Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
9352/18.5T8CBR.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: PAULA MARIA ROBERTO
Descritores: TRABALHO POR TURNOS
REGIME DE TURNO
ROTAÇÃO SEMANAL OU INFERIOR
SUBSÍDIO DE TURNO
Data do Acordão: 03/24/2023
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DO TRABALHO DE COIMBRA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA
Texto Integral: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 13.º E 59.º, N.º 1, AL.ª A), DA CONSTITUIÇÃO, DESPACHO NORMATIVO N.º 182/77, DE 28/12, E CLÁUSULA 57.ª DA CTT CELEBRADA ENTRE A AIMMAP E O SINTEL
Sumário: I – O Despacho Normativo n.º 182/77 é um elemento determinante na interpretação da cláusula 57.ª da CTT celebrada entre a AIMMAP e o SINTEL, posto que, foi emitido precisamente com o objetivo de fixar doutrinalmente um conceito inequívoco para o instituto do subsídio de turno, consagrado em vários instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, convencionais e administrativos, que têm dado lugar a interpretações desencontradas, nos seguintes termos:

Apenas têm direito ao subsídio de turno, no montante constante da norma que o consagre, os trabalhadores que prestem serviço nas seguintes circunstâncias, cumulativamente:

a) Em regime de turnos rotativos (de rotação contínua ou descontínua);

b) Com um número de variantes de horário de trabalho semanal igual ou superior ao número de turnos a que se refere o subsídio de turno considerado;

II – Os Autores que não trabalham em turnos de rotação semanal ou inferior não têm direito ao subsídio de turno previsto na cláusula 57.ª da CCT celebrada entre a AIMMAP e o SINDEL, sendo o escopo visado por esta cláusula o de compensar a penosidade do trabalho por turnos com uma componente noturna.


(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Integral: Apelação n.º 9352/18.5T8CBR.C1

_________________________________

Acordam[1] na Secção Social (6ª Secção) do Tribunal da Relação de Coimbra:

I – Relatório

AA, residente em ...

BB, residente em ...

CC, residente em ...

DD, residente em ...

EE, residente em ...

FF, residente em ...

GG, residente em ..., ...

HH, residente na ...

II, residente em ..., ...

JJ, residente em ...

KK, residente em ..., ...

LL, residente em ..., ...

MM, residente em ...

NN, residente em ..., ...

OO, residente em ..., ...

PP, residente na ...

QQ, residente em ...

RR, residente em ...

SS, residente em ..., ...

TT, residente em ..., ...

UU, residente em ..., ...

VV, residente em ..., WW

XX, residente em ..., ..., ...

YY, residente em ..., ... e

ZZ, residente em ..., ..., ...

  intentaram a presente ação declarativa de processo comum contra

  A..., S.A., com sede em ...

alegando, em síntese, que são trabalhadores da Ré e trabalham em regime de turnos rotativos; não são sindicalizados mas a AIMMAP é subscritora do CCT celebrado com o SINDEL, alterado em 2017 e objeto de PE, sendo por isso aplicável à Ré e seus trabalhadores; a prestação de trabalho em regime de turno confere ao trabalhador o direito a um complemento de retribuição nos termos do n.º 4 da cláusula 57.ª do CCT, não distinguindo entre diversas “variações de horário de trabalho” em que a rotação ocorra, sendo o fundamento da sua atribuição  a penosidade inerente à variabilidade do horário de trabalho a cumprir, superior à normal (horário fixo), podendo a rotatividade ser diária, semanal ou mensal; a citada cláusula 57.ª do CCT impõe o pagamento do complemento de retribuição aí previsto a todos os trabalhadores sujeitos a variações do seu horário de trabalho em turnos de rotação contínua ou descontínua, semanal, quinzenal ou mesmo mensal, tal como é o caso dos AA.

Terminam, pedindo que:

“Nestes termos e nos mais de Direito, deverá ser declarado por Vª Exª o reconhecimento do direito dos AA., ao pagamento pela Ré do complemento de retribuição no montante de 15% da retribuição base efetiva no caso de trabalho em regime de dois turnos, de que apenas um seja total ou parcialmente noturno; e/ou de 25% da retribuição de base efectiva no caso de trabalho em regime de três turnos, ou de dois turnos total ou parcialmente noturnos.”

                                                             *

Teve lugar a audiência de partes e na qual não foi obtido acordo.  

                                                             *         

A devidamente notificada para contestar, veio fazê-lo alegando, em síntese que:

A Ré não configura um verdadeiro sistema de trabalho por turnos porque não se verifica o requisito de que os trabalhadores ocupam sucessivamente os mesmos postos de trabalho nem o de que a rotação deve ser em períodos de dias ou semanas; o pagamento do subsídio de turno não e devido quando os trabalhadores não trocam de horários, ou não rodam pelos vários turnos de forma regular; nos termos do n.º 6 da cláusula 57.ª do CTT, o subsidio deixa de ser devido quando deixar de se verificar a prestação de trabalho em regime de turnos, ou seja, quando o trabalhador não estiver sujeito a variações de horário de trabalho.

Termina, dizendo que:

Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exa. doutamente suprirá:

a) Deverá a presente ação judicial ser julgada improcedente, por não provada, absolvendo-se a Ré integralmente do pedido, seja por faltar fundamento de facto, ou de Direito à pretensão dos Autores, seja por subsidiariamente procederem as exceções deduzidas pela Ré;

b) Nos termos e ao abrigo do disposto nos artigos 293.º, 296.º, 297.º, 300.º, n.º 2 e 305.º do CPC, deverá ser aceite, julgado provado e procedente o incidente de verificação do valor da causa deduzido pela Ré, por esta não aceitar e antes impugnar expressamente o valor indicado pelos Autores na Petição Inicial, oferecendo, em sua substituição, o valor global de € 750.000,25 (setecentos e cinquenta mil euros e vinte e cinco cêntimos), que corresponde a € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo) por cada um dos Autores coligados;

c) Deverá a presente Reconvenção ser julgada provada e procedente e, em consequência, serem os Autores condenados a reconhecer perante a Ré que:

i. Não existe qualquer direito dos Autores ao recebimento do subsídio de turno e que,

ii. Os Autores têm apenas direito a receber da Ré o valor percentual correspondente ao trabalho noturno efetivamente prestado, se e quando verificadas as circunstâncias de que a lei ou o potencial instrumento de regulamentação coletiva de trabalho aplicável fazem depender a existência do direito ao seu recebimento;

iii. Sem prescindir, a título subsidiário, por mera hipótese e dever de patrocínio, prevenindo a hipótese (em que de modo algum se crê), de procedência da lide, sempre deveriam ser os Autores condenados a reconhecer perante a Ré o direito desta à compensação entre o subsídio de turno e os valores pagos a respeito de trabalho noturno, bem como o direito da Ré ao recebimento do eventual saldo a seu favor resultante da operação de compensação, acrescidos dos juros de mora contados da notificação aos Autores da presente contestação-reconvenção.

d) Deverão os Autores ser ainda condenados nas custas da ação e da Reconvenção.”

                                                             *

Os AA. ofereceram resposta concluindo pela improcedência do pedido reconvencional e pela condenação da Ré como litigante de má fé em multa e indemnização.

                                                             *

Foi proferido o despacho saneador de fls. 737 e segs., tendo sido dispensada a fixação dos temas da prova .                                                                                                                                               *

Procedeu-se a julgamento conforme resulta das respetivas atas.

                                                             *

Foi, depois, proferida sentença (fls. 236 e segs.) com o seguinte dispositivo:

1.º Julgo a ação totalmente improcedente e, consequentemente, absolvo a ré do pedido formulado pelos autores;

2.º Julgo a reconvenção procedente e, consequentemente, declaro que os autores não têm direito ao recebimento do subsídio de turno e que têm apenas direito a receber da ré o valor percentual correspondente ao trabalho noturno efetivamente prestado, quando verificados os respetivos requisitos previstos na lei e no CCT aplicável;”

                                                             *

Os Autores, notificados desta sentença, vieram interpor o presente recurso que concluíram da forma seguinte:

“1. O fato 31º dado como provado deveria ter a seguinte redação: os Autores trabalhavam em regime de turnos rotativos mensais.

2. O fato 75º não deverá ser dado como provado.

3. O fato 93º deveria passar a ter a seguinte redação: Entre os autores, há trabalhadores cujas designações das categorias profissionais não correspondem às constantes no CCT AIMMAP SINDEL, designadamente (...), embora se tratem das mesmas profissões.

4.     Deveria ainda ter sido dado como provado que: A rotação de turno, mesmo que mensal, traz maior penosidade aos trabalhadores, com consequências na saúde dos mesmos.

5.     Independentemente dos erros da decisão da matéria de facto e mesmo que por hipótese académica se aceitasse, que se não se aceita, tal decisão, o certo é que a decisão de Direito está grave e multiplamente errada. Com efeito,

6.  Ao invés do que se sustenta na decisão recorrida, o conceito de trabalho por turnos já era conhecido da legislação portuguesa, pelo menos desde o Dec. Lei n.º 409/71, de 27/09, sendo amplamente densificado e utilizado pela doutrinas e jurisprudência.

7. Desde há mais de 50 anos que é entendido que o trabalho por turnos, e em particular por turnos rotativos, é bem mais penoso que o trabalho em regime de horários fixos e que é essa penosidade que precisamente justifica e fundamenta a fixação do acréscimo remuneratório universalmente conhecido por subsídio de turno.

8.  O famigerado Despacho Normativo n.º 182/77, de 28/12, não constitui qualquer interpretação autêntica (que tem de ser feita por lei de valor hierárquico igual ou superior ao da lei interpretada),

9. Como não constitui qualquer fonte de direito, com força vinculativa externa,

10. Não passando, quando muito, de uma instrução – e aliás completamente errônea – interna para os serviços,

11. Para além disso, a “interpretação” nele consagrada corresponde a uma “solução” legal e constitucionalmente inaceitável, face ao preceituado, designadamente nos n.º 13.º e 59.º, n.º 1, al a) da CRP.

12. O pretenso “acordo” com um dado sindicato – cuja existência os AA. impugnam – em que a sentença se estriba não é nenhum instrumento de regulamentação colectiva, nunca poderia abranger os trabalhadores não filiados no sindicato alegadamente subscritor, nem é sequer aquilo que alguns autores denominam de “acordo colectivo atípico” celebrado por uma comissão de trabalhadores.

13. Também não existiram acordos individuais de cada um dos AA. mas, mesmo que existissem ou como tal se pudessem considerar (não podem), as cláusulas apostas, em regime de contrato de adesão, em alguns contratos individuais, eles não poderiam nunca afastar a aplicação de cláusulas de conteúdo mais favorável aos trabalhadores constantes de um IRCT, não só pelo princípio da hierarquia das fontes e das normas, mas também pela natureza imperativa de tais cláusulas de IRCT.

