Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1358/17.8PBCBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: LUÍS TEIXEIRA
Descritores: ALCOOLÍMETRO;
VALIDADE DE APROVAÇÃO DO MODELO;
VALIDADE DA PROVA
Data do Acordão: 06/27/2018
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COIMBRA (J L CRIMINAL – J1)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ART. 125.º DO CPP; ART. 153, N.º 1 DO CE; ART. 14., N.ºS 1 E 2 DO REGULAMENTO DE FISCALIZAÇÃO DA CONDUÇÃO SOB INFLUÊNCIA DE ÁLCOOL OU DE SUBSTÂNCIAS PSICOTRÓPICAS, APROVADO PELA LEI Nº 18/2007 DE 17/05; ART. 2.º, N.º 2, DO DL N.º 291/90; ARTS. 4.º E 6.º, N.º 3, DO RCMA
Sumário:
I – O controlo metrológico dos alcoolímetros é da competência do Instituto Português da Qualidade, I. P. - IPQ e compreende as seguintes operações:
a) Aprovação de modelo;
b) Primeira verificação;
c) Verificação periódica;
d) Verificação extraordinária
II – Sendo a aprovação do dito modelo válida por 10 anos, salvo disposição em contrário.
III – Atingido o prazo inicial de aprovação de 10 anos, o mesmo modelo pode ser renovado, ou seja, com o atingir do prazo, não significa que o modelo não esteja apto a continuar a proceder a medições técnicas de qualidade.
IV – Quando o modelo atingiu o prazo de validade por que foi aprovado, significa que, a partir deste prazo, não podem ser introduzidos novos aparelhos, deste modelo, para uso, para medição, com sujeição à respetiva primeira verificação prevista no artigo 3.º do DL nº 291/90.
V - O que expira (expirou), é a aprovação do modelo em si, mas não expira (expirou) a qualidade técnica de um aparelho aprovado, embora não renovada essa aprovação, para poder continuar a ser usado, nos condicionalismos legalmente previstos.
Decisão Texto Integral:
Acordam em audiência de julgamento, na 4ª Secção (competência criminal) do Tribunal da Relação de Coimbra.
I
1. Nos autos supra identificados, foi o arguido A...,
Julgado e condenado pela autoria material de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos artigos 292. °, nº 1, e 69°, nº 1, alínea a), ambos do Código Penal, praticado a 01­-11-2017, nas penas principal e acessória de:
- sessenta e cinco (65) dias de multa, à razão de cinco euros (€ 5) dia, num total de trezentos e vinte cinco euros (€ 325); e
- quatro (4) meses de proibição de conduzir veículos motorizados, respetivamente.

2. Não se conformando com esta decisão, dela recorre o arguido A... formulando as seguintes conclusões:
(…)

3. Na sua resposta, o Ministério Público entende que:
(…)

4. Nesta instância, o Exmº Sr. Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.
5. Respondeu o arguido, terminando como o fizera nas alegações de recurso.
6. Procedeu-se à audiência de julgamento
Nesta, quer o recorrente quer o Ministério Público mantiveram as posições já consignadas nos autos.

