Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
846/09.4TBLSA-N.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: SÍLVIA PIRES
Descritores: INSOLVÊNCIA
CONTRATO PROMESSA DE COMPRA E VENDA
TERCEIRO DE BOA FÉ
ADQUIRENTE
Data do Acordão: 01/17/2017
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE COIMBRA – COIMBRA – JUÍZO COMÉRCIO – 3ª SEC.
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTºS 38º, Nº 3, 81º, NºS 1 E 6, E 152º DO CIRE.
Sumário: I – O artigo 81º, n.º 1, do CIRE, dispõe que a declaração de insolvência priva imediatamente o insolvente, por si ou pelos seus administradores, dos poderes de administração e de disposição dos bens integrantes da massa insolvente, os quais passam a competir ao administrador da insolvência, cominando o n.º 6 do mesmo artigo com a consequência da ineficácia dos actos realizados pelo insolvente em contravenção com tal privação.

II - O contrato-promessa, mesmo que sujeito a execução específica e em que se tenha verificado a antecipação dos efeitos do contrato prometido, não deixa de ter autonomia perante este, constituindo apenas uma etapa preparatória num processo que conduz à conclusão do contrato prometido.

III - Independentemente do grau de vinculação que exista do Administra­dor da Insolvência cumprir o contrato-promessa e das consequências que advirão de uma recusa a cumprir por parte daquele, estando o Insolvente privado dos poderes de administração e de disposição dos bens integrantes da massa insolvente, carece sempre de legitimidade substantiva para a prática do acto de cumprimento do contrato promessa.

IV - Até às alterações promovidas pelo Decreto-Lei n.º 116/2008, de 4 de Julho, no registo predial era apenas inscrita a apreensão do respectivo prédio, nos termos do artigo 152º do CIRE, o qual foi revogado pelo referido Decreto-Lei, não tendo esse registo qualquer relevância para efeitos de funcionamento da protec­ção dos terceiros de boa-fé prevista no n.º 6 do artigo 81º.

V - Com a modificação operada, o terceiro de boa-fé, adquirente de bens su­jeitos a registo, a título oneroso do insolvente, após a declaração de insolvência passou a estar protegido da aplicação do regime da ineficácia, desde que, nessas situações de impossibilidade do registo, nos termos do n.º 2 do artigo 38º do CIRE, o acto tenha sido celebrado anteriormente ao registo predial da declaração de insolvên­cia.

VI - Daí que quando na alínea a) do n.º 6 do artigo 81º do CIRE se exclui da consequência da ineficácia os actos celebrados a título oneroso com terceiros de boa-fé anteriormente ao registo da sentença da declaração de insolvência efectuado nos termos dos n.º 2 ou 3, consoante os casos, há que distinguir o registo da declaração de insolvência sobre bem integrante de massa insolvente de entidade sujeita a registo público e o registo da declaração de insolvência sobre bem integrante de massa insolvente de entidade não sujeita a registo público.

VII - No primeiro caso, a falta do registo predial da declaração de insolvência não gera a inoponibilidade da falta de legitimidade do insolvente perante terceiros, não aproveitando a estes, sendo antes determinante o registo público da sentença de declaração de insolvência, efectuado nos termos do n.º 2 do artigo 38º do CIRE.

VIII - Já no segundo caso é o registo predial da declaração de insolvência que é condição de ineficácia em relação à massa insolvente do acto oneroso praticado com terceiro de boa-fé após a declaração da insolvência.

Decisão Texto Integral:

Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra

A Autora intentou a presente acção pedindo:

a)  que seja declarada, nos termos do disposto no artigo 81.º, n.ºs 1, 4 e 6, alíneas a) e b) do CIRE, estas normas entendidas a contrario sensu, a ineficácia da compra e venda celebrada entre os 1.ª e 3.ºs Réus em 14.01.2010 no Cartório Notarial da Ex.ma Sr.a Dr.a ..., e na sequência da qual a 1.ª Ré declarou, através de procuração emitida em favor do 3.º Reu vendeu a este, P..., o bem imóvel identificado enquanto “prédio urbano composto por terreno para construção, lote três, sito na Rua da ..., com o valor patrimonial tributário de € 119.094,63 (cento e dezanove mil noventa e quatro euros e sessenta e três cêntimos), imóvel este que se encontrava registado definitivamente em nome da 1.ª R. pela Ap. 8 de 25.03.2004.”;

b) a condenação dos Réus a reconhecer a legitimidade e validade de tal declaração de ineficácia;

c) declarar-se revertido o bem imóvel em causa para a massa insolvente por força da reconstituição da situação que existiria se o acto não tivesse sido praticado e

d) fixando-se judicialmente um prazo para a sua restituição;

e) ordenando-se a extinção dos ónus e/ou registos de propriedade que so­bre o bem incidem com efeitos que retroagem à data do acto declarado ineficaz;

Alegou em síntese:

 - A 1ª Ré foi declarada insolvente em 16.11.2009.