14. Eos trabalhadores que, tal como os AA., vêm reclamar precisamente o pagamento do subsídio de turno previsto em IRCT não praticam qualquer abuso de direito, tal como num caso e noutro sempre têm entendido a melhor doutrina e jurisprudência.

15. As questões decidendas essenciais são assim a da aplicabilidade aos AA. das ditas cláusulas dos IRCT convencionais (e cujo âmbito de aplicação foi alargado a todos os trabalhadores por via das Portaria de Extensão), a saber, respectivamente, as cl. N.º 46.º, 59.º e 57.º.

16. Quer as normas do legislador nacional (maxime, os art.º 220.º e 222.º do CT), quer as do comunitário (Directiva n.º 2003/88) não só não proíbem a estatuição, por IRCT, do subsídio de turno, como as suas preocupações com a segurança e saúde no trabalho inculcam, de modo indubitável, a sua plena admissibilidade.

17. Por força do disposto na CRP, v.g. no art.º 18.º, n.º 2 e 112.º, n.º 5, as disposições da lei nacional e da lei constitucional não podem ser interpretadas e/ou aplicadas de forma restritiva relativamente ao direito dos trabalhadores a receberem um acréscimo remuneratório como contrapartida da especial penosidade da sua actividade.

18. Na interpretação de uma norma jurídica como a das cláusulas dos IRCT’s aqui em causa não pode o intérprete fazer o que faz a M.ª Juíza a quo, ou seja, ignorar por completo o elemento da “ratio legis”, e distinguir onde a norma de todo não distingue. Com efeito,

19. O normativo em causa não distingue nem impõe qualquer período mínimo ou máximo para o ritmo de rotação dos turnos, seja ele semanal, quinzenal, mensal ou bimensal.

20. Mas a sentença não só cria uma artificial e totalmente infundada distinção entre a modelação temporal semanal e a quinzenal ou mensal,

21. Como, ao determinar que os trabalhadores em regime de turnos rotativos com rotação quinzenal ou mensal recebam o mesmo que os trabalhadores sem regime de turnos, consagra uma interpretação normativa que viola por princípio constitucional da igualdade, e em particular o da igualdade salarial, consagrado nos art.º13.º e 59.º, n.º 1, al. a), ambos da CRP), o qual impõe que se trate desigualmente o que é – como na questão sub judice – substancialmente desigual,

22. Nenhuma violação desse princípio existindo, por outro lado, na solução propugnada pelos AA., ao invés da que erroneamente, embora na esteira da argumentação da Ré, se proclama na sentença apelada.

23. Por outro lado, não existe fundamento algum para – sem quaisquer bases científicas para tal – se aceitar que o trabalho em turnos rotativos com rotação quinzenal ou mensal não acarretaria maior penosidade e, logo, não justificaria o recebimento do subsídio de turno,

24. Sendo que todos os estudos nacionais e estrangeiros dos especialistas nas matérias de segurança, e saúde no trabalho e dos riscos físicos e psicossociais – e não meras “opiniões” de alguns quadros da própria Empresa Ré!... – confirmam a existência dessa mesma penosidade (em termos de danos físicos e psicológicos para a saúde dos trabalhadores e também de consequências negativas nas suas relações pessoais, familiares e sociais).

25. E, mais do que isso, que tal penosidade pode inclusive ser maior quando o período de rotação é, por exemplo, de um mês (por a mudança de horário ocorrer precisamente quando o organismo do trabalhador começa a criar alguma habituação). Assim,

26. Nada existindo na letra das cláusulas aplicáveis dos IRCT que distinga rotações semanais e rotações mensais, por exemplo, não sendo lícito ao intérprete fazer, artificial (como se viu) e de todo infundada, distinção; nada existindo na lei, quer nacional, quer comunitária, que imponha o entendimento da sentença a quo e não podendo as mesmas, por imposição constitucional, serem interpretadas e aplicadas de forma restritiva em matéria de acréscimo remuneratório; não havendo qualquer “acordo” colectivo escrito, não sendo este um IRCT e também não podendo vincular trabalhadores não inscritos no Sindicato subscritor; não podendo as cláusulas dos contratos individuais ou de qualquer pretenso “acordo” como o referido pela sentença serem contrárias às disposições, neste caso imperativas, dos IRCT’s (aplicáveis por via das Portarias de Extensão supra-referenciadas); não sendo um (ainda por cima mais que obsoleto e inconstitucional) Despacho Normativo uma Fonte de Direito externa e vinculativa, verificando-se todas as razões justificativas para que os AA. trabalhando em regime de turnos rotativos mensais aufiram o subsídio de turno que peticionaram, manifesta se torna a razão que lhes assiste e a procedência da sua pretensão.

Nestes termos e nos mais de Direito, se requer a Vªs Exªs a revogação da decisão proferida pelo Tribunal a quo, assim se fazendo,

JUSTIÇA!”

                                                             *

A contra-alegou concluindo que:

(…).       

                                                             *                                            

O Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu o parecer de fls. 1309 a 1310, no sentido de que “o recurso interposto deverá ser julgado improcedente”.

                                                             *

Colhidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

                                                             *

II – Questões a decidir

Como é sabido, a apreciação e a decisão dos recursos são delimitadas pelas conclusões da alegação do recorrente (artigo 639.º, n.º 1, do CPC), salvo as que são de conhecimento oficioso.

Questão prévia:

Ampliação do objeto do recurso a requerimento da recorrida

(…).

Assim sendo, cumpre conhecer as seguintes questões:

1ª – Reapreciação da matéria de facto.

2ª – Se é devido aos AA. o subsídio de turno peticionado.

                                                             *

III – Fundamentação

a-) Factos provados e não provados constantes da sentença recorrida:

1.º A ré tem como objeto social a indústria, comércio, importação e exportação de peças para motores de explosão e veículos a motor, de máquinas em geral e de artefactos de metal e artigos correlativos, a prestação de serviços nesse âmbito e a participação no capital social de outras sociedades, ainda que com objeto social diferente;

2.º A ré dedica-se, ainda, à produção de segmentos para motores a gasolina e a gasóleo para veículos ligeiros e pesados, na faixa de 60 a 150 mm de diâmetro nominal;

3.º A ré integra o internacional Grupo A..., fundado em 1920, que é um dos principais fornecedores mundiais de componentes de motores, tendo atualmente 170 fábricas distribuídas por 34 países, num total de cerca de 76 mil trabalhadores ao seu serviço;

4.º A integração da ré no Grupo A... ocorreu no ano de 1997;

5.º Antes dessa integração no Grupo A..., a ré posicionava-se no mercado sob a designação social de B..., S.A. (a alteração da designação para a atual ocorreu no ano de 2000);

6.º Os autores são trabalhadores da ré;

7.º Os trabalhadores da ré, no exercício dos seus direitos, adotaram os estatutos da comissão de trabalhadores;

8.º A autora AA foi admitida na ré em 1 de março de 1993 e tem a categoria profissional de auxiliar de produção 1;

9.º O autor BB foi admitido na ré em 16 de maio de 1993 e tem a categoria profissional de operador máquinas 1;

10.º O autor CC foi admitido na ré em 16 de dezembro de 1993 e tem a categoria profissional de operador máquinas 1;

11.º O autor DD foi admitido na ré em 1 de maio de 1994 e tem a categoria profissional de operador máquinas 1;

12.º O autor EE foi admitido na ré em 1 de maio de 1994 e tem a categoria profissional de operador máquinas 1;

13.º O autor FF foi admitido na ré em 16 de setembro de 1994 e tem a categoria profissional de operador máquinas 1;

14.º O autor GG foi admitido na ré em 16 de junho de 1995 e tem a categoria profissional de operador máquinas 1;

15.º O autor HH foi admitido na ré em 16 de junho de 1995 e tem a categoria profissional de operador laboratório I;

16.º O autor II foi admitido na ré em 16 de junho de 1996 e tem a categoria profissional de operador máquinas 1;

17.º O autor JJ foi admitido na ré em 16 de abril de 1997 e tem a categoria profissional de operador máquinas Q.E. Estag;

18.º O autor KK foi admitido na ré em 16 de junho de 1997 e tem a categoria profissional de operador máquinas 1;

19.º O autor LL foi admitido na ré em 1 de fevereiro de 1998 e tem a categoria profissional de operador máquinas 1;

20.º O autor MM foi admitido na ré em 16 de setembro de 1998 e tem a categoria profissional de operador máquinas 1;

21.º A autora NN foi admitida na ré em 16 de julho de 1999 e tem a categoria profissional de auxiliar de produção 1;

22.º O autor PP foi admitido na ré em 19 de fevereiro de 2003 e tem a categoria profissional de operador máquinas 3;

23.º A autora QQ foi admitida na ré em 15 de novembro de 2003 e tem a categoria profissional de operador laboratório 1;

24.º O autor SS foi admitido na ré em 1 de maio de 2008 e tem a categoria profissional de operador máquinas 1;

25.º O autor TT foi admitido na ré em 1 de julho de 2010 e tem a categoria profissional de operador máquinas 1;

26.º O autor UU foi admitido na ré em 1 de julho de 2010 e tem a categoria profissional de operador máquinas 1;

27.º O autor VV foi admitido na ré em 16 de fevereiro de 2011 e tem a categoria profissional de operador máquinas 1;

28.º O autor XX foi admitido na ré em 1 de julho de 2011 e tem a categoria profissional de operador máquinas 1;

29.º O autor YY foi admitido na ré em 16 de janeiro de 2012 e tem a categoria profissional de operador máquinas 2;

30.º O autor ZZ foi admitido na ré em 1 de agosto de 2014 e tem a categoria profissional de operador máquinas 3;

31.º Todos os autores trabalham em regime de turnos;

32.º Os autores não são sindicalizados;

33.º A ré encontra-se filiada na Associação de Industriais, Metalúrgicos, Metalomecânicos e Afins de Portugal - AIMMAP;

34.º A Associação de Industriais, Metalúrgicos, Metalomecânicos e Afins de Portugal - AIMMAP - é subscritora do contrato coletivo de trabalho celebrado com o SINDEL - Sindicato Nacional da Indústria e Energia -, publicado no Boletim de Trabalho e Emprego n.º 21, de 8 de junho de 2016;

35.º O prazo geral de vigência do contrato coletivo de trabalho referido em 34.º é de três anos (cláusula n.º 1), pelo que vigorará, pelo menos, até 13 de junho de 2019 e a verificar-se a sua denúncia vigorará, em sobrevivência após denúncia, pelo período de mais um ano, ou seja, até 13 de junho de 2020 (cláusula 2.ª, n.º 3);

