Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1230/11.5TBVIS.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: CARVALHO MARTINS
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
AUTO-ESTRADA
ANIMAL
CONCESSIONÁRIO
ÓNUS DA PROVA
Data do Acordão: 04/29/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: VISEU - 4º JUÍZO CÍVEL
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTS. 483, 493 CC, LEI Nº 24/2007 DE 18/7
Sumário: 1.- A concessionária de uma Auto-Estrada será obrigada, salvo caso de força maior, devidamente verificado, a assegurar permanentemente, em boas condições de segurança e comodidade, a circulação nas auto-estradas, quer tenham sido por si construídas, que lhe tenham sido entregues.

2.- O aparecimento de um javali, animal de grande porte, na faixa de rodagem constitui reconhecido perigo para quem ali circula, cabendo, por isso à concessionária evitar essa (e outras) fonte de perigos, essa anormalidade.

3.- Assim, não pode pôr-se a cargo do automobilista a prova da negligência da concessionária ou da origem do animal porque não foi a prestação dele que falhou, nem ele tem a direcção efectiva, o poder de facto sobre a auto-estrada (como um todo, incluindo vedações, ramais de acesso e áreas de repouso e serviço).

4.- Sendo que só o caso de “força maior devidamente verificado” exonera o devedor (a concessionária) da sua obrigação de garantir a circulação em condições de segurança (art. 799º, nº1, Código Civil – presunção de culpa e apreciação desta: incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua) e, na hipótese de inexecução, o dever de reparar os prejuízos causados.

5.- Não será suficiente (ao devedor, a concessionária) mostrar que foi diligente ou que não foi negligente: terá de estabelecer positivamente qual o evento concreto, alheio ao mundo da sua imputabilidade moral, que não lhe deixou realizar o cumprimento.

6.- Essa prova só terá sido produzida quando se conhecer em concreto, o modo de intromissão animal. A causa ignorada não exonera o devedor, nem a genérica demonstração de ter agido diligentemente.

7.- Verificada aquela anormalidade e existindo nexo de causalidade entre ela e o dano, presume-se, nos teremos do art. 493º, nº2, do Código Civil, omissão culposa de concessionária do dever de vigilância absoluto da auto-estrada e de prevenção de prejuízos, incumbindo-lhe ilidir tal presunção, sob pena de responder por culpa presuntiva.

8. - Em caso de acidente rodoviário em auto-estradas, em razão do atravessamento de animais, o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança pertence à concessionária. Caberá, pois, à concessionária demonstrar que a intromissão do animal na via, não lhe é, de todo, imputável.

Decisão Texto Integral: Acordam, em Conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:



I - A Causa:


Autora: "L (…), S.A.", com sede na (...) Lisboa.

Ré: "B....(...), S.A.", com sede no (...), Matosinhos,

Causa de pedir: A autora celebrou com a "I(…), S.A." um contrato de seguro  de responsabilidade civil automóvel tendo por objeto os riscos inerentes à circulação do veículo de matrícula CG(...).
Este veículo circulava na A25, autoestrada concessionada à Ré, quando um javali, atravessando a via, embateu em tal veículo. O condutor circulava de forma atenta e respeitando todas as regras estradais. Todavia, pela forma inopinada como surgiu o animal não conseguiu evitar o embate.
O veículo sofreu danos cuja reparação ascendeu a 17.230,00.
A Ré, concessionária da autoestrada, é civilmente responsável pela indemnização decorrente de responsabilidade civil extracontratual por não zelado pela conservação e manutenção das vedações, permitindo a entrada na via do animal.
A autora indemnizou a sua segurada, proprietária do veículo, e ficou sub-rogada nos  direitos desta.
Pedido: Condenação da Ré a pagar à Autora a quantia de €17.230,00, mais juros vencidos e vincendos desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Contestação: A Ré tomou todas as precauções exigíveis a fim de evitar a intrusão de animais na A25, designadamente, efetuou uma fiscalização apertada com patrulhamentos regulares e diligenciou no sentido de manter e conservar as vedações. Antes do acidente não teve qualquer informação sobre a presença de um animal selvagem ou outro na via.
Suscitou a intervenção da "C (...), S.A." com a qual celebrou um contrato de seguro que cobre os danos resultantes de eventos como o que se discute nos autos e que se encontrava em vigor à data da celebração do acidente.

Foi admitida a intervenção principal da " C (...), S.A.", a qual contestou a fls. 100.

Realizou-se audiência de discussão e julgamento com observância dos formalismos legais.

Oportunamente, foi proferida decisão onde se consagrou que

“(…) Assim, e demonstrando-se que o contrato de seguro celebrado entre a ré e a interveniente se encontrava em vigor na altura do acidente, e que o evento danoso se compreende no âmbito de cobertura do seguro, será a " C (...), S.A." a responsável pela indemnização devida à autora.
Nesta conformidade, e pelo exposto, o tribunal decide:
- Condenar a Ré " B (...), S.A." a pagar à Autora "L (...), S.A." a quantia de €17.230,00 (dezassete mil, duzentos e trinta euros), acrescida de juros de mora vencidos, bem como dos juros de mora vincendos, contabilizados, à taxa legal, desde a citação até efetivo e integral pagamento”.



D (...) (EX C (...)) veio interpor recurso de apelação, com efeito devolutivo da sentença de fls ... por com ela se no conformar, alegando e concluindo que:
(…)
B (...), S. A., R. nos autos à margem identificados, notificada da sentença de fls. … e com ela não se conformando, veio também dela interpor Recurso de Apelação, por sua vez alegando e concluindo, que:
(…)


II. Os Fundamentos:

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir:

Matéria de Facto assente na 1ª Instância e que consta da sentença recorrida:

1. A Autora exerce, devidamente autorizada, a indústria de seguros em diversos ramos. - alínea A) dos factos assentes
2. No exercício da sua atividade celebrou com a "I (…), S.A." um contrato de Seguro Obrigatório de Responsabilidade Civil Automóvel e contratou as coberturas facultativas nomeadamente a de "Choque, colisão e capotamento" titulado pela Apólice n.º 01157539 relativo ao veículo de matrícula CG(...). - alínea B) dos factos assentes
3. A Autora solicitou à Ré, no dia 15 de Fevereiro, o pagamento da quantia referida em 15), sendo que a Ré respondeu que não se considerava responsável pelo sinistro pelo que não procederia ao reembolso da quantia despendida pela Autora. - alínea C) dos factos assentes
4. À data do alegado acidente dos autos, a Ré B (...), S.A., havia transferido, até ao limite €30.000.000,00 (trinta milhões de euros), para a Interveniente a sua responsabilidade civil pelos eventuais danos causados a terceiros em virtude da sua atividade, nos termos do contrato de seguro titulado pela apólice n.º PA09CP0040.
Nos termos das referidas Condições Particulares, foi convencionado que, em cada anuidade, por cada sinistro participado, a Ré segurada da Interveniente, suportaria uma franquia de € 5.000,00. - alínea D) dos factos assentes
5. Em sequência do sinistro dos presentes autos, o veículo de matrícula CG(...), seguro na Autora sofreu diversos danos, que se reportam à parte da frente do veículo seguro, em toda a sua extensão, nomeadamente as grelhas, forras, pára-choques, reforço, faróis, projetores, guarda-lamas, tablier, bloco comando, radiadores, tubos, moto-ventilador, condensador, tabique, tubo ar condicionado. - Acordo das partes quanto ao ponto 14) da base instrutória
6. Com a reparação da viatura a Autora despendeu a quantia de €17.230,00. - Acordo das partes quanto ao ponto 15) da base instrutória

 Da base instrutória
 

7. No dia 4 de Dezembro de 2010, pelas 18h30, na A 25, Km 81,350, Freguesia de Torredeita, Concelho Viseu, ocorreu um acidente de viação. - Resposta ao ponto 1) dos factos provados
8. No qual foi interveniente o veículo de matricula CG(...), propriedade de I (…), SA e conduzido por J (…) no momento do acidente. - Resposta ao ponto 1) dos factos provados
9. O local caracteriza-se por ser uma autoestrada com duas faixas de rodagem para cada sentido de marcha, divididas por um separador central. - Respostas aos pontos 3) e 4 dos factos provados
10. O veículo seguro na Autora, circulava na A25, sentido Este /Oeste, na faixa mais à direita, a uma velocidade não superior a 120km/h. - Resposta aos pontos 5) e 6) dos factos provados
11. À hora da ocorrência do acidente era noite. - Resposta ao ponto 7) dos factos provados
12. O condutor do veículo de matrícula CG(...) circulava com as luzes médios acesas, as quais se encontravam em boas condições de funcionamento. - Resposta ao ponto 8)dos factos provados
13. Com atenção ao trânsito. - Resposta ao ponto 9) dos factos provados
14. Quando se aproximou do km 81,350 o condutor do veículo seguro foi, súbita e inesperadamente, surpreendido pela presença, insólita, de um animal selvagem (javali) que surgiu em plena faixa de rodagem, no meio da faixa de rodagem da direita, provindo da lateral direita da via. - Resposta ao ponto 10) e 12 dos factos provados
15. Dada a forma repentina e totalmente imprevisível como surgiu em plena faixa de rodagem, o condutor não evitou o embate com o animal. - Resposta ao ponto 13) dos factos provados
16. A concessão da Ré, denominada A25 é uma AE sem portagens, ou seja, uma SCUT (sem cobrança ao utilizador). - Resposta ao ponto 16) dos factos provados
17. Os "nós" de entrada e saída da referida infraestrutura viária não são fechados, não existindo quaisquer barreiras físicas, nomeadamente as habituais barreiras de portagem. - Resposta ao ponto 17) dos factos provados

