Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
4488/11.6TBLRA-J.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MARIA INÊS MOURA
Descritores: CONTRATO PROMESSA
INSOLVÊNCIA
RECUSA DE CUMPRIMENTO
INDEMNIZAÇÃO
Data do Acordão: 06/03/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: LEIRIA 1º JUÍZO CÍVEL
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE
Legislação Nacional: ARTS102, 104, 106 CIRE
Sumário: 1.Em contrato promessa ao qual não foi conferido eficácia real e não tendo havido tradição da coisa, havendo recusa por parte do Administrador em cumprir o contrato promessa, o artº 106 nº 2 do CIRE manda aplicar o regime do artº 104 nº 5, que remete para os efeitos do artº 102 nº 3 do mesmo diploma com a especificidade aí referida.

2. A outra parte tem assim direito a exigir, como crédito sobre a insolvência, não só o valor da prestação do devedor, na parte incumprida, deduzido do valor da contraprestação correspondente que ainda não tenha sido realizada, nos termos do artº 102 nº 3 al. c), mas ainda um crédito resultante da diferença, se positiva, entre o montante das prestações ou rendas previstas até final do contrato, actualizadas para a data da declaração de insolvência e o valor da coisa na data da recusa, nos termos do artº 104 nº 5.

Decisão Texto Integral: Acordam na 2ª secção do Tribunal da Relação de Coimbra

I. Relatório

A Autora O (…) S.A., vem intentar a presente acção de verificação ulterior de créditos, sob a forma de processo sumário contra a Massa Insolvente da A (…), S.A., os demais credores da referida massa e a própria devedora S (…), S.A., pedindo o reconhecimento do seu crédito de € 280.000,00 e a sua graduação como crédito garantido.

Alega, em síntese, que celebrou com a A (…) S.A. dois contratos promessa de compra e venda de dois imóveis, tendo igualmente sido celebrados dois contratos de hipoteca; por via de tais contratos promessa, e aí figurando na qualidade de promitente compradora entregou à promitente vendedora como sinal e princípio de pagamento o valor de € 130.000,00 relativamente a cada um dos contratos; a fim de garantir o cumprimento de tais contratos a promitente vendedora constitui a favor da autora., hipoteca voluntária sobre os imóveis prometidos vender; a promitente vendedora foi declarada insolvente e os contratos promessa não foram cumpridos, atendendo a que notificado o Administrador para se pronunciar sobre tal cumprimento o mesmo primeiro pediu prazo e nada mais disse. Conclui que tem direito a receber o montante de € 280.000,00 que correspondem € 260.000,00 ao sinal prestado e € 20.000,00 ao valor actual da coisa.

Citados os RR., contestou apenas a Massa Insolvente concluindo pela prescrição do direito da A., pela caducidade de exercer o respectivo direito, requerendo a declaração de resolução dos contratos promessa de compra e venda e escrituras de hipoteca.

Respondeu a A. arguindo a intempestividade da contestação e requereu a ampliação do pedido, tendo-lhe respondido a Massa Insolvente.

Procedeu-se à elaboração do despacho saneador, onde se julgou tempestiva a contestação, indeferiu-se a ampliação do pedido, concluiu-se pela inexistência de caducidade e prescrição e elaborou-se a competente base instrutória e selecionando-se também os factos assentes.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, dentro do estrito formalismo legal.

Foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, julgando verificado o crédito da A. sobre a insolvente A (…), S.A. no montante de € 260.000,00, sendo comum no valor de € 130.000,00 e garantido por hipoteca sobre o imóvel identificado no montante de € 130.000,00 não se reconhecendo o remanescente do crédito reclamado de € 20.000,00.

É com esta sentença que a A. não se conforma na totalidade e dela vem interpor recurso, apresentando para o efeito as seguintes conclusões:

A. Nos termos dos artigos 104.º, n.º 5 e 106.º, n.º 2 do CIRE, atendendo a que a Autora assumia a posição de promitente-compradora, esta tem direito a receber uma indemnização que corresponda à diferença entre o valor do imóvel à data da recusa e o valor das prestações que, de acordo com o contrato promessa, faltasse pagar por parte do promitente-comprador, i.e., da Autora.

B. Assim, a Autora detém um crédito sobre a insolvência de € 140.000,00, por cada um dos contratos promessa que celebrou com a Insolvente e que resulta da seguinte equação: Crédito da Autora = Valor do imóvel à data da recusa – Valor do preço que falta pagar.

C. O Tribunal a quo entendeu que a Autora apenas tem direito a que lhe seja devolvido o preço que pagou. Esta posição não tem cobertura nos artigos 104.º, n.º 5 e 106.º, n.º 2 do CIRE.

D. Se o legislador quisesse que neste tipo de contexto o promitente-comprador apenas tivesse direito ao preço que pagou, teria necessária e simplesmente escrito que o promitente-comprador teria direito a ver devolvido tudo aquilo que entregou ao promitente vendedor que entretanto foi declarado insolvente, o que não acontece, pelo que a interpretação que o Tribunal a quo faz da conjugação dos artigos 104.º, n.º 5 e 106.º, n.º 2 do CIRE é incorrecta.