36.º O contrato coletivo de trabalho referido em 34.º foi objeto de alterações, publicadas no BTE nº 21, de 8 de junho de 2017 e estas foram objeto de Portaria de Extensão, publicada no BTE n.º 33, de 8 de setembro de 2017, relativamente às relações de trabalho entre os empregadores filiados na associação de empregadores outorgantes e trabalhadores ao seu serviço das profissões e categorias previstas na convenção, não representados pela associação sindical outorgante;

37.º Situada na zona industrial de ..., município ..., a ré arrancou a produção no ano de 1993, dedicando-se atualmente à produção de segmentos para motores a gasolina e a gasóleo para veículos ligeiros e pesados, com uma gama diversificada que abrange desde os segmentos de compressão aos de óleo, em ferro fundido ou aço;

38.º A ré fornece segmentos para as principais marcas automobilísticas de excelência, a nível mundial, nomeadamente a Alfa Romeo, Audi, Ford, Opel, Fiat, Lamborghini, BMW, Volkswagen, Renault, Ferrari, Volvo, Mercedes, entre muitas outras;

39.º Ao nível da sua estrutura orgânica e organizativa, a ré encontra-se ordenada em seis departamentos: Recursos Humanos e Segurança, Financeiro e IT, Logística, Qualidade e Ambiente, Engenharia e Manufatura, englobando esta última a Secção de Produção, Manutenção e Ferramentaria;

40.º A ré atribuiu aos seus trabalhadores, entre outros, os seguintes benefícios:

» seguro de vida: em caso de invalidez ou morte, o colaborador ou os seus herdeiros recebem uma indemnização correspondente a 42 vezes o seu vencimento base mensal;

» seguro de saúde: de cada colaborador abrange também o seu agregado familiar e paga 80% ou 90% no caso das cirurgias, das despesas médicas por doença, acidente ou gravidez, incluindo próteses oculares, auditivas e de estomatologia;

» posto médico: devidamente equipado que possibilita aos colaboradores, para além da medicina do trabalho, o recurso à medicina curativa e serviços de enfermagem;

» ergoterapia: serviço de ergoterapia cujas sessões se realizam no posto médico da empresa, e aulas de ginástica pilates para todos os horários;

» ginásio: disponível nas suas instalações para todos os colaboradores que queiram fazer exercício físico;

» restaurante social: serve refeições (três pratos fixos à escolha - carne, peixe e dieta - e cinco pratos adicionais de confeção rápida) a todos os colaboradores, nos diferentes horários, com diversas opções de ementa e com serviço de Take Away;

» subsídio de transporte: todos os colaboradores recebem este subsídio diário para fazer face às despesas de deslocação;

» adiantamento de subsídios: sempre que um colaborador tem necessidade e assim o solicita, a ré faz adiantamento dos subsídios de Natal e férias;

» disponibilização de vacinação anual contra a gripe a todos os interessados e contra a hepatite quanto aos socorristas.

41.º Quando a conjuntura económico-financeira da empresa o permite, a ré tem atribuído prémios por circunstâncias extraordinárias e excecionais que representam marcos importantes para a A.... Por exemplo, quando a ré ganhou o prémio da Ford Q1, atribuiu aos seus colaboradores uma gratificação;

42.º Até 31 de dezembro de 2017, a ré havia já investido na sua operação em Portugal mais de €130 milhões, tendo reinvestido mais de metade dos lucros na sua atividade;

43.º Na 9.ª edição de setembro de 2018 da revista para os trabalhadores do grupo A..., consta noticiado que em 2017 aumentámos a nossa receita em 3,8% para 12,8 biliões de euros. Todas as nossas áreas de negócio, a Divisão de Mectrónica e os Centros de Lucro contribuíram para esse aumento. Conseguimos consolidar, desta forma, a nossa posição entre os 20 maiores fornecedores automotivos do mundo. No entanto, o resultado ficou aquém das nossas expetativas (…);

44.º A postura da ré sempre foi a de ouvir os trabalhadores e atender às suas críticas e sugestões, com partilha de opiniões e debate, o que era feito através de reuniões trimestrais entre a administração da ré e os trabalhadores, ações de formação, questionários, sufrágios e plebiscitos divulgados e realizados várias vezes por ano, sobre as variadas matérias, designadamente, sobre a organização do tempo de trabalho e regime de turnos;

45.º Nos estudos efetuados pelo Great Place to Work Institute, referentes aos anos de 2004 e 2006, na sequência da opinião emitida pelos trabalhadores da ré, a ré ficou posicionada entre as 20 e 25 melhores empresas para trabalhar em Portugal e no estudo referente ao ano de 2006, no critério de Equilíbrio Pessoal/Profissional ficou entre as 5 melhores empresas;

46.º Em 2014 a ré ganhou o prémio de melhor empresa da área automóvel atribuído pela Revista Exame;

47.º Desde a data da sua constituição, a ré criou mais de 1000 postos de trabalho diretos e indiretos, dinamizou e valorizou a zona industrial onde se estabeleceu;

48.º A antiguidade dos trabalhadores ao serviço da ré é grande;

49.º Em 30 de março de 1993, antes do início da sua atividade, a direção de recursos humanos da ré elaborou e apresentou à administração da ré a proposta de Ordem de Serviço n.º 3/93, sobre prestação de trabalho, junta de fls. 187 verso a 191 verso, cujos dizeres dou por integralmente reproduzidos;

50.º A proposta referida em 49.º foi apresentada em anexo à carta junta de fls. 186 a 187 cujos dizeres dou por integralmente reproduzidos, da qual, designadamente:

(…);

3. Turnos

3.1. Entendo que ainda não devemos estabelecer os horários de trabalho de turno, os quais apenas serão praticados em 1994: 2 turnos; prevendo-se que os 3 tiros entrem em funcionamento em 1996, porque não será possível dar formação, em simultâneo, a mais de 25 operadores e a formação de cada grupo durará cerca de 6 meses;

3.2. Nos termos da lei laboral, n.º 2 do art.º 27.º do DL n.º 409/71, os turnos deverão, na medida do possível, ser organizados de acordo com os interesses e as preferências manifestadas pelos trabalhadores. Ora, apenas poderemos ouvir os trabalhadores após serem admitidos, pelo que este assunto será abordado nas entrevistas de recrutamento e, quando possível, objeto de análise com os trabalhadores que vão praticar esse tipo de horário de trabalho.

3.3. No entanto, porque vamos iniciar as entrevistas de recrutamento dos primeiros operadores, temos de estabelecer os princípios orientadores nesta matéria:

a) Face às características do mercado, variação da quantidade e tipo de anéis a produzir, afigura-se muito difícil implementar horários rotativos, porque estes exigem um número de operadores idêntico em todos os turnos, o que não vai acontecer, sendo o 3.º turno um horário excecional, prevendo-se que terá um número muito reduzido de trabalhadores;

b) Os turnos rotativos, variação semanal de horário após descanso, tem efeitos muito negativos na saúde dos trabalhadores, porque o homem não consegue adaptar-se à variação constante da hora de dormir, de comer, e trabalhar. Existem vários estudos, no âmbito da Medicina do Trabalho que aconselham a fixação máxima possível do horário a praticar pelos trabalhadores.

A experiência negativa com os horários rotativos, vivida nas fábricas da B... e na Renault Cacia, levaram essas empresas a alterar os horários para turnos fixos.

A percentagem de trabalhadores reformados por invalidez nas empresas com turnos rotativos é muito superior às das empresas com turnos fixos, havendo a convicção de que se deve aos efeitos negativos dos turnos rotativos.

Em França, para evitar a rotação dos trabalhadores, foram criadas equipas de fim-de-semana, que trabalham exclusivamente nos dias de descanso semanal dos outros trabalhadores.

Se eventualmente a empresa vier a ter necessidade de trabalhar nalguns vetores durante as 24 horas da semana (o projeto B... prevê a laboração contínua) será o assunto discutido com o Ministério do Trabalho para se tentar obter autorização que viabilize as equipas de fim de semana em Portuga. O recurso às equipas de fim se semana será mais caro para a empresa do que os turnos de rotação semanal, com folga variável ao longo da semana, mas apresenta vantagens muito grandes para a saúde dos trabalhadores, que superam aquela desvantagem.

(…);

f) Assim, como temos falado várias vezes e apesar de pretendermos consultar os trabalhadores antes de iniciarmos o trabalho em turnos, importa fixar, desde já, que os horários não serão de rotação semanal e que, apesar disso, os nossos trabalhadores não irão ter, no conjunto das diversas prestações retributivas, uma retribuição global inferior à que resulta do CCT (retribuição base e o subsídio de turno), pelo que a retribuição base interna será superior à do CCT, no mínimo, 15%, acrescida do subsídio de trabalho noturno, correspondente às hora noturnas do horário praticado no mês.

g) (…) Nestes termos, é lícito à empresa não pagar o subsídio de turno nos horários de turno sem alteração, porque, em primeiro lugar, não lugar ao pagamento desse subsídio, nos termos do D.N. 182/77, e, por outro lado, porque a empresa vai pagar aos trabalhadores, em regime de turnos sem rotação mensal, uma retribuição global (retribuição de base mais subsídio de trabalho noturno) superior á estabelecida no IRCT aplicável (retribuição de base mais subsídio de turno) (… );

51.º A direção de recursos humanos da ré sempre manifestou a sua preferência pelos turnos fixos em detrimento dos turnos de rotação semanal, por entender que estes últimos tinham efeitos negativos na saúde dos trabalhadores;

52.º A ré emitiu a instrução de serviço n.º 04/1993/DRH sobre remunerações (política, regras e processamento) junta de fls. 191 a 194 cujos dizeres dou por integralmente reproduzidos, da qual consta, designadamente:

1.Política

A remuneração do trabalho tem por objetivo a satisfação económica das necessidades individuais e familiares do trabalhador e a participação deste na distribuição da riqueza produzida pela empresa, subordinando-se aos seguintes princípios orientadores:

(…)

b) A remuneração base representará a parte essencial das remunerações do trabalhador, pelo que os subsídios, complementos e suplementos apenas serão atribuídos se forem obrigatórios;

c) Promoção de horários fixos a fim de evitar os efeitos negativos na saúde dos trabalhadores provocados pela variação do horário de trabalho, pelo que as eventuais prestações remuneratórias devidas pela variação de horário devem ser integradas na remuneração base, pagando apenas de forma autónoma a prestação devida pelo trabalho noturno;

53.º A política de remunerações foi dada a conhecer aos trabalhadores da ré, encontrando-se disponível na intranet da empresa;

54.º A ré começou a exercer a sua atividade em 16 de maio de 1993 - data da admissão do primeiro grupo de trabalhadores para a área da produção -, sob a denominação social B..., S.A., tendo funcionado exclusivamente em horário diurno até janeiro de 1994;

55.º Em fevereiro de 1994, foi introduzido um regime de dois turnos fixos, situação que se manteve até fevereiro de 1996;

56.º Com a criação do segundo turno em fevereiro de 1994, a ré passou a prever o pagamento de um subsídio complementar: o subsídio de trabalho noturno;

57.º Em 31 de janeiro de 1994, foi publicada a Ordem de Serviço n.º 2/94 da ré, intitulada de Trabalho em Regime de Turnos, junta de fls. 200 a 201 verso cujos dizeres dou por integralmente reproduzidos, da qual consta, designadamente, que:

Como é do conhecimento geral, inicia-se em fevereiro/94 o trabalho em regime de dois turnos fixos, prevendo-se que em 1995 estarão reunidas as condições para a fábrica laborar em três turnos.