18. Os "Nós" da A25 permitem a ligação daquela AE a estradas nacionais ou municipais. - Resposta ao ponto 18) dos factos provados
19. A vedação da A25 encontrava-se, na data do sinistro, e nas imediações do local, em boas condições de segurança e conservação, i. e., sem quaisquer falhas, ruturas, aberturas, deficiências ou anomalias de qualquer espécie. - Resposta ao ponto 19) dos factos provados
20. Os colaboradores da Ré, oficiais de assistência e vigilância (OAV) que asseguram os regulares patrulhamentos à concessão exercem, na medida do possível (i.e., sempre que as condições do terreno o permitam), a vigilância sobre o estado das vedações da AE. – Resposta ao ponto 21) dos factos provados
21. Sempre que é detetado pelos OAV da Ré ou é comunicada a esta Ré qualquer deficiência na vedação esta trata de a mandar reparar rapidamente. - Resposta ao ponto 22) dos factos provados
22. A vedação é periodicamente vistoriada, a pé e com recurso a veículos, por equipas da obra civil ao serviço da R. em toda a extensão da sua concessão, e em ambos os sentidos de trânsito desta infraestrutura viária. - Resposta ao ponto 23) dos factos provados
23. No dia do acidente, os funcionários da contestante efetuaram diversos patrulhamentos a toda a extensão da Concessão desta Ré, passaram por diversas vezes no local do sinistro e não detetaram qualquer animal, designadamente um javali, nas imediações daquele local. - Resposta ao ponto 24) dos factos provados
24. Os patrulhamentos supra referidos são efetuados pelos funcionários da Ré, em regime de turnos, durante as 24 horas de cada dia e em todos os dias de cada ano. – Resposta ao ponto 25) dos factos provados
25. A Concessionária, aqui Ré., obrigou-se, regra geral, i. e., em condições normais, a efetuar passagens de vigilância no mesmo local com o intervalo máximo de 3 (três) horas, salvo, naturalmente, se as condições de tráfego/circulação ou a eclosão de acidentes, incidentes ou outro tipo de ocorrências o não permitirem. - Resposta ao ponto 26) dos factos  provados
26. Os patrulhamentos da Ré passaram no local onde terá ocorrido o sinistro, e no sentido deste (Este - Oeste) por volta das 17 horas, cerca de 1h30m antes da eclosão do acidente. - Resposta ao ponto 27) dos factos provados
27. Nessa altura e passagem efetuada no local do sinistro pela patrulha da Ré não foi detetado naquele local qualquer animal (nomeadamente um javali) que aconselhasse ou impusesse que os colaboradores da contestante procedessem à respetiva recolha e expulsão da via. - Resposta ao ponto 28) dos factos provados
28. A brigada de trânsito (BT) da GNR em serviço na rede da Ré também não detetou nos seus patrulhamentos normais àquela AE a presença de algum javali ou outro animal nas imediações do local do sinistro. - Resposta ao ponto 29) dos factos provados
29. Sempre que a Ré tem conhecimento de quaisquer animais (ou outros fatores) que possam colocar em risco a segurança e a normal circulação automóvel na sua concessão - nomeadamente, através de informações de utentes ou da própria BT da GNR -, atua de forma imediata e diligente por forma a expulsar rapidamente esses animais da via. - Resposta ao ponto 30) dos factos provados
30. As vedações existentes no local e suas imediações eram aquelas determinadas e aprovadas pelo concedente (Estado Português) através dos organismos competentes para o efeito. - Resposta ao ponto 31) dos factos provados


Factos não provados

- O condutor do veículo seguro foi surpreendido pela presença do javali a não mais de 20 metros de distância da sua viatura.
- O condutor apesar de ter travado não conseguiu evitar o embate com  o  animal.
- Não se provaram quaisquer outros factos com interesse para a boa decisão da causa.

Não foram proferidas, reciprocamente, quaisquer contra alegações.


Nos termos do art. 684°, n°3, e 690°,n°1, do CPC, o objecto do recurso acha-se delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo do disposto na última parte do n°2, do art. 660°, do mesmo Código.


Das conclusões, no recurso de apelação de D (...) (EX C (...) emergem as seguintes questões:

I.
17- A Lei n.º 24/2007, de 17 de Julho determina no n.º 2 do seu art. 12.º que, «para efeitos do disposto no número anterior, a confirmação das causas do acidente é obrigatoriamente verificada no local por autoridade policial competente…»
18 - Sucede que uma coisa é a entidade policial tomar conta de uma ocorrência consistente num acidente de viação, outra bem diferente é a confirmação obrigatória no local das causas do acidente.
19 - Se tal como alegado pela Autora a causa do acidente foi um embate com um animal que atravessava a via, forçoso é concluir que deveria ter alegado e deveria ter sido levado à BI que a entidade policial atestou, no local, o atravessamento da via por tais animais, porque tal inequivocamente é matéria que integra a causa de pedir.
20 – Não consta dos autos qualquer Auto Policial de Ocorrência em causa pelo que, em rigor, inexiste Auto do qual se tenha feito não se fez constar a constatação da existência de animais no local.
21 - Daqui que, no modesto entender da ora Recorrente faleça um dos pressupostos de que o n.º 2 do art. 12.º da citada Lei faça depender a aplicação do regime nele previsto: a confirmação obrigatória pela entidade competente, no local, das causas do acidente.
22 - Assim, ao decidir como decidiu, e mesmo a considerar-se aplicável aos autos a Lei n.º 24/07, violou o Tribunal o regime constante do n.º 2 do seu artigo 12.º pelo que a sentença deve ser revogada e substituída por uma outra que absolva as Rés e ora Recorrentes D (...) e B (...) do pedido.,



Apreciando, diga-se que resulta circunstancialmente provado, não havendo sido objecto de impugnação adrede, que:

14. Quando se aproximou do Km 81,350 o condutor do veículo seguro foi, súbita e inesperadamente, surpreendido pela presença, insólita, de um animal selvagem (javali) que surgiu em plena faixa de rodagem, no meio da faixa de rodagem da direita, provindo da lateral direita da via. — Resposta ao ponto 10) e 12) dos factos provados.
15. Dada a forma repentina e totalmente imprevisível como surgiu em plena faixa de rodagem. o condutor não evitou o embate com o animal. — Resposta ao ponto 13) dos factos provados.

Colhe, do mesmo modo, pertinência a expressa consideração decisória segundo a qual :

“A entrada em vigor da Lei nº24/2007 de 18 de Julho não veio resolver a questão relativa à natureza da responsabilidade da concessionária, mas deu resposta à importantíssima questão do ónus da prova. O artigo 12º desta lei dispõe que "1. Nas auto-estradas, com ou sem obras em curso, e em caso de acidente rodoviário, com consequências danosas para pessoas ou bens, o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança cabe à concessionária, desde que a respectiva causa diga respeito a: a) Objectos arremessados para a via ou existentes nas faixas de rodagem; b) Atravessamento de animais; c) Líquidos na via, quando não resultantes de condições climatéricas anormais. / 2. Para efeitos do disposto no número anterior, a confirmação das causas do acidente é obrigatoriamente verificada no local por autoridade policial competente, sem prejuízo do rápido restabelecimento das condições de circulação em segurança" Com efeito, tornou-se agora líquido que o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança (em sede de responsabilidade delitual ou contratual) cabe à concessionária nos caso previstos expressamente no artigo em causa.
Em nosso entender, o artigo 483º do C. Civil fornece o instrumento adequado a enquadrar juridicamente o problema da responsabilidade pelos danos causados por animais que atravessam auto-estradas concessionadas. Estipula o referido art. 483º do C. Civil que "Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigada a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação." Os pressupostos da responsabilidade civil delitual são: a acção ou omissão humana, o dano, a relação entre o facto e o dano, a ilicitude e a culpa.
(…)
as normas previstas nas Bases XLV e LIV impõem um dever de manter a estrada em "bom estado de conservação e perfeitas condições de utilização" e de "vigilância das condições de circulação". Estas normas que consagram deveres gerais de cuidado, vigilância e segurança serão violadas pelo simples facto do javali se encontrar no meio da auto-estrada concessionada à ré. É que a auto-estrada é uma fonte de perigo. A lei quis eliminar os riscos que para o utilizador advém do uso da autoestrada impondo à concessionária deveres que, uma vez observados, eliminem o risco próprio da utilização das auto-estradas. A presença de um javali numa auto-estrada vigiada e protegida é, por isso, uma anomalia. Se o javali se encontra no meio da auto-estrada e é embatido por um veículo que aí circula, à lesão dos interesses patrimoniais do proprietário do veículo corresponde a violação das normas que impõem a vigilância da auto estrada e a manutenção de perfeitas condições de circulação.
Concluímos, portanto, que é ilícita a conduta da ré”.

Enunciado que haverá de sufragar-se a pretexto de que a concessionária de uma Auto-Estrada será obrigada, salvo caso de força maior, devidamente verificado, a assegurar permanentemente, em boas condições de segurança e comodidade, a circulação nas auto-estradas, quer tenham sido por si construídas, que lhe tenham sido entregues. O aparecimento de um javali (!...), animal de grande porte na faixa de rodagem constitui reconhecido perigo para quem ali circula, cabendo, por isso à concessionária evitar essa (e outras) fonte de perigos, essa anormalidade.
Assim, não pode pôr-se a cargo do automobilista a prova da negligência da concessionária ou da origem do animal porque não foi a prestação dele que falhou, nem ele tem a direcção efectiva, o poder de facto sobre a auto-estrada (como um todo, incluindo vedações, ramais de acesso e áreas de repouso e serviço).
Sendo que só o caso de “força maior devidamente verificado” exonera o devedor (a concessionária) da sua obrigação de garantir a circulação em condições de segurança (art. 799º, nº1, Código Civil – presunção de culpa e apreciação desta: incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua) e, na hipótese de inexecução, o dever de reparar os prejuízos causados.
Não será suficiente (ao devedor, a concessionária) mostrar que foi diligente ou que não foi negligente: terá de estabelecer positivamente qual o evento concreto, alheio ao mundo da sua imputabilidade moral, que não lhe deixou realizar o cumprimento.
Essa prova só terá sido produzida quando se conhecer em concreto, o modo de intromissão animal. A causa ignorada não exonera o devedor, nem a genérica demonstração de ter agido diligentemente (cf. Ac. STJ, de 22.6.2004:CJ/STJ,2004, 2º-98).

