Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
12/17.5GCGVA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: VASQUES OSÓRIO
Descritores: MEDIDA DA PENA;
PENA DE SUBSTITUIÇÃO
Data do Acordão: 09/12/2018
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: GUARDA (J C GENÉRICA DE GOUVEIA)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: REVOGADA PARCIALMENTE
Legislação Nacional: ARTS. 40.º, 42.º, 44.º E 71.º DO CP
Sumário:
I – Prevenção e culpa são, então, os factores a ter em conta na aplicação da pena e determinação da sua medida.
II - Toda a pena que responda adequadamente às exigências preventivas e não exceda a medida da culpa é uma pena justa (Figueiredo Dias, Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, 2ª Edição, 2ª Reimpressão, 2012, Coimbra Editora, pág. 84).
III - Sobrepondo-se as circunstâncias agravantes às circunstâncias atenuantes e sendo elevadas as exigências de prevenção, a pena de oito meses de prisão fixada pela 1ª instância [pela prática do crime de violação de imposições, proibições ou interdições], situada que está, sensivelmente a meio do primeiro quarto e da metade da moldura abstracta aplicável, mostra-se adequada, proporcional e plenamente suportada pela medida da culpa do arguido, pelo que, deve ser mantida.
IV - Não obstante a personalidade mal formada e desconforme ao direito, os antecedentes criminais do arguido e a ausência de sinais demonstrativos da interiorização da sua culpa, cremos que as concretas circunstâncias da prática dos factos ainda permitem concluir que a execução da pena de prisão efectiva decretada em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância assegurará eficazmente a sua reintegração social e prevenirá a sua “reincidência”.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra

I. RELATÓRIO
No Tribunal Judicial da Comarca da Guarda – Juízo de Competência Genérica de Gouveia, o Ministério Público requereu o julgamento, em processo especial sumário, do arguido A, com os demais sinais nos autos, imputando-lhe a prática, em autoria, de um crime de violação de imposições, proibições ou interdições, p. e p. pelo art. 353º do C. Penal.

Por sentença de 11 de Julho de 2017, foi o arguido condenado, pela prática do imputado crime, na pena de oito meses de prisão.
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Inconformado com a decisão, recorreu o arguido, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões:
1. Peca por manifesto excesso a pena de 8 (oito) meses de prisão aplicada;
2. O arguido não regista qualquer antecedente criminal por crime de violação de imposições, proibições ou interdições;
3. Mostram-se violados os artigos 40º, 70º e 71º do Código Penal;
4. Mostra-se violado o princípio da proporcionalidade, constitucionalmente garantido;
5. Afigura-se proporcional e adequada a aplicação ao arguido de uma pena que não exceda os 4 (quatro) meses de prisão;
6. Na procedência da primeira questão suscitada, deverá ponderar-se a aplicação de uma pena de substituição, poder-dever a que o Julgador está vinculado.
7. O cumprimento da pena de prisão efectiva mostra-se desproporcionado e desnecessário, implicando desastrosas consequências na vida do Recorrente.
8. A suspensão da execução da pena satisfará convenientemente as finalidades da punição.
9. Se assim não se entender, sempre se dirá que cumprimento da pena em regime de permanência na habitação, verdadeira pena de substituição, satisfaz suficientemente as necessidades de prevenção e a tutela do bem jurídico protegido, e impede o efeito criminógeno particularmente activo nas penas de prisão de curta duração.
10. Mesmo que assim não se entenda, a substituição da pena por prisão por dias livres, mesmo não evitando o contacto com o meio prisional e com os seus efeitos, mostra-se mais adequada ao caso que o cumprimento da pena em regime contínuo, promovendo fortemente a censura da conduta criminosa, mas permitindo manter a inserção social, profissional e familiar do arguido.
Termos em que requer a V/ Exas. Se dignem dar provimento ao presente Recurso, revogando a Douta Sentença proferida, substituindo-a por outra que determine a aplicação ao arguido de uma pena que não exceda os 4 (quatro) meses de prisão, procedendo à sua substituição por uma das penas Substitutivas hierarquicamente referidas, assim se fazendo JUSTIÇA.
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Respondeu ao recurso a Digna Magistrada do Ministério Público, formulando no termo da contramotivação as seguintes conclusões:
1. O arguido/recorrente A, que impugna a sentença condenatória de fls. 151 e ss., que o condenou pela prática, como autor material, na forma consumada, de um crime de violação de imposições, proibições ou interdições, p. e p. pelo artigo 353.º do Código Penal, na pena de 08 (oito) meses de prisão.
2. Inconformado com tal decisão, veio o arguido/recorrente dela interpor recurso, entendendo que peca por excesso, mostrando-se violado os artigos 40.º, 70.º e 71.º do Código Penal, bem como o principio da proporcionalidade e que deveria ter-se optado pela aplicação de uma pena substitutiva da pena de prisão, nomeadamente, suspensão da execução da pena de prisão, regime de permanência na habitação ou prisão por dias livres.
3. Somos forçados a não aderir à tese propalada pelo arguido/recorrente, entendendo que a pena aplicada se mostra de acordo com os critérios de escolha e determinação da pena ínsitos nos artigos 40.º, 70.º e 71.º, do Código Penal.
4. É certo que a pena de prisão deve ser sempre encarada como último reduto no que diz respeito ao critério de escolha da pena, porém, o arguido já foi condenado, por diversas vezes (mais concretamente, nove vezes), nas quais já foram aplicadas diferentes penas, inclusivamente, em sete delas foram aplicadas penas substitutivas da pena de prisão.
