Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
586/11.4TBACB-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ISABEL SILVA
Descritores: PROPRIEDADE HORIZONTAL
LEGITIMIDADE
CONDOMÍNIO
DEFEITOS
PARTE COMUM
DANOS
Data do Acordão: 01/27/2015
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE LEIRIA - ALCOBAÇA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTºS 1305º, 1414º E 1437º DO C. CIVIL.
Sumário: I – Numa ação em que um condómino pretende a reparação dos defeitos das paredes comuns dum prédio em propriedade horizontal, bem como ser ressarcido dos prejuízos sofridos na sua fração e causados pela existência desses defeitos, parte legítima é o Condomínio desse prédio.

II - O Administrador desse Condomínio, na sua própria pessoa, é parte ilegítima e intervirá na ação apenas enquanto representante legal do Condomínio.

Decisão Texto Integral:
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA

I - HISTÓRICO DO PROCESSO

                1.            P… instaurou ação contra S… – Gestão de Condomínios, Lda. , …  e Condomínio do Edifício … .

                Invocando ser proprietário de uma fração integrante do Condomínio do Edifício … e que a mesma padece de defeitos vários, que descriminou, pretende a condenação dos Réus a reconhecer a existência de tais defeitos, a condenação do Condomínio a proceder à respetiva reparação e, bem assim, todos os Réus serem condenados solidariamente a pagar-lhe indemnização pelos danos morais e patrimoniais causados.

                Quer a Ré S…, quer os Réus pessoas singulares foram acionados na qualidade de administradores do Réu Condomínio.

                Os Réus contestaram e, para além de outras questões, suscitaram a ilegitimidade da Ré S… e dos Réus pessoas singulares, tese essa que foi acolhida pela M.mª Juíza, que assim o declarou em sede de despacho saneador.

2.            Inconformado com tal decisão, dela apelou o Autor, formulando as seguintes conclusões [[1]]:

3.            Os Réus recorridos não contra-alegaram.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II - FUNDAMENTAÇÃO

4.            OS FACTOS

Foi o seguinte o teor da decisão recorrida:

«Da Excepção de Ilegitimidade:

Invocam os réus, em sede de contestação, a preterição de formalidade essenciais à instauração da presente acção, por banda do autor, assim como a excepção de ilegitimidade da 10ª ré, por falta de competência legal para ordenar a prática dos actos pretendidos pelo autor.

Inexiste preceito legal que imponha ao autor a convocação de uma assembleia de condóminos, em momento prévio à propositura da presente acção, pelo que, não obstante o pudesse ter efectuado, não preteriu o autor qualquer formalidade essencial à propositura da acção.

Por outro lado, invocam ainda os réus a excepção de ilegitimidade do Condomínio, por falta de personalidade judiciária, uma vez que a realização de obras em partes comuns para eliminação dos defeitos de construção invocados é da competência da Assembleia de Condóminos, e o efeito útil pretendido com a acção – a assunção pelo Condomínio dos custos das reparações – apenas terá efectivação prática se cada condómino efectuar a contribuição necessária.

Invocam igualmente os réus a excepção de ilegitimidade dos 1º a 9º réus, enquanto pessoas singulares.

Na verdade, pode ser o Condomínio responsabilizado pela reparação dos defeitos de construção nas partes comuns do imóvel em regime de propriedade horizontal, não carecendo de ser a acção proposta contra os condóminos, a título individual, ou contra as pessoas singulares ou empresa que administra o condomínio, uma vez que este último dispõe de personalidade judiciária e de legitimidade para o efeito (artigo 6º, alínea e) do CPC).

Ao administrador do condomínio incumbem as funções de representação do condomínio (artigo 1437º, nº 2 do Código Civil), mas a legitimidade processual está atribuída ao próprio condomínio (a este propósito, vejam-se, a título de exemplo, o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 19 de Abril de 2005; o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 06 de Fevereiro de 2006; e o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12 de Fevereiro de 2009, publicados in www.dgsi.pt).

Em face do exposto, procede a arguida excepção de ilegitimidade dos 1º a 9º réus, determinando-se a absolvição dos mesmos da instância e prosseguindo os autos para apuramento da responsabilidade do Condomínio do referido edifício.

(…)».