Com tal tessitura institucional de protecção faz sentido, mostrando-se adequado, o que se fez consignar em decisório, pois que:

“(…) no caso em apreço, demonstrou-se que a ré vedou a auto-estrada de acordo com os parâmetros (características, altura e extensão das vedações) de segurança que lhe foram impostas e que procedeu à manutenção das vedações; que a ré efetuou patrulhamentos de fiscalização para eliminar qualquer anomalia existente na estrada (nas vedações ou na própria via); que no dia do acidente não foram detetadas quaisquer deficiências das vedações, nem viram as patrulhas qualquer animal na autoestrada. É isto suficiente para ilidir a presunção de culpa que onera a concessionária? Parece que não. O ónus de provar que sobre a ré impende implica que esta demonstre que a intrusão do animal se deveu a razões que ela não poderia dominar (por exemplo, a concessionária demonstra que determinado automobilista transportava o animal pela auto-estrada e soltou-o aí). Ao não lograr fazer essa prova, a ré não afastou a presunção de culpa a que subjaz a ideia de que é a concessionária que tem a possibilidade de controlar a fonte de perigo.
Face à matéria provada, e considerando que não se demonstrou em concreto de que modo é que o javali invadiu a auto-estrada, consideramos culposa a atuação da ré, na medida em que não afastou a presunção.
Estão, assim, reunidos os pressupostos da responsabilidade extracontratual da ré que a fazem incorrer na obrigação de indemnizar o lesado. Ora, o lesado já foi indemnizado pelos danos sofridos nos termos acima apontados pela via do contrato de seguro que celebrou com a autora. Esta ficou, assim, sub-rogada nos direitos do lesado”.

Nestes termos, pois que verificada aquela anormalidade e existindo nexo de causalidade entre ela e o dano, presume-se, nos teremos do art. 493º, nº2, do Código Civil, omissão culposa de concessionária do dever de vigilância absoluto da auto-estrada e de prevenção de prejuízos, incumbindo-lhe ilidir tal presunção, sob pena de responder por culpa presuntiva (Ac. RC. 18.12.2002:CJ, 2002, 4º-15).

Com tal consagração, mormente no que respeita à integral matéria de facto considerada assente, convertido em factor sistemático de todo irrelevante invocar que

“(…) deveria ter alegado e deveria ter sido levado à BI que a entidade policial atestou, no local, o atravessamento da via por tais animais, porque tal inequivocamente é matéria que integra a causa de pedir”.

Desde logo porque resulta inequivocamente provado, em termos de facto consumado causador dos danos verificados, em termos, também, de causalidade adequada, relevante na dinâmica explicativa do acidente, e em termos, mesmo, de póstuma prognose, que
“14. Quando se aproximou do km 81,350 o condutor do veículo seguro foi, súbita e inesperadamente, surpreendido pela presença, insólita, de um animal selvagem (javali) que surgiu em plena faixa de rodagem, no meio da faixa de rodagem da direita, provindo da lateral direita da via. - Resposta ao ponto 10) e 12 dos factos provados
15. Dada a forma repentina e totalmente imprevisível como surgiu em plena faixa de rodagem, o condutor não evitou o embate com o animal. - Resposta ao ponto 13) dos factos provados”

A circunstância de tal Brigada “não haver atestado, no local, que a causa do embate foi o atravessamento da via por um animal” não assume virtualidade para alterar a prova produzida, revelada inequívoca quanto à dinâmica causal do acidente, nos termos supra referidos e explicitados.

Por isso, não sai minimamente subvertida, sequer, a regra processual determinante de que só deve ser incluída na base instrutória a matéria de facto relevante para a decisão da causa que deva considerar-se controvertida (art. 511º, nº1, do CPC (Ac. RC, de 7.12.2004:Proc.04B4773.dgsi.Net). Tanto mais que só são de incluir na base instrutória os factos instrumentais que sirvam para apoiar o estabelecimento de presunções judiciais ou para preencher, de uma forma tão ampla quanto possível, determinados conceitos jurídicos ou juízos de valor relevantes para a procedência da acção ou da defesa (Ac. RP, de 5.12.2002:JTRP0033041/ITIJ/Net). O que foi satisfeito.

O que atribui resposta negativa às questões em I.

 II.

23 - Mesmo que assim se não entendesse, o que se não concede, sempre se dirá que a recair sobre a B (...) o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 12.º da citada Lei a prova produzida foi clara no sentido de que esse ónus foi cumprido.
24 - Por um lado, tem sido pacífico na jurisprudência anterior à entrada em vigor da referida Lei que o dever de vigilância que recai sobre a concessionária deve ser entendido em termos de dever médio, não implicando a “característica da omnipresença “(cfr. por todos Ac. STJ de 2.6.03, que pode ser consultado em dgsi.pt doc. n.º SJ200402030040816).
25 - Não se descortina qualquer razão para que este entendimento deixe de ser válido, agora no quadro dos deveres impostos pela referida Lei.

Haverá, aqui, de referir que se considera integralmente reproduzido o teor conceitual e de alcance da resposta anterior, uma vez que as questões ora em perfil não deixam de ser recorrentes face às que, anteriormente, se perfilaram.
 Impondo-se acrescentar, por confronto e constatação, que o Ac. de sustentação convocado, nos termos que vêm alegados, consubstancia toda outra dinâmica causal, por sua vez determinante de todo outro enfoque de apreciação jurídica, tal como se reconduz ao elemento narrativo aí constante de tal revelador. A saber (já que aí se tratava da existência de um obstáculo - veículo imobilizado na faixa de rodagem), e apenas para que tal se assinale, diferenciadamente:


«No local onde o FJ colidiu com a cabina do IZ havia 4 faixas de rodagem, rodando o FJ pela da esquerda, isto é, a junto ao separador central.
A menos que ocorresse alguma das circunstâncias que permitisse ou justificasse essa condução pela faixa da esquerda, inclusive, pela mais à esquerda, a junto ao separador central, seguia em infracção estradal (CE94- 13,1 e 2 3 14-1).
Incumbia ao autor alegar e provar que, in casu, alguma delas se verificava. Desde logo não satisfez o ónus de alegar, embora tivesse tido oportunidade para contrariar a versão da contestação da ré seguradora (nem sequer deduziu o articulado de resposta).
Não pode deferir para a ré as consequências da não satisfação de um ónus que sobre si impendia.
O local onde o FJ colidiu com a sua parte frontal na cabina do IZ, que ocupava parte dessa faixa esquerda, desenvolve-se em longa recta de boa visibilidade e dispõe de iluminação pública; o autor podia ter avistado o IZ a uma distância não inferior a 100 metros.
A falta de sinalização, se contra-ordenacional, não foi causal do acidente. Este ficou a dever-se à circulação do FJ - e de novo há que fazer apelo à insatisfação do ónus de alegar que sobre o autor impendia (quod non in acto non in mundo) - que seguia incorrendo em dupla infracção estradal: - a antes assinalada e o excesso de velocidade (CE94- 24,1; dispondo de visibilidade e correspondente tempo para percorrer a referida distância, nada fez para parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente ou, sequer, efectuou manobra para evitar a colisão).

A imobilização de um veículo, aqui do IZ, na faixa de rodagem obriga, por norma, ao uso do dispositivo de sinalização que assinale a sua presença (CE94- 59,2 e 88,2).
Provado que as condições de iluminação do local e traçado da via permitiam um fácil reconhecimento da presença do IZ (da sua cabine) a uma distância não inferior a 100 metros (CE94- 59,2 a) e 88-2 b)), o que, embora em termos de auto-estrada não dispense a sinalização, é sintomático do dever de cuidado que exige quer ao condutor do veículo imobilizado quer a quem circule por aquele local».


Necessariamente a determinar soluções diferentes para questões diferentes, a pretexto da sua não homologia e, por isso, em quadro factual de todo diferenciado. Sem virtualidade, também, para alterar o elemento decisório, a tal respeito, firmado.

Em tais termos uma vez que o ónus consiste – na referência do art. 342º, nº1, do Código Civil – na necessidade de observância de determinado comportamento, não para satisfação do interesse de outrem, mas como pressuposto da obtenção de uma vantagem para o próprio, a qual pode, inclusivamente cifrar-se em evitar a perda de um benefício antes adquirido (Antunes Varela, Obrigações, 35); traduz-se, para a parte a quem compete, no encargo de fornecer a prova de facto visado, incorrendo nas desvantajosas consequências de se ter como líquido o facto contrário, quando omitiu ou não logrou realizar essa prova; ou na necessidade de, em todo o caso, sofrer tais consequências se os Autos não contiverem prova bastante desse facto (trazida ou não pela mesma parte) (Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1956, p. 184).

O que atribui resposta negativa às questões em II. formuladas.