E. O entendimento jurisprudencial sobre esta matéria é o de que “Tratando-se de contrato-promessa, como no caso, o credor (promitente comprador) tem direito à diferença (se positiva) entre os valores das duas prestações – uma equivalente ao valor do contrato (na data da recusa de cumprimento do contrato-promessa) - e a outra equivalente ao montante do preço convencionado (actualizado à data da declaração de insolvência), acrescido do sinal em singelo”.

F. Para além da devolução do sinal que pagou, o promitente comprador tem direito a uma compensação que se traduz em receber a diferença entre o valor do imóvel à data da recusa e o preço convencionado no contrato promessa. Logo, a Autora/Recorrente tem direito a receber, nos termos dos artigos 104.º, n.º 5 e 106.º, n.º 2 do CIRE, a quantia de €280.000,00 da insolvente resultante da recusa por parte do administrador de insolvência em celebrar os dois contratos prometidos dos autos.

Não foram apresentadas contra-alegações.

II. Questões a decidir

Tendo em conta o objecto do recurso delimitado pela Recorrente nas suas conclusões - artº 635 nº 4 e artº 639 nº 1 a 3 do C.P.C.- salvo questões de conhecimento oficioso- artº 608 nº 2 in fine.

- do direito da A. a receber uma indemnização correspondente à diferença entre o valor do imóvel à data da recusa do cumprimento e o valor das prestações que, de acordo com o contrato-promessa, faltam pagar, nos termos do artº 104 nº 5 e 106 nº 2 do CIRE.

III. Fundamentos de Facto

Não tendo sido impugnada a matéria de facto e não havendo lugar a qualquer alteração, tendo em conta o disposto no artº 663 nº 6 do C.P.C., remete-se para os termos da decisão da 1ª instância, que considerou provados os seguintes factos:

1- No dia 11 de Agosto de 2011, a Autora celebrou com a A (…) S.A, um acordo designado pelas partes de “contrato de promessa de compra e venda de imóvel” no qual e além do mais que aqui se dá por integralmente reproduzido se deixou escrito:

“Entre A (…) S.A… doravante abreviadamente designada por promitente vendedora. O (…) S.A…doravante abreviadamente designada por promitente comparadora Doravante designadas conjuntamente por “Parte” Considerando que:

I- Que a promitente vendedora é proprietária de um prédio urbano, com a área total de 1.880m2, (mil oitocentos e oitenta metros quadrados) 107,8 m2 (cento e sete vírgula oito metros quadrados) dos quais de área coberta e 1.772,2m2 (mil setecentos e setenta e dois metros quadrados) de área descoberta, situado na Estrada Nacional 3, Km 46,6, (...), na freguesia da (...), inscrito na matriz predial urbana da freguesia de (...) sob o artigo (...) e descrito na Conservatória do Registo Predial de Santarém sob o número (...), com o alvará de licença de utilização número (...), emitido pela Câmara Municipal de Santarém em 16 de Maio de 2000, onde funciona um posto de abastecimento de combustível, doravante abreviadamente designado por “Prédio”.

II- Que sobre o Prédio não existem quaisquer ónus e encargos.

III- Que a promitente vendedora pretende vender e a promitente compradora pretende adquirir a propriedade do prédio de acordo com os termos e condições estabelecidos no presente contrato-promessa (doravante designado por “Contrato Promessa”).

É livremente estabelecido e mutuamente aceite, nos termos e condições infra, o presente contrato-promessa de compra e venda, que se rege pelos considerandos acima e pelas cláusulas seguintes:

Cláusula 1ª…

Cláusula 2ª (Objecto)

1- A promitente vendedora promete vender à promitente compradora que promete comprar o prédio ou quem esta indicar, livre de quaisquer ónus ou encargos, incluindo os equipamentos identificados no Anexo I ao presente contrato-promessa

2- A promitente vendedora compromete-se a entregar à promitente compradora

todos os elementos de que disponha relativamente ao prédio e a diligenciar tudo o que dela dependa no sentido do cabal e tempestivo cumprimento deste contrato promessa de compra e venda.

Cláusula 3ª (Preço)

1- O preço do prédio incluindo os equipamentos identificados no Anexo I. será de € 130.000,00 (cento e trinta mil euros)

2- O valor mencionado no nº 1 da presente cláusula será pago pela promitente compradora à promitente vendedora na data da celebração do presente contrato promessa, a título de sinal e princípio de pagamento dando a promitente vendedora quitação em documento autónomo ao presente contrato.

3- Como garantia do exacto e pontual cumprimento das obrigações da promitente vendedora resultantes do presente contrato promessa na presente data e contra o pagamento do sinal, a promitente vendedora obriga-se a constituir uma hipoteca sobre o prédio nos termos previstos na cláusula 6ª infra.

Cláusula 4ª…

Cláusula 5ª…

Cláusula 6ª…

Cláusula 7ª…

Cláusula 8ª…

O presente contrato promessa é feito em 2 exemplares, um para cada uma das partes devidamente rubricados e assinados, celebrado em Lisboa, aos onze dias do mês de Agosto de 2011.

Pela promitente vendedora

(…))

Pela promitente compradora

(…)

2- As assinaturas dos outorgantes acima referidos foram reconhecidas na data ai indicada no Cartório Notarial (…).