Os turnos são fixos, devido aos graves inconvenientes dos turnos rotativos para a saúde dos trabalhadores que praticam este tipo de horários. De facto, vários estudos realizados por especialistas de saúde ocupacional recomendam a adoção de turnos fixos para que os trabalhadores não estejam sujeitos à variação dos períodos de trabalho, de descanso e de refeições.

1.Início

No dia 94.02.07 iniciam o trabalho em regime de turnos os trabalhadores do Dep. Produção e Qualidade que concluíram a formação inicial, bem como os Op. de Equipamentos Industriais do Dp. Industrial (…);

3. Horário de Turnos

3.1. Horário de Dois Turnos Fixos

1.º Turno

De segunda a sexta feira:

Entrada: 06H00 M

Saída: 14H30 M

Intervalo:

- das 10H00 às 10H30M para o grupo A

- das 10H30 às 11H00M para o grupo B

Descanso complementar: Sábado;

Descanso obrigatório: Domingo;

2.º Turno

De segunda a sexta feira:

Entrada: 14H30 M

Saída: 23H00 M

Intervalo:

- das 18H30 às 19H00M para o grupo A

- das 19H00 às 19H30M para o grupo B

Descanso complementar: Sábado;

Descanso obrigatório: Domingo;

(…);

4. Subsídio de Trabalho Noturno

A prestação de trabalho entre as 20H00M e as 07H00M confere ao trabalhador o direito a um subsídio de 25% da sua remuneração base. Assim, os trabalhadores que pratiquem o regime de turnos fixos têm direito ao subsídio abaixo indicado, o qual faz parte integrante daa retribuição mensal, desde que auferido regular e permanentemente.

4.1. Subsídio no Horário de dois Turnos Fixos

1.º Turno: 4% do vencimento base;

2.º Turno: 10% do vencimento base; (…);

58.º A partir de fevereiro de 1994, a ré passou a pagar mensalmente aos seus trabalhadores que prestavam trabalho no referido sistema de dois turnos fixos, o subsídio de trabalho noturno;

59.º Em julho de 1994 a ré pagou ao trabalhador AAA subsídio de turno no valor de 3.000$00;

60.º Em agosto de 1994 a ré pagou a AAA subsídio de trabalho noturno no valor de 3.000$00;

61.º A rúbrica subsídio de turno que inicialmente constou dos recibos emitidos desde fevereiro a julho de 1994 resultou de uma falha do programa informático de processamento de salários que não continha o código para processar o subsídio de trabalho noturno, que foi detetada no primeiro processamento de subsídio de trabalho noturno em fevereiro de 1994 e solucionada no mês de agosto de 1994;

62.º A partir do mês de março de 1996, a ré adotou um sistema de três turnos, todos eles com descanso semanal obrigatório ao domingo e complementar ao sábado:

1.º turno: das 06:00 horas às 14:00 horas;

2.º turno: das 14:00 horas às 22:00 horas;

3.º turno: das 22:00 horas às 06:00 horas;

63.º Antes do início do regime de trabalho em três turnos, a ré realizou uma consulta aos trabalhadores para estes manifestarem os seus interesses e preferências na organização dos horários de turno;

64.º A ré, ainda com a denominação social de B..., pediu e obteve autorização de laboração contínua, concedida através do Despacho dos Ministérios da Economia e do Trabalho, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego n.º 24/2000, de 29 de junho;

65.º Porque a empresa necessitava de produzir mais e para evitar a rotação semanal entre turnos, em 2001 a ré criou equipas de fim de semana, que integram somente trabalhadores voluntários ou contratados expressamente para este horário;

66.º Em dezembro de 2003, a ré realizou um inquérito aos seus trabalhadores sobre horários de trabalho na sequência de uma reunião de 24 de novembro de 2003;

67.º Dos 288 questionários recebidos, apenas um manifestou preferência por turnos de rotação semanal, cujo resultado, divulgado internamente pela Informação de Serviço 114/03 junta a fls. 215, foi o seguinte:

» 83,7% preferem o sistema de horários praticado na empresa;

» 7,6% preferem horários fixos;

» 5,2% preferem horários fixos com destacamento ao 3.º turno;

» 0,4 % preferem horários com rotação semanal;

» 3,1% não responderam;

68.º Em 2004/2005, na sequência de um acordo celebrado com o Sindicato das Indústrias Metalúrgicas e Metalomecânicas dos Distritos de Coimbra e Leiria (Acordo com a Administração da A... sobre o Regime de Turnos), após negociações conhecidas pela Direção Geral do Emprego e das Relações do Trabalho, a ré aceitou implementar um regime de turnos rotativos com uma periodicidade semanal, nos termos que constam da informação sindical de 31 de dezembro de 2004 junta a 218 verso cujos dizeres dou por integralmente reproduzidos, da qual consta, designadamente:

A Direção do sindicato e a Administração da A... chegaram a acordo quanto às bases em que deve ser regulada a prestação em regime de turnos.

Este acordo foi estabelecido no respeito pelos direitos adquiridos pelos trabalhadores envolvidos, e pelas condicionantes da organização do sector produtivo, nomeadamente:

- o facto da maioria dos trabalhadores ter a sua vida organizada em função dos horários que atualmente praticam;

- haver decorrido um significativo lapso de tempo desde a entrada em vigor dos turnos, situação registada para os 2 turnos desde fevereiro de 1994 e desde maio de 1996 para os 3 turnos;

- a obrigação de serem respeitados os comandos legais, nomeadamente o n.º 1 do artigo 173.º do Código do Trabalho (proibição da alteração unilateral dos horários de trabalho);

A empresa apresentou ainda as seguintes condições que foram aceites pelo sindicato:

- admitem a implementação de turnos rotativos;

- a rotação será com periodicidade semanal;

- serão integrados no regime de turnos de rotação semanal os trabalhadores que, voluntariamente, manifestarem a sua concordância;

- aos trabalhadores integrados no regime de 3 turnos de segunda a sexta-feira, será pago subsídio de turno no valor de 25% e para os que prestarem trabalho em 3 turnos com descanso semanal variável este subsídios será de valor superior;

- tendo em conta os encargos financeiros que resultará desta alteração, deverá ser seguido um método de implementação que não ponha em causa o equilíbrio da empresa;

Ponderados todos os fatores, as partes concluem que para a concretização deste objetivo, se deve seguir o seguinte método:

- os trabalhadores que desejam transitar para o regime de 3 turnos, com rotatividade semanal, deverão comunicar a sua vontade perante a Direção de Recursos Humanos, dentro do prazo que constará da informação a emitir pela administração nesse sentido;

- a empresa analisará todos os casos, que irá incluindo na escala de turnos de forma gradual e de maneira a não desestabilizar a produção, tendo em conta nomeadamente a necessidade de formação de equipas;

- os trabalhadores que não estejam interessados em transitar para turnos rotativos, mantêm o seu horário atual, continuando nestes casos a retribuição a ser calculada nos termos vigentes, ou seja, com o acréscimo previsto na lei para o trabalho noturno quando tal ocorra;

O sindicato, naturalmente, está disponível para prestar aos trabalhadores todos os esclarecimentos que julguem pertinentes.

69.º Na sequência do acordo referido em 68.º seria eliminado o turno das equipas de fim de semana por o mesmo se tornar desnecessário;

70.º O acordo referido em 68.º não foi reduzido a escrito e não foi publicado no BTE;

71.º No início do ano de 2005 a ré emitiu um comunicado, que consta da Ordem de Serviço 01/05 junta de fls. 1037 verso a 1039 cujos dizeres dou por integralmente reproduzidos, intitulada de Regime de Turnos, através da qual divulgou os princípios de funcionamento do regime de turnos estabelecidos entre a empresa e o Sindicato das Indústrias Metalúrgicas e Metalomecânicas dos Distritos de Coimbra e Leiria e convidou todos os trabalhadores interessados num esquema de rotação semanal a informarem a empresa até ao dia 15 de janeiro de 2005 e a participarem numa reunião a realizar no dia 7 de janeiro de 2005, com o objetivo de apresentar o novo sistema de horários de trabalho;

72.º Findo o prazo de inscrição, apenas um trabalhador manifestou interesse em aderir aos turnos de rotação semanal;

73.º Todos os restantes, nomeadamente os autores admitidos antes de janeiro de 2005, optaram por permanecer no regime então em vigor;

74.º Por falta de adesão dos trabalhadores, a ré informou o sindicato e o único trabalhador inscrito que não havia condições para implementar tal regime de turnos por não existir um número mínimo de trabalhadores que se tivessem voluntariado para esse efeito;

75.º Em face desta decisão dos trabalhadores da ré, estes continuaram sujeitos ao mesmo regime de horários até então em vigor, ou seja, um sistema de três turnos (de segunda a sexta-feira), com eventual rotação mensal e equipas de fim de semana, pagando um subsídio de trabalho noturno nos seguintes moldes:

- horário das 06h00 às 14h00: 4% da remuneração base;

- horário das 14h00 às 22h00: 10% da remuneração base;

- horário das 22h00 às 06h00: 28% da remuneração base.