III.
32 - É entendimento da Recorrente que os factos dados como provados sob os arts 19.º a 30.º da sentença, demonstram que a B (...), no caso dos autos cumpriu todos os deveres de prevenção e fiscalização da via, em termos muito razoáveis e que o ónus previsto na citada Lei 24/2007, foi cumprido, no sentido em que o tem entendido os arestos citados a págs. 25 da sentença ou seja, Ac. da Relação do Porto, de 19.01.2009, proc. n.º 0857252; Ac. da Relação do Porto, de 9.11.2009, proc. n.º 6004/06.2TBSTS.P1; Ac. da Relação de Lisboa, de 15.10.2009, proc. n.º 3449/07.4TBOER.L1-8; todos consultados em www.dgsi.pt.
33 - Assim, ao decidir como decidiu, e mesmo a considerar-se aplicável aos autos a Lei n.º 24/07, violou o Tribunal o regime constante do n.º 1 b) do seu artigo 12.º pelo que a sentença deve ser revogada e substituída por uma outra que absolva as Rés e ora Recorrentes D (...) e B (...) do pedido.

O ser

 “entendimento da Recorrente que os factos dados como provados sob os arts 19.º a 30.º da sentença, demonstram que a B (...), no caso dos autos cumpriu todos os deveres de prevenção e fiscalização da via, em termos muito razoáveis e que o ónus previsto na citada Lei 24/2007, foi cumprido”,

compreende-se numa perspectiva eminentemente subjectiva de parte, que o mesmo é dizer de acordo com o seu legítimo interesse (exactamente aquilo que inter est entre as pessoas e os bens. Saber se os elementos probatórios, de facto e o argumentari de aliqua re de direito, invocados, dão cobertura à sua posição, já é coisa diversa, que supra se analisou, mas não sem antes chamar a atenção para o facto de não bastar, para alteração das respostas, a mera divergência de convicção, sendo exigível, antes, que se verifique erro na apreciação da prova.

Tanto mais que se não controvertem ou impugnam tais elementos referenciais. Exactamente aqueles que tiveram como expressão:

19. A vedação da A25 encontrava-se, na data do sinistro, e nas imediações do local, em boas condições de segurança e conservação, i. e., sem quaisquer falhas, ruturas, aberturas, deficiências ou anomalias de qualquer espécie. - Resposta ao ponto 19) dos factos provados
20. Os colaboradores da Ré, oficiais de assistência e vigilância (OAV) que asseguram os regulares patrulhamentos à concessão exercem, na medida do possível (i.e., sempre que as condições do terreno o permitam), a vigilância sobre o estado das vedações da AE. – Resposta ao ponto 21) dos factos provados
21. Sempre que é detetado pelos OAV da Ré ou é comunicada a esta Ré qualquer deficiência na vedação esta trata de a mandar reparar rapidamente. - Resposta ao ponto 22) dos factos provados
22. A vedação é periodicamente vistoriada, a pé e com recurso a veículos, por equipas da obra civil ao serviço da R. em toda a extensão da sua concessão, e em ambos os sentidos de trânsito desta infraestrutura viária. - Resposta ao ponto 23) dos factos provados
23. No dia do acidente, os funcionários da contestante efetuaram diversos patrulhamentos a toda a extensão da Concessão desta Ré, passaram por diversas vezes no local do sinistro e não detetaram qualquer animal, designadamente um javali, nas imediações daquele local. - Resposta ao ponto 24) dos factos provados
24. Os patrulhamentos supra referidos são efetuados pelos funcionários da Ré, em regime de turnos, durante as 24 horas de cada dia e em todos os dias de cada ano. – Resposta ao ponto 25) dos factos provados
25. A Concessionária, aqui Ré., obrigou-se, regra geral, i. e., em condições normais, a efetuar passagens de vigilância no mesmo local com o intervalo máximo de 3 (três) horas, salvo, naturalmente, se as condições de tráfego/circulação ou a eclosão de acidentes, incidentes ou outro tipo de ocorrências o não permitirem. - Resposta ao ponto 26) dos factos  provados
26. Os patrulhamentos da Ré passaram no local onde terá ocorrido o sinistro, e no sentido deste (Este - Oeste) por volta das 17 horas, cerca de 1h30m antes da eclosão do acidente. - Resposta ao ponto 27) dos factos provados
27. Nessa altura e passagem efetuada no local do sinistro pela patrulha da Ré não foi detetado naquele local qualquer animal (nomeadamente um javali) que aconselhasse ou impusesse que os colaboradores da contestante procedessem à respetiva recolha e expulsão da via. - Resposta ao ponto 28) dos factos provados
28. A brigada de trânsito (BT) da GNR em serviço na rede da Ré também não detetou nos seus patrulhamentos normais àquela AE a presença de algum javali ou outro animal nas imediações do local do sinistro. - Resposta ao ponto 29) dos factos provados
29. Sempre que a Ré tem conhecimento de quaisquer animais (ou outros fatores) que possam colocar em risco a segurança e a normal circulação automóvel na sua concessão - nomeadamente, através de informações de utentes ou da própria BT da GNR -, atua de forma imediata e diligente por forma a expulsar rapidamente esses animais da via. - Resposta ao ponto 30) dos factos provados
30. As vedações existentes no local e suas imediações eram aquelas determinadas e aprovadas pelo concedente (Estado Português) através dos organismos competentes para o efeito. - Resposta ao ponto 31) dos factos provados;

Sendo que, não obstante, como já se observou, em entendimento no qual se persiste “não será suficiente (ao devedor, a concessionária) mostrar que foi diligente ou que não foi negligente: terá de estabelecer positivamente qual o evento concreto, alheio ao mundo da sua imputabilidade moral, que não lhe deixou realizar o cumprimento. Essa prova só terá sido produzida quando se conhecer em concreto, o modo de intromissão animal. A causa ignorada não exonera o devedor, nem a genérica demonstração de ter agido diligentemente”.


E o certo é que se “a B (...), no caso dos autos cumpriu todos os deveres de prevenção e fiscalização da via, em termos muito razoáveis e que o ónus previsto na citada Lei 24/2007, foi cumprido”, no convencimento expresso em dimensão, de resto evidenciadamente fragmentária da recorrente, a verdade é que não logrou convencer, isentando-se, em absoluto, de responsabilidade, da “causa causal”, em termos próprios de “causalidade adequada”, que a pudessem de tal eximir.

Neste preciso sentido, nem os arestos convocados para cobertura da posição sustentada, aqui, funcionam como elemento sequer impediente, até por ser outra a emissão conceitual a que ancoram e que deles promana. Também por confronto:

no Ac. da Relação do Porto, de 19.01.2009, proc. n.º 0857252, em circunstancialismo diferenciado, o que, noematicamente, se destaca mais não é senão que:
 “o art. 12º da Lei 24/2007 de 18/07 que estabelece as regras do ónus da prova do cumprimento das regras de segurança pelas concessionárias das auto-estradas tem natureza interpretativa, aplicando-se aos acidentes, mesmo que ocorridos antes da sua entrada em vigor”;

Sendo que o que se encontrava, , em causa era haver-se invocado:

“os factos integrantes dos pressupostos da obrigação de indemnizar fundada nos danos emergentes de um despiste automóvel, ocorrido no dia 11 de Março de 2004, na Auto-Estrada nº.., devido à existência de um lençol de água no pavimento cujos rasgos de drenagem estavam obstruídos por incúria da Ré Brisa, sua concessionária, e que provocou  hidroplanagem.
Acrescentou, aliás, que a Base XXXVI do contrato de concessão tem carácter normativo e que, por isso, a sua violação é fonte de responsabilidade civil extracontratual, assumida pela seguradora mediante o respectivo contrato”.



Por sua vez, no Ac. RP de 9.11.2009, Proc. 6004.06.2TBST.P1 a emissão conceitual é, afinal (!) que:

“A responsabilidade da concessionária pelos acidentes ocorridos dentro da auto-estrada é de natureza extracontratual, sendo que aquela lei inovou ao fazer recair sobre a concessionária o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança”.


Enquanto que no Ac. RL de 15.10.2009, Proc. Nº3449.07.4TBOER.L1-8, o que se destaca, também no seu específico circunstancialismo (“em que a intrusão do animal na via não lhe pôde ser de todo imputada”), é, não obstante, que:

“A Lei n.º 24/2007 de 18 de Julho define direitos dos utentes nas vias rodoviárias classificadas como auto-estradas concessionadas.
 Aí se consagra que, em caso de acidente rodoviário, com ou sem obras em curso, do qual resultem consequências danosas para pessoas ou bens, o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança cabe à concessionária, desde que a respectiva causa diga respeito (entre outros) a atravessamento de animais.
Tal diploma deve considerar-se lei interpretativa e como tal deverá ter aplicação imediata”.


Exactamente por - no esquisso revelado nos presentes Autos -, tal se revelar compatível, por emergência, com a circunstância de o ónus de alegação da prova, como elemento pressuponente principiológico actuante e vinculador, consistir em cada uma das partes, que quer ver vingar as suas pretensões ter de cuidar de que os factos, de que resulta a exactidão das suas afirmações jurídicas segundo as disposições do direito material, sejam levadas ao tribunal mediante as afirmações correspondentes (A. Anselmo de Castro, Dir. Processual Civil Declaratório, cd., 1981, 1.°-70). Deste modo, se a parte a quem incumbe o “onus probandi” fizer prova por si suficiente, o adversário terá, por seu lado, de fazer prova que invalide aquela; que a naturalize, criando no espírito do juiz um estado de dúvida ou incerteza; não carece de persuadir o juiz de que o facto em causa não é verdadeiro (M. Andrade, Noções Elementares Proc. Civil, 2. ed., 193; ed. 1979, 207). Em todo o caso, tal ónus respeita aos factos da causa, distribuindo-se entre as partes segundo certos critérios. Traduz-se para a parte a quem compete, no encargo de fornecer a prova do facto visado, incorrendo nas desvantajosas consequências de se ter como líquido o facto contrário, quando omitiu ou não logrou realizar essa prova; ou na necessidade de, em todo o caso, sofrer tais consequências, se os autos não contiverem prova bastante desse facto — trazida ou não pela mesma parte (M. Andrade, Noc. Elementares Proc. Civil, 1979, 196).
Tal, do mesmo modo, em si - e a revelação dos Autos a tal respeito é elucidativa -, pois que não tem apenas a faculdade de fornecer a prova; ele deve provar, se quiser fazer reconhecer o seu direito. Não é obrigado a fornecer a prova; mas do não exercício do ónus depende a renúncia ao reconhecimento do direito que carece de prova. São perfeitos ou imperfeitos, consoante o resultado que asseguram depende somente da prestação que forma o conteúdo do ónus, ou essa prestação é, por si só, insuficiente. São ainda formais e materiais. O primeiro consiste no dever para as partes de produzir a prova; o segundo consiste na sujeição às consequências desfavoráveis resultantes da falta de prova (Cavaleiro de Ferreira, Curso, 1956, 11-304).