5. Para além do mais, sopesadas as todas as circunstâncias do caso em apreço, nos termos do artigo 71.º n.º 1, respeitando os limites da culpa e das exigências de prevenção, designadamente, o dolo directo do arguido/recorrente, a culpa e a ilicitude elevadas, a necessidade de desviar o arguido de comportamento similares e, como não podia deixar de ser, a existência de antecedentes criminais, o tribunal considerou e bem, a nosso ver, que a aplicação de uma medida não detentiva da liberdade já não seria suficiente para acautelar as aludidas exigências de prevenção, que o caso requer e, por conseguinte, deverá ser-lhe-ia aplicada uma pena privativa da liberdade.
6. Com efeito, numa ponderação entre a reposição da confiança dos cidadãos na norma violada e a protecção do bem jurídico e a ressocialização do arguido/recorrente, com as circunstâncias do caso concreto, é salutar o desrespeito evidenciado pelo arguido/recorrente à autoridade do sistema de justiça estadual e a sua desconformidade com a regras criminais, motivo pelo qual não se vislumbra, do leque de penas de substituição, uma que salvaguarde as necessidades e as finalidades da punição que se fazem sentir no caso em concreto.
7. Pelo que, o Mmo. Juiz conclui que este é um caso paradigmático do efeito “Sharp, short, schock” da pena de prisão, somente esta contribuindo para a consciencialização do arguido quanto à gravidade das suas condutas e consequência daí decorrentes e inexistindo qualquer outra pena que satisfaça as exigências do caso concreto, está afastar qualquer uma das penas substitutivas elencadas no Código Penal.
8. Por todo o exposto, entendemos que a douta decisão ora recorrida não merece qualquer reparo, por inexistência de violação do disposto nos artigos 40.º, 70.º e 71.º, do Código Penal, sendo a pena aplicada, justa, adequada e proporcional ao caso concreto e deverá manter-se, devendo, nesta conformidade, julgar-se o recurso apresentado pelo arguido/recorrente, totalmente improcedente.
Nesta conformidade, deve negar-se provimento ao recurso, mantendo-se a decisão nos precisos termos em que foi formulada, fazendo desta forma, o Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, a tão costumada Justiça.
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Na vista a que se refere o art. 416º, nº 1 do C. Processo Penal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da correcção da medida concreta da pena de prisão aplicada e da possibilidade de a mesma ser cumprida em regime de permanência na habitação com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, caso venham a estar reunidos os necessários requisitos e, para esta eventualidade, concluiu pelo parcial provimento do recurso.
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Foi cumprido o art. 417º, nº 2 do C. Processo Penal.

Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.
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II. FUNDAMENTAÇÃO
Dispõe o art. 412º, nº 1 do C. Processo Penal que, a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido. As conclusões constituem pois, o limite do objecto do recurso, delas se devendo extrair as questões a decidir em cada caso.
Assim, atentas as conclusões formuladas pelo recorrente, as questões a decidir, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, são:
- A excessiva medida da pena de prisão;
- A substituição da pena de prisão.
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Importa ter presente, para a resolução destas questões, o que de relevante consta da sentença recorrida. Assim:

A) Nela foram considerados provados os seguintes factos:
“ (…).
1. O arguido A foi condenado, por sentença datada de 02 de Fevereiro de 2015, proferida no âmbito do processo comum n.º 501/13.0GCBNV, da Secção Criminal – J1, Instância Local de X, numa pena de 10 (dez) meses de prisão, a cumprir em dias livres, em 60 períodos correspondentes a fins-de-semana, com a duração de 48 horas cada um, e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 18 (dezoito) meses, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelos artigos 292.º, n.º 1 e 69.º, n.º 1, al. a), do Código Penal.
2. Tal sentença transitou em julgado em 11 de Dezembro de 2015.
3. Por via do dispositivo de tal sentença, foi o arguido notificado, disso ficando bem ciente, do conteúdo e duração daquela pena acessória.
4. A carta de condução do arguido encontra-se apreendida no processo comum n.º 501/13.0GCBGNV, para cumprimento da pena acessória, desde o dia 06.03.2017.
5. No dia 29 de Maio de 2017, pelas 10h50, o arguido A conduzia o veículo automóvel, ligeiro de mercadorias, com a matrícula XX-XX-XX, na Estrada Nacional XX, na Rotunda da X, em Y.
6. O arguido agiu de modo livre, voluntário e consciente, sabendo e querendo violar a proibição de conduzir veículos motorizados que lhe tinha sido imposta por sentença criminal, assim faltando à obediência a ordem legítima, com base legal, emanada de autoridade competente, e que lhe fora devidamente notificada.
[Mais se provou que:]
7. O arguido foi condenado em 27.06.2000, pela prática em 25.07.1999 de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, nos autos de processo comum, tribunal singular com o n.º 252/99.7GCBNV do Tribunal Judicial de X (1.º Juízo), na pena de 80 dias de multa, à taxa diária de 600$00 (seiscentos escudos), e na pena de acessória de proibição de conduzir veículos a motor por dois meses e meio, transitada em 18.09.2000 e declarada extinta a pena de multa pelo pagamento, por despacho de 26.02.2003.
8. O arguido foi condenado em 17.11.2000, pela prática em 17.11.2000 de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez e de um crime de desobediência, nos autos de processo especial sumário com o n.º 303/00.4GCBNV do Tribunal Judicial de X (2.º Juízo), na pena de 3 meses de prisão, suspensa por um ano e na pena de 80 dias de multa, à taxa diária de 700$00 (setecentos escudos) e na pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor por 4 meses, transitada em julgado em 4 de Dezembro de 2000 e declarada extinta por despacho de 6.03.2002.