76.º E nas equipas de fim de semana com o seguinte regime:

- horário das 06h00 às 18h00 de sábado e domingo: 4% da remuneração base;

- horário das 18h00 às 06h00 de sábado e domingo: 28% da remuneração base;

77.º Na sequência das várias consultas, acordos, sufrágios e plebiscitos que se sucederam ao longo dos vários anos, os trabalhadores, incluindo os autores, manifestaram os seus interesses e preferências na organização dos horários, tendo sido adotado o sistema que ainda hoje se mantém e que consiste no seguinte:

» os trabalhadores afetos ao regime de trabalho por turnos rodam mensalmente por 2 ou por 3 turnos, conforme o sector a que estejam afetos, por forma a que só troquem de turno após o termo de cada mês;

» os trabalhadores, para adequar o horário de trabalho às suas preferências, podem acordar com os colegas do mesmo posto o horário a praticar, trocando de turno, e, por sua iniciativa ou da empresa, podem mudar de posto de trabalho, mediante o acordo do respetivo supervisor;

78.º Este sistema permite que haja trabalhadores, incluindo os autores, que se mantenham no mesmo turno durante meses e até mesmo anos;

79.º Os trabalhadores da ré, incluindo os autores, sempre puderam, se lhes for conveniente e com autorização da chefia, alterar entre si as escalas e os turnos de laboração -as ditas trocas;

80.º Durante todo o ano de 2018, o horário de trabalho da autora QQ (número de empregado ...) não foi alterado;

81.º Nos meses de junho e setembro de 2018, o autor ZZ (número de empregado ...) não rodou de turno uma única vez, tendo permanecido sempre afeto ao 1.º turno de trabalho e já se manteve consecutivamente a trabalhar no turno da manhã durante um ano;

82.º Nos meses de junho e setembro de 2018, o autor MM (número de empregado ...) permaneceu de forma contínua no 2.º turno de trabalho e já se manteve consecutivamente a trabalhar no turno da tarde durante um ano, o que ocorreu mais do que um ano;

83.º O autor SS (número de empregado ...) já se manteve consecutivamente a trabalhar no mesmo turno durante vários meses;

84.º Nos meses de maio, junho e julho de 2018, os trabalhadores BBB (número de empregado ...), CCC (número de empregado ...) e DDD (número de empregado ...) não fizeram qualquer rotação ou troca entre turnos, permanecendo de forma sucessiva no mesmo turno;

85.º Ao contratar trabalhadores para as equipas de fim de semana, com um período normal de trabalho de 24 horas e uma retribuição igual à praticada para períodos normais de trabalho de 40 horas, a ré tem, no setor em que há laboração contínua, mais 25% de trabalhadores do que necessitaria se adotasse um regime de turnos rotativos semanais;

86.º Desde dezembro de 2018 a dezembro de 2019 a ré pagou aos autores, mensalmente, as retribuições discriminadas nos recibos de vencimento juntos de fls. 825 a 993 cujos dizeres dou por integralmente reproduzidos, dos quais resulta, além do mais, que o subsídio de trabalho noturno tem por base um apuramento de 4%, 10% ou 28% sobre a retribuição base;

87.º A retribuição paga pela ré aos trabalhadores que trabalham por turnos - remuneração base acrescida de subsídio de trabalho noturno -, é superior à que resulta do CCTAIMMAP-SINDEL - remuneração base acrescida de subsídio de turno;

88.º Em 30 de julho de 1977, o Ministério do Trabalho emitiu o Despacho Normativo n.º 182/77 junto a fls. 78 cujos dizeres dou por integralmente reproduzidos, com o objetivo de fixar doutrinalmente um conceito inequívoco para o instituto do subsídio de turno, consagrado em vários instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, convencionais e administrativos, que têm dado lugar a interpretações desencontradas, nos seguintes termos:

Apenas têm direito ao subsídio de turno, no montante constante da norma que o consagre, os trabalhadores que prestem serviço nas seguintes circunstâncias, cumulativamente:

a) Em regime de turnos rotativos (de rotação contínua ou descontinua);

b) Com um número de variantes de horário de trabalho semanal igual ou superior ao número de turnos a que se refere o subsídio de turno considerado;

89.º Em 4 de março de 2004, a AIMMAP enviou carta ao ministro da Segurança Social e do Trabalho, Dr. Bagão Félix, colocando questões relacionadas com o pagamento do subsídio de turno, expressando o seu entendimento de que não obstante a revogação do DL 409/71 de 27 de setembro (LDT), a interpretação introduzida pelo Despacho Normativo n.º 182/77, de 16 de setembro de 1977, continua, atualmente, em vigor;

90.º A FIEQUIMETAL (maior federação de associações sindicais do setor metalúrgico e metalomecânico) propôs, em 2017, a revogação do Despacho Normativo n.º 182/77;

91.º A revogação do Despacho Normativo n.º 182/77 foi levada à Assembleia da República pelo Bloco de Esquerda através do Projeto de Lei n.º 420/VIII e apenas foi votado favoravelmente pelo referido partido e pelo Partido Comunista Português, tendo sido rejeitado pelos restantes partidos com assento parlamentar;

92.º Desde 2005, dos contratos individuais de trabalho celebrados com a ré, consta uma cláusula em matéria de horário de trabalho que prevê que o trabalhador aceita prestar trabalho em regime diurno, noturno, de turnos fixos ou rotativos, de equipa de fim de semana, de trabalho suplementar e em regime de prevenção, considerando-se apenas turno, para efeito e atribuição de subsídio de turno, os horários com rotação semanal;

93.º Entre os autores, há trabalhadores cujas categorias profissionais não se enquadram no CCTAIMMAP-SINDEL, designadamente:

» AA, com a categoria profissional de Auxiliar de Produção 1;

» HH com a categoria profissional de Operador de Laboratório 1;

» NN com a categoria profissional de Auxiliar de Produção 1;

» QQ com a categoria profissional de Operador de Laboratório 1;

94.º Em 27 de abril de 1999, 14 de fevereiro de 2000 e 26 de novembro de 2003 a ré solicitou à AIMMAP que esta, em conjunto com as associações sindicais com que negociava os diferentes contratos coletivos de trabalho, criasse novas categorias profissionais por forma a que desse enquadramento na convenção a estes colaboradores não abrangidos, nos termos que constam das cartas juntas de fls. 253 verso a 260 cujos dizeres dou por integralmente reproduzidos;

95.º Não obstante esse pedido, as categorias profissionais e profissões elencadas no 93.º nunca foram criadas ou previstas em qualquer convenção coletiva de trabalho celebrada pela AIMMAP;

96.º O regime de turnos mensais tem um impacto muito menor na saúde dos trabalhadores comparativamente com os turnos de rotação semanal;

97.º A composição dos diferentes turnos na ré nunca foi igual, havendo um número irregular e desigual de trabalhadores repartidos entre diferentes turnos, pelo que os postos de trabalho não são ocupados sucessivamente em todos os turnos;

98.º Os dias de descanso semanal dos autores são sempre os mesmos: sábado e domingo;

Factos não provados:

Não se provaram os seguintes factos com interesse para a decisão do mérito da causa:

1.º O autor PP foi admitido na ré em 16 de abril de 2000;

 2.º A ré conta, nos dias de hoje, com mais de 600 trabalhadores, alguns dos quais vinculados à ré desde a sua constituição e início de produção;

3.º Enquanto as circunstâncias económico-financeiras da ré o permitirem, a ré tem vindo a oferecer um cartão no valor de € 100,00 para compras e uma manta de bebé a todos os colaboradores quando têm filhos;

4.º A maioria dos trabalhadores da ré não tem rotação mensal entre turnos, nem sequer uma rotação regular;

5.º O autor TT (com o número de empregado ...) esteve meses seguidos no mesmo turno;

6.º O autor VV (com o número de empregado ...) permaneceu meses seguidos no mesmo turno;

7.º Os seguintes trabalhadores da ré nos meses de janeiro, fevereiro, março e setembro, outubro e novembro de 2018 não rodaram de turnos, permanecendo de forma contínua e sucessiva no mesmo turno (seja no primeiro, segundo, terceiro ou turno das equipas de fim de semana): EEE (número de empregado ...); FFF (número de empregado ...); GGG (número de empregado ...); HHH (número de empregado ...); III (número de empregado ...); JJJ (número de empregado ...); KKK (número de empregado ...); LLL (número de empregado ...); MMM (número de empregado ...); NNN (número de empregado ...); OOO (número de empregado ...); PPP (número de empregado ...); QQQ (número de empregado ...); RRR (número de empregado ...); SSS (número de empregado ...); TTT (número de empregado ...); UUU (número de empregado ...); VVV (número de empregado ...); WWW (número de empregado ...); XXX (número de empregado ...); YYY (número de empregado ...);

8.º As equipas dos turnos têm, atualmente, 204 trabalhadores no 1.º turno, 170 trabalhadores no 2.º turno, 70 trabalhadores no 3.º turno e 25 trabalhadores na equipa de fim de semana;

Fundamentação da matéria de facto:

(…)”.

*

                                                             *

b) - Discussão

Apreciando as questões suscitadas pelos AA. recorrentes:

1ª questão

Reapreciação da matéria de facto

(…)

2ª questão

Se é devido aos Autores o subsídio de turno peticionado.

Alegam os recorrentes que:

- Desde há mais de 50 anos que é entendido que o trabalho por turnos, e em particular por turnos rotativos, é bem mais penoso que o trabalho em regime de horários fixos e que é essa penosidade que precisamente justifica e fundamenta a fixação do acréscimo remuneratório universalmente conhecido por subsídio de turno.

-  O famigerado Despacho Normativo n.º 182/77, de 28/12, não constitui qualquer interpretação autêntica (que tem de ser feita por lei de valor hierárquico igual ou superior ao da lei interpretada).

- Para além disso, a “interpretação” nele consagrada corresponde a uma “solução” legal e constitucionalmente inaceitável, face ao preceituado, designadamente nos artigos 13.º e 59.º, n.º 1, al a) da CRP.

- O pretenso “acordo” com um dado sindicato – cuja existência os AA. impugnam – em que a sentença se estriba não é nenhum instrumento de regulamentação coletiva, nunca poderia abranger os trabalhadores não filiados no sindicato alegadamente subscritor, nem é sequer aquilo que alguns autores denominam de “acordo coletivo atípico” celebrado por uma comissão de trabalhadores.

- Também não existiram acordos individuais de cada um dos AA. mas, mesmo que existissem ou como tal se pudessem considerar (não podem), as cláusulas apostas, em regime de contrato de adesão, em alguns contratos individuais, eles não poderiam nunca afastar a aplicação de cláusulas de conteúdo mais favorável aos trabalhadores constantes de um IRCT, não só pelo princípio da hierarquia das fontes e das normas, mas também pela natureza imperativa de tais cláusulas de IRCT.

- Na interpretação de uma norma jurídica como a das cláusulas dos IRCT’s aqui em causa não pode o intérprete fazer o que faz a M.ª Juíza a quo, ou seja, ignorar por completo o elemento da “ratio legis”, e distinguir onde a norma de todo não distingue. Com efeito,

- O normativo em causa não distingue nem impõe qualquer período mínimo ou máximo para o ritmo de rotação dos turnos, seja ele semanal, quinzenal, mensal ou bimensal.

