Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | LUÍS COIMBRA | ||
Descritores: | DECISÃO INTERLOCUTÓRIA RECURSO SUBIDA DO RECURSO INUTILIDADE ABSOLUTA | ||
Data do Acordão: | 06/05/2013 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | TRIBUNAL DE INSTRUÇÃO CRIMINAL DE COIMBRA | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | RECURSO CRIMINAL | ||
Decisão: | INDEFERIDA A RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA | ||
Legislação Nacional: | ARTIGO 407.º, N.º 1, DO CPP | ||
Sumário: | I - A inutilidade a que se reporta o n.º 1 do artigo 407.º do CPP só é absoluta quando a retenção do recurso tiver como resultado a completa inconsequência do seu futuro resultado, isto é, quando mesmo a proceder o recurso, o recorrente já disso não pode retirar qualquer proveito. II - Não é o que sucede, todavia, no caso da invalidação, na decisão que puser termo à causa, de todas as declarações para memória futura, prestadas no decurso do inquérito, impugnadas pelo arguido, porquanto a única consequência daí decorrente é a impossibilidade de tais declarações servirem como meio de prova. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na 5ª Secção (Criminal), do Tribunal da Relação de Coimbra
I – RELATÓRIO 1. Nos autos Inquérito com o nº 823/12.8JACBR, a correr termos na 2ª Secção do Departamento de Investigação e Acção Penal de Coimbra, veio o arguido A..., em 14/01/2013, interpor recurso do despacho proferido pela Exmª JIC em 21/12/2012 que indeferiu a arguição de nulidade das declarações para memória futura tomadas à menor, sua mãe e ao companheiro desta, despacho esse certificado a fls. 114 e 115, cujo teor é o seguinte: “Fls. 133: A data das declarações para memória futura foi antecipada para o dia 22.11.2012, pelas 11H30, face á urgência manifestada pelo facto da testemunha ir emigrar para o estrangeiro no dia 27.11.2012. A antecipação da data foi requerida pelo M.P. a fls. 113 e a 20.11.2012. Foi apenas possível a marcação do dia 22.11.,pelas 11h30. Assim, face a tamanha urgência e á proximidade da data designada, o Tribunal socorreu-se do M.P. para efectuar as diligências necessárias de notificação. O M.P. di1igenciou nesse sentido, com a ajuda da PJ. Ora, face á situação de urgência verificada, ao disposto no artigo 112°, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Penal e ao teor de fls. 120 144, 145, 147 a 149 e 152 a 156, entende-se que nenhuma nulidade foi cometida, tendo sido respeitados os formalismos da referida norma legal. No que respeita ao local da diligência, sabia a Ilustre mandatária onde a mesma iria ter lugar, tanto mais que o seu escritório recebeu um telefonema do Tribunal de Instrução Criminal de Coimbra. Por outro lado, se disse que iria tentar falar com a Dra. B... saberia que a diligência seria no Tribunal de Instrução Criminal de Coimbra, por ser ela a Juiz desse tribunal. Entende-se que são desnecessárias mais considerações, dando-se aqui por reproduzido o teor das fls. supra mencionadas, reafirmando-se que nenhuma nulidade foi cometida, pelo que vai indeferido a requerido a fia. 133 e seguintes e 167 e seguintes. * Notifique, com o envio de cópias que se deram por reproduzidas (120 144, 145, 147 a 149 e 152 a 156).“
2. Em tal requerimento de interposição do recurso (e conforme decorre de fls. 2 destes autos), solicitou o arguido que o mesmo subisse “nos próprios autos com a decisão que ponha termo à causa e com efeito meramente devolutivo – cfr. Artigo 399º, 401, 1, al. b), 411º, nº 1, 406º, 1, 407º, nº 3 e 408º, a contrario sensu, todos do Código Penal)”.
3. Admitido o recurso, por despacho judicial proferido em 05/02/2013, “a subir imediatamente, em separado, sem efeito suspensivo” (cfr. fls. 129 destes autos de recurso) e efectuadas as legais notificações, apresentou resposta o Ministério Público no sentido de ser negado provimento ao recurso.