                5.            O MÉRITO DO RECURSO

O objeto do recurso é delimitado pelas questões suscitadas nas conclusões dos recorrentes, e apenas destas, sem prejuízo de a lei impor ou permitir o conhecimento oficioso de outras: art. 635º nº 3 e 4, 639º nº 1, 640º nº 1 e 608º n.º 2, ex vi do art. 663º nº 2, todos do Código de Processo Civil (de futuro, apenas CPC).

No caso, é uma única a questão a decidir: se os primeiros 9 Réus (a primeira, enquanto atual Administradora do Condomínio, e os restantes oito enquanto Administradores anteriores) são parte legítima para a presente ação.

5.1.         ILEGITIMIDADE DOS RÉUS

                «Relação jurídica — stricto sensu — vem a ser unicamente a relação da vida social disciplinada pelo Direito, mediante a atribuição a uma pessoa (em sentido jurídico) de um direito subjectivo e a correspondente imposição a outra pessoa de um dever ou de uma sujeição». [[2]]

Portanto, uma relação jurídica pressupõe sempre um sujeito de direito, seja ele pessoa singular ou pessoa coletiva, e tem por conteúdo um direito e o correspondente dever.

Existindo litígio sobre a existência ou âmbito desses direito-dever, o que se pretende é que estejam na causa os correspondentes sujeito do direito e o sujeito do dever.

Quando acionada num processo judicial, essa relação jurídica concretiza-se pela dedução de um pedido (a pretensão) e pela alegação dos factos constitutivos do direito subjacente.

É com esta realidade como pano de fundo que, no campo processual, se inscreve o conceito de legitimidade plasmado no art. 30º do CPC:

                1 – O autor é parte legítima quando tem interesse direto em demandar; o réu é parte legítima quando tem interesse direto em contradizer.

                2 – O interesse em demandar exprime-se pela utilidade derivada da procedência da ação; o interesse em contradizer, pelo prejuízo que dessa procedência advenha.

                3 – Na falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor.
Como refere João de Castro Mendes [[3]], «Em regra, portanto, afere-se da legitimidade comparando os sujeitos da relação jurídica subjacente com os sujeitos da relação jurídica processual (partes)».

                Assim, a (i)legitimidade das partes será apurada em função do pedido e da causa de pedir (tal como os apresenta o autor) pois só em função desses dois elementos é possível averiguar do interesse direto, da utilidade ou prejuízo resultantes da ação.

«Tal como no campo do direito material, há que a aferir, em regra, pela titularidade dos interesses em jogo (no processo), isto é, como dizem os n.ºs 1 e 2, pelo interesse direto (…) em demandar, exprimido pela vantagem jurídica que resultará para o autor da procedência da ação, e pelo interesse direto em contradizer, exprimido pela desvantagem jurídica que resultará para o réu da sua perda (…).». [[4]]

O Autor instaurou a ação contra a S… (1ª Ré) e contra 8 outros Réus pessoas singulares (2º a 9º), imputando-lhes a qualidade de serem, ou terem sido, administradores do Condomínio (cf. artigo 3º e 91º a 104º da douta PI).

                Para além destes, acionou um 10ª Réu, o Condomínio do prédio onde se insere a sua fração autónoma de sua propriedade.

                Formulou vários pedidos de condenação desses Réus, a saber (em resumo):
· Que todos os Réus reconheçam “os defeitos e vícios (…), dos quais enferma a fração “AA” propriedade do Autor são consequência dos vícios/defeitos que enfermam as partes comuns do edifício”.
· Que o Réu Condomínio proceda “à reparação dos defeitos/danos que o edifício apresenta nas suas partes comuns, (…)”.
· Que todos os Réus lhe paguem os danos patrimoniais “sofridos, em consequência das infiltrações provenientes das paredes exteriores do edifício que não foram reparados os seus defeitos, e acumulados desde Janeiro de 2009”.
· Que todos os Réus lhe paguem outros valores, a título de danos patrimoniais, morais, juros de mora e sanção pecuniária compulsória.

                Para alicerçar tais pedidos, alegou o Autor (em resumo): em finais de 2008 começaram a aparecer sinais de humidade na parede exterior, e nas duas perpendiculares a esta, dum dos quartos da fração de que é proprietário. Tais humidades foram-se agravando e alastraram o todo o apartamento do Autor, causando inclusive problemas elétricos. Essas humidades resultam de defeitos nas partes comuns do edifício, ou seja, nas suas paredes exteriores: do facto de o reboco do prédio ser impróprio para as suas caraterísticas, das cantarias colocadas nas janelas, falta de betume nas juntas de ligação das paredes, fissuras nas paredes exteriores. O Autor denunciou tais defeitos, por várias vezes, junto dos Réus, sendo que estes nada fizeram.