O que, em si, inviabiliza a (plena) conversão da retórica argumentativa das partes - perfeitamente compreensível da defesa de individualizado “interesse” (justamente o que inter est as pessoas e os bens), de consequência específica determinada -, em elemento de objectivação que só pode ter correspondência, como se equacionou, na verdade “real” consubstanciada naquilo que a revelação processual intra-diegética possibilitou. E que, pelas razões indicadas, não pode ir além do que se consagrou em decisório.

Noutra formulação, a decisão colhe a sua justeza na conformidade integral com o sistema jurídico que a propicia. A complexidade dos elementos que, nela depondo, a informam, torna-a possível, apenas, através do funcionamento da Ciência Jurídica que, assim se afirma como prudencial. E à Ciência do Direito compete ainda assegurar o controlo das decisões, numa operação fundamental para alargar o consenso e, dai, a sua eficácia. Nenhuma norma jurídica resolve, por si, problemas concretos ainda quando, no caso considerado, ela possa surgir como o argumento decisivo no modelo de decisão. A lei não se confunde com o Direito. Uma dogmática jurídica, radicada na cultura que a suporte e na segurança das convicções científicas dos juristas que a sirvam, coloca, entre a fonte e a solução do caso concreto, um percurso que nenhuma lei pode dispensar e que o legislador não pode corromper. Reside aqui, o harmonizar das soluções desavindas ou disfuncionais dentro do espaço jurídico, complementando as mensagens apenas esboçadas pelo legislador e limando, no concreto, as saídas injustas, inconvenientes ou paradoxais existentes numa individualizada praxis judicial, que haverá de atender à singularidade de qualquer caso (Cf. Menezes Cordeiro, Estudos de Direito Civil, 1, 1987, págs. 236 e s.).
Assim se fixando a questão, nos termos pré-ditos, no referencial condicionador de específico ónus de prova como obrigação que recai sobre uma pessoa de provar algum facto ou alguma circunstância com interesse para um determinado fim. Exactamente porque, em direito processual, sendo a prova o acto ou série de actos processuais através dos quais há que convencer o juiz da existência ou inexistência dos dados lógicos que tem que se ter em conta na causa, o ónus da prova é a obrigação que recai sobre os sujeitos processuais da realidade de tais actos. A traduzir-se - haverá de dizer-se, agora e sempre -, para a parte a quem compete, no encargo de fornecer a prova do facto visado, incorrendo nas desvantajosas consequências de se ter como líquido o facto contrário, quando omitiu ou não logrou realizar essa prova (Anselmo de Castro, Proc. Civil, 1966, 30 259).


O que, tudo visto, não possui virtualidade para alterar o decidido, uma vez que - e numa outra vertente se assinala - o escopo final a que converge todo o processo interpretativo é o de pôr a claro o verdadeiro sentido e alcance da lei; interpretar em matéria de leis, quer dizer não só descobrir o sentido que está por detrás da expressão, como também, de entre as várias significações que estão cobertas pela expressão, eleger a verdadeira e decisiva (Manuel de Andrade, Ensaio Sobre a Teoria da Interpretação das Leis, 21 e 26).

Em tais termos, pois que o que se pretende com a interpretação jurídica não é compreender, conhecer a norma em si, mas sim obter dela ou através dela o critério exigido pela problemática e adequada decisão justificativa do caso. O que significa que é o caso e não a norma o prius problemático – intencional e metódico (do Assento STJ, 27.9.1995:DR, IA, de 14.12.95, p.7878).

O que, do mesmo modo, leva a responder negativamente às questões em III.


***

Das conclusões, no recurso de apelação de B (...), S. A., R. nos autos à margem identificados, emergem, por sua vez, as seguintes questões:

1.

I.A sentença (e também o despacho datado de 26 de Novembro de 2013) é nula – nulidade essa que expressamente se invoca em relação a ambos -, na medida em que é óbvio que o Tribunal deixou de se pronunciar sobre questões que devia apreciar, mas também porque a fundamentação da sentença está em nítida oposição com a decisão tomada;
II. Na verdade, apesar de se ter escrito (e se ter dado como provado) a existência do contrato de seguro celebrado entre a R. e a Interveniente, bem como da respectiva franquia (inferior ao valor da condenação) e ainda que responsável pela indemnização seria a Interveniente (o que, diga-se, nem isso é correcto), condenou-se apenas a R. no pagamento da indemnização que se entendeu ser devida à A., quando, seguindo esse entendimento/fundamentação (e também o disposto no artigo 328º do NCPC), dever-se-ia ter condenado cada uma delas na parte que lhe compete ou, no mínimo, condenado solidariamente ambas (com a consideração, contudo, do valor da franquia contratual);
III. Violou assim a sentença (e o despacho) o disposto naquele artigo 328º, mas também nas alíneas c) e d) do artigo 615º, todos do NCPC;
Isto posto,

Apreciando, diga-se, desde logo, que não devem confundir-se as nulidades da decisão, prevenidas no nº1 do art. 668º CPC com as nulidades do processo, designadamente com as nulidades processuais secundárias previstas no art. 201º, nº1, as quais, sob pena de deverem ser julgadas sanadas, têm de ser arguidas perante o tribunal em que tiverem sido cometidas – cf. art.s 153º, 202º, 2ª parte, 203º, e 205º, nº1, todos do CPC (Ac. do STJ, de 7.4.2005:Proc. 05B205.dgsi.Net), tal como, circunstancialmente, aconteceu.

Tal significa, do mesmo modo, que se não devem, efectivamente, confundir as nulidades do processo, nomeadamente as nulidades processuais secundárias previstas no nº1 do art. 201º, com as nulidades das decisões a que aludem aos art.s 666º, nº3, e 668º, nº1, todos do CPC; e nem, também, estas últimas, de ordem formal, são confundíveis com eventual, substancial, erro de julgamento (Ac. STJ, de 22.4.2004:JTRP00036174.dgsi.Net).

Assim, também, a nulidade da sentença por contradição entre os fundamentos e a decisão apenas se verifica quando a decisão proferida padeça de erro lógico na conclusão do raciocínio jurídico, por a argumentação desenvolvida ao longo da sentença apontar claramente num determinado sentido e, não obstante, a decisão ser no sentido oposto (Ac. RC., de 24.5.2005: Proc.480.05.dgsi.Net). O que, de todo, e levando em consideração o que, anteriormente, já se deixou expresso, circunstancialmente não acontece.

Depois, não se olvide que a nulidade de omissão de pronúncia prevista na al. d) do nº1 do art. 668º do CPC traduz-se no incumprimento, por parte do julgador, do dever prescrito no nº2 do art. 660º do citado Código, e que é o de resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão estiver prejudicada pela solução dada a outras. E essas, no referencial que vem de aludir-se não ficaram sem consideração adrede. De resto, a expressão “questões”, que se lê naqueles preceitos, não abrange os “argumentos” ou “raciocínios” que não integram matéria decisória para o juiz. (Cf. Ac. STJ, de 30.3.1990, Rec. Nº2309:AJ, 7º-90º, pág. 22, e ADSTA, 346º-1297).

Continuando a funcionar como elemento vinculador que - tal como consta de fls. 9 dos Autos – o pedido se reconduz, assim se delimitando o seu preciso alcance, conceitualmente e por expressão redactorial, a

“deve(r) a presente acção ser julgada procedente por provada e consequentemente ser a Ré condenada ao pagamento de € 17.230,00, acrescidos de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento”;

o que foi, em absoluto, respeitado em enunciado decisório, necessariamente, a produzir todas as consequências processualmente inerentes ao desenvolvimento diegético evidenciado nos Autos, com repercussão e alcance em todos os intervenientes, recte, actores processuais.

Não sai assim nem contrariado nem comprometido que “o assistente não tem legitimidade para impugnar mediante recurso decisão desfavorável ao assistido, podendo, todavia, acompanhar o recurso por este interposto bem como recorrer das decisões em que seja vencido. É assim que o tribunal superior não pode conhecer do recurso interposto pelo assistido e que o assistente acompanhou, se só este apresentar alegações. O assistente não pode tomar posição que colida com a do assistido. A sua faculdade de articular e alegar está limitada pela actividade efectivamente exercida pelo assistido nesses campos. O assistente não pode arguir excepção não arguida pelo assistido, salvo se o tribunal dela poder conhecer oficiosamente” (Ac. RC. de 16.10.1990:Col. Jur., 1990, 4º-70).

Em tais termos, pois que, “com a constituição da assistência se verifica um desdobramento subjectivo (Alberto dos Reis, CPC Anotado, cit.,I, p.473): ao lado da parte principal, há agora uma parte acessória, como seu auxiliar. O estatuto desta deriva da conjugação de dois princípios: equiparação, em direitos e deveres, à parte principal; subordinação da sua actividade à actividade desta. A actividade da parte assistida (autor ou réu) pode assim ser completada pela do assistente, mas não suprida (mediante a prática de actos que o assistente não pratique, tendo o ónus de praticar) nem contrariada (mediante a assunção de atitude divergente da do assistido)” (Cf. José Lebre de Freitas/João Redinha/Rui Pinto, CPC Anotado, Vol. 1º, 2ª edição, 2008, p. 644).