3- No dia 11 de Agosto de 2011 a A (…) S.A. emitiu um documento com o seguinte conteúdo:

“A (…) S.A….neste acto devidamente representada por (…), na qualidade de administradores com poderes para o acto, declara ter recebido, na presente data, da sociedade comercial anónima O (…) …. a título de sinal, de acordo com o previsto no número 2 da cláusula 3ª do contrato promessa de compra e venda celebrado nesta data para aquisição do prédio urbano, com a área total de 1.880 metros quadrados, sito na Estrada Nacional nº 3, Km 46,6, em Terra de Bago de Milho, Abrantes (...) sob o artigo nº (...), e descrito na Conservatória do Registo Predial de Santarém sob o nº (...), com alvará de licença de utilização número (...), emitida pela Câmara Municipal de Santarém em 16 de Maio de 2000, onde funciona um posto de abastecimento de combustível. Mais declara que o pagamento foi efectuado através de transferência bancária para a conta nº 000801584721, junto do Banco BES, da qual a Declarante é titular exclusivo”

Lisboa 11 de Agosto de 2011.

Pela declarante

(…)

4- As assinaturas dos referidos em 3) foram reconhecidas na data aí indicada no Cartório Notarial de (…).

5- No dia 11 de Agosto de 2011 no Cartório Notarial de (…)em Lisboa, foi reduzido a escrito um documento intitulado de “hipoteca” no qual e além do mais que aqui se dá por integralmente reproduzido se deixou escrito:

“Primeiro – (…) Que outorgam na qualidade de únicos administradores e em nome e representação da sociedade anónima com a firma “A (…)S.A”….

Segundo – (…)Que outorgam na qualidade de administradores e em nome e representação da sociedade comercial anónima com a firma “O (…) S.A”…

Pelos primeiros outorgantes, nas qualidades em que figuram, foi dito: Que, são donos e legítimos possuidores do prédio urbano destinado a posto de

abastecimento de combustíveis e edifício de apoio, sito em (...), freguesia de (...), concelho de Santarém, descrito na Conservatória do Registo Predial de Santarém, sob o número trezentos e noventa da dita freguesia, registado a seu favor, pela apresentação trinta e dois, de trinta de Julho de mil novecentos e noventa e nove, inscrito na respectiva matriz, sob o artigo seiscentos e trinta e sete a que atribuem valor de cento e trinta mil euros.

Que pela presente escritura, eles primeiros outorgantes, em nome da dita “A (...) e em cumprimento das obrigações assumidas no Contrato Promessa de Compra e Venda, celebrado hoje, constituem hipoteca voluntária a favor da “O (…)”, sobre o imóvel atrás mencionado, para garantia do pagamento de todas e quaisquer quantias, de que a “A (…) seja ou venha a ser devedora, perante a “O (…)” até ao valor de duzentos e sessenta mil euros, provenientes de todas e quaisquer operações em direito permitidas, que

derivem do referido contrato.

Que a presente hipoteca garante ainda o pagamento de juros à taxa de juro comercial legal, que para efeitos de registo se fixa em quatro por cento, de despesas judiciais e extrajudiciais que a “OZ Energia” houver de fazer para se ressarcir dos seus créditos, as quais igualmente para efeitos de registo, se computam em oito mil e oitocentos euros, sendo pois, o montante máximo assegurado de capital e acessórios de Trezentos Mil Euros.

Que a hipoteca ora constituída, abrange todas as construções, benfeitorias e acessões, presentes e futuras, que ocorram ou forem efectuadas no imóvel hipotecado pelo que eles primeiros outorgantes, em nome da Sociedade sua representada se obrigam a proceder aos respectivos averbamentos junto das entidades públicas competentes.

Que a presente hipoteca se rege ainda pelas seguintes cláusulas:

1…

2…

3…

4…

5…

Pelos segundos outorgantes, nas qualidades em que figuram, foi dito:

Que, para a sociedade que representam, aceitam a presente hipoteca nos termos exarados. …”

Constam as assinaturas dos outorgantes e do notário.

6- Pela apresentação 2596 de 2011/08/12 encontra-se registada hipoteca voluntária sobre o prédio referido em 5) capital assegurado de € 260.000,00, montante máximo assegurado de € 300.000,00 sendo sujeito activo de tal ónus O (…)S.A. e sujeito passivo A (…) S.A., a qual registou a seu favor a aquisição de tal prédio pela 32 de 1999/07/30.

7- No dia 11 de Agosto de 2011, a Autora celebrou com a A (…)S.A, um acordo designado pelas partes de “contrato de promessa de compra e venda de imóvel” no qual e além do mais que aqui se dá por integralmente reproduzido se deixou escrito:

“Entre A (…) S.A… doravante abreviadamente designada por promitente vendedora.

