Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
92/10.4PAPBL-B.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE DIAS
Descritores: QUEBRA DO SEGREDO BANCÁRIO
PRESSUPOSTOS
Data do Acordão: 10/13/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE POMBAL
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: INDEFERIDO
Legislação Nacional: 78, N.º 1 E 79ºDO REGIME GERAL DAS INSTITUIÇÕES DE CRÉDITO E SOCIEDADES FINANCEIRAS, APROVADO PELO DL N.º 298/92, DE 31 DE DEZEMBRO E 135º DO CPP
Sumário: 1. O incidente de quebra de sigilo bancário só terá lugar quando houver recusa por parte da instituição bancária com fundamento de que a prestação da informação solicitada viola o dever de sigilo.
2. Não se está em presença de uma recusa de informação com fundamento na violação do dever de sigilo quando o Banco informa sobre o que concretamente lhe é pedido ou informa que não possui dados suficientes para satisfazer o solicitado.
Decisão Texto Integral: pág. 4
Vêm remetidos a este Tribunal os presentes autos de incidente relativo a segredo profissional (sigilo bancário).
Pelos despachos de fls. 14 a 17 e 23, destes autos, foi justificada a recusa por parte daquela instituição, a coberto do segredo bancário e, foi ordenado o envio ao Tribunal da Relação de Coimbra para efeitos do disposto no art. 135 nº 2 e 3 e 182 nº 1 e 2, do CPP.
Dispõe o art. 78, n.º 1 do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo DL n.º 298/92, de 31 de Dezembro, e alterado pelos Decretos Lei n.º 246/95, de 14 de Setembro, n.º 222/99, de 22 de Junho n.º 250/2000, de 13 de Outubro, e n.º 285/2001, de Novembro «que os membros dos órgãos de administração ou de fiscalização das instituições de crédito, os seus empregados, mandatários, cometidos e outras pessoas que lhes prestem serviços a título permanente ou ocasional não podem revelar ou utilizar informações sobre factos ou elementos respeitantes à vida da instituição ou às relações desta com os seus clientes cujo conhecimento lhes advenha exclusivamente do exercício das suas funções ou da prestação dos seus serviços», mais referindo o n.º 2 que «estão, designadamente, sujeitos a segredo os nomes dos clientes, as contas de depósito e seus movimentos e outras operações bancárias».
Por sua vez, o art. 79, n.º 2, aIs. d) e e) do referido diploma estabelece que os factos e elementos cobertos pelo dever de segredo só podem ser revelados, para além de outras situações, nos termos previstos na lei penal e de processo penal , ou quando exista outra disposição legal que expressamente limite o dever de segredo.
Nos termos do art. 135, nº 3 do CPP, “o tribunal…pode decidir da prestação de testemunho com quebra do segredo profissional sempre que esta se mostre justificada, segundo o princípio da prevalência do interesse preponderante, nomeadamente tendo em conta a imprescindibilidade do depoimento para a descoberta da verdade, a gravidade do crime e a necessidade de protecção de bens jurídicos” (redacção dada pelo art. 1 da L. 48/07).
Porém, in casu não se verificam os requisitos formais para que possa deferir-se o pedido de quebra de sigilo.
Em momento algum a instituição de crédito Caixa Económica Montepio Geral se escusou a fornecer os elementos solicitados com fundamento de que tal implicava violação do dever de sigilo imposto pelo Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras. Nas respostas desta instituição de crédito, fls. 11, 14 (repetida a fls. 33) não é invocado tal fundamento, mas antes se responde ao solicitado ou se informa que não há dados suficientes para a resposta.
Em causa o cheque nº 2586563120 e conforme fls. 32 apenas foi solicitado:
- Identificação do balcão onde o dito cheque foi levantado, em que data e hora, preservação de eventuais imagens recolhidas e informação de todos os elementos identificativos referentes a esse movimento do cheque.
- Tendo o Montepio respondido que, aquele cheque sobre a Caixa de Crédito Agrícola foi depositado em 08-04-2010, ás 14h47m, numa caixa automática no balcão da Figueira da Foz (indicando a morada do balcão).
Parece-nos que foram respondidas as questões concretas suscitadas, assim como parece que o banco entendeu ter respondido a todos os elementos solicitados.
“Informação de todos os elementos identificativos referentes ao movimento”, não concretiza, não encerra nenhuma informação específica.
Temos que da informação solicitada pela autoridade policial não possa o Mº Pº concluir que foi solicitada informação “acerca do titular da conta onde foi efectuado o depósito do cheque nº 2586563120”.
Provavelmente tal não sucederia se os elementos necessários fossem solicitados pela autoridade judiciária à entidade bancária – art. 135 do CPP.
Nos termos do art. 1, al. b), do CPP, considera-se autoridade judiciária: o juiz, o juiz de instrução e o Ministério Público, cada um relativamente aos actos processuais que cabem na sua competência.
Não se solicitou, em concreto, que a entidade bancária indicasse o titular da conta onde foi descontado o montante do cheque.
Não houve recusa a tal informação (porque não solicitada expressamente), nem se invocou violação da lei do sigilo.
Face ao ofício resposta da entidade bancária, a autoridade judiciária competente deveria concretizar os elementos que pretendia renovando a solicitação e não avançar pela instauração deste incidente.
Sem tais elementos certificados não se pode decidir que se mostra justificada a quebra do segredo profissional.
E o incidente de quebra de sigilo profissional, só terá lugar quando houver recusa com fundamento que a informação viola o dever de sigilo.
A jurisprudência do STJ em Acórdão de Fixação de Jurisprudência de 31-03-2008 , in www.dgsi.pt, refere: «1. Requisitada à instituição bancária, no âmbito de inquérito criminal, informação referente a conta de depósito, a instituição interpelada só poderá legitimamente escusar-se a prestá-la com fundamento em segredo bancário; 2. Sendo ilegítima a escusa, por a informação não estar abrangida pelo segredo, ou por existir consentimento do titular da conta, o próprio tribunal em que a escusa for invocada, depois de ultrapassadas eventuais dúvidas sobre a ilegitimidade da escusa ordena a prestação da informação, nos termos do nº 2 do art. 135 do CPP; 3. Caso a escusa seja legítima, cabe ao tribunal imediatamente superior àquele em que o incidente se tiver suscitado ou, no caso de o incidente se suscitar perante o Supremo Tribunal de Justiça, ao pleno das secções criminais, decidir sobre a quebra do segredo, nos termos do nº 3 do mesmo artigo».
Assim que o presente incidente não possa proceder.
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Acordam nesta Relação e Secção Criminal em, por falta de pressupostos não conhecer do incidente da quebra de sigilo profissional, suscitado.
Sem custas.
JORGE DIAS
BRÍZIDA MARTINS