9. O arguido foi condenado em 23.05.2005, pela prática em 29.04.2005, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, nos autos de processo especial sumário com o n.º 114/05.0GTSTR do Tribunal de X, na pena de 6 meses de prisão, suspensa por 3 anos, e na pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor por um ano, sendo a pena de prisão declarada extinta por despacho de 23.01.2009 e a pena acessória declarada de inibição de conduzir extinta em 02.06.2009.
10. O arguido foi condenado em 14.07.2005, pela prática em 05.07.2005, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, nos autos de processo especial abreviado com o n.º 340/03.7PAVFX do Tribunal de Família e Menores e Comarca de X (2.º Juízo), na pena de 8 meses de prisão, suspensa por três anos, com a condição de frequentar curso junto do IRS de prevenção rodoviária e na pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor por 8 meses, transitada em julgado em 17.02.2006 e declarada extinta por despacho de 07.05.2009.
11. O arguido foi condenado em 24.06.2008, pela prática em 14.05.2008, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, nos autos de processo especial sumário com o n.º 156/08.4GTALQ do Tribunal Judicial de X (1.º Juízo), na pena de 11 meses de prisão, substituída por prisão por dias livres que se fixou em 66 períodos de 40 horas cada um e na pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor por um ano e quatro meses, transitada em julgado em 14.07.2008 e declarada extinta a pena de prisão por despacho de 23.03.2014 e a pena acessória de inibição de conduzir por despacho de 05.04.2014.
12. O arguido foi condenado em 27.10.2009, pela prática em 30.09.2008, de um crime de desobediência, nos autos de processo especial sumaríssimo com o n.º 586/08.1TABNV do Tribunal Judicial de X (1.º Juízo), na pena de 120 dias de multa, à taxa diária de €6,50, transitada em julgado em 26.01.2010 e declarada extinta por despacho de 24.01.2011, pelo pagamento da multa.
13. O arguido foi condenado em 03.11.2015, pela prática em 10.09.2013, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, nos autos de processo comum com o n.º 501/13.0GCBNV do Tribunal Judicial de X, na pena de prisão, substituída por prisão por dias livres que se fixou em 60 períodos e na pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor por 18 meses.
14. O arguido foi condenado em 11.11.2015, pela prática em 01.11.2015, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, nos autos de processo sumário com o n.º 610/15.1GCBNV do Tribunal Judicial de X, na pena de 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por um ano e na pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor por 6 meses.
15. O arguido foi condenado em 22.04.2016, pela prática em 23.06.2015, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, nos autos de processo comum com o n.º 440/15.0GCBNV do Tribunal Judicial de X, na pena de 18 meses de prisão, suspensa na sua execução por um ano com regime de prova.
16. O arguido reside sozinho e tem um filho com cinco anos de idade, que se encontra a residir com a progenitora. O arguido dedica-se ao comércio de Z na exploração dos familiares localizada em Y e com a extensão de cerca de 17 hectares, auferindo um rendimento líquido anual de € 5.000,00. O arguido tem dificuldade em gerir situações de maior adversidade ou tensão, recorrendo ao consumo de bebidas alcoólicas, o que implicado para si o confronto regular com o aparelho de aplicação de justiça. O arguido foi condenado à frequência do “Programa Stop”, vocacionado para indivíduos vinculados à problemática da condução de veículos automóveis sob efeito do álcool e cujo efectivo cumprimento tem sido dificultado pelo facto de o arguido se encontrar preso ao fim-de-semana, dias em que os cursos integrantes daquele programa decorrem. O arguido possui um veículo automóvel no valor de € 2.000,00.
(…)”.

B) Inexistem factos não provados e dela consta a seguinte fundamentação, quanto à escolha e determinação da medida concreta da pena:
“ (…).
A todo o facto-ilícito-típico corresponde uma reacção penal pela qual a comunidade expressa o seu juízo de desvalor sobre os factos e a conduta realizada por quem viola os comandos legais do ordenamento penal, estando a mesma definida no respectivo tipo legal.
Escolha da Pena
O crime de violação de imposições, proibições ou interdições é punido pelo artigo 353.º do Código Penal, com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias.
Admitindo a punição prevista a aplicação, em alternativa, de duas penas principais, cumpre antes de mais proceder à determinação da espécie de pena que concretamente irá ser aplicada, atendendo, para o efeito, ao sentido e alcance do princípio geral que resulta da combinação dos artigos 40.º e 70.º do Código Penal.
De acordo com os preceitos supra referidos, o critério geral de escolha da pena, nos casos em que o legislador admita o funcionamento em alternativa de uma reacção detentiva e de uma pena não privativa da liberdade, é o de que o tribunal deverá dar preferência à segunda, sempre que com ela seja possível realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
Assim, dado que a aplicação de penas tem por objectivo a protecção de bens jurídicos e a integração do agente na sociedade, serão sempre e apenas considerações de prevenção geral e especial, e nunca de retribuição da culpa, a decidir da possibilidade de, em cada caso concreto, preferir uma ou outra reacção criminal.
Por outro lado, de entre as finalidades preventivas, o legislador português destaca as finalidades de prevenção especial como fundamentadoras do movimento de luta contra as penas curtas de prisão aplicáveis à pequena e média criminalidade; pelo que o tribunal só deverá recusar a aplicação da pena alternativa não privativa da liberdade, quando tal opção se revele inconveniente para a viabilidade e sucesso de um projecto de ressocialização, funcionando as exigências de prevenção geral – enquanto defesa do ordenamento jurídico – como um limite mínimo à actuação das exigências de socialização.