Daqui se conclui que o Autor pretende a reparação dos defeitos existentes na sua propriedade, que é uma fração autónoma integrada num Condomínio, bem como ser indemnizado pelos prejuízos entretanto sofridos.

Por outro lado, segundo alegou, esses defeitos da sua fração autónoma derivam, ou têm como causa, vícios na construção das fachadas do edifício: o reboco das paredes exteriores do prédio não foi efetuado de acordo com as caraterísticas próprias do local onde o edifício se mostra implantado, as juntas de ligação das pedras das cantarias colocadas nas janelas exteriores não foram betumadas e as fissuras existentes nas paredes exteriores.

Estamos portanto no domínio da responsabilidade civil extracontratual: ao proprietário de um imóvel é reconhecido o direito a que todos respeitem a integridade do seu prédio, sendo que quem o danificar fica responsável pela reposição dessa integridade e pela indemnização dos danos causados: artigos 1305º, 483º, 562º e 566º do Código Civil (de futuro, apenas CC).

No caso, estamos perante uma propriedade horizontal que, como é sabido, comporta a particularidade da coexistência na mesma pessoa de dois tipos de propriedade: dum lado, um direito de propriedade exclusiva de uma ou mais frações do edifício e, doutro lado, um direito de compropriedade nas partes comuns desse edifício: art. 1414º e 1415º do CC.

Ou seja, as partes comuns do edifício são compropriedade [[5]] do universo de condóminos.

Esse universo dos condóminos, vulgo o Condomínio [[6]], é quem é o titular de qualquer relação jurídica relativa às partes comuns do prédio.

São os condóminos, no seu conjunto e na proporção das respetivas quotas, os titulares dos direitos ou das obrigações, dos créditos ou dos débitos emergentes de responsabilidade civil quanto às partes comuns do prédio.

                Ora, a ser assim, e atenta a forma como o Autor configurou a ação —— as humidades existentes na sua fração autónoma são causadas pelas deficiências de construção das partes comuns do prédio ——, não restam dúvidas que quem tem legitimidade passiva é o Condomínio do prédio enquanto tal.

                Na verdade, é sobre o universo de condóminos/Condomínio que recai a obrigação de manter as partes comuns do prédio em condições de não perturbarem ou danificarem a propriedade alheia (de cada uma das frações, entenda-se), sob pena de incorrer nas consequências do incumprimento de tal obrigação (reconstituição in natura e/ou indemnização em dinheiro).

A entidade Condomínio integra um órgão deliberativo —— a Assembleia de Condóminos —— e um órgão executivo —— o Administrador: art. 1430º e seguintes do CC.

O Administrador é apenas o “executante” da vontade do Condomínio, ou, mais rigorosamente, das deliberações/decisões tomadas pelo universo dos condóminos reunidos em assembleia.

Nessa medida, o Administrador não é sujeito das relações jurídicas que contendam com a (com)propriedade das partes comuns dum edifício constituído em propriedade horizontal.

É certo que o art. 1437º nº 1 e 2 do CC comete ao administrador “legitimidade” ativa e passiva para agir em juízo.

Contudo, quando este preceito se refere a legitimidade, tal vocábulo deve ser interpretado no sentido de capacidade de representação, enquanto forma de suprimento da incapacidade judiciária.

Na verdade, se só as pessoas podem ter personalidade e capacidade jurídicas (cf. art. 66º e 67º do CC), o Condomínio não a tem.

Ora, consistindo a capacidade judiciária na suscetibilidade de estar por si mesmo em juízo, ela tem “por base e medida a capacidade de exercício de direitos” (art. 15º do CPC), estando portanto em íntima conexão com a personalidade judiciária.

Mas, apesar de não ter personalidade jurídica, a lei entendeu conferir-lhe personalidade judiciária.

Porém, ao Condomínio apenas é reconhecida expressamente personalidade judiciária “relativamente às ações que se inserem no âmbito dos poderes do administrador”: art. 12º al. e) do CPC.

Assim, «4. O art. 1437º do CC consagra a capacidade judiciária do condomínio, ao estabelecer a susceptibilidade de o administrador, seu órgão executivo, estar em juízo em representação daquele, nas lides compreendidas no âmbito das funções que lhe pertencem (art. 1436º), ou dos mais alargados poderes que lhe forem atribuídos pelo regulamento ou pela assembleia, sendo que, em qualquer dos casos, as acções deverão ter sempre por objecto questões relativas às partes comuns.