O (…) S.A…doravante abreviadamente designada por promitente comparadora Doravante designadas conjuntamente por “Parte”

Considerando que:

I- Que a promitente vendedora outorgou nesta data escritura de Justificação Notarial de aquisição por usucapião do prédio urbano, com a área total de 400 metros quadrados, sito na Estrada Nacional 118 Km, 139,8, na freguesia do (...), em Abrantes, Santarém, inscrito na matriz predial urbana da freguesia do (...) sob o artigo (...), com o alvará de licença de utilização número (...), emitida pela Câmara Municipal de Abrantes de 14 de Dezembro de 1995, onde funciona um posto de abastecimento de combustível, o qual se encontra omisso na Conservatória do Registo Predial competente, doravante abreviadamente designado por “prédio”;

II- Que o presente contrato deixará de produzir efeitos caso não seja obtido pela Promitente Vendedora, o registo definitivo da aquisição da propriedade por Usucapião do Prédio;

III- Que sobre o prédio à data da Justificação Notarial e consequente registo de aquisição definitiva por usucapião não existem quaisquer ónus ou encargos;

IV- Que a Promitente Vendedora pretende vender e a Promitente Compradora pretende adquirir a propriedade do prédio de acordo com os termos e condições estabelecidos no presente contrato-promessa (doravante designado por “contrato promessa”;

É livremente estabelecido e mutuamente aceite, nos termos e condições infra, o presente contrato-promessa de compra e venda, que se rege pelos considerandos acima e pelas cláusulas seguintes:

Cláusula 1ª…

Cláusula 2ª (Objecto)

1- A promitente vendedora promete vender à promitente compradora que promete comprar o prédio ou quem esta indicar, livre de quaisquer ónus ou encargos, incluindo os equipamentos identificados no Anexo I ao presente contrato-promessa

2- A promitente vendedora compromete-se a entregar à promitente compradora

todos os elementos de que disponha relativamente ao prédio e a diligenciar tudo o que dela dependa no sentido do cabal e tempestivo cumprimento deste contrato promessa de compra e venda.

Cláusula 3ª (Preço)

1- O preço do prédio incluindo os equipamentos identificados no Anexo I. será de € 130.000,00 (cento e trinta mil euros)

2- O valor mencionado no nº 1 da presente cláusula será pago pela promitente compradora à promitente vendedora na data da celebração do presente contrato promessa, a título de sinal e principio de pagamento dando a promitente vendedora quitação em documento autónomo ao presente contrato.

3- Como garantia do exacto e pontual cumprimento das obrigações da promitente vendedora resultantes do presente contrato promessa na presente data e contra o pagamento do sinal, a promitente vendedora obriga-se a constituir uma hipoteca sobre o prédio nos termos previstos na cláusula 7ª infra.

Cláusula 4ª…

Cláusula 5ª…

Cláusula 6ª…

Cláusula 7ª…

Cláusula 8ª…

Cláusula 9ª…

O presente contrato promessa é feito em 2 exemplares, um para cada uma das partes devidamente rubricados e assinados, celebrado em Lisboa, aos onze dias do mês de Agosto de 2011.

Pela promitente vendedora

(…)

Pela promitente compradora

(…)

8- As assinaturas dos outorgantes acima referidos foram reconhecidas na data ai indicada no Cartório Notarial de (…).

9- No dia 11 de Agosto de 2011 a A (…) S.A. emitiu um documento com o seguinte conteúdo:

“A (…) S.A….neste acto devidamente representada por (…), na qualidade de administradores com poderes para o acto, declara ter recebido, na presente data, da sociedade comercial anónima O (…)…. a título de sinal, de acordo com o previsto no número 2 da cláusula 3ª do contrato promessa de compra e venda celebrado nesta data para aquisição do prédio urbano, com a área total de 400 metros quadrados, sito em Abrantes, Santarém inscrito na matriz predial urbana da freguesia do (...) sob o artigo nº (...), com alvará de licença de utilização número (...), emitida pela Câmara Municipal de Abrantes em 14 de Dezembro de 1995, onde funciona um posto de abastecimento de combustível. Mais declara que o pagamento foi efectuado através de transferência bancária para a conta nº 000801584721, junto do Banco BES, da qual a Declarante é titular exclusivo”

Lisboa 11 de Agosto de 2011.

Pela declarante

(…)

10- As assinaturas dos referidos em 9) foram reconhecidas na data ai indicada no Cartório Notarial de (…).

11- No dia 11 de Agosto de 2011 no Cartório Notarial de (…) em Lisboa, foi reduzido a escrito um documento intitulado de “hipoteca” no qual e além do mais que aqui se dá por integralmente reproduzido se deixou escrito:

“Primeiro – (…) Que outorgam na qualidade de únicos administradores e em nome e representação da sociedade anónima com a firma A (…)S.A”….

Segundo – (…)Que outorgam na qualidade de administradores e em nome e representação da sociedade comercial anónima com a firma “O (…)S.A”…

Pelos primeiros outorgantes, nas qualidades em que figuram, foi dito:

Que, são donos e legítimos possuidores do prédio urbano – Instalações para comércio de combustíveis, constituído por casa de rés-do-chão com divisão e duas casas de banho; duas bombas duplas para fornecimentos; quatro tanques de armazenamento enterrados e logradouro, sito na Estrada Nacional cento e dezoito (ao quilómetro cento e trinta e nove vírgula oito) lugar e freguesia de (...), concelho de Abrantes, com a área total de quatrocentos metros quadrados, sendo dezoito metros quadrados de superfície coberta e trezentos e oitenta e dois metros de quadrados de logradouro, a confrontar de norte com Estrada Nacional cento e dezoito, do sul e poente com A(…) Lda, e do nascente com Vicente Moreira Moreno e outros, não descrito na Conservatória do Registo Predial de Abrantes, inscrito na respectiva matriz sob o artigo dois mil seiscentos e dezoito a que atribuem o valor de cento e trinta mil euros.