4. A Exmª Juíza limitou-se a mandar subir os autos a esta Relação (cfr. despacho de fls. 201 destes autos).
5. Nesta instância, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta, emitiu parecer no sentido de que o recurso deve ser declarado improcedente (cfr. fls. 207 e 208).
6. Foi cumprido o disposto no art. 417 n.º2 do CPP, não tendo havido resposta.
7. Aquando do exame preliminar, o aqui relator, por considerar verificada uma questão prévia relacionada com o momento de subida do recurso, nos termos do artigo 417º nº 6 al. a) do Código de Processo Penal, a fls. 213 a 220, proferiu decisão sumária que culminou com o seguinte: “DISPOSITIVO: Face ao exposto, altero o regime de subida do recurso, determinando que o mesmo suba, diferidamente, nos próprios autos, com o recurso que vier a ser interposto da decisão que ponha termo à causa. Sem tributação. Notifique. Oportunamente, baixem os autos à 1.ª instância.” * 8. Não se conformando com a assim decidida alteração do regime de subida do recurso, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta, nos termos do artigo 417º nº 8 do Código de Processo Penal, apresentou reclamação para a conferência, pelos fundamentos constantes de fls. 224 e 225 que se passam a transcrever: «Nos termos do artigo 414.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, a decisão sobre o regime de subida do recurso não vincula o tribunal superior, pelo que pode este Tribunal da Relação de Coimbra alterar o momento de subida do mesmo e é precisamente isso que irá ser feito, nos termos do artigo 417.º, n.º 6, al. a), do CPP, por se verificar, por isso, circunstância que obsta ao conhecimento, nesta ocasião, do mérito do recurso. O recurso em causa insurge-se contra uma decisão, proferida em inquérito, que se limitou a indeferiu a arguição de nulidade das declarações para memória futura ali realizadas. O despacho de admissão de recurso não faz alusão a qualquer normativo legal, para justificar a subida imediata, em separado e sem efeito suspensivo. Vejamos, o que a este respeito nos dizem os artigos 406º e 407º do Código de Processo Penal. No artigo 406.º, do CPP, pode ser lido o seguinte: “1. Sobem nos próprios autos os recursos interpostos de decisões que ponham termo à causa e os que com aqueles deverem subir. 2. Sobem em separado os recursos não referidos no número anterior que deverem subir imediatamente.” Por sua vez, no artigo 407.º, do CPP, consagra-se o seguinte: “1. Sobem imediatamente os recursos cuja retenção os tornaria absolutamente inúteis. 2. Também sobem imediatamente os recursos interpostos: a) De decisões que ponham termo à causa; b) De decisões posteriores às referidas na alínea anterior; c) De decisões que apliquem ou mantenham medidas de coacção ou de garantia patrimonial, nos termos deste Código; d) De decisões que condenem no pagamento de quaisquer importâncias, nos termos deste Código; e) De despacho em que o juiz não reconhecer impedimento contra si deduzido; f) De despacho que recusar ao Ministério Público legitimidade para a prossecução do processo; g) De despacho que não admitir a constituição de assistente ou a intervenção de parte civil; h) De despacho que indeferir o requerimento para a abertura de instrução; i) Da decisão instrutória, sem prejuízo do disposto no artigo 310.º; j) De despacho que indeferir requerimento de submissão de arguido suspeito de anomalia mental à perícia respectiva. 3. Quando não deverem subir imediatamente, os recursos sobem e são instruídos e julgados conjuntamente com o recurso interposto da decisão que tiver posto termo à causa.”