Atentemos então, primeiramente, nas exigências de prevenção geral positiva que no caso se fazem sentir.
No que concerne ao crime de violação de imposições, proibições ou interdições, atentando na praxis dos Tribunais constatamos que se mostram claramente generalizadas condutas como a em causa dos autos, questionando a autoridade ínsita nas decisões proferidas pelos Tribunais, sendo também bastante elevadas as exigência de prevenção geral no que respeita a este ilícito.
Ora, é necessário que todos os cidadãos se consciencializem que o cumprimento da lei e das decisões judiciais se sobrepõe a interesses individuais não tutelados nem protegidos, devendo todos os cidadãos em geral e o arguido em particular convencer-se da impossibilidade de confusão entre direitos e liberdades com ausência de respeito por directivas consagradas na lei e completa arbitrariedade perante ordens emanadas por quem tem com competência para o seu efeito.
Relativamente às exigências de prevenção especial importa desde logo dizer que o arguido, nascido a 15 de Fevereiro de 1971, foi já condenado por diversas vezes, pela prática de ilícitos criminais, desde 2000 tendo sido condenado pela prática de nove crimes, incluindo oito crimes de condução de veículo em estado de embriaguez, e dois crimes de desobediência; condenações que revelam, claramente, que os factos em causa nos presentes autos não correspondem a episódios isolados na vida do arguido, o qual, sistematicamente, tem vindo a praticar ilícitos de natureza criminal.
Acresce que, da análise das condenações do arguido ressalta que, desde 2000, este foi já condenado, por sete vezes, em penas substitutivas de penas de prisão – numa primeira condenação tendo a pena de 3 meses de prisão sido suspensa por um ano; após tendo a pena de 6 meses de prisão sido suspensa por 3 anos; em 2005 tendo a pena de 8 meses de prisão sido suspensa por três anos, com condição de frequentar curso de prevenção rodoviária; em 2008 tendo uma pena de 11 meses de prisão, substituída por prisão por dias livres; em 2015 tendo-lhe sido aplicada pena de prisão substituída por 60 períodos de prisão por dias livres; em 2015 tendo uma pena de 6 meses de prisão suspensa na sua execução por um ano e em 2016 uma pena de 18 meses de prisão suspensa na sua execução por um ano com regime de prova – revelando o arguido, claramente, com os factos em causa nos presentes autos, que nem mesmo tais condenações lograram afastá-lo da prática de ilícitos criminais.
De salientar ainda que a pena acessória (18 meses de inibição) aplicada no processo no qual o arguido foi condenado por decisão de 2 de Fevereiro de 2015, transitada em julgado em 11 de Dezembro de 2015, na pena de 10 (dez) meses de prisão, a cumprir em dias livres, em 60 períodos correspondentes a fins-de-semana, com a duração de 48 horas cada um, é precisamente a que está na génese da verificação do preenchimento dos elementos dos crimes pelos quais o arguido se mostrava acusado nos presentes autos, revelando o arguido, com a sua actuação, escassos meses depois de iniciado a execução da pena de substituição, não ter sido suficientemente influenciado, como deveria, pelas penas que já lhe foram aplicadas, sendo pois muito elevadas as exigências de prevenção especial.
Com efeito, com a sua actuação reiteradamente desconforme ao Direito o arguido demonstra que não foi, como devia, suficientemente influenciado pelas penas que lhe foram aplicadas, revelando-se pois particularmente premente, no plano da prevenção especial, a necessidade de uma resposta punitiva que não só consciencialize o arguido para a gravidade dos factos praticados, mas também simultaneamente previna a prática de comportamentos da mesma natureza, fazendo-lhe sentir a anti-jurisdicidade e gravidade das suas condutas.
Assim e não obstante estarmos perante um cidadão social e profissionalmente integrado, em face da reiterada actuação do arguido de forma desconforme ao Direito e insensível aos bens jurídicos que se pretendem tutelar com a incriminação das suas descritas condutas, entende o Tribunal que não estão já reunidas as condições que permitam formar um juízo de prognose favorável que permita concluir pela suficiência da pena não privativa da liberdade para fazer face às exigências de prevenção especial que, in casu, se reputam elevadíssimas – não respondendo também suficiente e adequadamente às exigências de prevenção geral também bastante significativas – apenas com a escolha da pena mais gravosa se logrando alcançar as finalidades da punição no caso concreto.
Da medida concreta das penas
A pena a determinar em concreto, dentro dos limites da lei, resultará da apreciação da culpa do agente e das exigências de prevenção; tendo em consideração todas as circunstâncias que – não fazendo parte do tipo legal convocado nem tendo sido já atendidas para os efeitos de qualificação – sejam expressivas da culpa do arguido e da medida das necessidades de prevenção (cfr. artigo 71.º do Código Penal).
O mínimo legalmente previsto corresponde ao imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada e o máximo inultrapassável à medida da culpa do agente do crime.
Desta forma, o espaço possível de resposta às necessidades de reintegração social do agente é o que se define entre aquele mínimo imprescindível à prevenção geral positiva e o máximo consentido pela sua culpa.
O crime de violação de imposições, proibições ou interdições é punido com pena de prisão até dois anos.
Relativamente às exigências de prevenção geral e especial, valem aqui, mutatis mutandis, as considerações supra tecidas.
No que concerne ao crime de violação de imposições, proibições ou interdições, há a ponderar: o modo de execução dos factos e a gravidade das suas consequências, normal atento o crime em apreço; a significativa ilicitude dos actos praticados pelo arguido, consubstanciados na natureza da violação dos deveres impostos por sentença judicial e a intensidade do dolo, na sua forma directa e portanto na sua modalidade mais intensa.