- Por escritura de compra e venda outorgada em 14.1.2010, a 1ª Ré declarou vender pelo valor de €100.000,00 ao 3º Réu o prédio identificado no pedido;

- No acto em causa a 1ª Ré foi representada pelo 3º Réu com base numa procuração emitida pelo sócio gerente daquela, o aqui 2º Réu.

- O 3º Réu é descendente dos sujeitos passivos que em Abril de 2004 per­mutaram à 1ª Ré o imóvel em causa.

- O registo desse prédio encontra-se efectuado a favor do 3º Réu mediante inscrição de 9.4.2009.

- A compra e venda efectuada foram acordadas pelos Réus para dissipar o património da 1ª Ré.

- O preço declarado na escritura nunca foi pago pelo 3º Réu, mas mesmo que o tivesse sido seria muito inferior ao valor de mercado do imóvel, o qual não é inferior a € 150.000,00.

 - A escritura pública da compra e venda em causa foi efectuada mais de um mês após a declaração da insolvência da 1ª Ré.

- A Administradora da Insolvência, quando teve conhecimento do negócio enviou comunicações ao 3º Réu e posteriormente à mandatária do mesmo, comunica­ções juntas aos autos.

- Os Réus bem sabiam que as dívidas da Insolvente eram de cerca de € 566.506,21 e que o bem objecto do negócio era o único que as satisfaria, sendo, no entanto irreversível a sua situação de insolvência.

Concluiu pela procedência da acção.

O 3º Réu P... contestou, impugnando o valor da causa, excepcionando a falta de consentimento/autorização da Comissão de Credores para a Autora intentar a acção, a preterição de litisconsórcio necessário passivo e ainda impugnando a versão dos factos alegada na p. inicial.

Conclui pela procedência das excepções dilatórias e, subsidiariamente, pela improcedência da acção.

A Autora, no articulado de resposta, pronunciou-se pela procedência da excepção da ilegitimidade do 2º Réu – V... -, defen­dendo a improcedência das demais, esclarecendo ainda que não submeteu a decisão de propor a acção à Comissão de Credores.

Veio a ser proferida decisão que, por ilegitimidade, indeferiu liminarmente a petição inicial quanto ao Réu V...

Na audiência prévia foi fixado o valor da acção e julgadas improcedentes as excepções de preterição de litisconsórcio necessário passivo e de falta de autoriza­ção ou deliberação/consentimento para a propositura da acção.

Conhecendo-se do mérito da acção foi a mesma julgada nos seguintes ter­mos:

Pelo exposto, na procedência da presente ação, declaro a ineficácia da compra e venda celebrada entre C..., Lda. e P..., em 14.01.2010 no Cartório Notarial da Exma. Sra. Dra. ..., e na sequência da qual a primeira vendeu ao segundo o prédio urbano composto por terreno para construção, lote três, sito na Rua..., declarando revertido o bem imóvel em causa para a massa insolvente e fixando-se um prazo de 30 dias para a sua restituição.

O Réu interpôs recurso desta decisão, apresentando as seguintes alegações:

...

Foi apresentada resposta na qual a Autora pugna pela confirmação da deci­são.

1. Do objecto do recurso

Considerando que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das suas alegações, cumpre conhecer das seguintes questões:

a) Devem ser alterados os factos considerados provados constantes dos pontos 6 e 8 da sentença recorrida?

b) O negócio impugnado efectivamente realizou-se quando se celebrou a promessa de compra e venda, se pagou o preço, houve tradição da coisa e se fez o registo provisório de aquisição?

c) Tendo a inscrição da insolvência no registo predial sido efectuada posteriormente à outorga do acto impugnado mostra-se preenchido o requisito exigido pelo artigo 81º, n.º 6, a), do CIRE?

2. Os factos

2.1. Da impugnação da matéria de facto

...

2.2. Os factos provados

Os factos provados são os seguintes:

...

