Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
656/12.1T4AVR-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE MANUEL LOUREIRO
Descritores: SOCIEDADE
EXTINÇÃO
CRÉDITO LABORAL
PRESCRIÇÃO
Data do Acordão: 05/02/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DO BAIXO VOUGA - TRIBUNAL DO TRABALHO DE AVEIRO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTºS 146º/1 E 2,152º, 162º, 163º E 164º DO CSC; ARTºS 337º/1 DO CT/2009, 279º E 306º DO C. CIVIL.
Sumário: I – Dissolvida uma sociedade, esta entra em liquidação (artº 146º/1 CSC), mantendo ainda a sua personalidade jurídica (artº 146º/2 CSC).

II – Os seus administradores passam a ser liquidatários, salvo disposição estatutária ou deliberação noutro sentido (artº 151º/1 CSC), competindo-lhes, em tal veste, ultimar os negócios pendentes, cumprir as obrigações da sociedade, cobrar os créditos, reduzir a dinheiro o património residual e propor a partilha dos haveres sociais (artº 152º/3 CSC).

III – Com a proposta respectiva, submetem a deliberação da sociedade (artº 157º/4 CSC) um relatório completo da liquidação, acompanhando as contas finais (artº 157º/1 CSC).

IV – Aprovada a deliberação, será requerido o registo do encerramento da liquidação – e é com este registo que a sociedade se considera extinta, mesmo entre os sócios, sem prejuízo das acções pendentes ou do passivo ou activo supervenientes.

V – Apesar da extinção da sociedade, que perde a sua personalidade jurídica e judiciária, as relações jurídicas de que a mesma era titular não se extinguem, como resulta claramente do disposto nos artºs 162º, 163º e 164º do CSC.

VI – Uma citação feita a uma sociedade extinta, no âmbito de uma acção em que o autor pretende exercer determinados direitos de crédito que, a reconhecerem-se, têm por sujeito passivo os ex-sócios daquela sociedade, individualmente considerados, não pode ter a virtualidade de interromper o prazo de prescrição daqueles direitos que se encontre em curso relativamente a estes ex-sócios – artºs 337º/1 do CT/2009, 279º e 306º do C. Civil.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

I - Relatório

O aqui autor propôs contra A..., Ldª, em 24/2/2012, uma acção de processo comum pedindo que fosse declarado ilícito o seu despedimento e que a ré fosse condenada a pagar-lhe determinados créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua ilícita cessação – (...).
O contrato de trabalho entre o autor e a sociedade A..., Ldª, terminou em 31/5/2011.
A sociedade A..., Ldª, encontrava-se registava na Conservatória do Registo Comercial de Aveiro.
Em 6/7/2011, foi inscrita na Conservatória do Registo Comercial de Aveiro, a dissolução e o encerramento da liquidação da sociedade A..., Ldª.
C... foi gerente da A..., Ldª, desde a data da sua constituição até 4/8/2010, data em que renunciou à gerência.
B... foi gerente da A..., Ldª, desde 4/8/10 e até à data em que foi inscrita a dissolução e o encerramento da liquidação.
Por decisão de 22/5/2012, proferida no âmbito da acção (...), notificada às partes no dia 25/5/2012, transitada em 19/6/2012, a aí ré A..., Ldª, foi absolvida da instância com o fundamento de que à data da proposição dessa acção já estava registada a dissolução e o encerramento da liquidação dessa ré.
A presente acção foi proposta no dia 21/6/2012, a ré foi citada em 5/7/2012 e o réu foi-o em 23/7/2012.
Na contestação, o réu arguiu, em relação a si, a prescrição dos créditos invocados pelo autor, tendo em conta a data da cessação do contrato (Maio de 2011) e a da proposição desta acção (21 de Junho de 2012).
Na resposta, o autor pugnou pela improcedência da excepção de prescrição, invocando: a) o disposto no art. 289º do CPC e o facto de esta acção ter sido proposta no prazo de trinta dias fixado nessa norma; b) o disposto no art. 327º/3 do CC e o facto de a presente acção ter sido proposta no prazo de dois meses fixado nessa norma.
No despacho saneador, julgou-se improcedente a excepção de prescrição, com o fundamento de que, face ao estatuído no art. 289º/1/2 do CPC, aproveitavam ao aqui autor, em relação ao réu, os efeitos interruptivos e suspensivos da prescrição emergentes da citação da empregadora no âmbito da acção […], sendo que entre a data dessa citação e a da proposição desta acção não tinha ainda decorrido o prazo de prescrição dos direitos que o autor invoca na petição.
É dessa decisão que apelou o réu, pugnando no sentido de que “… deve o recurso ora ajuizado merecer total provimento, revogando-se a decisão recorrida, com a consequente absolvição do demandado do pedido, assim se fazendo sã JUSTIÇA.”.
Apresentou, para tanto, as seguintes conclusões:
[…]
O autor contra-alegou, pugnando pela integral manutenção do julgado.
Apresentou as seguintes conclusões:
[…]
Nesta Relação, a exmª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de que o recurso  não merece provimento.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir, uma vez que a tanto nada obsta.
*
II – Questões a resolver
Sendo pelas conclusões que se delimita o objecto do recurso, a única questão a resolver é a de saber se estão ou não prescritos os direitos a que o autor se arroga nesta acção.
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III – Fundamentação

