Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1318/21.4T8SRE-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: HELENA MELO
Descritores: EXECUÇÃO
OBRIGAÇÃO ILÍQUIDA
QUANTIFICAÇÃO
ÓNUS DO EXEQUENTE
Data do Acordão: 11/22/2022
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DE EXECUÇÃO DE SOURE DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA
Texto Integral: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 713.º, 868.º, N.º 1, E DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.
Sumário: I – A obrigação é certa quando estiver qualitativamente determinada, ainda que esteja por liquidar ou individualizar.

II – A obrigação não é certa se o exequente desconhece quais foram concretamente os direitos cedidos – 2,97 ou 2,77 direitos baseados na área do lote e prédio rústico – e se foram feitos os necessários procedimentos junto do IFAP para que o executado auferisse os subsídios correspondentes.

III – A obrigação é ilíquida quando não se encontra determinada a obrigação relativamente à sua quantidade, carecendo da efetivação de cálculos aritméticos ou da alegação de factos que, depois de submetidos ao contraditório, permitam a sua quantificação.  No caso de obrigação ilíquida, não pode o exequente limitar-se a pedir o pagamento de determinada quantia. O exequente terá de especificar os valores que considera compreendidos na prestação devida e demonstrar o seu cálculo.

Decisão Texto Integral:
Relator: Helena Melo
Adjuntos: José Avelino Gonçalves
Arlindo Oliveira

1318/21.4T8SRE-A.C1

Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Coimbra:

I – Relatório

Na execução que AA e BB instauraram contra  CC veio o executado, deduzir embargos à execução, invocando, em síntese, que:

- no requerimento executivo, os exequentes solicitaram que seja determinado e ordenado ao executado, ora embargante, designadamente, que: a) proceda de imediato à transferência dos referidos direitos de exploração e produção agrícola para a titularidades dos requerentes AA e BB;

- no termo de transação homologado por sentença, pode ler-se no ponto 4 - “O Requerido CC compromete-se desde já a cumprir os procedimentos necessários à transferência dos direitos que existam relativamente ao prédio em causa, para a titularidade dos requerentes”;

- o embargante obrigou-se a cumprir os procedimentos necessários à transferência dos direitos que existam;

- no entanto, verificada a documentação do parcelário junto do IFAP, verificou o embargante que o anterior titular do prédio em causa nunca lhe transferiu quaisquer direitos sobre tal prédio;

- não sendo o embargante cessionário de quaisquer direitos relativos ao prédio em causa, também os não podia transmitir aos exequentes; estando perante a situação em que a prestação do facto é impossível, por falta ou inexistência do objeto;

- também o prazo para cumprir a sentença deveria ser fixado a final pelo Tribunal, após proceder às diligências consideradas necessárias;

- essa fase foi preterida pelos exequentes no processo executivo;

- e o embargante não detém quaisquer direitos do prédio em causa, pelo que nada pode receber em função da sua detenção e, por isso, nada pode devolver aos exequentes;

- tal valor não se encontra indicado no requerimento executivo, nem foi pedida a sua liquidação, sendo, nestes termos, impossível de executar;

- desconhece-se donde provém o valor de € 14.900,00 indicado no requerimento executivo como valor líquido, o qual se impugna;

- não decorre do título dado à execução qualquer obrigação assumida pelo embargante em devolver aos executados valores de subsídio recebidos do prédio em causa; nas execuções, a obrigação tem que ser certa, líquida e exigível, não estando preenchido, in casu, como facilmente se constata, qualquer destes requisitos;

- por isso, estamos perante a falta de título executivo que sustente o pedido formulado pelos exequentes;

- uma vez que a prestação a que o embargante se obrigou é impossível, por falta de objeto e também por não se encontrar fixado, nem na sentença exequenda, nem nos presentes autos, prazo para o cumprimento da obrigação, não existe, em consequência, incumprimento por parte do embargante;

- não havendo assim fundamento legal ou de facto para a fixação da peticionada sanção pecuniária compulsória.

            Notificados os exequentes, estes juntaram o seu articulado de defesa, contrariando o que foi aduzido pelo embargante e alegando que este atuou em abuso de direito e má-fé quando vem dizer que não está fixado o prazo para a prestação de facto no título executivo; isto porque nos contratos existentes nos autos e notarialmente autenticados, o último junto pelo próprio embargante dizia expressamente que a cedência dos direitos em causa tinha a duração exata da duração de cada um dos contratos.

Os direitos do prédio objeto da execução foram cedidos ao embargante pelos períodos correspondentes à duração dos contratos por ele outorgados e ali juntos.

Concluindo, a final, pela improcedência dos embargos e a condenação do embargante como litigante de má fé em multa e indemnização.

Em 19.11.2022 foi proferido despacho, onde se entendeu que autos já continham todos os elementos indispensáveis para ser proferida uma decisão de mérito sem necessidade de agendar audiência prévia, pelo que, ao abrigo do preceituado no art.º 3, n.º 3, do CPC, do dever de gestão processual e do princípio da adequação formal, previstos nos art.ºs 6º e 547º, todos do CPC, se determinou a notificação das partes para, em 5 (cinco) dias, querendo, se pronunciarem.

Apenas os embargados se pronunciaram, tendo vindo dizer que que seria “muito relevante para a decisão do presente pleito, no âmbito da componente declarativa que imana dos Embargos, instruir os presentes autos com a prova documental da qual os Exequentes/Embargados requereram a Notificação ao IFAP para que a viesse juntar;

Tal prova seria importante para a concretização do montante/valor dos Direitos que são referenciados no Título levado à Execução”.

Em 09.12.2021 foi, então, proferido o seguinte despacho:

Requerimento de 29-11-2021:

O pedido efetuado pelos exequentes em 29-11-2021 não é pertinente nem importante para a análise e decisão dos presentes embargos e das questões relativas aos pedidos formulados nas alíneas a), b) e c), para as quais se torna fundamental o exame do teor da sentença judicial dada à execução, pelo que se indefere totalmente.

Notifique e, após, conclua para proferir sentença.”

Vindo a ser proferida sentença em 18.02.2022, julgando os embargos procedentes.

Os exequentes não se conformaram e interpuseram o presente recurso de apelação, tendo concluído as suas alegações do seguinte modo:

a) - Refere a Douta Decisão ora Impugnada, na sua explanação das matérias em apreço, na rúbrica Do DIREITO, o seguinte: - “… É entendimento comum na doutrina e jurisprudência que os embargos de executado têm a configuração de uma ação declarativa enxertada no processo de execução, constituindo uma contra-acção do executado com vista impedir a execução ou a obstar à produção dos efeitos do título executivo…”;

b) - Cientes desse desiderato, os Exequentes/Embargados e aqui Recorrentes, na Contestação que apresentaram, invocaram prova de facto e documental integrante dos autos do procedimento Cautelar cuja Sentença deu corpo/Título à Execução que a outorga

do Contrato de arrendamento rural do prédio objeto dos autos, conferiu ao Executado/Embargante, pelo período de duração do Contrato, um total de: - (2,97 direitos) baseados na área do lote e prédio rústico, ao abrigo do Reg. (C.E.) 1882/2003, do Conselho de 29 de Setembro, em conjugação com o disposto no D.N. n. º 32/2004, de 20 de Julho – Regime de Pagamento Único; - Ou, no mínimo, considerando a argumentação, prova documental e, portanto, confissão do ora Embargante, Requerido naqueles autos do Procedimento Cautelar; (2,77 direitos);

