Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
763/11.8TTCBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: RAMALHO PINTO
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO
FUNÇÃO PÚBLICA
CONTRATO POR TEMPO INDETERMINADO
EFEITOS
NULIDADE
ANULABILIDADE
Data do Acordão: 12/13/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL DO TRABALHO DE COIMBRA – 1º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: TRIBUNAL DO TRABALHO DE COIMBRA – 1º JUÍZO
Sumário: I – Através do Dec. Lei nº 427/89, de 07/12 (alterado pelo D. L. nº 218/98, de 17/07) o legislador definiu o regime de constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego na Administração Pública.

II – Segundo o artº 3º deste Regime, a relação jurídica de emprego na Administração Pública constitui-se por “nomeação” e “contrato de pessoal”.

III - Neste regime, o chamado “contrato de pessoal” reveste-se de duas modalidades: o contrato administrativo de provimento e o contrato de trabalho a termo certo (artºs 14º e 15º).

IV – Constitui jurisprudência pacífica do STJ que o regime previsto na lei geral sobre a conversão dos contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho sem termo não é aplicável ao contrato de trabalho a termo celebrado com a Administração Pública.

V – Em 22 de Julho de 2004 entrou em vigor a Lei nº 23/2004, de 22/06, que aprovou o regime jurídico de contrato individual de trabalho da Administração Pública e que estabeleceu a possibilidade de celebração de contratos de trabalho por tempo indeterminado (artº 5º, nº 1).

VI – As normas que estabelecem as modalidades e as condições do chamado “contrato de pessoal para as Administrações Pública e local contêm disposições legais de carácter imperativo.

VII – Daí que se devam considerar nulos os negócios jurídicos celebrados contra o regime consagrado nessas normas.

VIII – Sendo o contrato de trabalho declarado nulo ou anulado produz efeitos, como se fosse válido, apenas em relação ao tempo durante o qual esteve em execução – artº 122º, nº 1 do C.T./2009.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

 

 

A... instaurou, no 1º Juízo do Tribunal do Trabalho de Coimbra, a presente acção emergente de contrato de trabalho, com processo comum, contra o Estado Português – Ministério da Agricultura do Desenvolvimento Rural e das Pescas – DireCção Geral de Veterinária, pedindo que o Réu fosse condenado:

a) – a reconhecer que a Autora se encontrava vinculada, por contrato de trabalho subordinado, desde 14 de Março de 2003 e até 31 de Março de 2010, data em que foi outorgado o contrato de trabalho por tempo indeterminado em funções públicas;

b) – a pagar à Autora, a título de subsídios de férias e de subsídios de Natal a quantia total de €  21.191,13 e

c) – a pagar-lhe os juros de mora legais, sobre as importâncias antes mencionadas, que se venceram desde as datas dos vencimentos de cada um dos valores e até ao integral pagamento, sendo que as prestações anteriores a Junho de 2006 só vencem juros a partir de 17/6/2006, encontrando-se vencidos nesta data, 21/6/2011, no montante € 3.255,34.

Alegou, para o efeito e em síntese:

A Autora foi contratada, em 14/3/2003, para trabalhar, subordinadamente,  como médica veterinária, para executar serviços de inspecção sanitária.

Tal contrato foi sendo sucessivamente renovado, anualmente, até 2010.

Com data de 10 de Março de 2010, foi celebrado entre a Direcção

Geral de Veterinária e a Autora um contrato de trabalho em funções públicas, por tempo indeterminado, donde constava que produzia os seus efeitos a partir de 1 de Abril de 2010, continuando a Autora a executar os mesmos serviços de inspecção.

O Réu nunca lhe pagou subsídios de férias e de Natal.

O Réu, representado pelo MºPº, contestou a acção, excepcionado a excepção de prescrição e impugnando a existência de um contrato de trabalho.

Efectuado o julgamento, foi proferida sentença, decidindo do seguinte modo:

“Face ao exposto, julgo procedente a invocada exceção de prescrição, extinto o direito da A. e, consequentemente, absolvo o R. dos pedidos contra si formulados nos presentes autos (artigo 493, nº 3, do C.P.C.)

Custas a cargo da A.”.

Inconformada com o decidido, veio a Autora interpor o presente recurso de apelação, onde formulou as seguintes conclusões:

[...]

O Réu contra-alegou, propugnando pela manutenção do julgado.