Daí que se mantenham o despacho em causa, na sua expressão redactorial assumida, onde se consigna

«(…) a interveniente goza do estatuto de parte principal, mas não é a parte primitiva, nem sucedeu a esta nessa posição. É certo que “A sentença que vier a ser proferida sobre o mérito da causa aprecia a relação jurídica de que seja titular o chamado a intervir, constituindo, quanto a ele, caso julgado” - art .320° do C.P.C. Daqui, porém, não se segue que, na parte dispositiva da sentença, o juiz deva condenar o interveniente. É que a sentença deve condenar (ou absolver) a parte contra quem a pretensão do autor foi deduzida, conforme resulta das disposições conjugadas (dos art.s 3°, n°1. 260°. 270°, al. b e 552°. n°1, al. a) todos do C.P.C. -  cfr. Acórdão do STJ de 11-12-2003 in www.dgsi.pt.
Indefere-se, assim, nesta parte o requerido pela interveniente”;

 bem como a decisão proferida com o alcance que lhes é inerente.


Colhendo, por isso, resposta negativa as questões em 1.


2.
IV. Mas a sentença violou também o artigo 5º nº 2 alíneas a) e b) do NCPC, já que podia e devia ter ido bem mais além na resposta (positiva, é certo – e bem) que deu ao artigo 19º da b. i.;
V. Efectivamente, importava – até porque se trata esta AE de uma ex-SCUT, com nós abertos (ou não fechados), como provado e, aliás, factos públicos e notórios – concretizar o que são afinal as “imediações do local do sinistro” no que respeita às boas condições de segurança e conservação da vedação da A25, atendendo designadamente ao que resultou da prova dos autos (quer do transcrito – em parte – depoimento (…), quer do não transcrito, mas devidamente identificado e balizado quanto à parte que interessa, de (…));
VI. Ora, a verdade é que se provou que aquelas vedações – para além de serem aquelas que ali tinham de estar implementadas – se encontravam em boas condições em toda a extensão de cerca de 12 Km (e em ambos os sentidos de marcha, o que perfaz cerca de 24 Km) do sublanço (entre nós abertos) onde se situa o ponto de eclosão do acidente;
VII. De modo que se impõe a reapreciação da prova e bem assim que a resposta ao citado artigo da b. i. seja a seguinte: Provado que “A vedação da A25 encontrava-se, na data do sinistro, e em toda a extensão de cerca de 12 quilómetros do sublanço (entre nós) em que se integra o local do sinistro, considerando, ademais, ambos os sentidos de marcha, em boas condições de segurança e de conservação, i. e., sem quaisquer falhas, rupturas, aberturas, deficiências ou anomalias de qualquer espécie”.

A este propósito, diga-se que, sem prejuízo de às partes caber a formação da matéria de facto, mediante a alegação, nos articulados, dos factos principais que integram a causa de pedir, a reforma do processo civil atribui ao tribunal a assunção de uma posição mais activa, por forma a aproximar-se da verdade material e alcançar uma verdade mais justa do processo (Ac. RC., de 9.3.2004:Proc. 4070/03.dgsi.Net). Sendo que, para que os factos sejam instrumentais é necessário que tenham uma relação com os factos principais, de tal maneira que, a partir daqueles, se possa chegar a estes (Ac. RC., de 27.4.2004: Proc.204/04.dgsi.Net). À luz do disposto na redacção actual do art. 264º CPC criou-se um alargamento da intervenção do juiz, dentro de determinados parâmetros; anteriormente, poderiam ser considerados na decisão apenas os factos notórios e outros relacionados com o uso anormal do processo; agora, além destes, podem utilizar-se factos instrumentais, essenciais, complementares ou concretizantes de outros já oportunamente alegados e resultantes da instrução e discussão da causa, dentro de certo condicionalismo. Esta complementaridade e concretização, distingue estes factos essenciais de factos pura e simplesmente novos, os quis ficam, portanto, excluídos do âmbito do referido artigo, até porque serão integrativos de nova causa de pedir (Ac. STJ, de 2.7.1998, 2º -157).

Em todo o caso, em função do disposto no art. 664º (relação entre actividade das partes e do juiz) o tribunal só é livre na qualificação jurídica dos factos desde que não altere a causa de pedir. Assim, o juiz, ao suprir as deficiências ou inexactidões das partes no tocante à qualificação jurídica dos factos ou à interpretação ou individuação das normas, tem de manter-se dentro do limite fundamental que lhe marca a acção, não podendo alterar as afirmações que identificam a razão e justificam as conclusões (Alberto dos Reis, CPC Anotado, 5º, 93).
Pelo que respeita ao direito, o juiz move-se livremente. Não está sujeito à alegação das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito. Pode ir buscar regras diferentes daquelas que as partes invocaram (indagação); pode atribuir às regras invocadas pelas partes sentido diferente do que estas lhe deram (interpretação; pode fazer derivar das regras de que as partes se serviram efeitos e consequências diversas das que estas tiraram (aplicação) (Alberto dos Reis, CPC Anotado, 5º - 453).

Como o art. 5º do NCPC corresponde, com alterações, no fundamental, ao enunciado aos art.s 264º e 664º do anterior CPC, mantém-se a projecção conceitual e vinculadora assim decorrente.

A convocação deste acervo jurídico permite, na economia dos Autos, e perante a consagração atribuída na resposta ínsita no art. 19º colocado em mira de observação –


19. A vedação da A25 encontrava-se, na data do sinistro, e nas imediações do local, em boas condições de segurança e conservação, i. e., sem quaisquer falhas, ruturas, aberturas, deficiências ou anomalias de qualquer espécie. - Resposta ao ponto 19) dos factos provados –

haver de reconhecer-se que, ainda assim, o que não deixa de ser classificado pela recorrente de

objecto de “resposta (positiva, é certo – e bem) que lhe foi dada (ao artigo 19º da b. i)”.;

Não obstante tal expressão de específico decisionismo voluntarista, vem, agora, pretender,

“a reapreciação da prova e bem assim que a resposta ao citado artigo da b. i. seja a seguinte:

Provado que “A vedação da A25 encontrava-se, na data do sinistro, e em toda a extensão de cerca de 12 quilómetros do sublanço (entre nós) em que se integra o local do sinistro, considerando, ademais, ambos os sentidos de marcha, em boas condições de segurança e de conservação, i. e., sem quaisquer falhas, rupturas, aberturas, deficiências ou anomalias de qualquer espécie”.

O que - haverá de adiantar-se, liminarmente - também não ultrapassar a sistemática irrelevante, face ao que, em termos plurais, em adequação, se deixou consagrado em decisório.

E o argumento que se entende retirar-lhe alcance, em termos da abordagem já empreendida, continua a ser - haverá de ser, uma vez mais e sempre -, convocando, de novo, o já utilizado, que se reitera, agora e sempre, nestas circunstâncias, mesmo, porventura, admitindo que

“a B (...), no caso dos autos cumpriu todos os deveres de prevenção e fiscalização da via, em termos muito razoáveis e que o ónus previsto na citada Lei 24/2007, foi cumprido”,

no convencimento expresso em dimensão, de resto evidenciadamente fragmentária da recorrente, a verdade é que não logrou convencer, isentando-se, em absoluto, de responsabilidade, em termos próprios de uma outra causalidade adequada, que a pudessem de tal eximir.

O que - também por aferição de outiva, e na reconstituição plena da prova produzida – a pretexto dos depoimentos das testemunhas aludidas, não foi almejado, restritos que foram no alcance dos seus relatos ao que, em sinopse, adequadamente, se destacou (sem controvérsia ou impugnação), uma vez que

(…)
Todavia, não mais do que isso!

O que quer dizer que, também aqui, que, por esta forma, alinhados e aferidos os elementos de prova com interesse para o esclarecimento do caso, sempre na relação intra-diegética dos Autos e na relação da verdade material, verdade real intra-processual, impõe-se, a tal pretexto, validar a decisão relativamente às respostas dadas aos referidos quesitos e, em particular, ao nº19, alinhado na resposta consagrada.

Verifica-se, assim, que o tribunal apreciou livremente as provas e respondeu segundo a convicção que formou acerca de cada facto, tudo em harmonia com o disposto no art. 655° do Cód. Proc. Civil. Isto porque o regime de prova é dominado pelo princípio da prova livre - o tribunal aferir livremente as provas; em qualquer circunstância, analisando criticamente as provas e especificando os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador. Deste modo, pois que o julgador não é arbitrário na apreciação das provas pericial e testemunhal, mas é, legalmente até, livre, na apreciação desses meios probatórios.
A decisão mostra-se, do mesmo modo, conforme ao dictat do que se consigna no art. 659°, do CPC, maxime, no seu n°3, pois na fundamentação da sentença, imperativamente, o juiz tomará em consideração os factos admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito e os que o tribunal deu como provados, fazendo o exame crítico das provas de que lhe cumpre conhecer. O que, igualmente, observações feitas, se mostra observado.
Demais, o ónus da prova (art. 342° Código Civil) traduz-se - aqui e sempre -, para a parte a quem compete, no dever de fornecer a prova do facto visado, sob pena de sofrer as desvantajosas consequências da sua falta. Assim, exactamente, pois que todos os elementos considerados deficitários, alegadamente inconsiderados, pelo recorrente, foram levados em conta, na decisão proferida.

O que responde negativamente às questões em 2 .

3.