c) - Assim ficando o ora Embargante a ser beneficiário dos subsídios correspondentes a esses direitos, pagos pelo IFAP;

d) - Cedência e Benefício de subsídios que apenas durariam no período correspondente à duração de cada um dos contratos, como era especificamente indicado nos contratos em causa;

e) - Ficando apenas de confirmar, em bom rigor, se seriam 2,77 ou 2,97 Direitos considerados ao abrigo do Reg. (C.E.) 1882/2003, do Conselho de 29 de Setembro, em conjugação com o disposto no D.N. n. º 32/2004, de 20 de Julho;

f) - E por isso na cláusula n. º 4 da transação se estabeleceu que: - “4- O Requerido CC compromete-se desde já a cumprir os procedimentos necessários à transferência dos direitos que existam relativamente ao prédio em causa, para a titularidade dos Requerentes”;

g) - Fossem os 2,77 ou os 2,94 direitos, ao abrigo da legislação Europeia, de que beneficiava o ora Embargante;

h) – Devendo saliente-se que o ora Embargante reconheceu sempre, em juízo, designadamente quando se procedeu à outorga da Transação, na presença do Douto Tribunal, das Partes e dos Ilustres Mandatários das mesmas, A EXISTÊNCIA DOS REFERIDOS DIREITOS E DO SEU BENEFÍCIO DOS MESMOS; - Doutro modo nunca tal constaria na transação outorgada de livre e espontânea vontade pelas partes e homologada por Sentença;

i) – Havendo pois e em consequência, na sua Contestação aos Embargos, os Embargados, ora Recorrentes: - E, após a sua articulação atrás dita, ainda argumentaram: - “…Sendo, absolutamente, indispensável que o INGA, agora IFAP, venha fornecer aos autos todas as informações que no parcelário do ora Embargante constavam e/ou constem relativamente ao prédio: -“…Prédio Rústico composto de Terra de Cultura registada sob o Lote n. º ...32 – Bloco ... da carta topográfica do perímetro de emparcelamento de ..., a confrontar do Norte com Caminho, do Sul com Vala, do Nascente com DD e do Poente com EE e outro…”; Desde o Ano de 2005 até ao ano de 2021; E ainda, que direitos estavam ou estiveram adstritos ou baseados na área de tal Lote, ao abrigo do Reg. (C.E) 1782/2003 do Conselho Europeu de 29 de Setembro, em conjugação com o disposto no D.N. n. º 32/2004, de 20 de Julho – regime de Pagamento Único; Se estavam ou estiveram e deixaram de estar, porque ocorreu tal alteração e se foram transferidos para que prédio ou prédios o foram; Para que se esclareça, adequadamente, tão importante questão;

j) – Invocaram ainda os Embargados, ora Recorrentes, quanto à questão dos valores (montantes em Causa), - Por ser relevante para a Liquidação da Obrigação: - Quanto à questão da liquidação do montante dos valores dos subsídios recebidos pelo Embargante, pelos referidos direitos, tal questão fica dependente de serem 2,94 direitos ou 2,77 direitos;

Assim, apenas após a informação que provier do IFAP se pode proceder à liquidação desses valores;

k) Apresentando os Embargados um valor para efeitos de liquidação da Obrigação – praticado pelo IFAP (ajudas Europeias), mas sempre considerando que seria aquele organismo Público a Entidade mais adequada para fornecer o valor certo;

l) – Esclareceram os Embargados que entendiam que a obrigação do Executado/Embargante devolver os subsídios que recebeu indevidamente era consequência direta do seu incumprimento até ao início dos autos da Execução;

m) - E alegaram que nada obstaria a que tal obrigação se apure, em definitivo, na presente fase Declarativa Processual em curso nestes Embargos;

n) Pelo que, a final Requereram em concreto e quanto à Prova: - “…Da Prova: - Documental: - Toda a dos autos principais e junta ainda 2 (Dois) Documentos; E AINDA:

o) - Deverá ainda ser ordenada a Notificação do IFAP, para que venha fornecer aos presentes autos: 1.º - todas as informações que no parcelário do ora Embargante constavam e/ou constem, desde o Ano de 2005 até ao Ano de 2021, relativamente ao prédio: - “…Prédio Rústico composto de Terra de Cultura registada sob o Lote n. º ...32 – Bloco ... da carta topográfica do perímetro de emparcelamento de ..., a confrontar do Norte com Caminho, do Sul com Vala, do Nascente com DD e do Poente com EE e outro…”;2.º - Que direitos estavam ou estiveram adstritos ou baseados na área de tal Lote, ao abrigo do Reg. (C.E) 1782/2003 do Conselho Europeu de 29 de Setembro, em conjugação com o disposto no D.N. n. º 32/2004, de 20 de Julho – regime de Pagamento Único; 3.º - Se estavam ou estiveram e deixaram de estar, porque ocorreu tal alteração e se foram transferidos para que prédio ou prédios o foram;4.º - Qual o valor, em Euros, do subsídio por cada direito, correspondendo ao valor do subsídio por ha (Hectare), para aquele local e para o tipo de cultura praticado e constante do referido Parcelário;…”;

p) - Aconteceu porém, que o Douto tribunal “a quo”, pela pena da Meritíssima Juíza titular do Processo, exarou Despacho Saneador, nos seguintes termos, cfr. ref. ª electrónica n. º 86855723: -

“…Embargos de Executado (2013); * Uma vez que os presentes autos comportam a análise de matéria invocada pelo embargante que reúne para esse efeito todos os elementos indispensáveis para proferir uma decisão de mérito sem necessidade de agendar audiência prévia, ao abrigo do preceituado no art.º 3, n.º 3, do CPC, do dever de gestão processual e do princípio da adequação formal, previstos nos art. º s 6 e 547, todos do CPC, determino a notificação das partes para, em 5 (cinco) dias, querendo, se

pronunciarem…”;

q) Em resposta ao Douto despacho, foram os Embargados ora Recorrentes ao únicos a pronunciarem-se, nos seguintes termos: - “…Vêm assim os Exequentes/Embargados, notificados para o efeito, especificar que no seu entendimento e salvado o devido respeito, que seria muito relevante para a decisão do presente pleito, no âmbito da componente declarativa que imana dos Embargos, instruir os presentes autos com a prova documental da qual os Exequentes e Embargados requereram a Notificação ao IFAP para que a viesse juntar; Tal prova seria importante para a concretização do montante/valor dos Direitos que são referenciados no Título levado à Execução…”;

r) – Esta Pronúncia dos Embargados, embora resumida e sucinta, sempre respeitosa e cordata, não poderá deixar de considerar-se a manifestação do desacordo como o Douto despacho em causa e a pretensão de que fosse dado cumprimento ao que, quanto à Notificação do IFAP, os Embargados haviam requerido na sua Contestação;

s) – Porém o Douto Tribunal a quo indeferiu, liminar e definitivamente, a pretensão dos embargados, ao emitir Douto despacho, sempre sob a pena da Meritíssima Juíza titular do processo, sob a ref. ª eletrónica n. º 87044956 dos autos, nos seguintes termos: - “…Embargos de Executado (2013) Requerimento de 29-11-2021: O pedido efetuado pelos exequentes em 29-11-2021 não é pertinente nem importante para a análise e decisão dos presentes embargos e das questões relativas aos pedidos formulados nas alíneas a), b) e c), para as quais se torna fundamental o exame do teor da sentença judicial dada à execução, pelo que se indefere totalmente. Notifique e, após, conclua para proferir sentença.