II
Dos autos resultam assentes os seguintes factos com interesse e relevantes para a decisão:
(…)
6. Não lhe são conhecidos antecedentes criminais.
7. O exame quantitativo de pesquisa de álcool no ar expirado, foi realizado, ao arguido, através do alcoolímetro marca "Drager" modelo "7110 MKIII P", série ARMA nº 0047, aprovado pelo Instituto Português de Qualidade (IPQ) através do Despacho nº 11037/2007, de 24 de Abril, aprovação de modelo nº 211.06.07.3.06e publicado no D.R. 2ª Série, nº 109, de 6 de Junho de 2007, do mesmo (despacho) constando que a validade da aprovação de modelo é de 10 anos a contar da data de publicação no Diário da República.
8. Este aparelho/alcoolímetro marca "Drager" modelo "7110 MKIII P", foi verificado pelo IPQ em 2016-09-15 - 1ª Verificação.
9. O mesmo aparelho foi aprovado para utilização pelo Despacho nº 19684/2009, da Autoridade Nacional Segurança Rodoviária (ANSR) e publicado no Diário da república em 25.6.2009.
III
Questão a apreciar.
A validade da prova produzida com base em alcoolímetro que, quando foi realizado o exame de pesquisa de álcool no sangue já tinha a sua data de validade de aprovação expirada.
IV
Cumpre decidir:
1. Efetivamente, alega o arguido que o despacho nº 11037/2007 do Instituto Português de Qualidade referente à aprovação do referido modelo de alcoolímetro e publicado no Diário da República a 06/06/2007, tem validade de 10 anos a contar da sua publicação no Diário da República.
Mais, considera que é desde essa data que deve ser contado o prazo de 10 anos e não da data de publicação no Diário da República, a 25/06/2009, do despacho nº 19684/2009 da ANSR, onde se aprova a utilização do referido modelo de alcoolímetro.
Considera ainda que a aprovação do aparelho em causa caducou no dia 07/06/2017, tornando, a partir dessa data, os resultados de testes quantitativos realizados com esse aparelho inválidos como meio de prova, ou seja, prova proibida.
Assim, conclui o arguido, ora recorrente, que a decisão recorrida violou, por erro de interpretação e de aplicação, as normas constantes dos artigos 125.º do CPP, 153º, nº 1 do Código da Estrada, artigo 14, nºs 1 e 2 do Regulamento de Fiscalização da Condução sob Influência de Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas aprovado pela Lei nº 18/2007 de 17/05, artigo 2.º nº 2 do DL nº 291/90 e 4.º e 6.º nº 3 do RCMA
2. O recorrente subdivide a análise da sua pretensão, nos seguintes pontos:
A. Qual a entidade que detém atribuições e competência administrativa para aprovar os modelos de Alcoolímetros de modo a que os resultados por eles produzidos possam valer como prova em processo penal ou contraordenacional, nos termos do art. 153º nº 1 do Código da Estrada (“aparelho aprovado para o efeito”)?

B. Estipulado, legalmente ou no próprio acto, um prazo para a validade da aprovação, desde quando se conta e quando terminou?

C. Terminado o prazo de validade, poderia o alcoolímetro em causa, no caso concreto, continuar em utilização nos termos do disposto no art. 2º nº 7 do Decreto-lei 291/90?

3. Como pressupostos da sua análise, estabelece o recorrente os seguintes considerandos, que se aceitam, pois correspondem quer a factos resultantes dos autos quer à legislação em vigor sobre a questão:
1) É um facto que a consistência e fiabilidade metrológica dos resultados revelados pelos aparelhos de medição de Taxa de Alcoolémia, por remissão dos arts. 153º nº 1 e 158º nº 1 a) do CE, arts. 1º nº 2 e 14º nos 1 e 2 do Regulamento de Fiscalização da Condução sob Influência do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas (doravante “RFCASP”), aprovado pela Lei nº 18/2007 de 17/05, art. 15º do Decreto-lei 291/90, e art. 2º a) da Portaria n.º 902-B/2007 de 13/04, é regulada pelo Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros, aprovado pela Portaria nº 1556/2007 de 10/12, que revogou a Portaria nº 748/94 de 03/10 (doravante “RCMA”);
2) É um facto que, ao se estipular no art. 153º nº 1 CE que “o exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito”, em conexão com o disposto no art. 14º nos 1 e 2 RFCASP, toda a prova obtida por pessoa que não as autoridades competentes (órgãos de polícia criminal) ou utilizando aparelho NÃO APROVADO para o efeito, nos termos remissivos do 158º nº 1 a) CE, é inutilizável, sendo nula por violação de disposição legal imperativa nos termos do art. 195º do CPP;
3) É também um facto que apenas pode servir como meio de prova, para os efeitos de quantificação da concreta Taxa de Álcool no Sangue, os aparelhos com capacidade de medição quantitativa ou a análise directa de sangue (art. 1º nos 2 e 3 RFCASP);
4) É outro facto, facilmente apreensível pela leitura dos despachos administrativos em causa, que o Despacho nº 11037/2007 do Instituto Português de Qualidade, referente à “aprovação do modelo nº 211.06.07.3.06” (que se cifra no badalado “DRAGER Alcotest 7110 MKIII P”) e publicado no Diário da República a 06/06/2007, contém no seu dispositivo a indicação de que “a validade DESTA APROVAÇÃO DE MODELO é de 10 anos a contar da data de publicação no Diário da República”;
5) É, por fim, e em conexão com o ponto anterior, um facto que no Despacho nº 19684/2009 da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, publicado no Diário da República a 25/06/2009, onde se aprova “para utilização na fiscalização do trânsito, o alcoolímetro qualitativo da marca Drager, modelo Alcotest 7110 MK IIIP”, nada se refere quanto ao prazo daquela autorização de uso.
4. Mais acrescenta:
“Isto porque, como se verá, tem sido muitas vezes colocada a questão de se contabilizar hipoteticamente o prazo de caducidade da aprovação de modelo a partir da data de emissão do despacho da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, que, no caso, seria o referido Despacho ANSR nº 19684/2009. Argumento em que o Tribunal a quo, erradamente, se arvora.
Para finalizar, diga-se que a questão que aqui é levantada já foi analisada por jurisprudência relevante para o caso: no sentido da caducidade da validade probatória do alcoolímetro pronunciaram-se os Acórdãos da Relação do Porto de 07/11/2012 (ELSA PAIXÃO) e os da Relação de Évora de 08/06/2010 (FERNANDO RIBEIRO CARDOSO) e 17/06/2010 (MARIA DA GRAÇA SANTOS SILVA) e 30/06/2015 (MARTINS SIMÃO). Para a posição contrária referem-se os Acórdãos da Relação de Lisboa de 17/03/2009 (MARGARIDA BLASCO), da Relação de Coimbra de 16/05/2012 (VASQUES OSÓRIO), e da Relação de Évora de 08/09/2015 (JOÃO GOMES DE SOUSA).
Por forma a repor a verdade, deve dizer-se que, na realidade, os únicos dois arestos (que se saiba) que de facto tiveram que se debruçar sobre a questão colocada foram os da Relação de Évora de 17/06/2010 e da Relação de Lisboa de 17/03/2009, porque se reportam a ocorrências durante o período de 26/09/2006 a 06/06/2007, e apenas durante esse período se verificou uma vacatio de modelos metrologicamente aprovados nos termos legais”.