- Mas a sentença não só cria uma artificial e totalmente infundada distinção entre a modelação temporal semanal e a quinzenal ou mensal,

- Como, ao determinar que os trabalhadores em regime de turnos rotativos com rotação quinzenal ou mensal recebam o mesmo que os trabalhadores sem regime de turnos, consagra uma interpretação normativa que viola o princípio constitucional da igualdade, e em particular o da igualdade salarial, consagrado nos art.º13.º e 59.º, n.º 1, al. a), ambos da CRP), o qual impõe que se trate desigualmente o que é – como na questão sub judice – substancialmente desigual.

- Não existe fundamento algum para – sem quaisquer bases científicas para tal – se aceitar que o trabalho em turnos rotativos com rotação quinzenal ou mensal não acarretaria maior penosidade e, logo, não justificaria o recebimento do subsídio de turno.

- Nada existindo na letra das cláusulas aplicáveis dos IRCT que distinga rotações semanais e rotações mensais, por exemplo, não sendo lícito ao intérprete fazer, artificial (como se viu) e de todo infundada, distinção; nada existindo na lei, quer nacional, quer comunitária, que imponha o entendimento da sentença a quo e não podendo as mesmas, por imposição constitucional, serem interpretadas e aplicadas de forma restritiva em matéria de acréscimo remuneratório; não havendo qualquer “acordo” coletivo escrito, não sendo este um IRCT e também não podendo vincular trabalhadores não inscritos no Sindicato subscritor; não podendo as cláusulas dos contratos individuais ou de qualquer pretenso “acordo” como o referido pela sentença serem contrárias às disposições, neste caso imperativas, dos IRCT’s (aplicáveis por via das Portarias de Extensão supra referenciadas); não sendo um (ainda por cima mais que obsoleto e inconstitucional) Despacho Normativo uma Fonte de Direito externa e vinculativa, verificando-se todas as razões justificativas para que os AA. trabalhando em regime de turnos rotativos mensais aufiram o subsídio de turno que peticionaram, manifesta se torna a razão que lhes assiste e a procedência da sua pretensão.

Por outro lado, a este propósito consta da sentença recorrida o seguinte:

“Alegam os autores que trabalham em regime de turnos rotativos e que a ré não lhes paga o subsídio de turno previsto cláusula 57.ª, n.º 4 do CCT AIMMAP-SINDEL que lhes é aplicável.

A noção de trabalho por turnos consta do art.º 220.º do CT que dispõe que:

Considera-se trabalho por turnos qualquer organização do trabalho em equipa em que os trabalhadores ocupam sucessivamente os mesmos postos de trabalho, a um determinado ritmo, incluindo o rotativo, contínuo ou descontínuo, podendo executar o trabalho a horas diferentes num dado período de dias ou semanas.

A introdução do conceito de trabalho por turnos na legislação laboral portuguesa apenas aconteceu em 1998, por força da Lei n.º 73/1998, de 10 de novembro.

Esta legislação, por sua vez, transpôs para a ordem jurídica nacional a Diretiva n.º 93/104/CE, de 23 de novembro, cuja evolução resultou na Diretiva n.º 2003/88/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de novembro, atualmente em vigor.

O art.º 2.º, n.ºs 5 e 6 desta Diretiva qualifica como trabalho por turnos qualquer modo de organização do trabalho em equipa em que os trabalhadores ocupem sucessivamente os mesmos postos de trabalho, a um determinado ritmo, incluindo o ritmo rotativo, e que pode ser de tipo contínuo ou descontínuo, o que implica que os trabalhadores executem o trabalho a horas diferentes no decurso de um dado período de dias ou semanas e como trabalhador por turnos qualquer trabalhador cujo horário de trabalho se enquadre no âmbito do trabalho por turnos.

O trabalho por turnos pode ser organizado de modo a que os trabalhadores fiquem adstritos em termos constantes a determinado período de laboração (turnos fixos) ou trabalhem alternadamente em períodos diferentes (turnos rotativos).

O art.º 220.º do CT in fine refere-se expressamente a dias ou semanas o que sugere que a variabilidade de horário deve ocorrer em ciclos de duração inferior a um mês, sendo certo que o legislador, quando pretendeu incluir a referência ao mês a par da referência à semana, fê-lo expressamente, como sucede, por exemplo, no art.º 150.º, n.º 3 do CT (o trabalho a tempo parcial pode ser prestado apenas em alguns dias por semana, por mês ou por ano, devendo o número de dias de trabalho ser estabelecido por acordo).

Ao que acresce que os normativos seguintes têm sempre como referência a existência de variações diárias ou semanais dos turnos. Assim, por exemplo, o art.º 221.º, n.º 4 do CT dispõe que o trabalhador só pode mudar de turno após o dia de descanso semanal.

O legislador optou por não determinar qualquer regime salarial específico para o trabalho por turnos, limitando-se a regular a contrapartida devida pela prestação de trabalho noturno.

Assim sendo, a obrigatoriedade de pagamento de algum tipo de contrapartida pela prestação de trabalho em regime de turnos só existe se decorrer de fontes hierarquicamente inferiores à lei, ou seja, de instrumento de regulamentação coletiva do trabalho ou de contrato de trabalho.

Neste contexto, os autores invocam que lhes é aplicável o contrato coletivo de trabalho celebrado entre a AIMMAP e o SINDEL, publicado no Boletim de Trabalho e Emprego n.º 21, de 8 de junho de 2016.

Este contrato coletivo de trabalho define na sua cláusula 57.ª o que se considera como trabalho em regime de turnos nos seguintes termos:

1 - Considera-se trabalho em regime de turnos o prestado em turnos de rotação contínua ou descontínua, em que o trabalhador está sujeito a variações de horário de trabalho;

2 - Em caso de prestação de trabalho em regime de turnos, deverá observa-se, em regra, o seguinte:

a) Em regime de dois turnos, o período normal de trabalho é de 40 horas, distribuídas pelos dias normais de trabalho;

b) Em regime de três turnos, o período normal de trabalho poderá ser distribuído por seis dias, de segunda-feira a sábado, não podendo exceder 40 horas semanais e as horas do turno predominantemente noturno serão em regra distribuídas de segunda-feira a sexta-feira;

3 - A distribuição do período normal de trabalho semanal poderá fazer-se de outra forma, desde que o empregador justifique por escrito a sua necessidade, devendo solicitar o pedido de aprovação ao Ministério do Trabalho;

4 - A prestação de trabalho em regime de turnos confere aos trabalhadores o direito a um complemento de retribuição no montante de:

a) 15 % da retribuição de base efetiva no caso de trabalho em regime de dois turnos, de que apenas um seja total ou parcialmente noturno;

b) 25 % da retribuição de base efetiva no caso de trabalho em regime de três turnos, ou de dois turnos total ou parcialmente noturnos.

5 - O acréscimo de retribuição previsto no número anterior inclui a retribuição especial de trabalho como noturno;

6 - Os acréscimos de retribuição previstos no número 4 integram para todos os efeitos a retribuição dos trabalhadores, mas não são devidos quando deixar de se verificar a prestação de trabalho em regime de turnos;

7 - Nos regimes de três turnos haverá um período diário de trinta minutos para refeição nas empresas que disponham de refeitório ou cantina onde as refeições possam ser servidas naquele período e de quarenta e cinco minutos quando não disponham desses serviços. Este tempo será considerado para todos os efeitos como tempo de serviço;

Argumentam os autores que o subsídio de turno previsto nesta cláusula é devido independentemente do tipo de rotação dos turnos - diária, semanal, quinzenal ou mensal.

Contra argumenta a ré alegando que o subsídio de turno previsto nesta cláusula apenas é devido no caso de rotação semanal ou inferior dos turnos.

Impõe-se, assim, proceder a uma interpretação da cláusula recorrendo aos diversos critérios interpretativos (literal, sistemático, histórico e teleológico).

Começando a interpretação pela análise do elemento gramatical, dispõe o n.º 1 que considera-se trabalho em regime de turnos o prestado em turnos de rotação contínua ou descontínua, em que o trabalhador está sujeito a variações de horário de trabalho.

Trata-se de uma formulação mais lata do que a prevista no art.º 220.º do CT, mas que tem ser objeto de uma interpretação restritiva que assegure a sua conformidade com referida Diretiva n.º 2003/88/CE.

Assim sendo, o inciso final do art.º 220.º do CT, que coincide com o disposto no art.º 2.º, n.º 5 da Diretiva e que sugere que a variabilidade de horário deve ocorrer em ciclos de duração inferior ao mês (dias ou semanas), deve ser considerado como elemento integrativo do conceito previsto no CCT.

Consequentemente, o elemento literal da cláusula também sugere que a variabilidade de horário deve ocorrer em ciclos de duração inferior ao mês (dias ou semanas).

Já no domínio sistemático, aferindo o contexto convencional, constitucional e legal da cláusula em apreço, afigura-se que o facto de o n.º 5 da cláusula em análise prever que o acréscimo de retribuição por subsidio de turno inclui a retribuição de trabalho como noturno, obsta a uma interpretação do disposto nesta cláusula como passível de incluir um único turno mensal.

Com efeito, nessa situação, os trabalhadores de qualquer um dos turnos teriam direito ao mesmo complemento de retribuição correspondente a 25% da retribuição base efetiva, independentemente do número de horas de trabalho noturno realizado nesse período (uma, duas ou oito horas, consoante se integrem no 1.º, 2.º ou 3.º turno).

Tal solução viola claramente o princípio da igualdade de tratamento retributivo, que constitui um princípio basilar do Direito do Trabalho, com assento constitucional.

E esta interpretação esvaziaria o escopo visado pela norma prevista no n.º 5, da cláusula 57.ª, que é o de compensar a penosidade do trabalho variável em função do maior ou menor número de horas de trabalho noturno.

Decisiva é, seguramente, a interpretação realizada pelo Despacho Normativo n.º 182/77, de 30 de julho.

Efetivamente, em 30 de julho de 1977, o Ministério do Trabalho emitiu o Despacho Normativo n.º 182/77 junto a fls. 78, com o objetivo de fixar doutrinalmente um conceito inequívoco para o instituto do subsídio de turno, consagrado em vários instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, convencionais e administrativos, que têm dado lugar a interpretações desencontradas, nos seguintes termos:

Apenas têm direito ao subsídio de turno, no montante constante da norma que o consagre,        os trabalhadores que prestem serviço nas seguintes circunstâncias, cumulativamente:

a) Em regime de turnos rotativos (de rotação contínua ou descontinua);

b) Com um número de variantes de horário de trabalho semanal igual ou superior ao número de turnos a que se refere o subsídio de turno considerado;

De forma clara e inequívoca, fixa este Despacho o entendimento de que é pressuposto da atribuição do subsídio de turno a verificação de uma rotação semanal ou inferior à semana que ocorra pelos menos tantas vezes quantos os turnos previstos.