A Juíza de Direito…”;

t) - Havendo pois, o Douto Tribunal a quo proferido a Douta Sentença que ora se impugna;

u) Devendo Salientar-se, ainda e também que, tendo os ora Recorrentes apresentado Rol de testemunhas com a sua Contestação, também lhes não foi concedida a possibilidade de produção de prova testemunhal e/ou outra, estando nós no âmbito do Processo declarativo, como o próprio Douto Tribunal a quo havia referido;

v) E sendo tal prova, absolutamente, relevante para, em concreto, aferir integralmente da certeza e exigibilidade do título e da obrigação e, por consequência da adequação dos Pedidos formulados;

- Ocorreu pois, na Douta Decisão a expressa violação dos Princípios Constitucionais e Processuais da prossecução da (descoberta da) verdade material, bem como os princípios da Cooperação e Princípio do Inquisitório que determinam que o documento ou demais prova que se revela essencial à descoberta da verdade material deve ser sempre apreciado pelo Tribunal; Em violação do art. º 411.º do C.P.C; POR “omissão de Pronúncia” sobre a matéria levada aos autos pelos Embargados;

w) – Mas também; Devendo-se aqui e desde já, para além de mais, referir que; no Douto Despacho Saneador, no qual refere estarem os autos prontos para a Decisão Final; (Ref. ª Elect. n. º n. º 86855723);

x) - O Douto tribunal a quo omite qualquer referência, ignorando-o completamente, ao articulado de Contestação produzido pelos ora Recorrentes;

y) - Apenas fazendo referência: - “…Uma vez que os presentes autos comportam a análise de matéria invocada pelo embargante que reúne para esse efeito todos os elementos indispensáveis para proferir uma decisão de mérito…”;

z) - Ora, até porque estamos no âmbito de um Processo ou Fase Declarativa, como aliás o Douto Tribunal ora Recorrido bem expressa na Douta Sentença, os autos não podem comportar, APENAS, a análise da matéria invocada pelo Embargante;

aa) - Terão de comportar, por Maioria de Razão, para uma justa apreciação do pleito, a matéria invocada por ambas as partes;

Não o havendo feito, houve uma situação da violação do Princípio da Igualdade das Partes e da Legalidade, Processual e Constitucionalmente consagrados;

bb) – Contudo e apear de nem terem sido considerados no Douto despacho os argumentos invocados pelos Executados/Embargados na Contestação que haviam apresentado; Tendo os ora Recorrentes dado cumprimento ao estabelecido no Douto despacho, no sentido de se pronunciarem, no prazo de 5 (Cinco) dias:

cc) - E pronunciaram-se, cfr. requerimento sob a referência electrónica n. º 6886656, nos autos, nos seguintes termos: Sendo, por demais evidente, que esta pronúncia dos Embargados, embora resumida e sucinta, sempre respeitosa e cordata, não poderia deixar de considerar-se a manifestação do desacordo como o Douto despacho em causa e a pretensão de que fosse dado cumprimento ao que, quanto à Notificação do IFAP, os Embargados haviam requerido na sua Contestação;

dd) – Havendo o Douto tribunal a quo Indeferido as pretensões expressas na pronúncia efectuada pelos Embargados; E tendo-se recusado a aceitar a produção de prova testemunhal requerida/invocada por Estes;

ee) - E assim tendo proferido a Douta Sentença que ora se impugna; - Sem que, estando nós no âmbito do Processo declarativo, em algum momento, fosse dada a oportunidade aos Exequentes/Embargados, ora Recorrentes de produzir a necessária, invocada e requerida, prova Documental e Testemunhal;

– Sendo que a falta de produção dessa prova foi invocada pelo Douto tribunal a quo para dar integral provimento aos Embargos deduzidos;

Isto é, o Douto Tribunal considerou como não provada/aferida a certeza e/ou exigibilidade do Título/pedidos, quando na verdade, foi o mesmo Douto Tribunal que impediu a produção e apreciação de tal prova;

- Pelo que, neste circunspecto, cometeu também o Douto Tribunal a quo, uma flagrante contradição entre a fundamentação que utilizou e a Douta Decisão que tomou;

- Acontecendo ainda e também que o Douto tribunal a quo, para além de mais, cometeu flagrante erro de julgamento da matéria de Facto e subsequente aplicação do direito, por duas ordens de razões;

 1 - A PRIMEIRA É que os ora Recorrentes na sua Contestação alegaram, concretamente, que o executado, nos autos que deram origem à Decisão Executiva e, voltaram a juntar prova documental disso mesmo, havia invocado e requerido, juntando documentos a comprová-lo, que efetivamente era o titular dos Direitos que os Exequentes queriam ver devolvidos, embora os quantificasse em 2,77 e não os 2,97 direitos reivindicados pelos Recorrentes;

- Ora, essa prova encontrava-se produzida nos autos, quer do Processo que, por via da Decisão nele proferida; deu origem à Execução, quer ainda e também na Contestação aos Embargos apresentada pelos Exequentes/Embargantes, ora Recorrentes;

- Logo, e no mínimo. o montante de 2,77 direitos admitida e reivindicada pelo Executado, pelo que e consequentemente confessada, teria de ser dada como certa e exigível, validando, sem mais, o pedido formulado na alínea a) da Execução: - (…concretizando-se, na cláusula 4 – da transação levada à Execução os “direitos que existam”); Ainda que não procedessem os restantes pedidos;

ff) – 2. A SEGUNDA É - Ainda e também porque, na matéria de facto que resumiu na Douta Decisão ora Impugnada, apenas deu relevância à questão invocada pelos Exequentes/Embargados, relativamente à atuação com má-fé do Embargante ao invocar a inexistência do prazo para o cumprimento da Obrigação;

gg) - “ …Notificados os exequentes, estes juntaram o seu articulado de defesa, contrariando o que foi aduzido pelo embargante e alegando que este atuou em abuso de direito e má-fé quando vem dizer que não está fixado o prazo para a prestação de facto no título executivo; isto porque nos contratos existentes nos autos e notarialmente autenticados, o último junto pelo próprio embargante dizia expressamente que a cedência dos direitos em causa tinha a duração exata da duração de cada um dos contratos.

hh) -Os direitos do prédio objeto da execução foram cedidos ao embargante pelos períodos correspondentes à duração dos contratos por ele outorgados e ali juntos.