5. Compulsado o teor da citada jurisprudência, verifica-se, na verdade, divergência quanto ao prazo de contagem da validade dos dez anos, se a partir da data de emissão do despacho da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária - que, no caso, seria o referido Despacho ANSR nº 19684/2009 - ou se a partir da aprovação do modelo nº 211.06.07.3.06, pelo Instituto Português de Qualidade (IPQ) através do Despacho nº 11037/2007, de 24 de Abril, e publicado no D.R. 2ª Série, nº 109, de 6 de Junho de 2007.
Aparelho este, com que foi realizado o exame em análise nos presentes autos.
5.1. Com efeito, no ac. da Relação de Lisboa de 17-03-2009, proferido no processo nº 178/2009-5, decide-se:
I. Sendo de 10 anos o prazo de validade da aprovação do aparelho Drager Alcotest 7110 MKIII, actualmente utilizado para fiscalização do estado de condução sob influência do álcool (cfr. art.2º., nº.2 do Regime Geral do Controlo Metrológico aprovado pelo DL nº.291/90, de 20 de Setembro e art.7º., nº.2 do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros aprovado pela Portaria nº.748/94, de 13 de Agosto), a questão que se coloca reside em saber se tal prazo se conta a partir da publicação em Diário da República do despacho de aprovação do Instituto Português da Qualidade (cfr. art.12º. do Decreto Regulamentar nº.24/98, de 30.10) ou do despacho da Direcção Geral de Viação que aprovou a utilização de tal aparelho, nos termos do art.5º., nº.5 do DL nº.44/05, de 23 de Fevereiro.
II. Entende-se, assim, ser de atender, para tal efeito, à data em que foi proferido o despacho da Direcção Geral de Viação, nos termos daquele último normativo (neste sentido, cfr. ACRL de 31.10.07, P.7087/07-3).
Seguindo igual posição o citado (pelo recorrente) ac. da Relação de Évora de 08/09/2015.
5.2. Em contrapartida, no citado ac. da Relação de Évora de 17-06-2010, proferido no proc. nº 89/07.1GTABF.E1, decide-se:
1. O prazo de caducidade da aprovação do alcoolímetro conta-se da data da publicação no DR dessa aprovação técnica pelo Instituto Português de Qualidade.
2. Depois da caducidade da aprovação do alcoolímetro Drager Alcotest, 7110 MKIII P, o resultado da medição levada a efeito em tal aparelho não vale como meio de prova.
Neste meso sentido se pronuncia o ac. do TRE de 30-06-2015, proferido no processo nº 855/12.6GDLLE.E1.