A) De facto

Os factos provados são os que resultam do relatório supra.
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B) De direito

Dissolvida uma sociedade, esta entra em liquidação (art. 146º/1 CSC), mantendo ainda a sua personalidade jurídica (art. 146º/2 CSC). Os seus administradores passam a ser liquidatários, salvo disposição estatutária ou deliberação noutro sentido (art. 151º/1 CSC), competindo-lhes, em tal veste, ultimar os negócios pendentes, cumprir as obrigações da sociedade, cobrar os créditos, reduzir a dinheiro o património residual e propor a partilha dos haveres sociais (art. 152º/3 CSC). Com a proposta respectiva, submetem a deliberação da sociedade (art. 157º/4 CSC) um relatório completo da liquidação, acompanhando as contas finais (art. 157º/1). Aprovada a deliberação, será requerido o registo do encerramento da liquidação – e é com este registo que a sociedade e se considera extinta, mesmo entre os sócios, sem prejuízo das acções pendentes ou do passivo ou activo supervenientes – Pinto Furtado, Curso de Direito das Sociedades, 3ª ed., pág. 546.
Importa, agora, apurar o regime jurídico referente à titularidade das relações jurídicas creditícias de que era sujeito passivo uma sociedade que venha a considerar-se extinta pelo registo do encerramento da liquidação (art. 160º/2 do CSC).
Apesar da extinção da sociedade, que perde a sua personalidade jurídica e judiciária, as relações jurídicas de que a mesma era titular não se extinguem, como resulta claramente do disposto nos arts. 162º, 163º e 164º do CSC.
Esses artigos do CSC regulam questões derivadas da subsistência de relações jurídicas, após a extinção da sociedade.
No primeiro, define-se o destino das acções em que anteriormente à extinção a sociedade era parte; no segundo, soluciona-se a questão do passivo superveniente ou débitos sociais não satisfeitos depois da partilha entre os sócios; e no terceiro, estabelece-se que os bens que não tiverem sido partilhados pertencem aos sócios, regulamentando a respectiva partilha adicional.
A propósito do estabelecido nos citados artigos 163º e 164º, refere Raul Ventura que, «expressamente estabelecida na lei a responsabilidade dos sócios, em certa medida, pelas dívidas sociais e a titularidade dos sócios nos bens sociais, uns e outros não incluídos na liquidação, ficam afastadas as teorias que, por qualquer processo técnico-jurídico, concluam ou pela cessação de qualquer titularidade ou que atribuam esta à sociedade. Há apenas que explicar como e porquê esses débitos, bens, créditos que tinham como sujeito a sociedade passam a ser encabeçados nos sócios.
O como não pode deixar de ser uma sucessão; só assim não seria se admitíssemos que, antes de extinta a sociedade, tais activo e passivo já pertenciam aos sócios, ou seja, se desprezássemos a personalidade jurídica da sociedade. Como tal não podemos fazer, temos de aceitar este corolário.
O porquê é, em primeiro lugar, intuitivo; desaparecida a sociedade-sujeito, e mantidos vivos os direitos da sociedade ou contra esta, só os sócios podem ser os novos titulares desse activo e passivo. A explicação jurídica dessa intuição reside na extensão do direito de cada sócio relativamente ao património ex-social. Os sócios têm direito ao saldo da liquidação, distribuído pela partilha. Se tiverem recebido mais do que era seu direito, porque há débitos sociais insatisfeitos, terão de os satisfazer; se tiverem recebido menos, porque não foram partilhados bens sociais, terão direito a estes» - Dissolução e Liquidação de Sociedades, pág. 480.