ii) - A final, pede a improcedência dos embargos e a condenação do embargante como litigante de má fé em multa e indemnização…”;

jj) - Quando na verdade e como consta da Contestação apresentada pelos Embargados, estes também invocaram o comportamento, “Em Abuso de Direito e por Má-Fé”, do Embargante quando vem negar a posse dos direitos em causa, designadamente, no mínimo, os 2,77 direitos que, conforme supra se disse confessara terem-lhe sido transmitidos;

kk) - Logo, ao vir agora dizer nos Embargos, que não detinha quaisquer direitos, ou o fazia, salvo o devido respeito, mentindo descaradamente; Ou aquando da tramitação dos autos do Procedimento Cautelar e da outorga da respetiva transação tinha, salvo o devido respeito, mentido descaradamente para poder concretizar a mesma;

ll) - Não constando qualquer apreciação, na Douta Decisão, sobre esta matéria em concreto, até por analogia e a contrario com a matéria que trouxe à Douta Decisão, (supra em 29.º);

Cometeu pois o Douto Tribunal a quo erro de julgamento da matéria de facto, ainda que e também nesta concreta situação, sob a forma de omissão de pronúncia;

mm) - Em consequência de tudo o que, também ora, supra se expôs, e por consequência, falhou flagrantemente, salvo o devido respeito, na aplicação do Direito à factualidade que definiu ou não, mas intrínseca à douta Decisão;

nn) - Sendo que tais falhas são flagrantíssimas, salvo o devido respeito, quando o Douto Tribunal a quo, refere em concreto na Douta Decisão: - “…As partes foram notificadas para se pronunciarem porquanto se entendia que o presente processo dispunha de todos os elementos necessários à prolação de decisão final, pelo que, sem audiência prévia, proferir-se-ia despacho saneador sentença.

Nenhuma das partes se opôs a esse desiderato…”

oo) - Ora, como supra se referiu e se encontra provado nos autos;

Jamais a Douta Decisão poderia ter vindo concluir, “Nenhuma das Partes se opôs a esse desiderato” , Para vir Fundamentar de Direito, também assim, a Douta Decisão, adulterando infundadamente, salvo o devido respeito, a Matéria constante dos autos;

Pelo que por tudo o que supra se enunciou e ainda e também por esta razão, a Douta Decisão fundamenta erradamente, também, aplicando mal, o Direito;

***

Nos termos exposto, salvo o devido respeito a Douta Decisão ora Impugnada violou:

- O Princípio da prossecução da (descoberta) da Verdade Material, bem como os princípios da Cooperação e Princípio do Inquisitório; e - O Princípio da Igualdade das Partes e da Legalidade; todos Processual e Constitucionalmente consagrados;

- Violou também o estatuído no art. º 411.º do C.P.C; por “omissão de Pronúncia”;

Assim tendo procedido é assim pois e por consequência, passível de Nulidade, nos termos e ao abrigo do Art. º n. º 615.º do C.P.C; alíneas b), c) e, essencialmente d);

- Dado que, cometeu também o Douto Tribunal a quo, uma flagrante contradição entre a fundamentação que utilizou e a Douta Decisão que tomou;

Considerando-se ainda que:

- Cometeu também o Douto Tribunal a quo flagrante erro de julgamento da matéria de facto, designadamente fazendo uma apreciação parcial da referida matéria presente nos autos: -

“…Uma vez que os presentes autos comportam a análise de matéria invocada pelo embargante que reúne para esse efeito todos os elementos indispensáveis para proferir uma decisão de mérito…”; ao ter dado, exclusiva relevância à matéria carreada pelo Embargante; -Ainda e também jugou erroneamente tal matéria ao conceder procedência aos Embargos, por considerar padecer a cláusula 4.

Da Sentença levada à Execução não se “…Em suma, a sentença dada à execução, na parte relativa à cláusula 4.ª, não se encontra dotada de exequibilidade intrínseca, pelo que os embargos são julgados procedentes…”;

- Isto quando, todos os requisitos da Exequibilidade, pertinentes ao aperfeiçoamento do Requerimento Executivo se encontram expressos nos autos;

- Sendo que, se porventura algum ali se não encontrasse, em face  dos requerimentos de prova feitos pelos Embargados, era bem previsível que viessem a integrá-los, se tal produção de prova não fosse obstaculizada pelo Douto tribunal a quo;

- A consequência final desta apreciação do douto Tribunal a quo, conduziu-o à, também, Errónea Aplicação do Direito;

Nestes Termos e nos melhores de Direito, sempre com o Vosso Douto suprimento, Venerandos Desembargadores, deverá considerar-se integralmente procedente, por Provado, o Presente Recurso, determinando-se e declarando-se a integral Revogação da Douta Decisão ora Recorrida;

- Considerando-a Nula ao abrigo e nos termos do Art. º 615.º do C.P.C;

- E, por consequência, determinarem a prossecução dos autos para a produção da prova invocada pelos Embargados na sua Contestação;

Ou, assim se não entendendo;

- Decidirem pela alteração da Matéria de Facto, nos factos supra evidenciados neste articulado, e que impunham decisão diversa como supra se expôs, no sentido de que se encontram provados nos autos os necessários requisitos para que a Douta Sentença seja considerada exequível;

- Decidirem, sempre, pela comprovada existência, nos autos, dos requisitos comportamentais conscientes conducentes à Condenação do Embargante por Litigância de Má-Fé;

            A parte contrária contra-alegou, tendo concluído da seguinte forma:

(…).

II – Objeto do recurso

            Tendo em consideração as conclusões da apelação que são as que delimitam o objeto do recurso, as questões a conhecer são as seguintes:

            . se a sentença é nula por contradição entre os fundamentos e a decisão;

            . se a sentença é nula por omissão de pronúncia;

. se foram violados os  princípios da igualdade  das partes e da legalidade;

            . se a matéria de facto deve ser alterada;

            . se se mostra violado o princípio da prossecução da descoberta da verdade material, o princípio da cooperação e do inquisitório a que alude o artº 411º do CPC; e,

            . se os embargos devem prosseguir para produção de prova.

III – Fundamentação

O tribunal de 1ª instância considerou provados os seguintes factos, por documento ou por acordo, tendo em conta o requerimento executivo, o título executivo e os documentos apresentados:

1. Em 16 de Junho de 2021, os exequentes AA e BB instauraram ação executiva para pagamento de quantia certa, sob a égide de agente de execução, contra o executado CC, com vista à cobrança coerciva de € 14.900,00 euros - cf. requerimento executivo, da execução principal.

2. Tal execução baseia-se em sentença judicial condenatória proferida no âmbito do Processo n.º 82/18...., que correu termos no Tribunal Judicial ..., ....

3. E transitou em julgado em 12-07-2018.

4. Na ata de audiência final de 26-06-2018, no âmbito da qual foi consignada sentença judicial, ficou exarado:

“ Declarada aberta a presente audiência pelas 10:45 horas (após tempo concedido às partes para conversações), pelos ilustres mandatários e pelas partes aqui presentes (AA e CC) foi dito que acordam em resolver o litígio em causa nos autos a título definitivo, mediante a seguinte transacção:

1- Todo e qualquer contrato de arrendamento que possa existir e mediante o qual o Requerido agriculta o prédio objeto dos presentes autos, cessam integralmente todos os seus efeitos, pondo fim a toda e qualquer relação contratual entre as partes litigantes e fazendo cessar integralmente todos os direitos e ou obrigações daí decorrentes no dia 31 de Outubro de 2018, caso se não verifiquem excecionais condições climáticas que obstem ao período normal de colheita, não podendo, todavia, exceder o dia 31 de Dezembro de 2018.