Foram colhidos os vistos legais.

x

Definindo-se o âmbito do recurso  pelas suas conclusões, temos, como questões a apreciar:

- a prescrição;

- a omissão de pronúncia.

x

Na 1ª instância foi considerada provada a seguinte factualidade, não objecto de impugnação, e que este Tribunal de recurso aqui acolhe:

[...]

x

- o direito:

Considerou a sentença recorrida que entre a Autora e o Réu existiu um contrato de trabalho que perdurou de 14/03/2003 até 31/03/2010, qualificação esta que se deve ter como definitivamente assente nos autos, já que não foi posta em causa por qualquer das partes.

Aliás, tal solução vai de encontro ao que vem sendo decidindo por esta Relação, de modo uniforme, em diversas outras situações em tudo semelhantes aos dos autos – cfr, a título de exemplo, o recentíssimo acórdão  de 13/9/2012, proferido no âmbito do processo 310/11.1TTCBR.C1.

Acontece, porém, que, continuando a relação  laboral, sem qualquer interrupção e nos mesmo moldes em que o vinha sendo até aí, a decorrer a parir de 1/04/2010, agora ao abrigo do contrato de fls. 29 a 32 – contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, a mesma sentença considerou que, havendo dois contratos, e tendo em conta que a acção foi proposta para além do decurso do prazo de um ano a partir da cessação do primeiro contrato - reconhecido como de trabalho – se verificou a prescrição dos créditos do mesmo resultantes.

Vejamos se é assim:

Ficou provado que foi celebrado entre a DRABL e a Autora, no dia 14/03/2003, um contrato de prestação de serviço de inspecção sanitária em regime de avença, contrato este que foi sendo renovado, anualmente, até 2010.

Com data de 10/03/2010, a Autora e a DGV acordaram nos termos constantes de fls. 29 a 32, ou seja, celebraram um contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado com efeitos a partir de 01/04/2010, e nos termos do Regime de Contrato de Trabalho em Funções Públicas, aprovado pela Lei nº 59/2008, de 11/9.

Mais se apurou que não houve  qualquer interrupção ou hiato entre o trabalho prestado até 31/03/2010 e o prestado a partir de 01/04/2010.

O que quer dizer que a relação laboral, não tendo sofrido qualquer alteração em termos de relação de facto, se viu sujeita, a partir da última data, ao regime jurídico da referida Lei 59/2008. Ou seja, e em termos estritamente de direito, a Autora esteve vinculada ao Réu por dois contratos, que se sucederam, e que o primeiro deles, qualificado como de trabalho pela sentença, cessou em 31/03/2010.

Esse primeiro contrato, e tal como vem sendo pacificamente reconhecido pela jurisprudência, estava ferido de nulidade, tendo em consideração as formas de vinculação à Administração Pública em termos de emprego que, à data da outorga do contrato, se verificavam.

Através do Decreto-Lei n.º 427/89, de 07/12 (posteriormente com as alterações introduzidas pelo Dec. Lei n.º 218/98 de 17/07), o legislador definiu o regime de constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego na Administração Pública.

Segundo o artº 3º daquele diploma legal “a relação jurídica de emprego na Administração Pública constitui-se por nomeação e contrato de pessoal.”

Sendo a nomeação o “acto unilateral da Administração pelo qual se preenche um lugar do quadro e se visa assegurar, de modo profissionalizado, o exercício de funções próprias do serviço público que revistam carácter de permanência” – artº 4º, nº 1, a qual se reveste de duas modalidades: a nomeação por tempo indeterminado e a nomeação em comissão de serviço.

O contrato de pessoal reveste-se, por sua vez, de duas modalidades (artº 14º)  a saber: o contrato administrativo de provimento que é “o acordo bilateral pelo qual uma pessoa não integrada nos quadros assegura, a título transitório e com carácter de subordinação, o exercício de funções próprias do serviço público, com sujeição ao regime jurídico da função pública (artº 15º, nº 1); e o contrato de trabalho a termo certo que é “o acordo bilateral pelo qual uma pessoa não integrada nos quadros assegura, com carácter de subordinação a satisfação de necessidades transitórias dos serviços de duração determinada que não possam ser asseguradas nos termos do contrato administrativo de provimento” (artº 18º, nº 1).