Que o referido prédio ainda não se encontra devidamente registado em seu nome na competente Conservatória do Registo Predial, em virtude do mesmo ter sido por ela adquirido, hoje por escritura de Justificação por Usucapião, lavrada a folhas 29 e seguintes deste livro.

Que pela presente escritura, eles primeiros outorgantes, em nome da dita “A (...) e em cumprimento das obrigações assumidas no Contrato Promessa de Compra e Venda, celebrado hoje, constituem hipoteca voluntária a favor da “O (…) sobre o imóvel atrás mencionado, para garantia do pagamento de todas e quaisquer quantias, de que a “A (…)” seja ou venha a ser devedora, perante a “O (…)” até ao valor de duzentos e sessenta mil euros, provenientes de todas e quaisquer operações em direito permitidas, que derivem do referido contrato.

Que a presente hipoteca garante ainda o pagamento de juros à taxa de juro comercial legal, que para efeitos de registo se fixa em quatro por cento, de despesas judiciais e extrajudiciais que a “O (…)” houver de fazer para se ressarcir dos seus créditos, as quais igualmente para efeitos de registo, se computam em oito mil e oitocentos euros, sendo pois, o montante máximo assegurado de capital e acessórios de Trezentos Mil Euros.

Que a hipoteca ora constituída, abrange todas as construções, benfeitorias e acessões, presentes e futuras, que ocorram ou forem efectuadas no imóvel hipotecado pelo que eles primeiros outorgantes, em nome da Sociedade sua representada se obrigam a proceder aos respectivos averbamentos junto das entidades públicas competentes.

Que a presente hipoteca se rege ainda pelas seguintes cláusulas:

1…

2…

3…

4…

5…

Pelos segundos outorgantes, nas qualidades em que figuram, foi dito:

Que, para a sociedade que representam, aceitam a presente hipoteca nos termos exarados. …”

Constam as assinaturas dos outorgantes e do notário

12- Pela apresentação 313 de 2011/10/26 foi registada hipoteca voluntária sobre o prédio referido em 11) com capital assegurado de € 260.000,00, montante máximo assegurado de € 300.000,00 sendo sujeito activo de tal ónus O (…) S.A. e sujeito passivo A (…) S.A., a qual registou a aquisição de tal prédio a seu favor pela apresentação nº (...)de 2011/09/26.

13- A A (…) S.A. apresentou-se à insolvência em 16 de Agosto de 2011 e foi declarada insolvente por sentença de 08 de Setembro de 2011.

14- Em 28 de Maio de 2012 o Administrador Judicial da R. Massa Insolvente da A (…) S.A. enviou à Autora uma missiva com o seguinte conteúdo:

“Assunto : Processo nº 4488/11.6TBLRA

Insolvência de A (…) S.A.

Comunicação de resolução de negócio em benefício da Massa Insolvente

Exmos Senhores,

Na qualidade de Administrador de Insolvência nomeado no processo identificado em epígrafe, venho por este meio, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 123º do CIRE, comunicar a resolução do contrato de hipoteca celebrado com V/Exa. com a insolvente, que se encontra registado sob a AP. 2596 de 2011/08/12, sobre o prédio abaixo identificado, tendo em conta que se verifica a conjugação das disposições dos artigos 120ç e 121º nº,1 al. c) do Cire, ou seja, trata-se da constituição pelo devedor de garantias reais relativas a obrigações pré-existentes ou de outras que as substituem, realizado no período de seis meses anteriores à data do inicio do processo de insolvência, pelo que, se considera prejudicial à Massa Insolvente, uma vez que podem diminuir, frustrar, dificultar, por em perigo ou retardar a satisfação dos credores da insolvência.

Prédio urbano correspondente a edifício destinado a posto de abastecimento de combustíveis, e edifício de apoio, sito em (...), inscrito na matriz predial sob o nº (...) e descrito na conservatória sob o nº (...)/19990730, da freguesia de (...) concelho de Santarém.

Acresce que tal ato de disposição do património da empresa, realizado no período de seis meses anteriores à declaração de insolvência, resultou na diminuição da garantia patrimonial dos credores em geral e bem assim na frustração da satisfação dos credores da insolvência, pelo que tal contrato, de acordo com os supracitados preceitos legais, é resolúvel em beneficio da Massa Insolvente.