6. Preceitua o art. 153º, nº 1, do Código da Estrada que:
O exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado por autoridade ou agente de autoridade mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito”.
Por sua vez, dispõe o art. 158º, nº1 do Código de Estrada que:
“São fixados em Regulamento:
a) O tipo de material a utilizar na fiscalização e nos exames laboratoriais para determinação dos estados de influenciado pelo álcool ou por substâncias psicotrópicas.

Dispõe, o artigo 1º, nº 2, da Lei nº 18/2007, de 17 de maio, que aprovou o Regulamento de Fiscalização da Condução sob Influência do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas, (que revogou o Decreto Regulamentar n.º 24/98, de 30 de Outubro que regulamentava os procedimentos para a fiscalização da condução sob a influência do álcool ou de substâncias estupefacientes ou psicotrópicas):
"A quantificação da taxa de álcool no sangue é feita por teste no ar expirado, efectuado em analisador quantitativo É o analisador ou aparelho a que se refere o artigo 153º, nº1, do Código da Estrada., ou por análise de sangue".
Esta mesma Lei nº 18/2007, dispõe no artigo 14º, nº1, que:
"Nos testes quantitativos de álcool no ar expirado podem ser utilizados analisadores que obedeçam às características fixadas em regulamentação e cuja utilização seja aprovada por despacho do presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária”.
Dispondo no nº2:
“A aprovação a que se refere o número anterior é precedida de homologação de modelo, a efectuar pelo Instituto Português da Qualidade, nos termos do Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros".
O Regulamento do Controlo Metrológico dos Alcoolímetros consta da Portaria nº 1556/2007, de 10 de dezembro que logo no artigo 5º, preceitua:
“O controlo metrológico dos alcoolímetros é da competência do Instituto Português da Qualidade, I. P. - IPQ e compreende as seguintes operações:
a) Aprovação de modelo;
b) Primeira verificação;
c) Verificação periódica;
d) Verificação extraordinária Já o nº 3, do artigo 1º, do DL nº 291/90, de 20 de setembro, dispõe que:
3 - O controlo metrológico dos instrumentos de medição compreende uma ou mais das seguintes operações:
a) Aprovação de modelo;
b) Primeira verificação;
c) Verificação periódica;
d) Verificação extraordinária.

Sendo a aprovação do dito modelo, válida por 10 anos, salvo disposição em contrário – nº 3, do artigo 6º, da mesma Portaria.
O mesmo prazo de 10 anos corresponde ao que dispõe o artigo 2º, nº 2, do DL nº 291/90, de 20 de setembro, cujo regime enforma o teor da Portaria nº 1556/2007, de 10 de dezembro, afirmando-se no seu preâmbulo desta que “para os instrumentos de medição abrangidos pelo Decreto Lei nº 291/90 de 20 de setembro…verifica-se a necessidade de actualizar as regras a que o respetivo controlo metrológico deve obedecer com vista a acompanhar, tecnicamente, o que vem sendo indicado nas Recomendações da Organização Internacional de Metrologia Legal”.

No caso dos autos, resulta do talão de fls. 8 que o arguido foi sujeito a fiscalização com o alcoolímetro marca DRAGER, modelo ALCOTEST 7110 MKIII P, n.º ARMA-0047.
Tal aparelho (modelo n.º 211.06.07.3.06), foi aprovado pelo IPQ através do Despacho n.º 11037/2007, de 24 de abril e publicado no Diário da República, 2.ª Série, n.º 109, de 06.06.2007.
Deste despacho consta expressamente, em sintonia com a legislação sobre a matéria, que a validade desta aprovação de modelo é de 10 anos a contar da data de publicação no Diário da República.
Sabe-se ainda que a ANSR aprovou, pelo Despacho n.º 19684/2009, de 25.06, publicado no Diário da República 2.ª Série, n.º 166, de 27.09.2009, a utilização daquele aparelho - após a homologação levada a cabo pelo IPQ.
Deste despacho de autorização de uso não consta qualquer prazo nem, em nosso entender, deveria constar, pois que o dito prazo relevante é o prazo de validade de aprovação de modelo pelo IPQ – logo, 10 anos.
O que significa que o dito modelo de aparelho tinha como data de validade o dia 6.6.2017.
Deste modo, mostram-se dadas as respostas aos dois primeiros pontos suscitados pelo recorrente no seu recurso.
Neste sentido se pronunciou, de novo e recentemente, o ac. do TRE de 08-05-2018, proferido no processo nº 260/10.9GTABF.E2.