Constitui jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal de Justiça que o regime previsto na lei geral sobre a conversão dos contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho sem termo não é  aplicável ao contrato de trabalho a termo celebrado com a Administração Pública (cfr. entre muitos outros, Acs. de 6/3/96, CJ/STJ 1996, Tomo 1, pág. 264, de 23/9/96, BMJ 479º, 351, de 28/10/98, BMJ 480°,236, e de 26.11.08, in www.dgsi.pt, proc. 08S1982).

No Acórdão 683/99 do Tribunal Constitucional (publicado no Diário da República, II Série, de 3 de Fevereiro de 2000) escreveu-se:

“A forma de acesso à função pública pela conversão de contratos de trabalho a termo certo em contratos de trabalho por tempo indeterminado, sem concurso, seria independente de quaisquer razões materiais, ligadas à função a exercer, para além de violar o princípio da igualdade estabelecido no artigo 47°, nº 2 da Constituição. Não deve, pois, ter-se por admissível.”

Aí se considerou, ainda, que a conversão em contrato sem termo de um contrato com termo que ultrapasse os limites à sua renovação "não se apresenta como único meio, ou sequer, como disciplina indispensável, para o cumprimento pelo  Estado do seu dever de proteger a segurança no emprego”.

  Pelo Acórdão nº 368/00 (Diário da República, 1ª Série- A, de, 30.11.2000), o Tribunal Constitucional veio a declarar inconstitucional, com força obrigatória geral, a norma do artigo 14°, nº 3, do Dec.-Lei nº 427/89, de 7 de Dezembro, na interpretação segundo a qual os contratos de trabalho  a termo celebrados pelo Estado se convertem em contratos de trabalho sem termo, uma vez ultrapassado o limite máximo de duração total fixado na lei geral sobre contratos a termo, por violação do disposto no nº 2 do artigo 47º da Constituição.

Em 22 de Julho de 2004 entrou em vigor a Lei n.º 23/2004, de 22/6, que aprovou o regime jurídico de contrato individual de trabalho da Administração Pública e que – entre outros aspectos que aqui não relevam – estabeleceu a possibilidade de celebração de contratos de trabalho por tempo indeterminado (cfr. designadamente o respectivo art. 5º, n.º 1), contrariamente ao que sucedia na anterior legislação, bem como manteve a possibilidade de contratação a termo resolutivo em determinadas circunstâncias que nela são taxativamente fixadas.

A contratação por tempo indeterminado pela Administração Pública ao abrigo daquele diploma, para além de ter de ser precedida de um processo de selecção que obedece a determinados princípios que devem ser respeitados, só poderia ocorrer se existisse um quadro de pessoal para aquele efeito e com obediência aos limites desse quadro.

Posteriormente, foi publicada, para entrar em vigor em 1 de Janeiro de 2009, a já citada Lei nº 58/2009, de 11/9, ao abrigo da qual foi outorgado o contrato de fls. 29 a 32.

Mas, quid juris, se nos deparamos com uma impossibilidade jurídica daquele primeiro contrato por tempo indeterminado, face à inexistência desta forma de contratação na Administração Pública?

Estatui o artº 294° do Cód. Civil que "os negócios celebrados contra disposição legal de carácter imperativo, são nulos, salvo nos casos em que outra solução resulte da lei."

As normas que estabelecem, taxativamente, as modalidades e as condições do contrato de pessoal (para as Administrações Pública e Local) contêm disposições legais de carácter imperativo. Daí que se devam considerar nulos os negócios jurídicos celebrados contra o regime consagrado naquelas normas, nos termos do artº 294° do Cód. Civil. Esta é também a jurisprudência do STJ (cfr. acórdãos atrás referidos).

Sendo nulos esses negócios, que efeitos se devem considerar daí  decorrentes para os sujeitos de uma relação de trabalho que violem o estatuído nesses preceitos?

Os efeitos só podem ser os previstos no artº 122°, nº 1, do Código do Trabalho de 2009, segundo os quais "o contrato de trabalho declarado nulo ou anulado produz efeitos como válido em relação ao tempo durante o qual esteve em execução”.

Sendo o contrato nulo produz efeitos, como se fosse válido, apenas em relação ao tempo durante o qual esteve em execução.

Esse artº 122º, nº 1, impõe a regra geral da não retroactividade dos efeitos da declaração de nulidade ou da anulação do contrato de trabalho executado, ao contrário do que sucede no regime geral da invalidade constante do nº 1 do artº 289º do Código Civil, onde se estabelece que “tanto a declaração da nulidade como a anulação do negócio têm efeito retroactivo, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado”.