Por conseguinte, naqueles preceitos do CSC, a questão do passivo e do activo superveniente foi solucionada no sentido de a responsabilidade e a titularidade passarem, em determinados termos, para os sócios por sucessão.
Na situação em apreço, caso fossem reconhecidos os direitos de crédito a que o autor se arroga, estaremos perante uma situação de passivo superveniente ou de débitos sociais insatisfeitos depois da partilha entre os sócios, à qual é aplicável o artigo 163º CSC, no qual se estabelece que, encerrada a liquidação e extinta a sociedade, os antigos sócios respondem pelo passivo social não satisfeito ou acautelado, até ao montante que receberam na partilha (nº 1), podendo as acções necessárias para o efeito ser propostas contra a generalidade dos sócios, na pessoa dos liquidatários, que são considerados representantes legais daqueles (nº 2).

Esse art. 163º veio a consagrar expressamente a responsabilidade dos sócios, embora limitada ao que receberam na partilha, pela via da sucessão – os créditos que tinham como sujeito a sociedade passam a ser encabeçados nos sócios –, como defende Raul Ventura (Dissolução e Liquidação das Sociedades, Comentário ao Código das Sociedades Comerciais, 1999, pág. 486).
Flui claramente que quanto vem de referir-se que o problema do passivo superveniente foi resolvido no sentido de a responsabilidade passar, em certos termos, para os sócios; assim, dissolvida e liquidada a sociedade, esta considera-se substituída pela generalidade dos sócios, sendo estes que têm de ser demandados com vista a efectivar a sua responsabilidade pelos débitos sociais dentro dos limites consignados no nº 1 do artigo 163º - trata-se, pois, de uma responsabilidade própria dos ex-sócios.
Uma vez que a sociedade devedora dos créditos reclamados pelo autor estava extinta antes da data em que o autor instaurou uma acção para cobrança dos mesmos, deveria ele ter optado, no entender de Raul Ventura (Dissolução e Liquidação das Sociedades, Comentário ao Código das Sociedades Comerciais, 1999, pág. 486), por uma de duas alternativas: a) propositura de acção contra os sócios responsáveis na medida em que o fossem (nº1 do art. 163º); b) propositura da acção contra a “generalidade dos sócios”, na pessoa dos liquidatários (nº2 do art. 163º).
Sucede que na situação em apreço a primeira acção (...) pela qual o autor pretendeu exercer os direitos que igualmente pretende exercer na presente foi instaurada contra a sociedade considerada empregadora, numa altura em que a mesma se estava já extinta, tendo a citação dessa sociedade ocorrido após tal extinção, com a consequente falta de citação (art. 195º/1/d CPC) e a nulidade de todo o processado subsequente à petição da mencionada acção (art. 194º/d do CPC), tudo se passando, pois, como se a mesma não tivesse ocorrido.
Assim, do nosso ponto de vista, uma citação nula, feita a uma sociedade extinta, no âmbito de uma acção em que o autor pretende exercer determinados direitos de crédito que, a reconhecerem-se, têm por sujeito passivo os ex-sócios daquela sociedade, individualmente considerados, não pode ter a virtualidade de interromper o prazo de prescrição daqueles direitos que se encontre em curso relativamente a estes ex-sócios.
Com efeito, quem foi citado não é o titular passivo dos créditos e, por outro lado, este titular não foi citado.
Reportando-nos à situação concreta em apreço, temos que o contrato de trabalho celebrado entre o autor e a sociedade A..., Ldª, cessou em 31/5/2011, data em que a referida sociedade ainda não estava extinta.
Nos termos do art. 337º/1 do CT/09, “O crédito de empregador ou de trabalhador emergente de contrato de trabalho, da sua violação ou cessação prescreve decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.”.
O prazo de prescrição dos créditos emergentes desse contrato iniciou-se em 1/6/2011 e completar-se-ia em 1/6/2012 - artigos 279º/c e 306º do CC.