Assim, e na qualidade de Administrador de Insolvência de A (…)S.A., nos termos do disposto nos art. 120º e 121º do CIRE, declaro em beneficio da Massa Insolvente, a resolução do contrato de hipoteca supra referido, pelo que, não se reconhecendo tal contrato, é o mesmo ineficaz relativamente à Massa Insolvente”

15- Em 30 de Maio de 2012 a Autora enviou ao Administrador Judicial da Massa Insolvente a missiva constante de fls. 67 na qual e além do mais que aqui se dá por integralmente reproduzido se deixou escrito:

“Em face do exposto a O (…).A. solicita a V.Exa. que a informe, nos termos dos artigos 102º e 106º do CIRE e no prazo de 15 dias, se pretende cumprir com os contratos promessa ora identificados, caso em que a O (…)S.A. desencadeará o procedimento previsto nos ditos contratos para a realização das respectivas escrituras”

16- Em carta enviada à Autora a 10 de Setembro de 2012, e por aquela recebia a 12 de Setembro de 2012 veio o Administrador Judicial da Massa Insolvente dizer:

“ Na qualidade de Administrador da Insolvência nomeado no processo identificado em epígrafe, em resposta à V/Comunicação de 30/05/2012, e na sequência do anteriormente conversado, venho por este meio, solicitar a prorrogação do prazo para me pronunciar nos termos do art. 102º do CIRE por um período de 30 dias relativamente aos contratos promessa celebrados sobre os imóveis abaixo identificados:

a)…

b)…

Certo da V/Melhor atenção quanto ao exposto, voltarei ao V/Contacto dentro do referido prazo”.

17- Após a carta referida em 16) o Administrador Judicial da Massa Insolvente nada mais disse.

18- Em Outubro de 2012 o valor dos prédios identificados em 1) e 7) ascendia ao valor de € 140.000,00 relativamente a cada um deles.

19- Os prédios referidos em 1) e 7) foram sujeitos a contratos de arrendamento celebrados entre a A (…). e a Sociedade O (…), em 11 de Agosto de 2011 e pelo período de 10 anos, ai passando a referida (…)a explorar as respectivas bombas de combustíveis.

20- No dia referido em 11, a O (…). pagou à A (…) S.A. o valor de € 59.040,00 correspondente a 24 meses de renda.

21- Foram transferidos em 11 de Agosto de 2011 da Autora para a A (…)S.A € 260.000,00 e da O (…). para a A (…). € 59.040,00.

22- Foram transferidos em 11 de Agosto de 2011 da AA (…)S.A. para a Termo de acesso € 319.039,00.

23- Foram transferidos em 11 de Agosto de 2011 da Termo de Acesso Lda. para a O (…) LDA. € 308.462,00.

24- Os contratos promessa de compra e venda acima referidos e bem assim o contrato de arrendamento supra mencionado foram assinados, pelo lado dos promitentes compradores e pelo lado dos arrendatários, (…)na aí designada qualidade de administradores e gerentes, respectivamente.

IV. Razões de Direito

- do direito da A. a receber uma indemnização correspondente à diferença entre o valor do imóvel à data da recusa do cumprimento e o valor das prestações que, de acordo com o contrato-promessa, faltam pagar, nos termos do artº 104 nº 5 e 106 nº 2 do CIRE.

A decisão recorrida considerou que o crédito da A. corresponde ao valor por ela entregue no âmbito dos contratos promessas celebrados, num total de € 260.000,00 e não ao valor de € 280.000,00 por ela reclamado.

Alega a A./Recorrente que devido ao facto do valor dos imóveis prometidos vender ser de € 140.000,00 cada, à data do incumprimento, em lugar dos € 130.000,00 que lhes foi atribuído pelas partes quando da realização do contrato promessa, o seu crédito ascende à quantia de € 280.000,00 por força do disposto nos artº 104 nº 5 e 106 nº 2 do CIRE em lugar dos € 260.000,00 determinados pelo tribunal a quo.

Vejamos o regime legal aplicável, socorrendo-nos das normas que constam do CIRE e que respeitam a esta matéria específica.

Desde logo, o artº 102 do CIRE vem estabelecer no seu nº 1 o princípio geral quanto a negócios não cumpridos à data da declaração de insolvência, estipulando que o cumprimento fica suspenso até que o administrador da insolvência declare optar pela execução ou recusar o cumprimento. O nº 3 deste artigo, vem regular as consequências da opção pelo não cumprimento por parte do Administrador, prevendo a al. c) que a outra parte tem direito a exigir, como crédito sobre a insolvência, o valor da prestação do devedor, na parte incumprida, deduzido do valor da contraprestação correspondente que ainda não tenha sido realizada.

Com referência ao contrato promessa regula o artº 106 do CIRE, que no seu nº 2 dispõe que: “À recusa de cumprimento de contrato-promessa de compra e venda pelo administrador da insolvência é aplicável o disposto no nº 5 do artigo 104º, com as necessárias adaptações, quer a insolvência respeite ao promitente-comprador quer ao promitente-vendedor.”

Por seu turno, o artº 104 nº 5 do CIRE, para o qual aquela norma remete, diz-nos que: “Os efeitos da recusa de cumprimento pelo administrador, quando admissível, são os previstos no nº 3 do artigo 102º, entendendo-se que o direito consignado na respectiva alínea c) tem por objecto o pagamento, como crédito sobre a insolvência, da diferença, se positiva, entre o montante das prestações ou rendas previstas até final do contrato, actualizadas para a data da declaração de insolvência por aplicação do estabelecido no nº 2 do artigo 91º, e o valor da coisa na data da recusa, se a outra parte for o vendedor ou o locador, ou da diferença, se positiva, entre este último valor e aquele montante, caso ela seja o comprador ou o locatário.”