2- Os Requerentes neste procedimento abdicam do pagamento da renda no montante de 1.000,00 € relativa ao prédio objeto dos presentes autos e relativa ao ano em curso.

3- Com a entrega do prédio livre e devoluto, os Requerentes entregam ao Requerido, por intermédio dos respetivos mandatários, a quantia de 500,00 €.

4- O Requerido CC compromete-se desde já a cumprir os procedimentos necessários à transferência dos direitos que existam relativamente ao prédio em causa, para a titularidade dos Requerentes.

5- O Requerido CC, desde já, se compromete a apresentar declaração de desistência da queixa crime no âmbito do inquérito nº. 148/18...., a correr ser termos nesta Procuradoria do Juízo de Competência Genérica ..., no qual é denunciado o Requerente AA.

6- Custas devidas em Juízo em partes iguais pelos Requerentes e Requerido, prescindindo ambas de custas de parte. “.

5. E foi proferida de imediato a seguinte sentença:

“Nos presentes autos de Procedimento Cautelar, em que são Requerentes AA e BB e Requerido CC, vieram as partes, conforme supra exarado, efetuar transação quanto aos termos do procedimento cautelar, acordando, a título definitivo, sobre o objeto do presente litígio.

Assim, perante o acordo celebrado entre as partes, em conformidade com o disposto nos artigos 277.º, alínea d), 283º nº 2, 284º, 289.º, n.º 1 “a contrario” e 290º, nºs 1 e 3, todos do Código de Processo Civil (aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho), e 1248.º e 1249.º, ambos do Código Civil, quer pela qualidade dos intervenientes, quer pelo objeto do processo/disponibilidade do direito litigioso, importa homologar, por sentença, a transação acima exarada, com a consequente extinção da presente instância.

Pelo exposto, dada a qualidade dos intervenientes e a disponibilidade do direito litigioso e ao abrigo das citadas disposições legais, julgo válida, por sentença, a transação supra exarada, condenando e absolvendo nos seus precisos termos. “.

6. No requerimento executivo, os exequentes alegaram:

“ Foi alcançada TRANSAÇÃO nos autos, que foi validada por Sentença, devidamente notificada e transitada em Julgado em 03 de Novembro de 2018; No ponto 4 da mesma ficou determinado: -

"...4 - O Requerido CC compromete-se, desde já a cumprir os procedimentos necessários à transferência dos direitos que existam relativamente ao prédio em causa, para a titularidade dos Requerentes...";

Aconteceu porém que o Requerido CC, até ao presente momento, não deu cumprimento à obrigação que assumiu na referida transação que, tornada Sentença, transitou em Julgado em 3 de Novembro de 2018;

No presente momento os Requerentes já perderam os direitos relativos ao prédio objeto dos autos, designadamente os subsídios decorrentes dos mesmos em três anos consecutivos, 2019, 2020 e 2021, uma vez que já encerrou o processo de candidaturas aos subsídios agrícolas do IFAP;

É o requerido que se mantém detentor de tais direitos, relativos ao prédio objeto dos autos (Lote n. º ...32 - Bloco ... da carta topográfica do perímetro de emparcelamento de ... - Art. º 4711 União das freguesias ..., ... e ..., ..., Predial, Comercial e automóvel sob o n.º ...62, da respetiva União das Freguesias - );

Os Direitos baseados na área do referido prédio são no montante de 2,97 Dt. ºs, ao abrigo do Reg. (CE) 1882/2003 do Conselho de 29 de Setembro, em conjugação com o disposto no D.N. n.º 32/2004, de 20 de Julho - Regime do Pagamento Único;

O Valor Monetário exato dos 2,97 Dt. º s só o Requerido pode prová-lo, uma vez que é quem o tem recebido;

Assim e no cumprimento da Sentença Transitada em Julgado, na presente Execução da mesma, deverá ser determinado e ordenado que:

a) - O Requerido CC proceda de imediato à transferência dos referidos Direitos de Exploração e produção Agrícola para a titularidade dos Requerentes AA e BB;

b) - O Requerido CC proceda de imediato à entrega aos ora Requerentes AA e BB dos valores Monetários correspondentes aos três últimos anos de subsídios que recebeu, indevidamente, relativos aos referidos Direitos;

c) - E, uma vez que o requerido é, assumidamente, relapso no cumprimento das determinações a que fica sujeito; Deverá ainda ser decidida e determinada UMA SANÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA, no montante de 500,00 € (Quinhentos Euros), por cada mês que o Requerido se atrase em dar Cumprimento às suas obrigações aqui definidas, resultantes da Douta Sentença Transitada em Julgado;“.

Mostram-se ainda provados por documentos, os seguintes factos (a considerar pela Relação de acordo com o disposto no artº 607º, nº 4 ex vi do artº 663º, nº 2, ambos do CPC):

.Em 16 de fevereiro de 2005 foi celebrado entre EE e o executado um contrato de arrendamento, tendo, designadamente, por objeto o lote de terreno com o nº 232 da carta topográfica do perímetro de emparcelamento de .../..., Bloco ... com a área de 27.749 m2 que proveio do prédio rústico sito no ..., freguesia ....

.Este contrato foi celebrado pelo prazo de sete anos, renovável por períodos e três anos.

.Nos termos da cláusula 4ª do referido contrato, o 1º outorgante cedeu ao 2º outorgante (o arrendatário e ora executado) e por igual período de tempo, 2,97 direitos baseados na área do lote e prédio rústico, ao abrigo do Regulamento (CE) nº 1782/2003 do Conselho, de 29 de setembro.

.Em  16 de fevereiro de 2006 foi celebrado um contrato, tendo por objeto o mesmo prédio entre o executado e FF, igualmente celebrado pelo prazo de sete anos, renovável por períodos de três anos (cláusula 1ª).

.Na cláusula 4º deste contrato as partes acordaram que a 1º outorgante cedeu ao 2º outorgante (o arrendatário e ora executado) e por igual período de tempo, 2,77 direitos baseados na área do lote e prédio rústico, ao abrigo do Regulamento (CE) nº 1782/2003 do Conselho, de 29 de setembro.

Apreciando:

O título executivo dado à execução é uma transação efetuada no âmbito do processo 82/18...., homologada por sentença. Na transação, as partes acordaram, nomeadamente, que:

.4. O Requerido CC – nestes autos aqui executado e embargante - compromete-se desde já a cumprir os procedimentos necessários à transferência dos direitos que existam relativamente ao prédio em causa, para a titularidade dos Requerentes.

Da nulidade da sentença por contradição entre os fundamentos e a decisão

Os apelantes entendem que o tribunal de 1ª instância não deveria ter indeferido (por despacho de 0.12.2021) o seu requerimento de 29.11.20121, onde requeriam a notificação do IFAP para juntar documentação, nem deveria ter sido proferido saneador/ sentença, sem previamente lhes ter sido permitido produzir prova testemunhal.

