162.º e 163.º do Decreto-Lei nº 422/89, de 2 de Dezembro, na redacção do Decreto-Lei nº 10/95, de 19 de Janeiro, o jogo desenvolvido em máquina automática na qual o jogador introduz uma moeda e, rodando um manípulo, faz sair de forma aleatória uma cápsula contendo uma senha que dá direito a um prémio pecuniário, no caso de o número nela inscrito coincidir com algum dos números constantes de um cartaz exposto ao público”.

O crime tipificado pelo art. 108º consiste na “exploração de jogos de fortuna ou azar fora dos locais legalmente autorizados”.
A norma incriminatória constitui uma norma compósita, que reclama, para a caracterização do crime, o recurso ao conceito de “jogos de fortuna ou azar”, previsto em outras disposições legais do mesmo diploma, designadamente os artigos 1º, 3º, 4º, 6º, 7º, 8º.
No seu preenchimento têm sido avançados vários critérios jurisprudenciais, mais relevantes (cfr. síntese em Comentário das Leis Penais Extravagantes organizado por Pinto de Albuquerque e José Branco, Vol. II, p. 361, comentário de Conde Fernandes): - o carácter aleatório do resultado; - a natureza do prémio; - a natureza da relação com o jogador, sendo nas modalidades afins a oferta iria ao encontro do público e nos jogos de fortuna a azar o jogador o jogador a procurar a entidade exploradora; - um critério meramente formal (aqueles jogos cuja exploração apenas é autorizada nos casinos.
O critério hermenêutico, como refere na sua fundamentação, o acórdão do STJ nº4/2010, não pode deixar de ser material, a atingir a partir das próprias categorias legais, dentro de um critério de interpretação teleológico perspectivado fundamentalmente à protecção do bem jurídico como expressão do princípio da legalidade, a que estão associados princípios de natureza constitucional como o da dignidade penal, da carência de tutela penal, da máxima restrição penal.
 
Visando especificamente os Jogos em Máquinas, refere já reproduzido o art. 4º:
f) Jogos em máquinas pagando directamente prémios em fichas ou moedas;
g) Jogos em máquinas que, não pagando directamente prémios em fichas ou moedas, desenvolvam temas próprios dos jogos de fortuna e azar ou apresentem como resultado pontuações dependentes exclusiva ou fundamentalmente da sorte.
Na procura de uma interpretação sistemática, teleologicamente fundada, perspectivada para os aludidos princípios da dignidade e da carência de tutela penal, surgem-nos assim como conceitos relevantes, definidos pelo legislador como jogos de fortuna ou azar, proibidos fora dos locais legalmente autorizados:
- aqueles que pagam prémios em fichas ou moedas – alíneas f).
- os jogos em máquinas que desenvolvem temas “típicos” dos jogos de fortuna ou azar – aqueles que, por remissão, estão exemplificados nas alíneas a) a e) do art. 4º, de exploração exclusiva nos casinos (nomeadamente o póquer, frutos, campainhas, roleta, dados, bingo, lotaria de números ou instantânea, Totobola e Totoloto) – 1ª parte da al. g).
- ou os jogos em máquinas que apresentem como resultado pontuações dependentes exclusiva ou fundamentalmente da sorte – 2ª parte da al. g).
- Importando ainda, na busca da interpretação sistemática e teleologicamente fundada, confrontar este regime com o das “modalidades afins de jogo de fortuna ou azar” – definido pelo art. 159º.
- Bem como a natureza dos jogos proibidos pelo art. 160º, nº 3, dentro do conceito de jogos afins. 

Numa interpretação sistemática, teleologicamente fundada, tendo em vista os princípios da subsidiariedade, da dignidade penal, da tutela de bens jurídicos que constituem o mínimo ético, afigura-se que não poderão subsumir-se na modalidade prevista na 2ª parte da citada al. g) [ou jogos em máquinas que apresentem como resultado pontuações dependentes exclusiva ou fundamentalmente da sorte], jogos que não tenha um desvalor social semelhante ou muito próximo dos jogos previstos:
 - ao longo das várias alíneas do nº1 do preceito.
- mais especificamente na al. f) do preceito – pagamento de prémios em fichas ou moedas.
- Ou na 1ª parte da mesma alínea g) – desenvolvimento de temas “típicos” dos jogos de fortuna ou azar (nomeadamente o póquer, frutos, campainhas, roleta, dados, bingo, lotaria de números ou instantânea, Totobola e Totoloto).
Salientando-se que também nas chamadas “modalidades afins” são proibidos pelo n.º 3 do artigo 161.º do Decreto -Lei n.º 422/89, de 2 de Dezembro, na redacção do Decreto -Lei nº 10/95, de 19 de Janeiro. Onde, além dos aludidos “jogos típicos” se acrescenta, nas proibições dos jogos afins: “nem substituir por dinheiro ou fichas os prémios atribuídos”.