Já com referência aos factos que resultaram provados, está adquirido nos autos que a A. e a Insolvente celebraram dois contratos promessa de compra e venda, com referência aos dois imóveis identificados no processo, estabelecendo para cada um dos prédios o valor de venda de € 130.000,00 e tendo a A. procedido, desde logo, à entrega de tal quantia, que correspondia à totalidade do preço.

Os dois contratos promessa em causa não foram celebrados com eficácia real e também não houve tradição dos imóveis a favor da A. promitente compradora, tendo o Administrador da Insolvência usado da faculdade de não cumprir os contratos promessa e tendo ficado apurado que, a essa data, cada um dos imóveis tinha o valor de € 140.000,00.

As divergências jurisprudenciais e doutrinais que têm vindo a surgir, quer quanto ao facto de saber se o Administrador da insolvência pode recusar o cumprimento do contrato promessa ao qual não foi conferida eficácia real, mas em que tenha havido tradição da coisa, questão relativamente à qual se pronunciou recentemente o Supremo Tribunal de Justiça, através do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência de 20/03/2014, in. www.dgsi.pt ; bem como a de saber se à decisão de recusa de cumprimento do contrato promessa se aplica o regime geral do Código Civil, ou o regime especial do artº 106 nº 2 do CIRE, não se colocam no caso em presença, atentas as questões em discussão.

O que constatamos é a especialidade de um regime estabelecido no CIRE, do que nos dá conta o artº 119º, que sanciona com a nulidade as convenções que excluam ou limitem a aplicação das normas contidas nos artº 102º a 118º do CIRE. Havendo recusa por parte do Administrador em cumprir o contrato promessa, o artº 106 nº 2 do CIRE manda aplicar o regime do artº 104 nº 5, que remete para os efeitos do artº 102 nº 3 do mesmo diploma, com a especificidade aí referida.

Assim, na situação que se discute é pacífico que o regime aplicável aos contratos promessas em apreciação, é o que resulta do artº 106 nº 2 do CIRE, que remete para o artº 104 nº 5, já que estamos perante contratos promessa aos quais não foi conferida eficácia real e não houve tradição da coisa, não tendo sido também aqui questionada a decisão do Administrador da insolvência de não cumprir tais contratos.

Na verdade, a decisão recorrida também considerou a aplicação de tais normas, o que é igualmente defendido pela Recorrente, sendo que a questão em divergência prende-se antes com a interpretação dada às mesmas.

A decisão recorrida socorrendo-se das normas em questão conclui que não existe o direito da A. a haver a diferença entre aquilo que pagou e o valor dos imóveis à data do incumprimento, fundamentando-o da seguinte forma: “Salvo o devido respeito, da conjugação das normas acima referidas (artigos 102º 104º e 106º do CIRE) não resulta expresso esse direito, pois que, e no caso concreto se a Autora desde logo pagou aquando da assinatura dos contratos promessas de compra e venda o valor integral que seria devido aquando do contrato definitivo, então é esse apenas e só o valor que tem de receber, sob pena de enriquecimento ilegítimo caso receba mais do que isso, a não ser que, o que não ocorreu, alegasse e comprovasse ter tido outros prejuízos.”

Esta interpretação, contudo, passa por cima do regime previsto no artº 104 nº 5 do CIRE, para o qual remete o artº 106 nº 2, não podendo dizer-se que, pelo facto de ter sido logo paga a totalidade do preço, não estando em falta qualquer prestação, é só esse o valor que o promitente-comprador tem direito a haver, sob pena de enriquecimento ilegítimo.

A decisão recorrida aplica aqui o regime do artº 102 nº 3, determinando a devolução do sinal em singelo nos termos da al. c) e ponderando que não tendo sido alegados e provados outros prejuízos não há lugar a indemnização, (de acordo com o que possibilita a al. d)), mas desta forma desconsidera o regime especial do artº 104 nº 5 aplicável com as necessárias adaptações ao contrato promessa por força do artº 106 nº 2.

É que, o mencionado artº 104 nº 5 prevê uma especificidade quanto ao regime do artº 102 nº 3 al. c), que se concretiza precisamente no facto de a outra parte ter direito a exigir, como crédito sobre a insolvência, não só o valor da prestação do devedor, na parte incumprida, deduzido do valor da contraprestação correspondente que ainda não tenha sido realizada (artº 102 nº 3 al. c)), mas ainda um crédito resultante da diferença, se positiva, entre o montante das prestações ou rendas previstas até final do contrato, actualizadas para a data da declaração de insolvência (artº 104 nº 5) e o valor da coisa na data da recusa.

Também no acolhimento desta interpretação já se pronunciou o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 20/09/2011, in. www.dgsi.pt quando nos diz, em avaliação de caso semelhante, que: “Na verdade, estamos perante dois contratos promessa em curso, que, se porventura não forem cumpridos pelo administrador, os créditos em causa serão o sinal em singelo e a diferença de valor entre o preço convencionado e o valor dos bens aquando da recusa do administrador, que ainda se não concretizou, ao abrigo do disposto no artigo 104 n.º 5 e 102 n.º 2 al. c), ambos do CIRE.”