A favor do arguido releva o facto de o arguido estar social e profissionalmente integrado; sendo aqui de salientar que relativamente a este ilícito o arguido não tem antecedentes criminais.
Sopesados todos os factores supra expostos, reputamos de suficiente e adequada a aplicação ao arguido de uma pena de 8 meses de prisão.
Pena de Substituição
Atendendo a que o processo de determinação da pena não se esgota nas operações de determinação da pena principal aplicável e de determinação do seu quantum, comportando a fase, pelo menos eventual, de escolha da espécie de pena a cumprir efectivamente; cumprirá ponderar da aplicação ao arguido de uma pena de substituição.
Nesta ponderação o Tribunal está sujeito a uma discricionariedade vinculada, já que tem o poder-dever de, atentos os pressupostos materiais e formais de que estas dependem, substituir a pena principal concretamente fixada.
Ora as penas de substituição radicam essencialmente no movimento de política criminal adverso à aplicação de penas curtas de prisão, sendo o critério essencial que preside à substituição o da adequação da pena substitutiva às necessidades e finalidades da punição.
Não existindo uma hierarquia legal de penas de substituição, quando o Tribunal tenha ao seu dispor mais do que uma pena de substituição a realizar de forma adequada as finalidades da punição, o critério de escolha da pena a aplicar terá que assentar na avaliação das exigências de prevenção especial ou de socialização que se fazem sentir em concreto; optando-se por aquela que, atento a prognose favorável no sentido da ressocialização em liberdade e a não oposição das irrenunciáveis exigências de prevenção geral de defesa da ordem jurídica, as realiza de forma mais adequada.
No caso em apreço estariam reunidos os pressupostos formais da pena de multa de substituição (cfr. artigo 43.º do Código Penal), suspensão da execução da pena de prisão (cfr. artigo 50.º do Código Penal), prestação de trabalho a favor da comunidade (cfr. artigo 58.º do Código Penal) e prisão por dias livres (cfr. artigo 45.º do Código Penal).
A aplicação de penas não pode ser vista desligada do seu concreto destinatário e portanto da especificidade de cada indivíduo e das exigências de prevenção especial, mormente de ressocialização que este convoca.
Ora, haverá lugar à suspensão da execução da pena de prisão quando a simples censura do facto e a ameaça daquela pena forem bastantes para afastar o arguido da criminalidade, satisfazendo simultaneamente as necessidades de prevenção do crime (cfr. artigo 50.º, n.º 1, do Código Penal).
A pena de prisão suspensa, sujeita ou não a condições ou obrigações, deverá revelar-se a reacção que exprima suficiente e adequadamente o desvalor ético-social da conduta e que não só permita antever mas também propiciar ao arguido, a sua reintegração na sociedade.
Não obstante, sendo certo que um dos vectores que compõem os fins das penas são as necessidades de prevenção geral e portanto a protecção dos bens jurídicos violados e naturalmente a protecção da sociedade em relação ao crime; só quando também esta finalidade se cumpra poderá existir o juízo de prognose favorável à suspensão da correspondente pena de prisão.
In casu, conforme supra aludimos, os antecedentes criminais do arguido são nitidamente reveladores de uma personalidade claramente desconforme ao Direito e do claro desprezo tem tido pelas oportunidades que lhe foram sendo dadas, tendo, inclusivamente, praticado os factos em causa nos presentes autos já depois de ter sido condenado em pena de prisão substituída por prisão por dias livres por crime de natureza rodoviária.
Com efeito, estão em causa nos presentes autos factos ocorridos a 29 de Maio de 2017 e então o arguido já havia sido condenado, com trânsito em julgado, no processo n.º 501/13.0GCBNV (sentença transitada em julgado a 11 de Dezembro de 2015), pela prática em 10 de Setembro de 2013, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de prisão de 10 meses de prisão, a cumprir em dias livres, em 60 períodos correspondentes a fins-de-semana; tendo o arguido, posteriormente àquela condenação, sido já condenado por duas vezes pela prática de dois crimes de condução de veículo em estado de embriaguez, em 2015 e 2016 (em pena de prisão suspensa), sendo que a prática dos factos em causa nos autos ocorreu no decurso do período da suspensão da execução da pena de prisão (por um ano), aplicada no processo n.º 440/15.0GCBNV.
Ora, avaliando as elevadíssimas exigências de prevenção especial de socialização que se fazem sentir em concreto, não obstante a integração social e familiar do arguido A, os antecedentes criminais do arguido para além de reveladores de uma personalidade claramente desconforme ao Direito, conforme supra aludimos, reflectem que o arguido, pelas suas condutas ilícitas recidivas, não tem sido influenciado pelas penas que lhe têm sido aplicadas, nem mesmo as solenes advertências e possibilidade de efectiva privação de liberdade resultando das penas de prisão suspensas não tendo surtido em si os efeitos desejados; entendendo-se pois que a mera suspensão da execução da pena de prisão – ainda que acompanhada de deveres / regime de prova - não responderia cabalmente às exigências de prevenção que o caso convoca, sendo que ao arguido foram já aplicadas penas de prisão a cumprir em dias livres e nem tais penas o afastaram da prática de crimes.
Entende pois o Tribunal ser este um caso paradigmático em que o efeito “sharp, short, schock” da pena de prisão e portanto da privação da liberdade, poderá contribuir para que o arguido se consciencialize (finalmente) quanto à gravidade das suas condutas e consequências daí decorrentes - e se afaste, no futuro, da prática de novos crimes, entendendo-se pois que nem a pena de substituição de prestação de trabalho a favor da comunidade nem a simples censura do facto e a ameaça da pena de prisão seriam já bastantes, para afastar o arguido da criminalidade; outra pena que não a pena de prisão efectiva satisfazendo, simultaneamente, as exigências de prevenção geral que o caso convoca, já que um dos vectores que compõem os fins das penas são precisamente as aludidas necessidades de prevenção geral e portanto a protecção dos bens jurídicos violados e naturalmente a protecção da sociedade em relação ao crime.