XIII. No caso dos autos a apelante satisfez o ónus que lhe competia, i. e., demonstrou que cumpriu com aquelas suas obrigações de segurança, particularmente no que se refere à integridade da vedação numa extensão de cerca de 24 Km.
XIX. De modo que, e não podendo a R./apelante (nem tal lhe sendo exigível) ser omnipresente, não se vislumbra como podia (ou pode) ser responsabilizada pela eclosão deste acidente, tanto mais que nos parece pacífico que as obrigações a seu cargo são obrigações de meios e não obrigações de resultado (ou seja, de garantir aos utentes que não vão ter acidentes durante a sua circulação em AE);
XXI. Assim, no entendimento da apelante, a douta sentença violou o artigo 12º nº 1 alínea b) da Lei nº 24/2007, de 18 de Julho e ainda a Base LXXIII do Decreto-Lei nº 142-A/2001, de 24 de Abril, devendo, por isso, ser revogada em conformidade com o expendido nestas linhas.
Termos em que se deve dar total provimento ao presente recurso e respectivas conclusões, declarando-se nula a sentença por violação do disposto no artigo 615º alíneas c) e d) do NCPC, alterando-se a resposta ao artigo 19º da b. i. e, independentemente disso, revogando-se a decisão de que se recorre, substituindo-se por uma outra que julgue totalmente improcedente a presente acção com base nos argumentos expendidos nesta peça processual, bem como absolva a apelante do pedido, tudo com as necessárias consequências legais e como é de inteira JUSTIÇA.

De novo a considerar aqui reproduzido o alcance do que, anteriormente e, em sequência, se deixou expresso, considere-se que, a ser de outro modo, a invocada probatio diabólica redundaria num impossível categórico, exactamente em termos de prova, mas para qualquer utilizador  (“utente consumidor”) deste tipo de vias, sempre sujeito a qualquer imprevisto sinistral, como em termos similares àqueles que se equacionam nos Autos, e que, nessa conformação, sempre redundaria em completa impunidade para as concessionárias, sobre as quais impende um dever de garante sobre os utilizadores/consumidores neste tipo de utilização das vias, e onde sempre não deixarão de ser as partes mais fracas, tendo em conta a relação que, por esta forma se estatui, e que os colocaria em manifesta sotoposição.

Assinale-se, do mesmo modo, que no invocado ac. da RG de 23-9-2010), tal não sai contrariado; o que se consignou foi – na sua própria temporalidade, que se não pode olvidar - que:
«(…)a Lei nº 24/2007, de 18 de Julho, entrou em vigor a 19 de Julho de 2007, vindo estabelecer no seu art. 12º:
“1 – Nas auto-estradas, com ou sem obras em curso, e em caso de acidente rodoviário, com consequências danosas para pessoas ou bens, o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança cabe à concessionária, desde que a respectiva causa diga respeito a:
a)Objectos arremessados para a via ou existentes nas faixas de rodagem;
b)Atravessamento de animais; c)Líquidos na via, quando não resultantes de condições climatéricas anormais.
2 – Para efeitos do disposto no número anterior, a confirmação das causas do acidente é obrigatoriamente verificada no local por autoridade policial competente, sem prejuízo do rápido restabelecimento das condições de circulação em segurança.
3 – São excluídos do número anterior os casos de força maior, que directamente afectem as actividades da concessão e não imputáveis ao concessionário, resultantes de:
Condições climatéricas manifestamente excepcionais, designadamente graves inundações, ciclones ou sismos; Cataclismo, epidemia, radiações atómicas, fogo ou raio;
Tumulto, subversão, actos de terrorismo, rebelião ou guerra.”
Perante esta disposição é hoje claro que em caso de acidente rodoviário em auto-estradas, em razão do atravessamento de animais, o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança pertence à concessionária. Caberá, pois, à concessionária demonstrar que a intromissão do animal na via, não lhe é, de todo, imputável.
Afigura-se-nos, que o mencionado artº 12º da Lei nº 24/2007 não veio consagrar expressamente uma presunção de culpa sobre as concessionárias das auto-estradas; apenas veio estabelecer uma inversão do ónus da prova, fazendo recair o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança sobre a concessionária».

Por sua vez, no AC. RC., de 10.01.2006 (igualmente em diferenciada temporalidade), limitou-se a consagrar, no condicionalismo desses próprios Autos, que
«Segundo determinado entendimento, dispondo a Base XXVI nº2 do DL nº294/97 que a obrigação de assegurar “ boas condições de segurança “ só é afastada em “ caso de força maior devidamente verificado “, nela se englobando para além do “ caso fortuito “, o facto de terceiro ou do lesado.
Daí que a presunção só será ilidida se comprovar o modo concreto da intromissão do animal, pois a causa ignorada não exonera o devedor, nem a genérica demonstração de ter agido diligentemente, sendo insuficiente a prova de que as vedações se encontravam em bom estado de conservação na zona do acidente ( cf., por ex., SINDE MONTEIRO, RLJ ano 131, pág.111, e ano 133, pág.65, Ac do STJ de 22/6/04, www dgsi.pt/jstj ).
Com o devido respeito, não parece aceitável tal posição sobre o rigor da prova liberatória.
Em primeiro lugar, porque a comprovação necessária de caso de força maior, tal como prevista no contrato de concessão, será matéria específica no âmbito do regime administrativo concedente/concessionário (cf. CARDONA FERREIRA, loc.cit., pág.94).
Em segundo lugar, fazer depender a ilisão da presunção do modo concreto da intromissão do animal é tornar impossível a prova, implicando na prática uma situação de responsabilidade objectiva, e a norma nesta dimensão interpretativa seria materialmente inconstitucional por violação do princípio da proporcionalidade.
Sendo assim, para além de determinar a inversão do ónus da prova (art.344 nº1 C.C.), tanto o nº1 do art.493, como o art.799 nº1 do CC, não agravam a medida da normal diligência do " bonus pater familias ", pois de contrário a previsibilidade do dano estaria “ re ipsa “ e seria inócua a relevância negativa da causa virtual do dano, tal como sucede para as hipóteses do nº2 do art.493 do CC ( actividades perigosas ).

O problema terá que ser equacionado perante o caso concreto, quanto a saber se os elementos factuais disponíveis são suficientes, segundo o princípio da exigibilidade, para afastar a presunção.

A este propósito, comprovou-se que ao longo da A1 a B... efectua vigilância constante ( 24 horas sobre 24 horas ), através das suas patrulhas de oficiais mecânicos e de um departamento de “ Obra Civil “, sobre as vedações espalhadas e com vista a detectar situações anómalas.
O carro de patrulhamento da B... passou no local cerca de 15 minutos antes e não avistou qualquer cão na via, sendo certo que posteriormente ao acidente, ninguém viu mais ali o canídeo ou nas imediações.

Muito embora o dever de vigilância haja sido observado, em termos razoáveis, já não é suficiente para a prova liberatória a comprovação genérica de que “ junto ao local do acidente existe vedação que estava em bom estado de conservação “.
É que a vedação não visa apenas delimitar as margens, destinando-se primordialmente a obstaculizar fontes de perigo, como a intromissão de animais, ou seja, a garantir as “ boas condições de segurança “.

Por conseguinte, impunha-se saber se a vedação era apta ou idónea a evitar a intromissão do canídeo,
o que pressupunha a alegação das respectivas características, designadamente, qual o tipo de vedação, a sua estrutura material, a altura da mesma, pois só assim se poderia aquilatar da efectiva condição de segurança para afastar a presunção, cujo ónus de alegação e prova lhe incumbia, o que não fez.
Por isso, não tendo ilidido a presunção de culpa sobre ela impende a obrigação de indemnizar, reunidos que estão todos os demais pressupostos da obrigação de indemnização, improcedendo consequentemente as apelações».

O que, por seu turno, a tal pretexto, e nessas circunstâncias, só permitiu enunciar que:


“a) - A responsabilidade civil da X..., enquanto concessionária de auto -estradas, pelos danos decorrentes de um acidente de viação provocado pelo aparecimento súbito de um cão, é simultaneamente extra-contratual, com o regime previsto no art.493 nº1 do CC, e contratual, verificando-se uma situação de concurso aparente de responsabilidades, conferindo-se ao lesado a possibilidade de optar por um ou outro regime e até de cumular regras de uma e outra modalidade da responsabilidade, segundo a chamada “teoria da opção”.
b) - Em ambos os casos impende sobre a X... uma presunção legal de culpa ( arts.493 nº1 e 799 nº1 do CC ),
mas sem qualquer restrição no modo de ilisão.
c) - Fazer depender a ilisão da presunção do modo concreto da intromissão do animal é tornar impossível a prova, implicando na prática uma situação de responsabilidade objectiva, e a norma nesta dimensão interpretativa seria materialmente inconstitucional por violação do princípio da proporcionalidade.
d) - Não é suficiente para ilidir a presunção a mera alegação genérica de que “ junto ao local do acidente existe vedação que estava em bom estado de conservação”, impondo-se a concreta alegação das características físicas da vedação, designadamente o tipo de vedação, a estrutura material, a altura da mesma, para se aquilatar da efectiva condição de segurança”.


Faz, assim, sentido o que se deixou expresso em decisório ao considerar-se que:
“o ónus de provar que sobre a ré impende implica que esta demonstre que a intrusão do animal se deveu a razões que ela não poderia dominar. Ao não fazer essa prova, a ré não afastou a presunção de culpa a que subjaz a ideia de que é a concessionária que tem a possibilidade de controlar a fonte de perigo.
Face à matéria provada, e considerando que não se demonstrou em concreto de que modo é que o javali invadiu a auto-estrada, consideramos culposa a actuação da ré, na medida em que não afastou a presunção.
Estão assim reunidos os pressupostos da responsabilidade extracontratual da ré que a fazem incorrer na obrigação de indemnizar o lesado”.