Mais acrescentaram que o tribunal ao considerar que a obrigação exequenda não era certa, considerando “não provada/aferida a certeza e/ou exigibilidade do título/pedidos”(sic) e ao impedir a produção de prova nos termos referidos, entrou em contradição entre a fundamentação e a decisão.

Nos termos da alínea c) do nº 1 do artº 668º do CPC é nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão.

A propósito desta nulidade diz José Lebre de Freitas  “entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica; se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença. Esta oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; mas já quando o raciocínio expresso na fundamentação aponta para determinada consequência jurídica e na conclusão é tirada outra consequência, ainda que esta seja a juridicamente correta, a nulidade verifica-se”.

Ora, não entendemos que se verifique a alegada contradição. Tendo o tribunal considerado que não estavam reunidos os requisitos de exequibilidade, em conformidade com este entendimento, julgou os embargos procedentes.

            Improcede, assim, a invocada nulidade.

            Da nulidade da decisão por omissão de pronúncia

Entendem os apelantes que a decisão recorrida não se pronunciou sobre a exceção de abuso de direito e sobre a má fé por si invocadas na contestação que deduziram aos embargos.

A não apreciação dessa matéria foi configurado pelos apelantes como um erro de julgamento da matéria de facto “sob a forma de omissão de pronúncia”.

E, em sede de impugnação da matéria de facto, vieram também insurgir-se contra o texto do relatório da decisão recorrida, no segmento em que se pronuncia sobre a contestação dos ora apelantes aos embargos deduzidos pelo embargante, por não ter referido que os embargados vieram invocar o abuso de direito e a má fé.

A impugnação da matéria de facto tem por objeto a reapreciação da matéria de facto dada como provada ou não provada e não visa corrigir qualquer segmento do  relatório da sentença recorrida. Poderá haver desconformidade entre o que consta do relatório e o que se verifica nos autos, mas não constitui erro de julgamento da matéria de facto, nem qualquer nulidade por omissão de pronúncia.

A falta de conhecimento da totalidade das questões suscitadas pelos embargados,  constitui causa de nulidade da decisão (artº 615º, nº 1, alínea d) e 608º, nº 2, ambos do CPC), a não ser que a falta de conhecimento da questão resulte da circunstância do conhecimento ter ficado prejudicado pela decisão dada a outras questões.

Como tem sido entendimento pacífico da doutrina e da jurisprudência, apenas as questões em sentido técnico, ou seja, os assuntos que integram o “thema decidendum”, constituem verdadeiras questões de que o tribunal tem o dever de conhecer para decisão da causa, sob pena de incorrer na nulidade prevista no artº 615, nº 1, al. d) do CPC. E, por questões, deve entender-se “os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e todas as exceções de que oficiosamente cumpre, ao juiz, conhecer” (José Lebre de Freitas e outros, Código de Processo Civil Anotado, 2º volume, Coimbra Editora, 2001, pág. 670). Deve assim distinguir-se as verdadeiras questões dos meros “raciocínios, razões, argumentos ou considerações”, invocados pelas partes, entendendo-se que o art. 608º, nº 2 do CPC impõe somente que o tribunal resolva todas as questões que as partes lhe hajam submetido a julgamento, mas não a apreciação de todos os argumentos por elas produzidos.

Ora, basta ler a sentença recorrida para se constatar que o tribunal se pronunciou sobre a alegada má fé, na parte final da decisão.

Quanto ao abuso de direito invocado no artigo 30º da contestação: efetivamente o tribunal não se pronunciou sobre esta questão, mas, tendo considerado que não havia título executivo, a questão suscitada ficou obviamente prejudicada, pelo que a sentença recorrida não enferma de nulidade por  omissão de pronúncia.

Improcede, consequentemente, a arguição de nulidade por omissão de pronúncia.

Da violação dos princípios da igualdade  das partes e da legalidade

Defendem os apelantes que ocorre violação do princípio da igualdade das partes porque no despacho proferido em 19.11.2022, em que o tribunal convidou as partes a pronunciarem-se sobre a sua intenção de proferir decisão de mérito sem produção prévia de prova, mencionou-se  que os autos já contém todos os elementos para “a análise de matéria invocada pelo embargante”  e não se fez menção à matéria alegada pelos embargados.

O princípio da igualdade das partes previsto no artº 4º do CPC estabelece que o tribunal deve assegurar, ao longo de todo o processo, um estatuto de igualdade substancial das partes, designadamente no uso dos meios de defesa e na aplicação de sanções processuais.

E o Tribunal assim fez. Ambas as partes tiveram oportunidade de apresentar a sua posição nos autos. A não apreciação de uma questão ou questões suscitadas por uma das partes não viola o princípio da igualdade das partes, podendo, no entanto, dar causa a nulidade da sentença por omissão de pronúncia.  No entanto, nesse despacho o Tribunal não deixou de apreciar qualquer questão, limitando-se a ordenar a notificação das partes para se pronunciarem sobre a possibilidade de prolação de decisão final de imediato.

            Relativamente à alegada violação do princípio da legalidade:

Os Tribunais portugueses devem obediência à lei (artº 203º do CRP). Também o artigo 8º do CC estabelece um dever de obediência à lei por parte dos tribunais. Este princípio sofre a exceção do julgamento com base na equidade, exceção que é consentida pela própria lei.

            Ora, o erro na aplicação da lei não conduz à violação do princípio da legalidade, o qual só seria de considerar violado se o tribunal não julgasse com base na lei. Improcede assim, também, a invocada violação do princípio da legalidade.

 

Do erro do julgamento da matéria de facto

O recorrente que pretende impugnar a matéria de facto tem de cumprir diversos ónus. Assim, em obediência ao disposto no artº 640º do CPC O sistema que passou a vigorar impõe o seguinte:

            .a) o recorrente deve indicar os concretos pontos da matéria de facto que considere encontrarem-se incorretamente julgados, tanto na motivação do recurso como nas conclusões, ainda que nestas de modo mais sintético;

            .b) quando  a impugnação se fundar em meios de prova constantes do processo ou que nele tenham sido registados, o recorrente deve indicar aqueles que em seu entender conduzem a uma decisão diversa relativamente a cada um dos factos;

            .c) no que concerne aos pontos da matéria de facto cuja impugnação se apoie em prova gravada (no todo ou em parte), para além da especificação dos meios de prova em que se fundamenta, tem de indicar com exatidão as passagens da gravação relevantes, transcrevendo, se assim o entender, os excertos que considere oportunos;

            .d) o recorrente deverá mencionar expressamente qual a decisão que deve ser proferida sobre os pontos concretos da matéria de facto impugnada.

           

            Segundo interpretamos o alegado pelos apelantes, estes entendem que o tribunal deveria ter dado como provado que o executado era titular, pelo menos, de 2,77 dos direitos  reclamados pelos exequentes. Fundamentam a sua pretensão na posição dos executados no procedimento cautelar onde foi celebrada a transação, onde assumiram ter-lhes sido transmitidos os direitos correspondentes a 2,77, usufruindo os benefícios correspondentes, na transação realizada nesses autos e na  contestação que os apelantes deduziram aos presentes embargos, onde juntaram documentos.