Quando o resultado do jogo nas máquinas automáticas, embora dependendo exclusivamente da sorte, não atribui prémios pagos em fichas (convertíveis em dinheiro) ou moedas ou não desenvolve temas característicos dos jogos típicos de fortuna ou azar, deverá, ainda assim, importar para o jogador uma álea/risco relevante para o jogador, da mesma natureza ou semelhante ao previsto nas múltiplas alíneas do mesmo preceito – o mesmo é dizer, prémios em fichas convertíveis em dinheiro, moedas - como sucede, aliás, com todos os jogos “típicos” previstos ao longo do preceito. Podendo dizer-se que não há fortuna ou azar se não há fortuna ou azar relevante envolvidos.
 Impõe-se assim uma redução teleológica do âmbito de aplicação da 2ª parte da al. g) do nº1 do art. 4º (… “ou jogos em máquinas que apresentem como resultado pontuações dependentes exclusiva ou fundamentalmente da sorte”) no sentido de apenas revestirem a natureza de jogos de fortuna ou azar, os jogos em máquinas automáticas cujos resultados, dependendo embora fundamentalmente da sorte, não contém uma álea relevante, da mesma natureza de fichas, dinheiro ou bens de valor económico ou não desenvolvam temas próprios dos jogos de fortuna ou azar nos termos previstos na 1ª parte daquele dispositivo ou nas alienas precedentes do mesmo nº1 do preceito.
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Ora, no caso da máquina dos autos, além da “pequena dimensão” referida no ponto 2 da matéria provada, verifica-se que o jogo disponibilizado, constitui no seguinte: introduzindo a moeda de € 0,50, a máquina enceta o “jogo” que consiste no acendimento, num ecrã circular, de 64 led's numerados, dos quais oito (10, 1, 50, 2, 100, 5, 20 e 200) são pontuados. No caso de a luz se fixar – aleatoriamente, sem influência da perícia do jogador - num dos led`s pontuados, o jogador ganha os pontos identificados em cada um daqueles números. Fixando-se em qualquer um dos restantes pontos (56) o jogador não ganha ponto nenhum.
No entanto, a única consistência, o único significado dos pontos ganhos é a sua conversão em nova ou novas jogadas, sempre idênticas - fazendo acender de novo as luzinhas, da mesma forma. Sem qualquer possibilidade de troca dos pontos por fichas, dinheiro ou prémios de qualquer natureza. Apenas pontos cuja única função/finalidade se esgota na conversão em novas jogadas.
A referência feita na matéria provada é apenas “valor dos pontos” em termos de equiparação ao valor de cada jogada. Não a qualquer valor de fichas, dinheiro ou bens. Que não só não resulta da matéria provada (e, em caso de dúvida funcionaria o princípio e in dubio pro reo) como é afastada pelas características da máquina descritas no exame pericial realizado.
O jogo consiste apenas em ver acendidas rotativamente múltiplas luzinhas. E, fixando-se em algumas das “premiadas” o prémio é apenas a repetição do espectáculo das luzinhas, qual jogo do mal-me-quer, bem-me-quer, sem outra expressão que não seja o acendimento das luzes e a possibilidade de, fixando em alguma das 8 premiadas, conferir nova ou novas jogadas. Não existindo uma álea digna de relevo que provoque o impulso ao jogo, na mira de ganho de algo de valor superior ao da “aposta” pressuposto pela valoração dos interesses protegidos pelo tipo legal.
No aludido sentido de justiça o preenchimento do tipo apenas se satisfaz mediante uma redução teleológica do âmbito de aplicação dos seus elementos típicos normativos, no respeito do “padrão de adequação social” perspectivado para a satisfação do “limiar mínimo” da dignidade penal, assente na perigosidade abstracta ou presumida da conduta que exige um jogo com a densidade pressuposta em qualquer das alíneas do n.º1 do art. 4º ou na 1ª parte da mesma alínea.
Aliás, em termos de senso comum e da presunção ínsita no art. 9º do C. Civil, nunca poderia entender-se que o legislador quis fazer entrar pelo postigo (parte final da citada al. g) – após a disjuntiva “ou”) situações que nunca poderiam entrar na porta grande prevista na 1ª parte da mesma alínea o ou em qualquer das múltiplas alíneas precedentes do mesmo preceito.
Concluindo-se assim com o douto parecer do Exmo. Procurador-Geral Adjunto no sentido de que a máquina dos autos não integra o crime p e p pelo art. 108º do DL 422/89.
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3.3. Afastada a qualificação como crime, podia considerar-se aplicável uma coima por contra-ordenação prevista no art. 163º do DL 422/89 de 02.12, tendo em vista, nomeadamente, o mecanismo previsto no art. 77º do RCCC.
No entanto se é certo que tal preceito permite a apreciação de contra-ordenações no processo-crime, não é menos certo que exige a conexão entre a contra-ordenação e o crime investigado. Ou uma situação que foi investigada como crime mas veio a apurar-se no processo constituir apenas mera contra-ordenação.
Exigindo, em todo o caso, que o arguido seja confrontado com tal possibilidade, em tempo oportuno, a fim de poder exercer amplamente o contraditório. Importando ainda a comunicação da qualificação jurídica no sentido de poder ver produzida/discutida a prova pertinente, com vista à nova perspectiva surgida durante a discussão - em audiência, nos ternos do art. 158º do CPP.
Aliás o RGCC exige (quando se conclui que o “tema do processo” iniciado como contra-ordenação, constitui crime) a prévia “conversão” do processo em processo-crime (cfr. art. 76º).
Ou, no caso contrário (crime que passa a contra-ordenação) que “o processo passará a obedecer aos requisitos desta lei” – art. 77º do RGCC.
Ora não é o que sucede, no caso, uma vez que a questão surgiu / foi equacionada apenas, como possível, na fase de recurso, além do mais sem possibilidade de discussão, em tempo e com os meios próprios do processo por contra-ordenação, dos pressupostos fácticos do ilícito desta natureza.
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III.
Nos termos e com os fundamentos expostos, decide-se conceder provimento ao recurso, absolvendo a arguida do crime pelo qual vinha condenada, sem prejuízo de instauração de processo próprio, pela autoridade competente, por eventual responsabilidade por contra-ordenação. ---
Caso a arguida, em 90 dias, não prove a legalização e obtenção de licença para a exploração da máquina, vai a mesma perdida a favor do Estado.
Sem tributação.

Belmiro Andrade (Relator)
Abílio Ramalho