7. O exame de pesquisa de álcool no sangue com o aparelho em apreço, foi realizado em 1.11.2017, ou seja, já depois daquela data de 6.6.2017.
Entramos, pois, na análise da terceira questão, a de saber se a prova obtida com este exame é legalmente válida para fundamentar a condenação do recorrente.
Ora, o mesmo preceito que regula o prazo de validade de aprovação de modelo - o artigo 2º, nº 2, do DL nº 291/90, de 20 de setembro – dispõe também no seu nº 7 (mesmo artigo), que:
“Os instrumentos de medição em utilização cuja aprovação de modelo não seja renovada ou tenha sido revogada podem permanecer em utilização desde que satisfaçam as operações de verificação aplicáveis”.
No momento da realização do teste/exame com o aparelho em apreço, não era conhecido que a sua aprovação tivesse sido renovada.
Todavia, como consta dos autos, este aparelho foi verificado, em 1ª verificação, pelo IPQ, em 15 de setembro de 2016.
Dispõe o artigo 3º do DL nº 291/90, de 20 de setembro que:
“Primeira verificação
1 - Primeira verificação é o exame e o conjunto de operações destinados a constatar a conformidade da qualidade metrológica dos instrumentos de medição, novos ou reparados, com a dos respectivos modelos aprovados e com as disposições regulamentares aplicáveis, devendo ser requerida, para os instrumentos novos, pelo fabricante ou importador, e pelo utilizador, para os instrumentos reparados.
2 - A marca de primeira verificação será aposta no acto da operação por forma a garantir a inviolabilidade do instrumento”.
E dispõe o artigo 4.º, do mesmo diploma:
“Verificação periódica
1 - Verificação periódica é o conjunto de operações destinadas a constatar se os instrumentos de medição mantêm a qualidade metrológica dentro das tolerâncias admissíveis relativamente ao modelo respectivo, devendo ser requerida pelo utilizador do instrumento de medição.
2 - Os instrumentos de medição são dispensados de verificação periódica até 31 de Dezembro do ano seguinte ao da sua primeira verificação, salvo regulamentação específica em contrário. Sublinhado nosso.
3 - Nos instrumentos de medição cuja qualidade metrológica esteja dentro das tolerâncias admissíveis, relativamente ao respectivo modelo, será aposta, no acto da operação, a marca de verificação periódica.
4 - A marca referida no número anterior será aposta por forma a garantir a inviolabilidade do instrumento de medição.
5 - A verificação periódica é válida até 31 de Dezembro do ano seguinte ao da sua realização, salvo regulamentação específica em contrário”.
Numa interpretação racional e lógica, numa situação normal em que não esteja qualquer prazo de validade de aprovação do modelo em causa, esta 1ª verificação do aparelho teria como data de validade, o dia 31 de dezembro de 2017 – nº 2, do artigo 4º, supracitado.
A questão que se coloca é pois se, pese embora a aprovação deste modelo de aparelho cuja aprovação apenas era válida até 6.6.2017, poderia continuar a realizar exames de pesquisa de álcool no sangue - legalmente válidas -, da interpretação e conjugação do disposto no artigo 2º, nº 7, do DL nº 291/90, de 20 de setembro com a validade da sua verificação, até 31.12.2017.
Entende-se que a resposta é positiva, ou seja, esta medição é válida.
Com certeza que, findo o prazo de aprovação de um determinado modelo de aparelho de medição, a entidade responsável/competente, pelo seu uso (utilização), pode retirá-lo de imediato desse mesmo uso.
Não ocorrendo esta situação, como parece ser o caso - e não sendo essa retirada de utilização do aparelho, automática, segundo a melhor interpretação do nº 7, do artigo 2º, do DL nº 291/90, de 20 de setembro, supra reproduzido -, cumpre averiguar se o modelo de aparelho em causa e, concretamente, o aparelho que procedeu à medição, satisfaz as condições de verificação aplicáveis segundo a legislação em vigor. Porque o referido nº 7 do artigo 2º, do DL nº 291/90, de 20 de setembro assim dispõe:
“…pode permanecer em utilização desde que satisfaça as operações de verificação aplicáveis” Também o artigo 10º da portaria nº 1556/2007, de 10 de dezembro, preceitua o seguinte:
“Os alcoolímetros cujo modelo tenha sido objecto de autorização de uso, determinada ao abrigo da legislação anterior, poderão permanecer em utilização enquanto estiverem em bom estado de conservação e nos ensaios incorrerem em erros que não excedam os erros máximos admissíveis da verificação periódica”..
Prevendo a própria legislação que a aprovação de um modelo de aparelho por determinado período, no caso dez anos, pode ser renovada, significa que o que o legislador releva é, por um lado, a qualidade técnica do aparelho para proceder às medições pretendidas Do mesmo modo que prevê a sua revogação, antes do fim do prazo de validade de aprovação, desde que apresente defeitos de medição – v. nº 6, alínea b), do artigo 2º, do DL nº 291/90:
“6 - A aprovação de modelo é revogada em qualquer dos casos seguintes:
a) Não conformidade dos instrumentos de medição fabricados com o modelo aprovado, com as respectivas condições particulares de aprovação, ou com as disposições regulamentares aplicáveis;
b) Defeito de ordem geral dos instrumentos de medição que os torne impróprios para o fim a que se destinam”.
. e, por outro lado, outras eventuais circunstâncias, como seja a eventual disponibilidade do modelo no mercado para renovação ou não da sua aprovação, que pode, simplesmente, ser substituído por outro modelo, pois é sabido a evolução e qualidade/quantidade de aparelhos, sendo ainda preocupação do legislador a harmonização desta aprovação com as normas de mercado da União Europeia – v. preâmbulo do DL nº 291/90.
A relevância da qualidade técnica do aparelho para proceder às medições resulta ainda do teor do nº2, do artigo 1º, do DL nº 291/90, de 20 de setembro, quando afirma que “os métodos e instrumentos de medição obedecem à qualidade metrológica estabelecida nos respectivos regulamentos de controlo metrológico de harmonia com as directivas comunitárias…”.
O que significa que, atingido o prazo inicial de aprovação de 10 anos, o mesmo modelo pode ser renovado. Portanto, com o atingir do prazo, não significa que o modelo não esteja apto a continuar a proceder a medições técnicas de qualidade.
A interpretação que fazemos tem por base uma política legislativa de qualidade/eficiência/custos, pelo que não pode inutilizar-se, sem mais, um aparelho legalmente aprovado que, na data em que atinge o prazo de validade de aprovação, ainda mantém qualidade técnica para efetuar as pretendidas medições. Pressuposto é que essa qualidade técnica esteja reconhecida e válida segundo as verificações exigidas.