3. O direito aplicável

A Administradora da Massa Insolvente de C..., Limitada propôs uma acção de reconhecimento da ineficácia de contrato de compra e venda de bem pertencente à massa insolvente, celebrado pela Insolvente após a declaração de insolvência.

O artigo 81º, n.º 1, do CIRE, dispõe que a declaração de insolvência priva imediatamente o insolvente, por si ou pelos seus administradores, dos poderes de administração e de disposição dos bens integrantes da massa insolvente, os quais passam a competir ao administrador da insolvência, cominando o n.º 6 do mesmo artigo com a consequência da ineficácia dos actos realizados pelo insolvente em contravenção com tal privação.

O comprador contestou esta acção, alegando, além do mais, que a venda era eficaz, uma vez que preenchia a situação excepcional de protecção dos terceiros de boa-fé, prevista no n.º 6 do artigo 81º do CIRE, uma vez que estavam preenchi­dos os requisitos aí exigidos para que essa protecção fosse accionada.

A sentença recorrida decretou a ineficácia do negócio impugnado, com fundamento em que, revelando-se, desde logo, não se encontrar preenchido o requisito da anterioridade ao registo da sentença de declaração de insolvência, face à inscrição desta na Conservatória do Registo Comercial em data anterior à celebração do negócio impugnado, não era necessário apurar a verificação dos restantes requisi­tos.

No recurso interposto o Recorrente, além de afirmar que o negócio se consumou em data anterior à declaração de insolvência da vendedora, sustenta que, pelo menos, o negócio impugnado foi celebrado em data anterior ao registo que releva para os efeitos do artigo 81º, n.º 6, a), que é a inscrição da sentença de insol­vência no registo predial do imóvel transmitido.

Em primeiro lugar, o Recorrente defende que o negócio impugnado se deve considerar realizado com a celebração do respectivo contrato-promessa, pagamento do preço, tradição da coisa e registo provisório da sua aquisição, factos que ocorreram em data anterior à prolação da sentença de insolvência.

Não tem razão o Recorrente, uma vez que o contrato-promessa, mesmo que sujeito a execução específica e em que se tenha verificado a antecipação dos efeitos do contrato prometido, não deixa de ter autonomia perante este, constituindo apenas uma etapa preparatória num processo que conduz à conclusão do contrato prometido [1].

Se a antecipação das prestações do contrato prometido, como efeito da mera celebração do contrato-promessa, chegou a causar alguma perturbação na doutrina e na jurisprudência, tendo-se equacionado a possibilidade dessa antecipação resultar na celebração do contrato prometido, cedo se concluiu que tais antecipações são apenas isso mesmo – o cumprimento antecipado de obrigações ainda não consti­tuídas – só vindo a produzir-se o título jurídico que constitui a sua fonte constitutiva com a celebração do negócio prometido [2]. Daí a natureza precária destas prestações antecipadas.

Não se desconhece a controvérsia existente sobre a liberdade do Adminis­trador da Insolvência poder optar por recusar-se a celebrar o contrato prometido quando o contrato-promessa tem eficácia meramente obrigacional e verificou-se a tradição antecipada da coisa prometida vender, apesar do disposto nos art.º 106º, n.º 1, e 102º, n.º 1, do CIRE [3].

Mas, independentemente do grau de vinculação que exista do Administra­dor da Insolvência cumprir o contrato-promessa e das consequências que advirão de uma recusa a cumprir por parte daquele, estando o Insolvente privado dos poderes de administração e de disposição dos bens integrantes da massa insolvente, carece sempre de legitimidade substantiva para a prática do acto de cumprimento do contrato promessa.

Por estas razões, não é possível afirmar, para os efeitos previstos no artigo 81º, n.º 6, do CIRE, que o contrato de compra e venda se pode considerar finalizado com a celebração de um contrato-promessa, em que foi antecipado o pagamento do preço e a transmissão do gozo da coisa prometida vender, e com o registo da aquisi­ção provisória, com fundamento naquele contrato-promessa, sendo irrelevante a data em que é outorgada a escritura da compra e venda prometida.

Mas o Recorrente também alegou que é um terceiro de boa-fé a quem não é oponível a ineficácia do negócio celebrado indevidamente pela Insolvente.