Extinta a referida sociedade em 6/7/2011, os direitos de crédito a que o autor se arroga, a existirem efectivamente, transitaram para os ex-sócios da sociedade, não estando aqui em questão qualquer situação de responsabilidade solidária, seja porque não está legalmente determinada (art. 513º do CC), seja porque cada ex-sócio responde, apenas, até ao montante do que recebeu em partilha.
Não resulta dos factos provados que o aqui apelante, um dos ex-sócios da sociedade, tenha sido citado ou notificado, antes de 1/6/2012, nos termos e para efeitos do art. 323º/1/4 do CC, tendo a presente acção sido proposta em 21/6/2012, já depois de esgotado o aludido prazo prescricional.
É certo que ocorreu, no decurso do prazo prescricional em questão, a citação da sociedade de que o apelante era sócio.
Porém, como já se deixou sustentado, essa citação não produziu qualquer efeito interruptivo da prescrição em relação ao apelante.
Por outro lado, ao contrário do sustentado pelo apelado, não tem aplicação o estatuído no art. 327º do CC, pois que os diferentes números desse normativo só têm aplicação se tiver efectivamente ocorrido uma interrupção da prescrição (“Se a interrupção resultar de …” – nº 1), o que no caso dos autos não ocorreu, seja em relação à empregadora citada, que já não era titular passivo dos direitos a que o autor se arroga, seja em relação ao apelante, que nunca foi citado ou equivalentemente notificado.
Invoca o apelado a seu benefício o estatuído nos números 1 e 2 do art. 289º do CPC, respectivamente, segundo os quais: a) a absolvição da instância não obsta a que se proponha outra acção sobre o mesmo objecto; b) sem prejuízo do disposto na lei civil relativamente à prescrição e à caducidade dos direitos, os efeitos civis derivados da propositura da primeira causa e da citação do réu mantêm-se, quando seja possível, se a nova acção for intentada ou o réu for citado para ela dentro de 30 dias, a contar do trânsito em julgado da sentença de absolvição da instância.
Sustenta o autor que os efeitos civis a que se reporta o nº 2 do artº 289º do CPC abarcam todos e quaisquer efeitos, incluindo os referentes à prescrição e caducidade: assim, tendo ocorrido em 19/6/2012 o trânsito em julgado da decisão de absolvição da instância na primeira acção intentada contra a sociedade empregadora, terminando em 19/7/2012 o prazo de trinta dias fixado pelo art. 289º/2 do CPC, tendo a presente acção sido intentada em 21/6/2012, com citação presuntiva dos réus em 26/6/2012 (art. 323º/2 do CC), então manter-se-iam os efeitos interruptivos e suspensivos da prescrição resultantes da citação da empregadora para a primeira acção, dos quais resultaria que a prescrição apenas se completava em 1-3-2013, aproveitando tais efeitos ao autor e deles resultando que os créditos dele a que se arroga nesta acção não teriam prescrito em relação a qualquer dos réus.
Se bem se percebe, foi também nesse sentido que se encaminhou a decisão recorrida.
Não concordamos.
Em primeiro lugar porque, como já dito, a citação feita relativamente a uma sociedade já extinta não pode produzir, relativamente a ela e a todos aqueles que, como o aqui apelante, não tiveram participação no acto de citação,
Em segundo lugar porque realmente o art. 289º do CPC não se aplica em matérias referentes à prescrição e caducidade.
Efectivamente, se fosse desiderato do legislador a consagração da regra de que os efeitos civis derivados para a prescrição e para a caducidade da proposição da primeira causa e da citação se mantinham, caso a nova acção fosse intentada ou o réu para ela fosse citado dentro de trinta dias contados do trânsito em julgado da sentença de absolvição da instância, certamente que não teria antecedido a redacção do art. 289º/2 do CPC da asserção «Sem prejuízo do disposto na lei civil relativamente à prescrição e à caducidade…».
Se o fez, foi para deixar vincado que a matéria atinente à prescrição e à caducidade dos direitos era regida pela lei civil, aí se incluindo os efeitos que delas decorrem.