E não obstante ter sido emitido no ano de 1977, este regulamento ainda se encontra em vigor.

Desde logo, porque não houve qualquer revogação expressa, ou tácita, uma vez que a legislação posterior não regulou esta matéria do subsídio de turno, nem alterou de forma relevante para o caso a regulamentação do trabalho por turnos.

Também não cessou por caducidade com o início da vigência do Código do Trabalho. Ao invés, verifica-se que o quadro jurídico vigente à data deste Despacho Normativo mantém-se praticamente inalterado, porquanto as disposições do Código do Trabalho de 2003 (art.ºs 188.º a 191.º) e do Código do Trabalho de 2009 (art.ºs 220 a 222.º), acabaram por reproduzir o que já estava estatuído nos art.ºs 27.º e 28.º do DL n.º 409/71, de 27 de setembro.

Acresce que a revogação do Despacho Normativo n.º 182/77 foi levada à Assembleia da República pelo Bloco de Esquerda através do Projeto de Lei n.º 420/VIII e apenas foi votado favoravelmente pelo referido partido e pelo Partido Comunista Português, tendo sido rejeitado pelos restantes partidos com assento parlamentar.

Em 4 de março de 2004, a própria AIMMAP enviou carta ao ministro da Segurança Social e do Trabalho, Dr. Bagão Félix, colocando questões relacionadas com o pagamento do subsídio de turno, expressando o seu entendimento de que não obstante a revogação do DL 409/71 de 27 de setembro (LDT), a interpretação introduzida pelo Despacho Normativo n.º 182/77, de 16 de setembro de 1977, continua, atualmente, em vigor.

Por fim, também a FIEQUIMETAL (maior federação de associações sindicais do setor metalúrgico e metalomecânico) defendeu, em carta reivindicativa de 12 de julho de 2017, a revogação desde Despacho Normativo, admitindo, portanto, a vigência do mesmo.

E apesar de se entender que não é vinculativo, trata-se de um elemento determinante na fixação do alcance da cláusula em análise, quer porque foi emitido precisamente com esse objetivo inequívoco - fixar doutrinalmente um conceito inequívoco para o instituto do subsídio de turno, consagrado em vários instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, convencionais e administrativos, que têm dado lugar a interpretações desencontradas-, quer pelo contexto histórico que motivou a respetiva publicação.

Assim tem sido entendido pela jurisprudência que reconhece a obrigatoriedade de pagamento do subsídio de turno imposto em regulamentação coletiva de trabalho apenas quando os turnos apresentam variações de horário semanal ou em períodos inferiores, tendo decidido neste sentido, entre outros, o ac. do STJ de 10.02.1983, BMJ, n.º 324, pp. 486 e segs; ac. da RP de 22.01.1990, CJ, 1990, I, pp. 273 e segs. (onde se considerou que é indevido o subsídio de turno aos trabalhadores cuja variação do horário de trabalho seja quinzenal relativamente aos dois turnos que fazem em cada mês); ac. da RC de 11.06.1981, CJ, 1981, III, pp. 265 e segs; ac. da RL de 17.10.1990, relatado por Nunes Ferreira, disponível em www.dgs.pt e o ac. da RE de 26.09.2006, CJ, 2006, IV, pp. 257 e segs..

Na doutrina, Luís Miguel Monteiro também se pronuncia no mesmo sentido ao afirmar que É comum encontrar-se a previsão do subsídio de turno em instrumento de regulamentação coletiva. Na ausência desta previsão ou de estipulação das partes, aquele subsídio não é devido. De acordo com o Despacho Normativo n.º 182/77, de 30 de julho, ainda que previsto em instrumento de regulamentação coletiva, o direito ao subsídio de turno só deve ser pago aos trabalhadores que prestem serviço em regime de turnos rotativos e em que a rotação semanal de turno se dê pelo menos tantas vezes quantos os turnos previstos. Importa ainda sublinhar que o trabalhador por turnos que preste serviço em período noturno tem direito ao pagamento de retribuição especial pelo trabalho realizado naquele período (artigos 223.º e 266.º), exceto se lhe for atribuído subsídio de turno, o qual exclui, em princípio, a obrigação de pagamento daquela retribuição especial (Pedro Romano Martinez e outros, Código do Trabalho Anotado, Almedina, 11.º edição, 2017, pp. 578-579, anotação ao art.º 220.º).

Historicamente, a cláusula cuja interpretação se discute, mantém-se praticamente inalterada desde a sua previsão inicial na Base XVII da Portaria de Regulamentação do Trabalho para a Indústria Metalúrgica, publicada no BTE n.º 18/77, de 15 de maio, que dispõe o seguinte:

1 - Apenas é considerado trabalho em regime de turnos o prestado em turnos de rotação contínua ou descontínua, em que o trabalhador está sujeito às correspondentes variações de horário de trabalho;

(…);

7 - A prestação de trabalho em regime de turnos confere aos trabalhadores um direito a um complemento de retribuição, no montante de:

a) 15 % da retribuição de base efetiva no caso de trabalho em regime de dois turnos, de que apenas um seja total ou parcialmente noturno;

b) 25 % da retribuição de base efetiva no caso de trabalho em regime de três turnos, ou de dois turnos total ou parcialmente noturnos.

8 - O acréscimo de retribuição imposto nas alíneas do número anterior inclui a retribuição especial de trabalho como noturno;

Tratava-se, portanto, na respetiva génese, de uma norma regulamentar constante de uma fonte exclusivamente dimanada do governo (pelos Ministérios do Trabalho e do Plano e Coordenação Económica, da Indústria e Tecnologia).

Devido à deficiente redação da referida Base XVII e às dúvidas entretanto suscitadas, o Ministério do Trabalho veio fixar a interpretação do preceito que ele próprio elaborou, especificando as condições que conferem direito ao subsídio de turno, através do referido Despacho Normativo n.º 182/77 (registe-se que a Portaria foi publicada em 15 de maio e o Despacho Normativo que a veio interpretar de forma autêntica foi emitido em 30 de julho do mesmo ano de 1977).

E é também por este elemento histórico que a interpretação da atual versão da cláusula convencional referente ao trabalho em regime de turnos não pode dissociar-se da interpretação fixada pelo referido Despacho Normativo n.º 182/77, que a acompanhou praticamente desde o momento em que a mesma começou a ser aplicável ao sector metalúrgico, por força da dita Portaria de Regulamentação do Trabalho.

Na verdade, os diversos instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, emitidos após a Portaria de Regulamentação do Trabalho de maio de 1977, aplicáveis à indústria metalúrgica, mantiveram a redação da Base XVII, no pressuposto de que a mesma seria aplicável em conformidade com a interpretação realizada pelo Despacho Normativo que acompanhou a previsão normativa inicial, o que é um elemento crucial para apuramento do pretendido pelas partes outorgantes dos CCT ulteriores.

E esta constatação resulta inequívoca na referida carta que a AIMMAP remeteu ao ministro da Segurança Social e do Trabalho, Dr. Bagão Félix, em 2004, na qual expressou o seu entendimento de que a interpretação introduzida pelo Despacho Normativo n.º 182/77, de 16 de setembro de 1977, continua, atualmente, em vigor.

Mais releva na interpretação da cláusula, o processo negocial realizado em 2004/2005, com o Sindicato das Indústrias Metalúrgicas e Metalomecânicas dos Distritos de Coimbra e Leiria, por se tratar de uma iniciativa negocial promovida por um sindicato abrangido por um CCT do qual constava uma cláusula sobre o regime de turnos com o exato conteúdo da cláusula em apreço nos autos (cláusula 46.ª do CCT celebrado entre a AIMMAP e a FEQUIMETAL, publicado no BTE n.º 11 de 22.03.2002, com retificações publicadas no BTE n.º 17/2002 e alteração publicada no BTE n.º 15/2003).

Assim, resultou provado a este respeito que:

- em 2004/2005, na sequência de um acordo celebrado com o Sindicato das Indústrias Metalúrgicas e Metalomecânicas dos Distritos de Coimbra e Leiria (Acordo com a Administração da A... sobre o Regime de Turnos), após negociações conhecidas pela Direção Geral do Emprego e das Relações do Trabalho, a aceitou implementar um regime de turnos rotativos com uma periodicidade semanal, nos termos que constam da informação sindical de 31 de dezembro de 2004 junta a 218 verso, da qual consta, designadamente:

A Direção do sindicato e a Administração da A... chegaram a acordo quanto às bases em que deve ser regulada a prestação em regime de turnos.

Este acordo foi estabelecido no respeito pelos direitos adquiridos pelos trabalhadores envolvidos, e pelas condicionantes da organização do sector produtivo, nomeadamente:

- o facto da maioria dos trabalhadores ter a sua vida organizada em função dos horários que atualmente praticam;

- haver decorrido um significativo lapso de tempo desde a entrada em vigor dos turnos, situação registada para os 2 turnos desde fevereiro de 1994 e desde maio de 1996 para os 3 turnos;

- a obrigação de serem respeitados os comandos legais, nomeadamente o n.º 1 do artigo 173.º do Código do Trabalho (proibição da alteração unilateral dos horários de trabalho);

A empresa apresentou ainda as seguintes condições que foram aceites pelo sindicato:

- admitem a implementação de turnos rotativos;

- a rotação será com periodicidade semanal;

- serão integrados no regime de turnos de rotação semanal os trabalhadores que, voluntariamente, manifestarem a sua concordância;

- aos trabalhadores integrados no regime de 3 turnos de segunda a sexta-feira, será pago subsídio de turno no valor de 25% e para os que prestarem trabalho em 3 turnos com descanso semanal variável este subsídios será de valor superior;

- tendo em conta os encargos financeiros que resultará desta alteração, deverá ser seguido um método de implementação que não ponha em causa o equilíbrio da empresa;

Ponderados todos os fatores, as partes concluem que para a concretização deste objetivo, se deve seguir o seguinte método:

- os trabalhadores que desejam transitar para o regime de 3 turnos, com rotatividade semanal, deverão comunicar a sua vontade perante a Direção de Recursos Humanos, dentro do prazo que constará da informação a emitir pela administração nesse sentido;

- a empresa analisará todos os casos, que irá incluindo na escala de turnos de forma gradual e de maneira a não desestabilizar a produção, tendo em conta nomeadamente a necessidade de formação de equipas;

- os trabalhadores que não estejam interessados em transitar para turnos rotativos, mantêm o seu horário atual, continuando nestes casos a retribuição a ser  termos vigentes, ou seja, com o acréscimo previsto na lei para o trabalho noturno quando tal ocorra;

O sindicato, naturalmente, está disponível para prestar aos trabalhadores todos os esclarecimentos que julguem pertinentes.