Nesta medida, o promitente-comprador tem direito à diferença, se positiva, entre o valor das duas prestações: uma equivalente ao valor do obejcto do contrato prometido na data da recusa de cumprimento por parte do Administrador da insolvência e a outra correspondente ao preço convencionado, actualizado para a data da declaração da insolvência, acrescido do valor que já prestou- Vd. neste sentido, Catarina Serra, in. Novo Regime Português da Insolvência, pág. 94 ss.  

Alega a Recorrente que tal diferença se traduz na quantia de € 10.000,00 por cada prédio, na medida em que foi convencionado o preço de € 130.000,00 e à data da recusa cada um deles tinha o valor de € 140.000,00. Contudo, não é exactamente assim, já que tal conclusão “esquece” que o preço convencionado deve ser actualizado para a data da declaração da insolvência, por aplicação do disposto no artº 109 nº 2 do CIRE, conforme dispõe o artº 104 nº 5.

Importa, então, proceder à actualização do valor de € 130.000,00 que corresponde ao preço convencionado, de acordo com o que estabelece a norma mencionada e que é o seguinte: “Toda a obrigação ainda não exigível à data da declaração de insolvência pela qual não fossem devidos juros remuneratórios, ou pelo qual fossem devidos juros inferiores à taxa de juro legal, considera-se reduzido para o montante que, se acrescido de juros calculados sobre esse mesmo montante, respectivamente, à taxa legal, ou a uma taxa igual à diferença entre a taxa legal e a taxa convencionada, pelo período de antecipação do vencimento, corresponderia ao valor da obrigação em causa.”

Para se fazer esta actualização, há assim que considerar a data acordada para o cumprimento da obrigação, bem como a data da declaração da insolvência, de forma a apurar-se o “período de antecipação” sobre o qual deverão ser contabilizados juros à taxa legal que é de 4%- de acordo com a Portaria 291/03 de 8 de Abril que fixou os juros legais a que alude o artº 559 do C.Civil- sobre o valor convencionado de € 130.000,00 de forma a termos tal quantia “actualizada” nos termos legais.

No caso a insolvência foi declarada por decisão de 08/09/2011; por outro lado, em conformidade com os contratos promessa juntos aos autos, a data acordada para a realização das escrituras de compra e venda dos imóveis, ou seja para a realização dos contratos definitivos, em cumprimento do contrato promessa foi fixada no prazo de 180 dias a contar da realização do contrato- tanto na cláusula 4ª nº 1 do contrato promessa relativo ao prédio da (...), como na cláusula 5ª do contrato relativo ao prédio de Abrantes, sendo em ambas estipulado que: “a escritura de compra e venda deverá realizar-se no prazo de 180 dias a contar do presente contrato.” Ambos os contratos foram celebrados a 11/08/2011. Daqui resulta que o seu cumprimento, com a realização da escritura de compra e venda 180 dias depois, deveria ter lugar a 10/02/2012.

Importa então fazer a actualização do valor de € 130.000,00 fazendo incidir sobre o mesmo a taxa legal de 4% sobre o tempo que decorre entre a declaração de insolvência e a data prevista para o cumprimento do contrato, o que dá o valor de juros de € 2.208,22 correspondendo por isso ao valor actualizado dos imóveis nos termos legais a € 132.208,22.

O valor positivo que a Recorrente tem direito a ver reconhecido também como crédito, por aplicação do mencionado artº 104 nº 5 do CIRE corresponde à diferença entre € 132.208,22 (preço convencionado actualizado para a data da declaração de insolvência por aplicação do estabelecido no artº 91 nº 2) e os € 140.000,00 do valor do prédio à data da recusa do cumprimento, ou seja, € 7.791,78 num total de € 15.583,56 pelos dois contratos.

Nestes termos, o recurso procede parcialmente, reconhecendo-se como crédito da Recorrente para além daquele que foi reconhecido na sentença recorrida, a quantia de € 15.583,56 nos termos das normas mencionadas.

V. Sumário

1.Em contrato promessa ao qual não foi conferido eficácia real e não tendo havido tradição da coisa, havendo recusa por parte do Administrador em cumprir o contrato promessa, o artº 106 nº 2 do CIRE manda aplicar o regime do artº 104 nº 5, que remete para os efeitos do artº 102 nº 3 do mesmo diploma com a especificidade aí referida.

2. A outra parte tem assim direito a exigir, como crédito sobre a insolvência, não só o valor da prestação do devedor, na parte incumprida, deduzido do valor da contraprestação correspondente que ainda não tenha sido realizada, nos termos do artº 102 nº 3 al. c), mas ainda um crédito resultante da diferença, se positiva, entre o montante das prestações ou rendas previstas até final do contrato, actualizadas para a data da declaração de insolvência e o valor da coisa na data da recusa, nos termos do artº 104 nº 5.

VI. Decisão:

Em face do exposto, julga-se o recurso parcialmente procedente, revogando-se em parte a decisão recorrida e reconhecendo-se à A., para além do crédito naquela reconhecido, o crédito da quantia de € 15.583.56 (quinze mil quinhentos e oitenta e três euros e cinquenta e seis cêntimos).

Custas pela Recorrente na proporção do decaimento.

Notifique.

                                                           *

                                               Coimbra, 3 de Junho de 2014

                                               Maria Inês Moura (relatora)

                                               Fernando Monteiro (1º adjunto)

                                               Luís Cravo (2º adjunto)