A par deste argumento literal e no mesmo sentido, pode invocar-se um argumento histórico.
No CPC de 1939, prescrevia o corpo do artº 294º do CPC que “A absolvição da instância em caso algum obstará a que se proponha outra acção sobre o mesmo objecto.
Os efeitos civis derivados da proposição da primeira causa e da citação do réu manter-se-ão, quando seja possível, se a nova acção for intentada ou o réu for citado para ela dentro de trinta dias, a contar do trânsito em julgado da sentença de absolvição da instância.
”.
No CPC de 1961, os números 1 e 2 do art. 289º mantiveram prescrições idênticas às dos primeiro e segundo parágrafos do artº 294º do Código de 1939, com ligeiríssimas alterações de redacção, já que aí se dispôs:
1. A absolvição da instância em caso algum obsta a que se proponha outra acção sobre o mesmo objecto.
2. Os efeitos civis derivados da proposição da primeira causa e da citação do réu mantêm-se, quando seja possível, se a nova acção for intentada ou o réu for citado para ela dentro de trinta dias, a contar do trânsito em julgado da sentença de absolvição da instância.”.
A aposição da proposição «Sem prejuízo do disposto na lei civil relativamente à prescrição e à caducidade dos direitos…» só ocorreu com a reforma de 1967, após a vigência do Código Civil aprovado pelo DL 47.344, de 25/11/1966, podendo ler-se na «observação» do Projecto, após a primeira revisão ministerial (Boletim do Ministério da Justiça, nº 122, pág. 92) que “…são aceitáveis as pequenas alterações de texto sugeridas pela Comissão…”, sendo que, como decorre do relatório preambular do DL 47.690, de 11/5/1967, as modificações introduzidas no diploma adjectivo civil tiveram “…como fim quase exclusivo consagrar as inovações e as alterações exigidas pela entrada em vigor da nossa lei civil, por não se julgar necessário e oportuno levar mais longe, neste momento, a revisão do direito adjectivo…”.
Como escrevem Pires de Lima e Antunes Varela, ao “…lado da interrupção admite-se, nos casos enumerados no n.º 1, um prolongamento dos efeitos da interrupção até ao julgamento da causa; só neste momento é que começa a contar-se o novo prazo.
Exceptuam-se, porém, no n.º 2, quatro casos: o de o autor desistir da instância, o de o réu ser absolvido da instância, o de a instância ficar deserta e o de o compromisso arbitral ficar sem efeito. Nestes casos, o novo prazo de prescrição começará a contar-se desde a interrupção, nos termos do artigo anterior.
Modificou-se, assim, o regime que era consagrado nos artigos 289.º, n.º 2, e 285.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, antes das alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 47 690.” - Código Civil Anotado, 2ª edição, volume I, pág. 272.
Também Anselmo de Castro  refere que para “…os efeitos civis da prescrição e caducidade passaram a reger os arts. 327.º e 332.º do Cód. Civ. – art. 327.º, n.º 3…”, considerando, imediatamente antes, que os “…efeitos civis a que se reporta esta disposição são a cessação da boa fé do possuidor (art.º 481.º a)), a constituição do devedor em mora quando a obrigação não dependa de prazo certo (art. 805.º, n.º 2 do Cód. Civ.) e a inibição do réu de propor contra o autor a acção destinada à apreciação da mesma questão jur[í]dica – Código Proc. Civ. Art. 481.º, c)…”.
Face aos argumentos e ensinamentos acabados de explanar, facilmente se conclui que não acolhemos a interpretação sustentada pelo apelado e na decisão recorrida, da qual resulta que o nº 2 do artº 289º do CPC implica, na prática, uma derrogação do preceituado no art. 327º/2 do CC, ou, ao menos, uma regência da forma como começaria a contar o novo prazo prescricional, em moldes diversos daqueles que a lei substantiva determinou.
De tudo resulta, pois, a nosso ver, que o art. 289º/2 do CPC não se aplica às situações como a dos autos, devendo a matéria da prescrição e das suas interrupções e/ou suspensões ser regida, exclusivamente, pelo disposto na lei substantiva.
Assim sendo, como deflui do exposto, não ocorreu em relação ao apelante, até 1/6/2012, qualquer causa interruptiva e/ou suspensiva da prescrição pois: a citação no âmbito da primeira acção da sociedade extinta não produziu em relação ao apelante quaisquer efeitos interruptivos da prescrição; a presente acção foi intentada em 21/6/2012, com citação presuntiva dos réus em 26/6/2012 (art. 323º/2 do CC), já depois de esgotado, em 1/6/2012, o prazo prescricional dos direitos de crédito a que o autor se arroga.
Procede, pois, o recurso.
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IV – Decisão

Acordam os juízes que compõem esta secção social do Tribunal da Relação de Coimbra no sentido de julgar a apelação procedente, revogando-se a decisão recorrida e declarando-se prescritos, em relação ao apelante, os créditos que o autor pretende ver reconhecidos através desta acção.
Custas pelo autor


 (Jorge Manuel Loureiro - Relator)
 (Ramalho Pinto)
 (Azevedo Mendes)