No que tange ao momento da subida de um recurso, podemos afirmar que a regra geral é a da subida diferida, excepção feita aos recursos abrangidos pela cláusula aberta do n.º 1, do acima citado artigo 407.º, ou elencados no seu n.º 2. Não há dúvidas que o despacho recorrido não se encontra previsto em nenhuma das diferentes alíneas do artigo 407.º, n.º 2, do Código de Processo Penal. Quanto muito, e para justificar a subida imediata do recurso, poderia ser enquadrado no nº 1, da aludida norma legal. Mas poderá tal ser entendido, no caso em apreço? Acontece que a expressão “absolutamente inúteis” tem um alcance muito restrito. Na realidade, a inutilidade tem que ser absoluta, sendo certo que esta não tem nada que ver com o risco de virem a ser anulados determinados actos, designadamente o julgamento, caso a final venha a ser julgado procedente o recurso. Em bom rigor, a inutilidade só é absoluta quando a retenção do recurso tiver como resultado a completa inconsequência do futuro resultado do mesmo, ou seja, quando, mesmo a proceder o recurso, o recorrente já disso não puder retirar qualquer proveito. Dito de outra forma, se a apreciação diferida do recurso e a sua eventual procedência ditar que o efeito pretendido ou o direito que o recorrente pretende ver acautelado irá determinar a anulação de actos processuais, a retenção do recurso torna-o inconveniente em termos de celeridade e economia processual, mas não lhe retira a utilidade em absoluto já que a anulação de actos processuais é uma das consequências normais do recurso. Ora, é esse o caso dos autos. Como se refere no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 964/96, “a subida imediata poderia dar-lhe maior utilidade, mas não é essa a hipótese contemplada no art. 407 n.º2 do Código Processo Penal (leia-se, hoje, n.º 1), onde se estatui com clareza que a subida imediata tem em vista evitar que a retenção torne o recurso absolutamente inútil. O que o legislador pretende evitar é que o diferimento da subida inutilize por completo as potencialidades da impugnação. Não que essa subida diferida lhe retire alguma possível acutilância.” É entendimento corrente que só a inutilidade absoluta, que não a relativa, releva para efeitos de subida imediata dos recursos. Como explicita Lebre de Freitas, “Código de Processo Civil Anotado”, Volume III, pág. 155, “a jurisprudência tem interpretado de forma exigente o requisito da absoluta inutilidade, considerando que a eventual retenção deverá ter um resultado irreversível quanto ao recurso, não se bastando uma mera inutilização de actos processuais, ainda que contrária ao princípio da economia processual”. É certo que podem ocorrer diversos cenários que originem a que o presente recurso não chegue a subir. Estamos a pensar na hipótese de decisão final, condenatória ou absolutória, com que os sujeitos processuais se conformem. Ou mesmo numa situação de não pronúncia com que o Ministério Público se conforme. A opção do legislador foi, sem dúvida, a de aguardar pela decisão final para, então, se apreciarem todas as questões, até porque muitas delas poderão perder interesse face ao teor dessa decisão final. Não se esqueça que o recorrente, nos termos do artigo 412.º, n.º 5, do CPP, tem que indicar quais os que mantêm interesse… Ora, a utilidade do recurso mantém-se na íntegra, se conhecida em simultâneo com o recurso da sentença, na medida em que, nessa altura, se o recurso interlocutório for conhecido e provido, consuma-se, em absoluto, todo o seu efeito. No sentido do entendimento aqui expresso, vejam-se, entre outros, os Acórdãos do TRE, de 30/5/2006, processo 705/06-1, e de 6/4/2006, processo 388/06-1, www.dgsi.pt/tre, e, ainda, do TRP, de 21/9/2005, processo 6143/04, C.J. 2005, Tomo 4, e do TRL, de 24/11/2005, processo 5594/05-9, C.J., 2005, Tomo 5, e, ainda, a Decisão proferida pelo Exmo. Senhor Desembargador António Piçarra, ilustre Presidente do Tribunal da Relação de Coimbra, em 22/1/2008, Reclamação n.º 33/05.0JBLSB-B, www.dgsi.pt/trc. Conclui-se, pois, pela subida diferida do recurso, tal como, aliás, e bem, havia sido requerido pelo recorrente. Os recursos com subida diferida sobem e são instruídos e julgados conjuntamente com o recurso interposto da decisão que tiver posto termo à causa (n.º 3 do art. 407.º do CPP). Em consonância com o disposto pelo artigo 414.º, n.º 3, do CPP, e como supra dissemos, a decisão que determina o momento de subida do recurso não vincula este tribunal superior. *
[1] 1 Anotação ao art° 271° do CPP, pag 681 — Anotações ao CPP dos Magistrados do MP do DJP — Coimbra Editora 2009 - |