            Com a contestação aos embargos os apelantes juntaram cópia dos contratos de arrendamento celebrados com o executado em 2005 e 2006, nos quais consta, também na cláusula quarta, que o 1º outorgante cedeu ao 2º outorgante (o arrendatário e ora executado) e por igual período de tempo, respetivamente 2,97 (contrato de 2005) e 2,77 (contrato de 2022) direitos baseados na área do lote e prédio rústico, ao abrigo do Regulamento (CE) nº 1782/2003 do Conselho, de 29 de setembro.

            O embargado não impugnou esses contratos, mas iniciou o seu requerimento de embargos alegando que:

“3º Ora, o embargante obrigou-se a cumprir os procedimentos necessários à transferência dos direitos que existam.

4.ºContudo, verificada a documentação do parcelário junto do IFAP, verificou o embargante que o anterior titular do prédio em causa nunca lhe transferiu quaisquer direitos sobre tal prédio.

5.º O que pode ser confirmado pela análise dos parcelários do embargante desde 2018 a 2021 inclusive, os quais se juntam como docs. 1 a 4 e se dão como reproduzidos para os legais efeitos”.

Sobre a posição que o embargante assumiu no procedimento cautelar, processo onde foi proferida a transação, não pode esta Relação pronunciar-se, pois que tem apenas  conhecimento do termo de transação.  De qualquer modo, a confissão judicial da parte em processo civil não tem qualquer eficácia fora do processo em que tiver ocorrido. No âmbito do processo civil, dispõe o artigo 421º do Código de Processo Civil que “os depoimentos e perícias produzidos num processo com audiência contraditória da parte podem ser invocados noutro processo contra a mesma parte, sem prejuízo do disposto no n.º 3 do artigo 355.º do Código Civil; se, porém, o regime de produção da prova do primeiro processo oferecer às partes garantias inferiores às do segundo, os depoimentos e perícias produzidos no primeiro só valem no segundo como princípio de prova”.

Este preceito consagra o princípio do valor ou da eficácia extraprocessual das provas, permitindo que as provas produzidas num processo possam ser invocadas em processo diferente, concretamente os depoimentos de parte, os depoimentos das testemunhas e a prova pericial. Contudo, a confissão judicial (a que alude o artigo 355º nº 3 do Código Civil) está subtraída à eficácia extraprocessual, ficando a sua eficácia limitada ao processo em que for feita.

Nestes autos é manifesto que o apelado não reconheceu ser titular dos referidos direitos, pelo que não se vislumbra qualquer erro de julgamento, ao não ter sido dado como provado que o executado era titular de, pelo menos, 2,77. 

O que se pode ser considerado provado é a outorga dos  contratos de arrendamento celebrados em 2005 e 2006 entre o apelado e o anteriores senhorios que antecederam os  embargados, documentos juntos aos autos pelos embargados/apelantes, matéria que esta Relação já incluiu na matéria de facto dada como provada, em cumprimento do disposto no artº 607º, nº 4 do CPC ex vi do artº 663º, nº 2 do CPC.

           

Vieram também os apelantes invocar que a decisão recorrida incorreu ainda em erro de julgamento da matéria de facto, por ter entendido que os autos já continham todos os elementos para que fosse proferida sentença, sem prévia realização da audiência final.

Ora, o eventual errado juízo sobre a desnecessidade de realizar  audiência final, também não constitui qualquer erro de julgamento sobre a matéria de facto. A existir, consubstancia um erro de julgamento que conduzirá à revogação da sentença e ao prosseguimentos dos autos para produção de prova sobre a  matéria de facto controvertida  necessária à decisão sobre as questões suscitadas e de que o tribunal cumpra conhecer.

            A matéria de facto a considerar é pois a que foi dada como provada pelo tribunal a quo e a  aditada por esta Relação, ao abrigo do artº 607º, nº 4 e 663º, nº 2, do CPC.

Da violação pelo sentença recorrida do princípio da prossecução da descoberta da verdade material, do princípio da cooperação e do inquisitório a que alude o artº 411º do CPC

Entendem os apelantes que a sentença recorrida violou estes princípios por não ter ordenado a produção de prova por si requerida – notificação do IFAP para que viesse juntar determinada documentação -  prova que seria importante para a concretização do montante/valor dos Direitos que são referenciados no Título executivo.

Ora, os apelantes foram notificados do despacho que indeferiu a notificação pretendida e não interpuseram recurso autónomo do mesmo (artº 644º, nº 2, alínea d) do CPC), pelo que não podem agora vir colocá-lo em questão, através da invocação da violação de diversos princípios.

Se os autos devem prosseguir com produção de prova

A sentença recorrida entendeu que o título executivo não continha uma obrigação certa, concreta ou qualitativamente determinada, pelo que não era dotada de exequibilidade intrínseca. Escreveu-se, a propósito, que O que torna exigível a obrigação é o facto do vencimento. Obrigação exigível é a que está vencida, podendo o credor pedir o cumprimento; se o devedor se recusa a cumprir, pode promover a execução para obter o equivalente do cumprimento voluntário: a satisfação coativa. As obrigações com prazo e dia certo vencem-se logo que expira o prazo ou chega o dia determinado.

No caso dos autos, verifica-se que, primeiro, a quantia exequenda não é certa, uma vez que os exequentes pedem o cumprimento da sentença na parte concernente à cláusula 4.ª, mas não estão seguros de que o crédito existe em certas condições, nomeadamente, que o seu montante é de 14.900,00 euros – montante este que não é minimamente explicável pelos exequentes, pois desconhece-se como se alcança esse valor, que não é certo.

Efetivamente, da própria leitura da cláusula 4.ª se constata a incerteza do crédito quando se refere que “CC compromete-se desde já a cumprir os procedimentos necessários à transferência dos direitos que existam relativamente ao prédio em causa”. Ou seja, “os direitos que existam” não significa que eles existem de facto e os exequentes também não procederam, no requerimento executivo, às diligências necessárias para tornar o crédito certo, exigível e líquido.

Na verdade, os exequentes, desde logo, não especificaram ou delimitaram com rigor e precisão qual o crédito a receber por parte do executado/embargante, nem o liquidaram com os cálculos adequados a perceber os seus montantes e também não o tornaram exigível.

Deste modo, a cláusula 4.ª, que consta da sentença homologatória de transação, que apenas refere que o embargante/executado se compromete desde já a cumprir os procedimentos necessários à transferência dos direitos que existam relativamente ao prédio em causa, para a titularidade dos Requerentes, aqui exequentes, não incorpora uma obrigação certa, concreta ou qualitativamente determinada, pelo que não é dotada de exequibilidade intrínseca.

Nessa ocasião, os exequentes, como Requerentes, deveriam ter indicado o concreto crédito a que o embargante, como Requerido, se obrigava a pagar, o que não sucedeu.

Em suma, a sentença dada à execução, na parte relativa à cláusula 4.ª, não se encontra dotada de exequibilidade intrínseca, pelo que os embargos são julgados procedentes.”

Entendeu-se na sentença recorrida que a falta de certeza da obrigação resulta do teor da cláusula 4ª da transação, onde se constata a incerteza do crédito quando se refere que “CC compromete-se desde já a cumprir os procedimentos necessários à transferência dos direitos que existam relativamente ao prédio em causa”. Ou seja, “os direitos que existam” não significa que eles existem de facto e os exequentes também não procederam, no requerimento executivo, às diligências necessárias para tornar o crédito certo, exigível e líquido.