Dos preceitos citados, resulta clara a diferença entre prazo de validade de determinado modelo de aparelho e prazo perentório de não utilização desse aparelho. Que podem não coincidir. E no caso concreto não coincidem.
O modelo atingiu o prazo de validade por que foi aprovado. Significa que, a partir deste prazo, não podem ser introduzidos novos aparelhos, deste modelo, para uso, para medição, com sujeição à respetiva primeira verificação prevista no artigo 3º do DL nº 291/90.
Questão diferente, salvaguardada em termos legislativos, é a dos aparelhos aprovados, ainda a funcionar, segundo as verificações exigidas, no momento em que expira o dito prazo de aprovação do modelo. O que expira (expirou), é a aprovação do modelo em si, nos termos supra expostos. Não expira (expirou) a qualidade técnica para um aparelho aprovado, embora não renovada essa aprovação, poder continuar a ser usado, nos condicionalismos legalmente previstos.
Por todos estes considerandos, entende-se que o exame de pesquisa de álcool no sangue feito ao recorrente, constitui prova legal e válida.
No sentido do agora decidido, se pronunciou já o ac. do Tribunal da Relação de Guimarães de 5.3.2018, proferido no processo nº 122/17.9PFGMR.G1, onde se afirma:
“Por força do disposto no art. 2º, n.º 7, do DL n.º 291/90, de 20 de setembro, que aprovou o Regime Geral de Controlo Metrológico de Métodos e Instrumentos de Medição, nos quais se incluem os alcoolímetros, o esgotamento do prazo de validade de 10 anos da aprovação técnica de modelo, previsto no art. 6º, n.º 3, da Portaria n.º 1556/2007, de 10 de dezembro, sem que tenha havido lugar à sua renovação, não acarreta, por si só, que os alcoolímetros do modelo em causa deixem de poder ser utilizados nas operações de fiscalização, podendo continuar a sê-lo desde que satisfaçam as operações de verificação a que tenham de ser sujeitos, através das verificações periódicas e extraordinárias previstas nos arts. 4º e 5º do DL n.º 291/90 e no art. 5º da Portaria n.º 1556/2007, continuando dessa forma a garantir a fiabilidade metrológica”.
E mais recentemente, pronunciou-se o ac. deste Tribunal da Relação de Coimbra de 24.4.2018, proferido no processo nº 320/17.5GBPMS.C1, onde se afirma:
I – A conjugação das normas dos referidos n.ºs 1, 2 e 7 do artigo 2.º do DL n.º 291/90, de 20-09, conduz às seguintes conclusões:
- A aprovação do modelo de alcoolímetro permite que, no prazo da sua validade, o fabricante introduza no mercado respectivo o aparelho aprovado, desde que mantenha as suas características técnicas;
- Se, no decurso desse prazo, aquele «introduzir alteração ou substituição de componente ou por adjunção de dispositivo complementar, modificações que possam influenciar os resultados das medições ou as condições regulamentares de utilização» nos novos aparelhos, deve sujeitar o modelo a nova aprovação complementar (art. 2.º, n.º 5);
- Porque as especificações atinentes ao aparelho aprovado não podem ser alteradas sem prévia aprovação complementar, e caso esta não seja obtida, a aprovação é revogada se ocorrer desconformidade com o modelo aprovado [n.º 6, al. a)] ou se se revelar defeito que torne os aparelhos de medição impróprios para o fim a que se destinam [n.º 6, al. b)].
II – Ocorrendo renovação da aprovação do modelo, pode o fabricante ou importador introduzir no mercado respectivo, no decurso do novo prazo, aparelhos do mesmo modelo e com as mesmas especificações.
III – Caso contrário, ao fabricante ou importador do modelo fica vedada a introdução de novos aparelhos no mercado, sem prejuízo de os aparelhos referentes ao modelo aprovado – e anteriormente introduzidos no mercado – poderem permanecer em utilização «desde que satisfaçam as operações de verificação aplicáveis» (art. 2.º, n.º 7), quais sejam, as que resultam das verificações periódicas (art. 4.º) ou extraordinárias (art. 5.º).
IV – Tal entendimento é reforçado pela norma do artigo 10.º da Portaria n.º 1556/07, de 19/12, donde resulta que o exame de pesquisa de álcool no sangue será válido, desde que o alcoolímetro utilizado se encontre em bom estado de conservação e não tenha excedido os erros máximos admissíveis na verificação periódica (anual).
Jurisprudência perfilhada igualmente pelo ac. desta Relação de 6.6.2018, proferida no proc. nº 27/17.3PTFIG.C1, onde se decide:
IX – Independentemente de o aludido prazo de validade de aprovação de modelo se encontrar ultrapassado, ponto é que o concreto instrumento se encontre em condições metrológicas normais, certificadas por operação de verificação em vigor, sendo que em tal caso se deve considerar válida a prova através dele obtida, pois que a medição efectuada está conforme às exigências técnico-científicas que asseguram a fiabilidade do resultado através dela obtido.