(…)

8. Ao conferir ao administrador a possibilidade de actuar em juízo, o art. 1437º do CC mais não faz do que concretizar uma aplicação do disposto no art. 22º do CPC – que estatui sobre a representação das entidades que carecem de personalidade jurídica – eliminando possíveis dúvidas sobre se aquele poderia, no exercício das suas atribuições, recorrer à via judicial.

9. O art. 1437º não resolve, pois, o problema da legitimidade do administrador, que, aliás, não se coloca, porque este age, em juízo, enquanto órgão do condomínio e, portanto, em representação deste. Do que, no fundo, se trata, é de atribuir ao administrador legitimação para agir em nome do conjunto dos condóminos.

10. Parte no processo, relativamente às partes comuns do edifício, é o condomínio, sendo relativamente a este, e não no tocante ao administrador, que se poderá colocar a questão da legitimidade.». [[7]]

Em juízo, o Condomínio/universo de condóminos é representado pelo Administrador/órgão executivo do Condomínio.

Repare-se que logo no nº 1 desse art. 1437º se deixa consignado que essa “legitimidade” lhe é cometida apenas no domínio da “(…) execução das funções que lhe pertencem ou quando autorizado pela assembleia”, ou seja, uma legitimidade não própria mas decorrente duma relação de mandato.

Como refere Sandra Passinhas [[8]], «O legislador não está a tratar da legitimidade processual, no sentido da legitimatio ad causam, porque a legitimidade, que consiste no interesse directo em demandar, é um pressuposto processual que só em concreto pode ser determinado. Só o juiz, e não o legislador, pode decidir sobre a legitimidade ou não das partes. Esta norma respeita à legitimatio ad processum, ou seja, à capacidade processual. É o artigo 1437º que trata do suprimento da incapacidade judiciária do condomínio.».

O que bem se compreende, dado que «Um representante judiciário nunca é, por definição, parte legítima numa acção, nem passiva nem activamente, pois só o seu representado como verdadeiro titular do interesse directo em contradizer ou demandar - nº 1 do artigo 26º do Código de Processo Civil - tem essa qualidade.». [[9]]

Ainda que o cargo de Administrador possa ser exercido por um dos condóminos (art. 1435º nº 4 do CC), há que separar essas duas qualidades da pessoa sujeito de direitos em questão: dum lado, a de condómino/comproprietário nas partes comuns e, doutro lado, a de Administrador/gestor dessas partes comuns.

O Administrador-condómino não deixa de ter direito de voto nas Assembleias de condóminos, fazendo-o na vertente de condómino; já o Administrador-terceiro não votará porque carece daquela qualidade.

Como é sabido, é cada vez mais frequente que o exercício da administração dos Condomínios seja entregue a pessoas, singulares ou coletivas, que não são condóminos, como é o caso, aliás, da aqui 1ª Ré S...

É certo que o Administrador também pode ser, ele próprio e enquanto tal, sujeito de relações jurídicas conexas com um Condomínio.

Porém, tal acontecerá apenas no domínio das “relações internas” (Administrador versus Condomínio).

Assim, por exemplo, sendo o seu cargo remunerado, pode acionar o Condomínio com vista a exigir o pagamento dos honorários em dívida, da mesma feita que pode ser acionado pelo Condomínio pelos prejuízos causados por irregularidades ou negligência no exercício das suas funções, entregar as receitas cobradas, etc.

Neste tipo de casos ele atua em seu nome, defendendo um interesse próprio (do lado ativo ou passivo).

E, como é bom de ver, a causa de pedir encontra assento numa relação jurídica de índole contratual (mandato, prestação de serviços…) e não extracontratual, como é o caso dos autos.

Situação diferente ocorre no domínio das “relações externas” (Condomínio versus um condómino ou um terceiro).

 Quando algum prejuízo é causado nas partes comuns do prédio, por um condómino ou por um terceiro, o direito à respetiva indemnização cabe ao Condomínio (universo dos condóminos).

Da mesma feita, quando algum terceiro/ou condómino, se vê prejudicado por qualquer ocorrência causada pelas partes comuns de um prédio, a responsabilidade pelo ressarcimento dos prejuízos cabe ao Condomínio, ou seja, ao universo dos condóminos, na proporção das respetivas quotas.