- na sequência do acordo anteriormente referido seria eliminado o turno das equipas de fim de semana, por o mesmo se tornar desnecessário;

- no início do ano de 2005 a ré emitiu um comunicado, que consta da Ordem de Serviço 01/05 junta de fls. 1037 verso a 1039 cujos dizeres dou por integralmente reproduzidos, intitulada de Regime de Turnos, através da qual divulgou os princípios de funcionamento do regime de turnos estabelecidos entre a empresa e o Sindicato das Indústrias Metalúrgicas e Metalomecânicas dos Distritos de Coimbra e Leiria e convidou todos os trabalhadores interessados num esquema de rotação semanal a informarem a empresa até ao dia 15 de janeiro de 2005 e a participarem numa reunião a realizar no dia 7 de janeiro de 2005, com o objetivo de apresentar o novo sistema de horários de trabalho;

- findo o prazo de inscrição, apenas um trabalhador manifestou interesse em aderir aos turnos de rotação semanal;

- todos os restantes, nomeadamente os autores admitidos antes de janeiro de 2005, optaram por permanecer no regime então em vigor;

- por falta de adesão dos trabalhadores, a ré informou o sindicato e o único trabalhador inscrito que não havia condições para implementar tal regime de turnos por não existir um número mínimo de trabalhadores que se tivessem voluntariado para esse efeito;

Resulta desta factualidade, no essencial, que a ré decidiu implementar um regime de turnos rotativos com uma periodicidade mensal[2] e os trabalhadores que aderissem a este regime de trabalho por turnos beneficiariam de um subsídio de turno no valor de 25% da retribuição base ou de valor mais elevado no caso de prestarem trabalho num regime de três turnos com descanso semanal variável. Em consequência, seria eliminado o turno das equipas de fim de semana, por o mesmo se tornar desnecessário.

Porém, este regime assentava num princípio de voluntariedade, pelo que não chegou a ser implementado por ausência de trabalhadores voluntários em número suficiente, pois apenas um trabalhador aderiu ao mesmo.

E estipulou-se que os trabalhadores que não estivessem interessados em transitar para o regime de três turnos com rotação semanal, manteriam o horário de trabalho praticado até àquele momento, beneficiando, neste caso, apenas do acréscimo previsto para o trabalho noturno, o que efetivamente ocorreu.

Do que se retira, claramente, a interpretação que ambos - sindicato e empresa - faziam do disposto no CCT a que se encontravam vinculados: o subsídio de turno é devido quando o regime de turnos implicar mudanças de horário de variabilidade semanal.

Mas ainda mais relevante é o facto de o referido processo negocial ter envolvido diretamente os trabalhadores, através da comunicação geral escrita que consta da Ordem de Serviço n.º 01/05 e da reunião plenária de 7 de janeiro de 2005, que assim tiveram total conhecimento da interpretação realizada pela empresa e pelo sindicato no que concerne ao tipo de turnos que justifica o pagamento do respetivo subsídio, sem que tivesse ocorrido qualquer manifestação em sentido divergente.

E o mesmo se pode afirmar relativamente aos trabalhadores contratados após 2005, por força do conteúdo dos respetivos contratos de trabalho, que incluem uma cláusula em matéria de horário de trabalho que prevê que o trabalhador aceita prestar trabalho em regime diurno, noturno, de turnos fixos ou rotativos, de equipa de fim de semana, de trabalho suplementar e em regime de prevenção, considerando-se apenas turno, para efeito e atribuição de subsídio de turno, os horários com rotação semanal.

Quanto ao elemento racional e teleológico, resulta claro que o escopo visado pela cláusula controvertida é o de compensar a penosidade do trabalho por turnos com uma componente noturna, pois só há direito a subsídio de turno se, pelo menos, um dos turnos for total ou parcialmente noturno, definindo uma contrapartida cujo valor varia em função do maior ou menor número de horas de trabalho noturno.

Por outro lado, e como resultou provado, o regime de turnos mensais tem um impacto muito menor na saúde dos trabalhadores comparativamente com os turnos de rotação semanal, não implicando a mesma penosidade.

E terá sido este também o entendimento ministerial subjacente ao Despacho Normativo n.º 182/77, ao limitar o pagamento do subsídio de turno às modalidades de rotação semanal ou inferior.

Em suma, da conjugação dos diversos critérios hermenêuticos anteriormente escalpelizados, resulta que o subsídio de turno previsto na cláusula 57.ª, 4 do CCT AIMMAP-SINDEL apenas é devido quando o trabalhador efetue turnos de rotação semanal ou inferior.

Na ré vigora o seguinte sistema:

» os trabalhadores afetos ao regime de trabalho por turnos rodam mensalmente por 2 ou por 3 turnos, conforme o sector a que estejam afetos, por forma a que só troquem de turno após o termo de cada mês;

» os trabalhadores, para adequar o horário de trabalho às suas preferências, podem acordar com os colegas do mesmo posto o horário a praticar, trocando de turno, e, por sua iniciativa ou da empresa, podem mudar de posto de trabalho, mediante o acordo do respetivo supervisor;

» os trabalhadores da ré, incluindo os autores, sempre puderam, se lhes for conveniente e com autorização da chefia, alterar entre si as escalas e os turnos de laboração - as ditas trocas;

» este sistema permite que haja trabalhadores, incluindo os autores, que se mantenham no mesmo turno durante meses e até mesmo anos;

» a composição dos diferentes turnos na ré nunca foi igual, havendo um número irregular e desigual de trabalhadores repartidos entre diferentes turnos, pelo que os postos de trabalho não são ocupados sucessivamente em todos os turnos;

» os dias de descanso semanal dos autores são sempre os mesmos: sábado e domingo;

Do que ressalta que:

- os autores não efetuam turnos de rotação semanal ou inferior;

- em alguns caso não existe sequer rotação porque os mesmos postos de trabalho não são ocupados sucessivamente em todos os turnos e alguns autores permanecem meses e até anos no mesmo turno;

- e a existir rotação de turnos pelos autores, esta rotação é apenas mensal;

E assim sendo, não é devido aos autores o pagamento do subsídio de turno previsto na cláusula 57.ª do CCT AIMMAP-SINDEL por não se verificar o respetivo pressuposto de rotação de turnos semanal ou inferior.

Consequentemente, a ação improcede in totum e procede o pedido reconvencional principal.” fim de citação.

Como já ficou dito, os Autores não se conformam com esta decisão, no entanto, desde já avançamos que não lhes assiste razão.

Na verdade, tendo em conta a matéria de facto apurada, dúvidas não existem de que os Autores não trabalham por turnos rotativos semanais ou de duração inferior, sendo certo que quando há rotação a mesma é mensal, permitindo o sistema da Ré que os AA. mantenham o mesmo turno durante meses e até anos e, porque a composição dos turnos na Ré nunca foi igual, os postos de trabalho não são ocupados sucessivamente em todos os turnos.

Por outro lado, acompanhamos a sentença recorrida na interpretação do n.º 4 da cláusula 57.ª da CCT celebrada entre a AIMMAP e o SINDEL, em consonância com o parecer junto aos autos, pouco mais se impondo dizer.

Desta forma, não assiste qualquer razão aos recorrentes quando alegam que a “interpretação” consagrada no Despacho Normativo n.º 182/77 corresponde a uma “solução” legal e constitucionalmente inaceitável, sendo que, não vislumbramos que a mesma incorra na invocada violação do princípio da igualdade ou do princípio de que para trabalho igual salário igual (artigos 13.º e 59.º, n.º 1, a), da CRP).

Mesmo que se entenda que tal Despacho, ainda em vigor, não tem natureza vinculativa, pelos motivos expressos na sentença recorrida, o mesmo é um elemento determinante na interpretação da cláusula 57.ª da CTT aplicável, posto que, foi emitido precisamente com o objetivo de fixar doutrinalmente um conceito inequívoco para o instituto do subsídio de turno, consagrado em vários instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho, convencionais e administrativos, que têm dado lugar a interpretações desencontradas, nos seguintes termos:

Apenas têm direito ao subsídio de turno, no montante constante da norma que o consagre, os trabalhadores que prestem serviço nas seguintes circunstâncias, cumulativamente:

a) Em regime de turnos rotativos (de rotação contínua ou descontínua);

b) Com um número de variantes de horário de trabalho semanal igual ou superior ao número de turnos a que se refere o subsídio de turno considerado;

Quanto ao pretenso “acordo” com um dado sindicato, como alegam os recorrentes, a sentença mais não fez do que relevar na interpretação da cláusula supra referida, o processo negocial realizado em 2004/2005 e que resultou provado.

Ao contrário do alegado pelos AA., a sentença recorrida não ignorou por completo o elemento da “ratio legis”, distinguindo onde a norma de todo não distingue, criando uma artificial e totalmente infundada distinção entre a modelação temporal semanal e a quinzenal ou mensal.

Na verdade, na interpretação da cláusula 57.ª da CTT foram analisados os elementos literal, sistemático, histórico e teleológico, tendo-se ponderado que o escopo visado por aquela é o de compensar a penosidade do trabalho por turnos com uma componente noturna e, como resultou provado, que o regime de turnos mensais tem um impacto muito menor na saúde dos trabalhadores comparativamente com os turnos de rotação semanal, não implicando a mesma penosidade.

Em suma, tal como consta da sentença recorrida, uma vez que os Autores não trabalham em turnos de rotação semanal ou inferior, não lhes é devido o subsídio de turno previsto na cláusula 57.ª da CCT celebrada entre a AIMMAP e o SINDEL.

*

Improcedem, assim, as conclusões formuladas pelos AA. recorrentes, impondo-se a manutenção da sentença recorrida em conformidade.

*

*                                                       

IV – Sumário[3]

(…).

*

*

V – DECISÃO

Nestes termos, sem outras considerações, na improcedência do recurso acorda-se em manter a sentença recorrida.
*
*

Custas a cargo dos AA. recorrentes.

                                                             *

                                                             *

                                                                                              Coimbra, 2023/03/24

(Paula Maria Roberto)

(Mário Rodrigues da Silva)

(Felizardo Paiva)





[1] Relatora – Paula Maria Roberto
  Adjuntos – Mário Rodrigues da Silva
                    – Felizardo Paiva

[2] Consta mensal ao invés de semanal, certamente, por lapso.
[3] O sumário é da responsabilidade exclusiva da relatora.