Deste modo, pois que se continua a ponderar que “no caso da auto-estrada, a coisa tem de ser vista na sua globalidade, considerando todas as componentes que contribuem para a segurança, a fim de verificar se o funcionamento da coisa obedece aos parâmetros do direito positivo.
Ora, se as bases da concessão impõem a vedação em toda a extensão é porque se pretende evitar a entrada de animais. Logo, a simples presença de um animal na auto-estrada é uma anomalia que faz presumir a culpa do encarregado da vigilância da coisa.
É certo que, mais do que uma simples presunção de culpa, é daquilo mesmo que se trará na moderna teoria dos “deveres no tráfego” ou “deveres de presunção do perigo” (Antunes Varela, anot. ao Ac. do STJ de 26 de Março de 1980, na Rev. Leg. Jur., Ano 114, pp.40-41, 72 s; e Sinde Monteiro, ob cit. na n.(9), pp.300-330), conforme se lê em Larenz/Canaris (Larenz/Canaris, Leherbuch dês Shulderechts, Band II, Halbband 2, Besonderer Teil, 13. Aufl., Munchen, 1994, pp- 371 e 475, referindo que também o Código Civil alemão fala de presunção de culpa, mas considerando até como mais marcante o aspecto da violação de um dever” (Sinde Monteiro, Consideração Crítica: auto-estradas…, RLJ, Ano 133, pp.65-66).
Razões conjugadas pelas quais a sentença proferida não violou o artigo 12º nº 1 alínea b) da Lei nº 24/2007, de 18 de Julho e a Base LXXIII do Decreto-Lei nº 142-A/2001, de 24 de Abril. Tendo em conta, do mesmo modo, também aqui, que só se verifica a nulidade da al.c) do nº1 do art. 668º do CPC, quando a construção da sentença é viciosa, isto é, quando as premissas de facto e de direito que o julgador teve por apuradas, se extraia uma resultante oposta à que logicamente deveria ter extraído (Ac. STJ, de 19.3.2002, Ver. Nº 537/02-2, Sumários, 58). O que, circunstancialmente, não aconteceu.

 Consequentemente, também aqui, se conclui que, verificando-se que na sentença recorrida constam os factos e as razões de direito em que o tribunal alicerçou a sua decisão e esta é consequência lógica daquela fundamentação, é evidente que aquela peça processual não está inquinada de qualquer nulidade (art. 668º, nº1. als. b),c) e e) do CPC, na versão então vigente (Ac. RE, de 22.5.1997, 3º, 265).

O que atribui resposta negativa às questões em 3.


Podendo, por isso, concluir-se, sumariando (art. 663º NCPC), que:
1.
A concessionária de uma Auto-Estrada será obrigada, salvo caso de força maior, devidamente verificado, a assegurar permanentemente, em boas condições de segurança e comodidade, a circulação nas auto-estradas, quer tenham sido por si construídas, que lhe tenham sido entregues.
2.
O aparecimento de um javali (!...), animal de grande porte na faixa de rodagem constitui reconhecido perigo para quem ali circula, cabendo, por isso à concessionária evitar essa (e outras) fonte de perigos, essa anormalidade.
3.
Assim, não pode pôr-se a cargo do automobilista a prova da negligência da concessionária ou da origem do animal porque não foi a prestação dele que falhou, nem ele tem a direcção efectiva, o poder de facto sobre a auto-estrada (como um todo, incluindo vedações, ramais de acesso e áreas de repouso e serviço).
4.
Sendo que só o caso de “força maior devidamente verificado” exonera o devedor (a concessionária) da sua obrigação de garantir a circulação em condições de segurança (art. 799º, nº1, Código Civil – presunção de culpa e apreciação desta: incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua) e, na hipótese de inexecução, o dever de reparar os prejuízos causados.
5.
Não será suficiente (ao devedor, a concessionária) mostrar que foi diligente ou que não foi negligente: terá de estabelecer positivamente qual o evento concreto, alheio ao mundo da sua imputabilidade moral, que não lhe deixou realizar o cumprimento.
6.
Essa prova só terá sido produzida quando se conhecer em concreto, o modo de intromissão animal. A causa ignorada não exonera o devedor, nem a genérica demonstração de ter agido diligentemente.
7.
Verificada aquela anormalidade e existindo nexo de causalidade entre ela e o dano, presume-se, nos teremos do art. 493º, nº2, do Código Civil, omissão culposa de concessionária do dever de vigilância absoluto da auto-estrada e de prevenção de prejuízos, incumbindo-lhe ilidir tal presunção, sob pena de responder por culpa presuntiva.
8.
Não será suficiente (ao devedor, a concessionária) mostrar que foi diligente ou que não foi negligente: terá de estabelecer positivamente qual o evento concreto, alheio ao mundo da sua imputabilidade moral, que não lhe deixou realizar o cumprimento. Essa prova só terá sido produzida quando se conhecer em concreto, o modo de intromissão animal. A causa ignorada não exonera o devedor, nem a genérica demonstração de ter agido diligentemente.
9.
O que se pretende com a interpretação jurídica não é compreender, conhecer a norma em si, mas sim obter dela ou através dela o critério exigido pela problemática e adequada decisão justificativa do caso. O que significa que é o caso e não a norma o prius problemático – intencional e metódico.
-

10.
Não devem confundir as nulidades do processo, nomeadamente as nulidades processuais secundárias previstas no nº1 do art. 201º, com as nulidades das decisões a que aludem aos art.s 666º, nº3, e 668º, nº1, todos do CPC; e nem, também, estas últimas, de ordem formal, são confundíveis com eventual, substancial, erro de julgamento).

11.
A nulidade de omissão de pronúncia prevista na al. d) do nº1 do art. 668º do CPC traduz-se no incumprimento, por parte do julgador, do dever prescrito no nº2 do art. 660º do citado Código, e que é o de resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão estiver prejudicada pela solução dada a outras. E essas, no referencial que vem de aludir-se não ficaram sem consideração adrede. De resto, a expressão “questões”, que se lê naqueles preceitos, não abrange os “argumentos” ou “raciocínios” que não integram matéria decisória para o juiz.
 
12.
Com a constituição da assistência se verifica um desdobramento subjectivo: ao lado da parte principal, há agora uma parte acessória, como seu auxiliar. O estatuto desta deriva da conjugação de dois princípios: equiparação, em direitos e deveres, à parte principal; subordinação da sua actividade à actividade desta. A actividade da parte assistida (autor ou réu) pode assim ser completada pela do assistente, mas não suprida (mediante a prática de actos que o assistente não pratique, tendo o ónus de praticar) nem contrariada (mediante a assunção de atitude divergente da do assistido).
13.
Em função do disposto no art. 664º (relação entre actividade das partes e do juiz) o tribunal só é livre na qualificação jurídica dos factos desde que não altere a causa de pedir. Assim, o juiz, ao suprir as deficiências ou inexactidões das partes no tocante à qualificação jurídica dos factos ou à interpretação ou individuação das normas, tem de manter-se dentro do limite fundamental que lhe marca a acção, não podendo alterar as afirmações que identificam a razão e justificam as conclusões).
14.
Pelo que respeita ao direito, o juiz move-se livremente. Não está sujeito à alegação das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito. Pode ir buscar regras diferentes daquelas que as partes invocaram (indagação); pode atribuir às regras invocadas pelas partes sentido diferente do que estas lhe deram (interpretação; pode fazer derivar das regras de que as partes se serviram efeitos e consequências diversas das que estas tiraram (aplicação). Como o art. 5º do NCPC corresponde, com alterações, no fundamental, ao enunciado aos art.s 264º e 664º do anterior CPC, mantém-se a projecção conceitual e vinculadora assim decorrente.
15.
O ónus da prova (art. 342° Código Civil) traduz-se - aqui e sempre -, para a parte a quem compete, no dever de fornecer a prova do facto visado, sob pena de sofrer as desvantajosas consequências da sua falta. Assim, exactamente, pois que todos os elementos considerados deficitários, alegadamente inconsiderados, pelo recorrente, foram levados em conta, na decisão proferida.

16.
A ser de outro modo, a invocada probatio diabólica redundaria num impossível categórico, exactamente em termos de prova, mas para qualquer utilizador (“utente consumidor”) deste tipo de vias, sempre sujeito a qualquer imprevisto sinistral, como em termos similares àqueles que se equacionam nos Autos, e que, nessa conformação, sempre redundaria em completa impunidade para as concessionárias, sobre as quais impende um dever de garante sobre os utilizadores/consumidores neste tipo de utilização das vias, e onde sempre não deixarão de ser as partes mais fracas, tendo em conta a relação que, por esta forma se estatui, e que os colocaria em manifesta sotoposição.

17.Em caso de acidente rodoviário em auto-estradas, em razão do atravessamento de animais, o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança pertence à concessionária. Caberá, pois, à concessionária demonstrar que a intromissão do animal na via, não lhe é, de todo, imputável.
18.
Verificando-se que na sentença recorrida constam os factos e as razões de direito em que o tribunal alicerçou a sua decisão e esta é consequência lógica daquela fundamentação, é evidente que aquela peça processual não está inquinada de qualquer nulidade (art. 668º, nº1. als. b),c) e e) do CPC, na versão então vigente.


III. A Decisão:


Pelas razões expostas, nega-se provimento aos recursos interpostos pelas Recorrentes, confirmando a decisão proferida

Custas individualizadas pelas Recorrentes, fixando-se a taxa de justiça, para cada uma delas em 5 UC.

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António Carvalho Martins – Relator
Carlos  Moreira - 1º Adjunto
Anabela Luna de Carvalho - 2º  Adjunto