Na verdade, o artigo 81º, n.º 6, do CIRE exclui da consequência da inefi­cácia dos actos realizados pelo insolvente em violação do disposto no n.º 1, do mesmo artigo, os actos que, cumulativamente reúnam os seguintes requisitos:

- forem celebrados a título oneroso;

- o terceiro esteja de boa-fé;

- os actos tenham sido celebrados anteriormente ao registo da sentença da declaração de insolvência efectuado nos termos do n.º 2 ou 3 do artigo 38º, consoante os casos.

- os actos não estejam compreendidos nos tipos referidos no n.º 1, do ar­tigo 121º do CIRE.

A sentença recorrida entendeu que tendo o registo da declaração de insol­vência na Conservatória do Registo Comercial sido efectuado em data anterior ao negócio impugnado, não estava verificado um dos requisitos imprescindíveis para o terceiro beneficiar da protecção excepcional prevista no artigo 81º, n.º 6, do CIRE.

Já o Recorrente entende que tendo o acto sido praticado anteriormente ao registo da declaração de insolvência na Conservatória do Registo Predial não se encontra excluído da referida protecção, importando verificar a sua boa-fé que nesta fase é ainda matéria controvertida no presente processo.

Os n.º 2 e 3 do artigo 38.º do CIRE dispõem:

2 - A declaração de insolvência e a nomeação de um administrador da in­solvência são registadas oficiosamente, com base na respectiva certidão, para o efeito remetida pela secretaria:

a) Na conservatória do registo civil, se o devedor for uma pessoa singu­lar;

b) Na conservatória do registo comercial, se houver quaisquer factos re­lativos ao devedor insolvente sujeitos a esse registo;

c) Na entidade encarregada de outro registo público a que o devedor es­teja eventualmente sujeito.

3 - Sem prejuízo do disposto no n.º 5 do artigo 43.º do Código de Registo Predial, a declaração de insolvência é ainda inscrita no registo predial, relativa­mente aos bens que integrem a massa insolvente, com base em certidão judicial da declaração de insolvência transitada em julgado, se o serviço de registo não conse­guir aceder à informação necessária por meios electrónicos, e em declaração do administrador da insolvência que identifique os bens.

Este n.º 3 foi acrescentado pelo Decreto-Lei n.º 116/2008 de 4 de Julho, em alteração conjugada da redacção da alínea a), do n.º 6, do artigo 81º, do CIRE, a qual passou a incluir a actual referência ao referido n.º 3, do artigo 38º.

Anteriormente, o artigo 38º não previa a inscrição no registo predial da de­claração de insolvência do titular do prédio respectivo e, consequentemente, o n.º 6 do artigo 81º não previa que a anterioridade do acto pudesse ser anterior a essa inscrição no registo predial.

Na verdade, até às alterações promovidas pelo Decreto-Lei n.º 116/2008 de 4 de Julho, no registo predial era apenas inscrita a apreensão do respectivo prédio, nos termos do artigo 152º do CIRE, o qual foi revogado pelo referido Decreto-Lei, não tendo esse registo qualquer relevância para efeitos de funcionamento da protec­ção dos terceiros de boa-fé prevista no n.º 6 do artigo 81º.

A modificação operada pelo Decreto-Lei n.º 116/2008 de 4 de Julho visou proteger os terceiros de boa-fé, adquirentes de bens sujeitos a registo, a título oneroso, relativamente aos actos que, não integrando o menu do n.º 1, do artigo 121º, do CIRE, tenham sido celebrados com insolvente não sujeito a registo público (v.g. as heranças aceites indivisas) [4].

Não existindo, até essa altura, possibilidade de qualquer registo da decla­ração de insolvência, relativamente aos insolventes que, pela sua qualidade, não estavam sujeitos a qualquer registo público, nunca se poderia verificar, nessas situações de inexistência de registo, o requisito exigido pelo artigo 81º, n.º 6, a), do CIRE, de que o acto fosse anterior ao registo da declaração de insolvência, deixando os terceiros de boa-fé desprotegidos nessas situações.

Com a modificação operada, o terceiro de boa-fé, adquirente de bens su­jeitos a registo, a título oneroso do insolvente, após a declaração de insolvência, passou a estar protegido da aplicação do regime da ineficácia, desde que, nessas situações de impossibilidade do registo, nos termos do n.º 2, do artigo 38º do CIRE, o acto tenha sido celebrado anteriormente ao registo predial da declaração de insolvên­cia.