Como resulta do artigo 713º do CPC a obrigação exequenda tem de ser certa, exigível e líquida.

A ação executiva pressupõe o incumprimento da obrigação. Quando o incumprimento não resulta do próprio título, há que a tornar certa, exigível e líquida, devendo a execução iniciar-se pelas diligências necessárias a tornar a obrigação certa, exigível e líquida.

A obrigação é certa quando estiver qualitativamente determinada, ainda que esteja por liquidar ou individualizar (Lebre de Freitas, A ação executiva, Coimbra Editora, 5ª edição, p. 82). Não é certa aquela em que a determinação (ou escolha) da prestação, entre uma pluralidade, está por satisfazer.

A obrigação é exigível quando a obrigação se encontra vencida ou o seu vencimento depende, de acordo com estipulação expressa ou com a norma geral supletiva do artº 777º, nº 1 do CC, de simples interpelação ao devedor e este já foi interpelado extra judicialmente ou não o tendo sido, já foi citado.

Assim, não é exigível, não tendo ocorrido o vencimento, quando este não está dependente de mera interpelação. É o caso quando:

. tratando-se de uma obrigação com prazo certo, este ainda não decorreu (artº 779º do CC);

. o prazo é incerto a fixar pelo tribunal (artº 777º, nº 2 do CC);

. a constituição da obrigação foi sujeita a condição suspensiva, que ainda não se verificou (artº 270º do CC e artº 715º, nº 1 do CPC); e,

. em caso de sinalagma, o credor não satisfez a contraprestação (artº 428º do CC) (cfr. ensinamentos de Lebre de Fretas, obra citada, p. 83).

A obrigação é ilíquida quando não se encontra determinada a obrigação relativamente à sua quantidade, carecendo da efetivação de cálculos aritméticos ou da alegação de factos  que, depois de submetidos ao contraditório, permitam a sua quantificação (artº 716º do CPC).  No caso de obrigação ilíquida, não pode o exequente limitar-se a pedir o pagamento de determinada quantia. O exequente terá de especificar os valores que considera compreendidos na prestação devida  e demonstrar o seu cálculo (artº 716º, nº 1 do CPC).

            A certeza, exigibilidade e a liquidez são pressupostos processuais específicos da obrigação exequenda que quando não se revelem pelo título deverão ser satisfeitos pelos mecanismos de natureza declarativa, nos termos do artº 713 e ss do CPC.

Os apelantes entendem que a obrigação é certa por resultarem dos contratos de arrendamento  que juntaram, o embargante reconheceu essa obrigação e ainda porque poderá produzir-se prova sobre o conteúdo da obrigação que sobre si recai.

Ora, não lhes assiste razão.

Face ao título, há dúvidas sobre a obrigação que recai sobre o executado.

Os próprios apelantes não sabem quais são os concretos direitos que o apelado deveria transmitir-lhes. Como eles próprios o reconhecem não sabem se representam 2,94 (queriam dizer certamente 2,97 que foi o que os embargados começaram por  afirmar e corresponde ao mencionado no contrato de arrendamento de 2005) se 2,77.

E o facto dos anteriores locadores terem assumido a obrigação de cederem os referidos direitos e consequentemente os subsídios que viessem a auferir,  não significa que tenham sido efetuadas as diligências necessárias junto do IFAP para que esse pagamento se realizasse. Trata-se de um acordo onde foram intervenientes os então senhorios e o executado e no qual o IFAP não interveio, pelo que necessariamente tinha de lhe ser dado conhecimento e requerer que o pagamento dos correspondentes subsídios, a serem devidos, fossem efetuados ao executado.

E tanto não havia certezas que, quando foi efetuada a  transação, o  embargado apenas se obrigou a transmitir os direitos que existam, sem qualquer concretização dos mesmos.

Assim, desconhece-se quais os direitos transmitidos e se o foram efetivamente. A certeza da obrigação pressupõe uma prestação que se encontra, qualitativamente determinada no momento da sua constituição, o que não se verifica. A obrigação não é certa se o exequente desconhece quais foram concretamente os direitos cedidos - 2,97 ou 2,77 direitos baseados na área do lote e prédio rústico – e se foram feitos os necessários procedimentos junto do IFAP para que o executado auferisse os subsídios correspondentes, como os exequentes reconhecem.

Acresce que da cláusula 4ª não resulta para o apelado a obrigação de pagar ao apelante qualquer quantia. O que o executado se obrigou foi a efetuar as diligências necessárias para efetuar a transmissão de direitos que existam, não se tendo obrigado a pagar qualquer quantia aos exequentes, a título de subsídios ou outro.

No entanto, se alguém estiver obrigado a prestar um facto em prazo certo e não o cumprir, o credor pode requerer a prestação por outrem, se o facto for fungível, bem como a indemnização moratória a que tenha direito, ou, como se verificou no caso,  a indemnização por dano sofrido com a não realização da prestação, podendo também pedir a aplicação de uma sanção pecuniária compulsória (artº 868º, nº 1 do CPC).

Poder-se-á questionar, se a obrigação tinha prazo para se cumprida.

Se entendermos que não tem, então os apelantes também deveriam ter seguido a tramitação prevista no artº 874º e seguintes do CPC, requerendo a fixação de um prazo pelo tribunal, constituindo mais uma razão para a procedência dos embargos.

Por outro lado, se considerarmos que o apelado ao obrigar-se nos termos em que se obrigou,  significa que se obrigou imediatamente, após a transação, a proceder à transferência,  o que resultaria da adoção da expressão “desde já[1]” inserta na cláusula 4ª e ultrapassado esse prazo há muito, assistiria ao apelantes o direito de requerer uma indemnização pelo dano sofrido com a não realização da prestação, sem ter de recorrer previamente ao disposto no artº 874º do CPC, como se nos afigura.

Não obstante, em qualquer dos entendimentos, sempre os apelantes tinham de ter liquidado a quantia exequenda,  o que não fizeram (artº 868º, nº 1 do CPC). No caso, a liquidação não depende de simples cálculo aritmético e a obrigação de liquidar não se basta com a mera indicação de um valor, sem qualquer explicação para tal indicação,  sendo necessário que sejam demonstradas as operações efetuadas e a razão de ser dos valores mencionados, o que não foi feito.

Assim, sempre, pelo menos, por  falta de liquidação incidental, bem como pela  falta de certeza, os embargos devem proceder, como se entendeu na sentença recorrida.

Por último, importa que se refira que, embora já após as conclusões, os apelantes pedem a condenação do apelado como litigante de má fé, mas nenhumas razões invocam nas conclusões para a procedência desse pedido.

Sumário:

(…).

            IV - Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal em julgar improcedente o recurso, confirmando a decisão recorrida.

Custas pelos apelantes.

Coimbra, 22 de novembro de 2022





[1] Neste momento, a contar do instante em que se fala; imediatamente, a partir de agora – Grande Dicionário da Língua Portuguesa, Tomo III, Edição  do Círculo dos Leitores.