No caso concreto, o Réu não invocou, para fazer cessar a actividade laboral do Autor, nem essa invalidade, nem lhe comunicou que o mesmo cessava a partir do dia 31 de Março de 2010. O que pura e simplesmente aconteceu é que a Autora passou a estar vinculada pelo já mencionado contrato de fls. 29 a 32, fazendo cessar o primeiro, desde logo por impossibilidade de manutenção dos dois em paralelo, como é bom de ver.

Como salientam Mário Pinto, Furtado Martins e António Nunes de Carvalho, in Comentários às Leis do Trabalho, vol. I, pag. 73, a extinção do contrato de trabalho coloca problemas particulares quando se verifique a invalidade do mesmo. “…Em qualquer momento podem as partes (qualquer delas) invocar a invalidade e deixar de cumprir o contrato, pois, como é geralmente reconhecido, do contrato inválido não nasce uma relação laboral, pelo que nem o trabalhador está obrigado a executar a actividade prometida, nem o empregador tem o dever (ou o ónus) de consentir a explicitação dessa actividade, pagando a retribuição correspondente”. Assim, a invocação da invalidade por parte do empregador não está sujeita às diversas restrições aplicáveis ao despedimento.

Se a cessação de uma relação de trabalho inválida pode ser promovida em qualquer altura, sem qualquer dos fundamentos previstos na lei para a denúncia do contrato válido, atendendo a que não existe para o trabalhador a obrigatoriedade de executar um contrato inválido, nem para o empregador a de consentir essa execução, importa que a entidade empregadora invoque, na altura da cessação, essa invalidade.

Se, por hipótese não o faz, procedendo a um verdadeiro despedimento,  as consequências desta atitude, em termos de quantias a atribuir ao trabalhador, não poderá ser outra que não a aplicação das regras sobre os efeitos do despedimento ilícito, embora aqui possa ser necessário fazer uma adaptação dessas regras tendo em vista a invalidade do contrato de trabalho. Neste sentido os autores e obra referidos, a pag. 74, Pedro Romano Martinez, in Direito do Trabalho, Almedina, Abril de 2002, pag. 420 e ss, e os Ac. do STJ de 22/3/2007, proc. 07S364, e de 25/06/2009, proc. 08S2566, in www.dgsi.pt.

Assim sendo, um dos efeitos do despedimento ilícito – a reintegração - não poderá ocorrer, pois o tribunal não pode declarar a invalidade e, ao mesmo tempo, declarar que o contrato se mantém. Mas já  será de fazer funcionar a outra consequência: a obrigação da entidade empregadora pagar as retribuições vencidas correspondentes ao tempo em que o contrato esteve em execução e a indemnização de antiguidade. O contrato de trabalho nulo produzirá efeitos como se fosse válido em relação ao tempo durante o qual esteve em execução material efectiva, ou em execução meramente jurídica, no caso de ter havido triunfante impugnação de despedimento ilícito.

No caso sub judice, não se verificou nem essa invocação de nulidade, nem tão pouco qualquer declaração do Réu que consubstanciasse um declaração unilateral que devesse qualificar-se com despedimento: o que se passou foi que, continuando a Autora a exercer as suas funções exactamente  da mesma maneira que o fazia anteriormente - cfr. pontos 11 e 12 da matéria  de facto provada, a sua situação no Réu acabou por submetida às normas que regulam o contrato de trabalho em funções públicas, contendo o contrato outorgado entre as partes, de fls. 29-32, todas as referências exigidas pela Lei nº 59/2008.

Assim sendo, as consequências, em termos de cessação do contrato, da ficção de validade do contrato nulo, nunca poderiam passar pela fixação da indemnização legal por despedimento ilícito.

Como tal, e no caso concreto, os efeitos do contrato nulo, como se fosse válido,  em relação ao tempo durante o qual esteve em execução, limitam-se à obrigação da entidade empregadora pagar as retribuições vencidas correspondentes ao tempo em que o contrato esteve em execução, designadamente os subsídios de férias e de Natal reclamados. Mais nenhum efeito jurídico é legítimo extrair dessa invalidade.