Num caso e noutro, seja do lado ativo ou passivo, o Administrador agirá como representante do Condomínio.

Assim sendo, prefigurando a ação nos termos delineados pelo Autor __ pretende a reparação dos defeitos das paredes comuns do edifício e ser ressarcido dos prejuízos sofridos na sua fração e causados pela existência desses defeitos __ não nos restam dúvidas que a titularidade de tal relação jurídica reside apenas no Condomínio (universo de condóminos) pois nele reside a obrigação de conservação/reparação do prédio, bem como a de indemnizar os prejuízos causados.

Nessa medida, sendo o Condomínio o sujeito jurídico do dever, só ele pode vir a ser prejudicado com a procedência da ação e, portanto, só ele tem interesse direto em contradizer.

Qualquer ação a intentar contra o Administrador, na sua própria pessoa, só terá viabilidade no âmbito da sua gestão, sendo portanto outra a causa de pedir; assim, por exemplo, alegando ter sido a incúria ou negligência do Administrador que provocou a deterioração das partes comuns.

O Administrador do Condomínio, nessa veste, não é comproprietário das partes comuns.

Não sendo titular do direito, não é sujeito da relação jurídica, pelo que não tem legitimidade para ser parte numa ação onde se discute esse direito.

Os 1º a 9º Réus, inclusive, foram aqui demandados em nome próprio, e enquanto Administradores (atual e anteriores) do Condomínio, pelo que são parte ilegítima.

                6.            SUMARIANDO (art. 663º nº 7 do CPC)

Numa ação em que um condómino pretende a reparação dos defeitos das paredes comuns dum prédio em propriedade horizontal, bem como ser ressarcido dos prejuízos sofridos na sua fração e causados pela existência desses defeitos, parte legítima é o Condomínio desse prédio.

                O Administrador desse Condomínio, na sua própria pessoa, é parte ilegítima e intervirá na ação apenas enquanto representante legal do Condomínio.

                III.           DECISÃO

7.            Pelo que fica exposto, acorda-se nesta secção cível da Relação de Coimbra em não dar provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida.

Custas do recurso a cargo do Autor.

                                                                                                              Coimbra, 27/01/2015

(Relatora, Isabel Silva)

(1ª Adjunto, Alexandre Reis)

(2º Adjunto, Jaime Ferreira)

      [[1]] Como é sabido, são as conclusões que delimitam o objeto do recurso ou “thema decidendum”; as alegações servirão para explanar os argumentos na defesa da tese do Recorrente quanto à demonstração das questões suscitadas; já as conclusões devem referir, de forma sucinta, os pontos em que se considera ter havido erro de julgamento (seja quanto à matéria de facto, seja quanto à de direito), em conformidade com o nº 1 e 2 do art. 639ºdo CPC.
      Constatando-se que sob a epígrafe "conclusões", o Recorrente reproduz decisões jurisprudenciais já invocadas na motivação, dispensamo-nos de aqui reproduzir o que não são conclusões.
[[2]] Manuel Domingues de Andrade, “”Teoria Geral da Relação Jurídica”, vol. I, Coimbra, 1983, Livraria Almedina, pág. 2.
[[3]] In “Direito Processual Civil”, II vol., edição AAFDL, 1987, pág. 203.
[[4]] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 1º, 3ª edição, Coimbra Editora, 2014, pág. 70/71.
[[5]] Artigo 1403º do CC: existe propriedade em comum, ou compropriedade, quando duas ou mais pessoas são simultaneamente titulares do direito de propriedade sobre a mesma coisa.
[[6]] Sempre que usarmos este designativo, estaremos a referir-nos ao conjunto/universo dos condóminos.
[[7]] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), de 04.10.2007 (processo 07B1875, relator Santos Bernardino), disponível em www.gde.mj.pt/, sítio a ter em conta nos demais arestos que vierem a ser citados sem outra menção de origem.
[[8]] In “A Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal”, 2ª edição, Almedina, pág. 339. Com interesse, cf. ainda pág. 343, a propósito dum exemplo (idêntico ao dos autos) de aplicação do nº 2 do art. 1437º do CC, em que se entende que “o Condomínio é citado na pessoa do seu legal representante”, ou seja, o Administrador atua sempre na qualidade de representante do Condomínio e não em seu próprio nome.

[[9]] Acórdão da Relação de Lisboa (TRL), de 08.02.1990, in Colectânea de Jurisprudência (CJ), Ano XV, Tomo 1, pág. 161.