8. Uma última observação, atento o teor da conclusão 14º, do recorrente, com o seguinte teor:
“O IPQ não segue a versão actualizada de 2012 da Recomendação OIML R 126, mas a versão revogada de 1998, em clara violação do disposto no art. 4º do RCMA, não tendo a verificação realizada validade para os efeitos “extensivos” pretendidos”.

Questão que o recorrente desenvolveu na motivação de recurso:

“A resposta às perguntas antecedentes pode ser encontrada no art. 4º do RCMA (Portaria 1556/2007): “Os alcoolímetros deverão cumprir os requisitos metrológicos e técnicos definidos pela Recomendação OIML R 126”. Ora, não reparou nem valorou o Tribunal a quo que o Certificado de Verificação junto – aliás, conforme alegado pela Defesa em alegações finais gravadas na plataforma Habilus, através do programa WMA–Windows Media Audio, com o nº 20171120112104_2747335_2870727, minutos 3:30 a 6:11 e 14:08 a 14:36 – demonstra e comprova que não foram feitos os ensaios técnicos legal e regulamentarmente (cfr. art. 4º RCMA) exigidos. É que, como se pode constatar no documento de fls. 25, os ensaios técnicos de verificação têm sido feitos tendo como “documento de referência” a versão de 1998 da Recomendação OIML R 126 Disponível em https://www.oiml.org/en/files/pdf_r/r126-e98.pdf., versão que está desactualizada e revogada desde Outubro de 2012 Nova versão em vigor, disponível em https://www.oiml.org/en/files/pdf_r/r126-e12.pdf.! É que, tendo nessa nova edição da Recomendação sido determinadas uma miríade de novos ensaios e testes técnicos obrigatórios (cfr. por comparação a Parte 2, pontos 10 e 11 da edição de 2012 e os anexos A a D da edição de 1998), e bem assim alterados os valores de referência dos erros máximos admissíveis (cfr. por comparação os pontos 5.1 da edição de 1998 e 5.2 da edição de 2012), e uma vez que esta vale por inteiro na nossa ordem jurídica sem indicação de edição – cfr. novamente o art. 4º RCMA –, fica claro que estamos perante uma violação de disposição regulamentar e de uma convenção internacional de que Portugal é parte (cfr. artigo VIII da Convenção OIML, a que Portugal aderiu pelo Decreto do Governo nº 34/84, publicado no Diário da República nº 159, I Série, em 11/07/1984).

A este propósito responde-se no parecer do Ministério Público junto deste tribunal, que se subscreve, quando sobre a questão diz:

“Sendo certo que o aparelho em causa teve a primeira verificação a 15/9/2016, com validade até 31/12/2017, nos termos do art.°4 do citado DL 291/90, como se refere no certificado, junto a fls.25, do qual consta ainda a sua conformidade com o disciplinado no art.°4° do Regulamento do Controle Metrológico dos Alcoolímetros, estabelecido pela Portaria 1556/2007 de 10/12, ou seja, no essencial, a Recomendação OIML R 126. Que se vê ser a de 1998 e não a actual, havendo a notar ainda que, contrariamente ao por si afirmado, desta, ou da assinatura da Convenção OIML, não deriva a vinculação do Estado Português ou à sua aplicação imediata na ordem jurídica portuguesa. Desde logo pelo que consta do prefácio da recomendação — Os Estados Membros da OIML devem implementar estas Recomendações o mais possível — mas também porque tal decorre da vinculação apenas moral constante do art.° VIII da Convenção OIML invocada — As decisões são imediatamente comunicadas aos Estados membros para informação, estudo e recomendação. Os Estados membros tomam o compromisso moral de aplicar estas decisões, em toda a medida possível. Ou seja, nada obriga a uma transposição/aplicação imediata da revisão da recomendação, nem a mesma vigora sem mais na nossa ordem jurídica, sendo, pois, válida a verificação efectuada, já que está de acordo com os dispositivos legais aplicáveis.

Por último, dir-se-á que o controle metrológico, aqui em questão, se reporta a analisadores quantitativos e não qualitativos, como decorre, em última análise, dos EMA, especificados no Regulamento do Controle Metrológico dos Alcoolímetros, mencionado pelo recorrente, que visam precisamente reduzir ao mínimo os erros nas medições, não se referindo pois a utilização, por si aludida e referente ao artigo 10º do aludido regulamento, aos segundos mas aos primeiros, sendo assim válida a prova”.

De onde é legítimo concluir que a análise/exame de pesquisa de álcool feita ao recorrente com o aparelho em causa, identificado nos autos, é válida, inexistindo assim qualquer vício, nomeadamente o da ilegalidade da prova em qua assenta a decisão de condenação do recorrente.

IV
Decisão
Por todo o exposto, decide-se negar provimento ao recurso do recorrente A..., mantendo-se a decisão recorrida.

Custas a cargo do recorrente com a taxa de justiça que se fixa em 4 (quatro) Ucs.

Coimbra, 27 de Junho de 2018

Luís Teixeira (relator)

Vasques Osório (adjunto)

Jorge Dias (presidente da secção)