Sendo esse o único efeito jurídico da declaração de nulidade do contrato, ficam excluídos quaisquer outros, designadamente os efeitos prescricionais decorrentes do decurso do prazo previsto no artº 337º, nº 1, do CT. É que não faria sentido que, não se podendo extrair da cessação do contrato nulo qualquer consequência jurídica, nomeadamente a nível indemnizatório do trabalhador, sendo essa compensação nitidamente favorável ao mesmo  trabalhador, se admitisse e/ou relevasse qualquer efeito de natureza prescricional tomando como ponto de partida o momento dessa cessação, efeito claramente contrário aos interesses do trabalhador, criando-se assim uma intolerável desproporção dos interesse em confronto. Solução que até o próprio no artº 122º, nº 1, do Código do Trabalho, claramente subentende, ao estabelecer que o contrato de trabalho declarado nulo ou anulado produz efeitos como se fosse válido em relação ao tempo durante o qual esteve em execução.

Assim, não operando a prescrição, nenhum obstáculo sobreexiste no sentido não de reconhecer à Autora os subsídios de férias de Natal reclamados, e devidos nos termos do disposto nos artºs 2º, nº 1, al. a), do DL 100/99, de 31 de Março, 10º do DL 496/80, de 25/10, e 2º, nº 1, 1 do DL 496/80, de 25/10, no montante peticionado, que não foi objecto de impugnação pelo Réu.

Passando ao que a Autora considera como nulidade da sentença por  omissão de pronúncia, temos que a mesma argumenta que, apesar de a sentença recorrida ter reconhecido que existiu um relação de trabalho subordinado entre as partes até 31/03/2010, acabou por não condenar o Réu a reconhecer a existência desse mesmo vínculo, apesar de tal sido objecto do pedido.

Numa primeira análise, seria de considerar extemporânea essa arguição de nulidade, por não ter sido expressa e separadamente invocada no requerimento de interposição do recurso, como impõe o artº 77º, nº 1, do CPT.

Acontece, porém, que não estamos perante um omissão de pronúncia.

A nulidade de omissão de pronúncia - prevista no nº 1, al. d), do artº 668º do Cód. Proc. Civil-    verifica-se quando o juiz conhece de questões de que não podia tomar conhecimento, ou quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar, em violação do disposto no artº 660, nº 2, do CPC, isto é, do dever, por parte do juiz, de não ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras, assim como de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.

Refira-se que as “questões” que o juiz deve conhecer se reportam às pretensões formuladas, não estando obrigado a apreciar todos os argumentos ou fundamentos que as partes indiquem para fazer valer o seu ponto de vista, sendo certo que, quanto ao enquadramento legal, não está o mesmo sujeito às razões jurídicas invocadas pelas partes, pois o julgador é livre na interpretação e aplicação do direito -  artº 664º do CPC.

Na sentença recorrida, a Srª Juíza não deixou de abordar e conhecer da questão em concreto: a existência de uma relação jurídico-laboral entre 14/03/2003 e 31/03/2010. O que se passou foi que incorreu em erro de julgamento, na parte decisória, e não em omissão de pronúnica, já que, não obstante esse reconhecimento e a Autora ter formulado o pedido de que fosse declarado que se encontrava vinculada ao Réu, por contrato de trabalho subordinado, desde 14 de Março de 2003  até 31 de Março de 2010, acabou por absolver o Ré de todos os ”pedidos contra si formulados”.

Daí que se entenda que pode e deve este Tribunal de recurso corrigir esse erro de julgamento e condenar o Réu nos precisos termos peticionados pela Autora.

Com a consequente procedência, na estrita medida do exposto, das conclusões do recurso.

x

Decisão:

Nos termos expostos, acorda-se em julgar procedente a apelação e, revogando-se a sentença recorrida, em julgar a acção totalmente procedente, condenando-se o Réu:

a) – a reconhecer que a Autora se encontrava vinculada, por contrato de trabalho subordinado, desde 14 de Março de 2003  até 31 de Março de 2010, data em que foi outorgado o contrato de trabalho por tempo indeterminado em funções públicas;

b) – a pagar à Autora, a título de subsídios de férias e de subsídios de Natal, a quantia total de € 21.191,13, acrescida dos juros de mora legais, sobre as importâncias mencionadas no ponto 126 da petição inicial, desde a data de vencimento de cada uma dessas prestações e até ao integral pagamento, sendo que as prestações anteriores a Junho de 2006 só vencem juros a partir de 17/6/2006.

Sem custas, incluindo na 1ª instancia.

 

 

Ramalho Pinto (Relator)

Azevedo Mendes

Joaquim José Felizardo Paiva