Daí que, quando na alínea a) do n.º 6 do artigo 81º do CIRE se exclui da consequência da ineficácia os actos celebrados a título oneroso com terceiros de boa-fé anteriormente ao registo da sentença da declaração de insolvência efectuado nos termos dos n.º 2 ou 3, consoante os casos, há que distinguir o registo da declaração de insolvência sobre bem integrante de massa insolvente de entidade sujeita a registo público e o registo da declaração de insolvência sobre bem integrante de massa insolvente de entidade não sujeita a registo público.

No primeiro caso, a falta do registo predial da declaração de insolvência não gera a inoponibilidade da falta de legitimidade do insolvente perante terceiros, não aproveitando a estes [5], sendo antes determinante o registo público da sentença de declaração de insolvência, efectuado nos termos do n.º 2, do artigo 38º do CIRE.

Já no segundo caso é o registo predial da declaração de insolvência que é condição de ineficácia em relação à massa insolvente do acto oneroso praticado com terceiro de boa-fé após a declaração da insolvência.

A data do registo predial da declaração de insolvência só vale, pois, para os casos em que apenas existe esse registo [6]. Daí que a referida alínea a) do n.º 6 do artigo 81º do CIRE refira que o registo operante é o do n.º 2 ou o do n.º 3, do artigo 38º, consoante os casos.

Na presente situação, a Insolvente é uma sociedade sujeita a registo co­mercial, tendo a declaração de insolvência sito inscrita no Registo Comercial em 18.11.2009, pelo que tendo o acto impugnado sido praticado pela Insolvente em 14.1.2010 não pode o Recorrente beneficiar da protecção excepcional prevista no referido artigo 81º, n.º 6, do CIRE, sendo, assim, correcta a opção da decisão recor­rida de julgar desde logo improcedente a defesa apresentada pelo Recorrente.

Por estas razões deve o recurso ser julgado improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.

Decisão

Pelo exposto, julga-se improcedente o recurso, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas pelo Recorrente.

Coimbra, 17 de Janeiro de 2017.


***

[1] Cfr., explicando a autonomia do contrato-promessa face ao contrato prometido, Ana Prata, em O contrato-promessa e o seu regime civil, pág. 69 e seg., ed. 1999, Almedina, e Menezes Cordeiro, em Tratado de direito civil português II, Direito das obrigações, tomo 2, pág. 457-458, ed. 2010, Almedina

[2] Ana Prata, ob. cit. pág. 118-121.

[3] Menezes Leitão, em Direito da Insolvência, pág. 182, ed. de 2009, Almedina, defende uma interpretação correctiva do disposto no CIRE no sentido do administrador se encontrar vinculado a cumprir quando tenha existido a transmissão antecipada da coisa prometida vender, mesmo que o contrato-promessa não tenha eficácia real, o que foi seguido pelo Acórdão do S.T.J. de 20-10-2011, relatado por Hélder Roque, acessível em www.dgsi.pt.

   Contudo, tal opinião é rejeitada, no plano do direito constituído por Catarina Serra, em O novo regime português da insolvência, pág. 91-92, 4.ª ed., Almedina, Pinto Oliveira/Catarina Serra, em Insolvência e Contrato-Promessa, na Revista da Ordem dos Advogados, Ano 70.º, Vol. I/IV pág. 403 e seg., Luís Pestana de Vasconcelos, em Direito de retenção, contrato-promessa e insolvência, em Cadernos de Direito Privado, n.º 33, pág. 11, Carvalho Fernandes/João Labareda, no CIRE anotado, pág. 473, 3.ª ed., Quid iuris, e Maria do Rosário Epifânio, Manual de direito da insolvência, pág. 185-186, 5.ª ed., Almedina, e o Acórdão do S.T.J. de 21.6.2016, relatado por Júlio Gomes, acessível em www.dgsi.pt.

[4] Neste sentido, Catarina Serra, em Insolvência e registo predial (a propósito das alterações do DL n.º 116/2008, de 4/7), Scientia Iuridica, n.º 317, pág. 81 e seg. e o Parecer do Instituto dos Registos e do Notariado n.º 82/09 SJC-CT, aprovado em 21.10.2009 e homologado em 6.11.2009, acessível em www.irn.mj.pt

[5] Tal como sucedia, anteriormente ao Decreto-Lei n.º 116/2008 de 4 de Julho, com a falta do registo predial da apreensão do bem, como referiam Carvalho Fernandes e João Labareda, em CIRE anotado, vol. I, pág. 509, ed. de 2005, Quid Iuris.

[6] Catarina Serra, ob. cit., pág. 84.