Assim, avaliando as exigências de prevenção especial de socialização que se fazem sentir em concreto e as exigências de prevenção geral ponderadas, entende-se que outra pena que não a pena de prisão efectiva, não lograria afastar o arguido A, no futuro, da prática de novos crimes, nem realizaria de forma adequada e suficiente as exigências de prevenção geral que o caso convoca, pelo que este deverá cumprir 8 meses de prisão efectiva.
(…)”.
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Questão prévia
O ponto 15 dos factos provados tem a seguinte redacção:
- O arguido foi condenado em 22.04.2016, pela prática em 23.06.2015, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, nos autos de processo comum com o n.º 440/15.0GCBNV do Tribunal Judicial de X, na pena de 18 meses de prisão, suspensa na sua execução por um ano com regime de prova.
Sendo o crime de condução de veículo em estado de embriaguez punível com pena de prisão até um ano (art. 292º, nº 1 do C. Penal), e impondo a lei que o período de suspensão da execução da pena de prisão igual ou superior a um ano seja igual à medida da prisão fixada (art. 50º, nº 5 do C. Penal), torna-se patente a existência de lapso de escrita no transcrito ponto de facto, quando refere a pena de prisão de dezoito meses, suspensa por um ano.
Com efeito, basta ler o certificado do registo criminal de fls. 30 a 44, em especial, fls. 44, para perceber que os dezoito meses correspondem à medida da pena acessória e que o ano corresponde à medida da pena principal e, consequentemente, também ao prazo de suspensão da respectiva execução.
A correcção do erro verificado não importa modificação essencial da decisão, e é admissível a sua eliminação pelo tribunal de recurso (art. 380º, nºs 1, b) e 2 do C. Processo Penal.
Assim, procedendo-se à eliminação do erro em questão, a redacção do ponto 16 dos factos provados da sentença passa a ser a seguinte:
- O arguido foi condenado em 22.04.2016, pela prática em 23.06.2015, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, nos autos de processo comum com o n.º 440/15.0GCBNV do Tribunal Judicial de X, na pena de um ano de prisão, suspensa na sua execução por um ano com regime de prova.
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Da excessiva medida da pena de prisão
1. Alega o recorrente – conclusões 1 a 5 – que não tendo antecedentes quanto ao crime praticado, se mostram violados os arts. 40º, 70º e 71º do C. Penal e o princípio constitucional da proporcionalidade, sendo excessiva a pena de oito meses de prisão aplicada e adequada uma pena cuja medida não exceda os quatro meses de prisão.
No corpo da motivação densifica a alegação, começando por dizer ser verosímil que tenha laborado em erro pois, tendo sido notificado em Março de 2016 da obrigação de entregar a carta de condução no processo nº 501/13.0GCBNV, em Abril de 2017 foi notificado da extinção de uma pena acessória, mas no processo nº 610/15.1GCBNV pelo que, tendo mediado entre ambas as notificações mais de um ano, embora sejam distintos os processos, foi induzido em erro, pensando que já podia conduzir o que, se não tem a virtualidade de excluir a ilicitude e a culpa, influirá na espécie e determinação da sanção. Depois, reconhecendo a ‘robustez’ do seu passado criminal com particular incidência no crime de condução de veículo em estado de embriaguez, mas frisando a qualidade de ‘primário’ quanto ao crime de violação de imposições, proibições ou interdições, invoca a circunstância de, registando condenações desde 1999 e com oito penas acessórias, não haver notícia da violação e qualquer delas. Finalmente, chama à colação a circunstância de ter conduzido para exercer a actividade de X, já que é o suporte da empresa familiar que assegura o sustento do seu agregado familiar.
Dito isto.
a. O arguido não impugnou a decisão proferida sobre a matéria de facto nos termos previstos no art. 412º, nº 3 do C. Processo Penal e da leitura da sentença não resulta que a mesma padeça de qualquer vício decisório previsto no nº 2 do art. 410º do mesmo código pelo que se tem por definitivamente fixada a matéria de facto, nos exactos termos em que o foi pela 1ª instância (cfr. art. 431º do C. Processo Penal).
Do elenco dos factos provados da sentença recorrida não consta, enquanto tal, a existência de erro em que tenha incorrido o arguido no sentido por este apontado, nem que o arguido tenha conduzido no exercício da actividade de floricultor e que seja o suporte da empresa familiar que assegura o sustento do seu agregado familiar.
Assim, evidente se torna que estas circunstâncias, porque não provadas, não podem relevar na operação de determinação da medida concreta da pena.
b. Como é sabido, a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade (art. 40º, nº 1 do C. Penal) mas, em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa (nº 2 do mesmo artigo). Concordantemente, estabelece o art. 71º, nº 1 do mesmo diploma que, a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção.
Prevenção e culpa são, então, os factores a ter em conta na aplicação da pena e determinação da sua medida, reflectindo a primeira a necessidade comunitária da punição do caso concreto e constituindo a segunda, dirigida ao agente do crime, o limite inultrapassável da pena (cfr. Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, Aequitas, Editorial Notícias, pág. 214 e ss.). Daí que, toda a pena que responda adequadamente às exigências preventivas e não exceda a medida da culpa é uma pena justa (Figueiredo Dias, Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, 2ª Edição, 2ª Reimpressão, 2012, Coimbra Editora, pág. 84).
Sendo aplicáveis ao crime, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal deve dar preferência a esta última, sempre que ela satisfaça, adequada e suficientemente, as exigências de prevenção (art. 70º do C. Penal).
O crime de violação de imposições, proibições ou interdições é punível com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias (art. 353º do C. Penal).
Aparentemente, o arguido não contesta a opção feita pela Mma. Juíza a quo pela pena de prisão, ao concluir que esta deve ser fixada em quantum não superior a quatro meses. E dizemos, aparentemente porque, se bem que sem maior desenvolvimento argumentativo, na conclusão 3, além de outros, indica-se como violado o art. 70º do C. Penal que, como resulta do supra exposto, contém o critério de escolha da pena.
Não obstante, sempre diremos que a opção da 1ª instância mostra-se correcta pois, como acertadamente se afirma na sentença em crise, são elevadas as exigências de prevenção geral, dada a frequência com que vem sendo praticado este tipo de ilícito, e são notórias as exigências de prevenção especial, dado o passado criminal do arguido e a sua incapacidade para ser influenciado pela aplicação de penas que não signifiquem privação da liberdade pelo que, a aplicação, in casu, de pena de multa não daria adequada resposta às exigências de prevenção requeridas e apenas contribuiria para o descrédito desta pena criminal.
Quanto ao mais.
O critério legal da determinação da medida da pena encontra-se previsto no art. 71º do C. Penal. Nos termos do disposto nos seus nºs 1 e 2, tal determinação, tendo em conta a moldura penal abstracta aplicável, é feita ponderando as exigências de prevenção geral e especial, a medida da culpa do arguido e todas as circunstâncias que, não sendo típicas, militem contra e a seu favor (sendo meramente exemplificativa a lista constante do citado nº 2).
É mediana a ilicitude do facto e não foram graves as suas consequências.
O arguido agiu com dolo intenso, tal como se refere na sentença recorrida, revelando acentuada energia criminosa.
Milita a favor do arguido a sua inserção social e laboral.
Pelas razões sobreditas, são elevadas, as exigências de prevenção geral e são notórias, as de prevenção especial.
A este propósito, cabe dizer que, tendo o arguido convocado a confissão parcial e a circunstância de viver com a companheira, tais circunstâncias não constam dos factos provados – com as consequências supra referidas – como a confissão não é mencionada na motivação de facto da sentença, nem o arguido esteve presente em qualquer sessão da audiência de julgamento onde a pudesse ter validamente produzido [cfr. actas de fls. 133 a 137, de fls. 148 a 150 e de fls. 171 a 172], acrescendo que, quanto à sua vida familiar, foi considerado provado [ponto 16 dos factos provados] que vive sozinho [em plena conformidade com o teor do Relatório Social de fls. 141 a144, onde consta que o arguido e B se separaram de forma efectiva e que aquele não assume a situação existente].
Assim, sobrepondo-se as circunstâncias agravantes às circunstâncias atenuantes e sendo elevadas as exigências de prevenção, a pena de oito meses de prisão fixada pela 1ª instância, situada que está, sensivelmente a meio do primeiro quarto e da metade da moldura abstracta aplicável, mostra-se adequada, proporcional e plenamente suportada pela medida da culpa do arguido, pelo que, deve ser mantida.

Da substituição da pena de prisão
3. Alega o recorrente – conclusões 8 a 10 – que a suspensão da execução da pena de prisão, o cumprimento da pena em regime de permanência na habitação ou a prisão por dias livres, dariam adequada satisfação às finalidades da punição pelo que, por esta ordem, deveria a pena de prisão ter sido substituída.
Vejamos.
Na sentença recorrida foi implicitamente afastada a eventual aplicação do regime de permanência na habitação, pela não verificação dos respectivos pressupostos formais de aplicação [é o que se infere de na sentença se ter escrito, «No caso em apreço estariam reunidos os pressupostos formais da pena de multa de substituição (cfr. artigo 43.º do Código Penal), suspensão da execução da pena de prisão (cfr. artigo 50.º do Código Penal), prestação de trabalho a favor da comunidade (cfr. artigo 58.º do Código Penal) e prisão por dias livres (cfr. artigo 45.º do Código Penal).»] ou seja, pela falta de consentimento do arguido quanto à aplicação do regime. E o mesmo se diga quanto ao regime de semidetenção.
Contudo, sempre com ressalva do devido respeito, o que deveria ter sido feito era apreciar a verificação ou não, dos pressupostos materiais destas penas de substituição e na hipótese afirmativa, procurar obter aquele consentimento que, caso não fosse dado, determinaria então a não substituição da pena principal.
Dito isto.
a. A pena de prisão não superior a cinco anos, deve ser suspensa na respectiva execução se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, for de concluir que a simples censura do facto e ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades de prevenção (art. 50º, nº 1 do C. Penal)
Pressuposto formal da suspensão da execução da pena de prisão, pena de substituição em sentido próprio, é que a medida da prisão decretada não seja superior a cinco anos. In casu, verifica-se este pressuposto.
Pressuposto material da sua aplicação é a possibilidade de formulação, pelo tribunal, de um juízo de prognose favorável ao agente, no sentido de que, considerando a sua personalidade, as condições da sua vida, a sua conduta anterior e posterior ao crime e as circunstâncias deste, a simples censura do facto e a ameaça da prisão, realizarão de forma adequada e suficiente, as finalidades da punição (art. 50º, nºs 1 e 2, do C. Penal).
O objectivo de política criminal visado por esta pena de substituição é “ (…) o afastamento do delinquente, no futuro, da prática de novos crimes e não qualquer «correcção», «melhora» ou – ainda menos – «metanóia» das concepções daquele sobre a vida e o mundo. (…). Ou, como porventura será preferível dizer, decisivo é aqui o «conteúdo mínimo» da ideia de socialização, traduzida na «prevenção da reincidência».” (Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, Aequitas, Editorial Notícias, pág. 343).
As sucessivas condenações sofridas pelo arguido, na sua maior parte, concretizadas com a aplicação de prisão suspensa na respectiva execução revelam uma personalidade mal formada, indiferente aos valores tutelados pelas normas penais violadas e à ameaça da respectiva sanção, incapaz de compreender a oportunidade de ressocialização que a aplicação de cada uma daquelas penas de substituição representou e que, por isso, desbaratou, acrescendo que, como se nota na sentença recorrida, quando praticou os factos objecto dos autos em 29 de Maio de 2017, decorria o período de suspensão da execução da pena de prisão imposta no processo nº 440/15.0GCBNV, tudo isto determinando, inexoravelmente, a impossibilidade de formulação da necessária prognose favorável.
Deste modo, porque não se verificam os pressupostos de aplicação da suspensão da execução da pena de prisão, não pode o arguido beneficiar da sua aplicação.
b. Nos termos do disposto no art. 44º, nº 1, a) do C. Penal, na redacção em vigor na data da prática dos factos, a pena de prisão não superior a um ano pode ser executada em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, sempre que se conclua que esta forma de cumprimento realiza, adequada e suficientemente, as finalidades da punição.
Pressupostos formais deste regime [na modalidade relevante] são, o consentimento do condenado e que a pena de prisão decretada não seja superior a um ano.
Pressuposto material da sua aplicação é apenas e só, que o tribunal possa concluir que o mesmo realiza de adequada e suficiente as finalidades da punição ou seja, as exigências de prevenção que, em cada caso, se verifiquem.
Com a entrada em vigor das alterações ao C. Penal introduzidas pela Lei nº 94/2017, de 23 de Agosto, o regime de permanência na habitação passou a estar previsto no art. 43º do referido código, resultando do seu nº 1, a) que, a pena de prisão efectiva não superior a dois anos pode ser executada em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, sempre que o condenado consinta, e se conclua que por este meio se realizam, adequada e suficientemente, as finalidades da execução da pena de prisão.
Por sua vez, dispõe o nº 1 do art. 42º do C. Penal que, a execução da pena de prisão, servindo a defesa da sociedade e prevenindo a prática de crimes, deve orientar-se no sentido da reintegração social do recluso, preparando-o para conduzir a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes. No mesmo sentido dispõe o art. 2º, nº 1 do C. da Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade.
Independentemente de o regime de permanência na habitação, após as modificações operadas pela Lei nº 94/2017, de 23 de Agosto dever, ou não, continuar a ser entendido como uma pena de substituição, na parte em que agora releva, são pressupostos formais da sua aplicação, a prisão efectiva não superior a dois anos e o consentimento do condenado.
Notificado para o efeito, o recorrente requereu, a fls. 233 a 234, a aplicação do regime de permanência na habitação.
As pessoas que com ele coabitam deram o seu consentimento, e a pena de prisão efectiva foi fixada em oito meses de prisão, pelo que, estão verificados os indicados pressupostos formais.
Finalmente, os serviços de reinserção social, após averiguações várias, asseguraram a compatibilidade da situação pessoal, familiar, laboral e social do arguido com as exigências de vigilância electrónica.
Pressuposto material da aplicação do regime é que através dele, se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da execução da pena de prisão ou seja, a finalidade preventivo-especial de reintegração do agente na sociedade, sem prejuízo de, a execução da pena de prisão dever satisfazer também exigências de prevenção geral positiva, sendo, portanto, objectivo principal da execução da pena de prisão a não-dessocialização do recluso (Maria João Antunes, Consequências Jurídicas do Crime, 1ª Edição, 2013, Coimbra Editora, pág. 79 e ss.).
Pois bem.
Não obstante a personalidade mal formada e desconforme ao direito, os antecedentes criminais do arguido e a ausência de sinais demonstrativos da interiorização da sua culpa, cremos que as concretas circunstâncias da prática dos factos ainda permitem concluir que a execução da pena de prisão efectiva decretada em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância assegurará eficazmente a sua reintegração social e prevenirá a sua ‘reincidência’
Assim, verificados que estão os pressupostos da aplicação do regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância, previstos no art. 44º, nº 1, a) do C. Penal, na redacção em vigor na data da prática dos factos [e também no regime legal que se lhe seguiu] e não existindo qualquer obstáculo de natureza técnica, deve o recorrente cumprir a pena de oito meses de prisão em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância.
Face ao teor da «Avaliação Global» que consta da última Informação da DGRSP, e sendo disso caso, a 1ª instância apreciará a conveniência e viabilidade de autorização de ausências necessárias para a actividade profissional do recorrente.
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III. DECISÃO
Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes do Tribunal da Relação em conceder parcial provimento ao recurso. Em consequência, decidem:
A) Determinar que a pena de oito meses de prisão que ao arguido A foi imposta nos autos, seja executada em regime de permanência na habitação, com fiscalização por meios técnicos de controlo à distância.
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B) Confirmar, quanto ao mais, a sentença recorrida.
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C) Recurso sem tributação, atenta a parcial procedência (art. 513º, nº 1 do C. Processo Penal).
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Coimbra, 12 de Setembro de 2018
Heitor Vasques Osório (relator)
Helena Bolieiro (adjunta)