Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
216/13.0TBTNV-B.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: JORGE ARCANJO
Descritores: COMPETÊNCIA TERRITORIAL
ACÇÃO DE ANULAÇÃO
DELIBERAÇÃO
ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS
Data do Acordão: 10/15/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE TORRES NOVAS – 2º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ARTºS 85º E 87º DO CPC.
Sumário: I - O tribunal territorialmente competente para a acção de anulação de deliberações sociais de assembleia de condóminos é aferido em função do critério do domicílio do réu ou dos réus, estabelecido nos arts. 85º e 87º CPC.

II - Para efeitos da aplicação do art. 87º, nº 1 do CPC só relevam os réus certos, com domicílio em parte certa.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

I - RELATÓRIO

         1.1.- Y…, SA, com sede em …, instaurou na Comarca de Torres Novas acção declarativa, com forma de processo ordinário, contra os Réus:

C…, Lda, com sede em Torres Novas;

Condóminos do prédio denominado B…, sito na Praia da Rocha, Portimão.

Alegou, em resumo:

A Autora é proprietária de diversas fracções de um prédio em propriedade horizontal, sito na Praia da Rocha, e a 1ª Ré, na qualidade de administradora de condomínio, convocou uma assembleia geral de condóminos que se realizou em 12 de Janeiro de 2013.

Contudo, as deliberações tomas na referida assembleia são inválidas.

A convocatória não foi acompanhada de elementos indispensáveis (relatório de despesas e orçamento), havendo falta de informação.

O relatório apresentado na assembleia contém vícios e mostra-se injustificado.

Por outro lado, não houve votação, nem contagem presencial de votos, e parte das procurações outorgadas pelos condóminos, cujos representantes votaram favoravelmente as deliberações, são falsas.

Pediu que sejam anuladas as deliberações tomadas na assembleia geral de condóminos geral que teve lugar no dia 12 de Janeiro de 2013.

Contestou a 1ª Ré, defendendo-se, além do mais, com a excepção da incompetência territorial, alegando que o tribunal competente é aquele onde se situa o Condomínio ...

         1.2.- Por decisão de 12/4/2013 julgou-se o tribunal territorialmente incompetente para conhecer da acção e determinou-se a remessa do processo ao Tribunal Judicial da Comarca de Portimão.

         1.3.- Inconformada, a Autora recorreu de apelação, com as seguintes conclusões:

         Não houve contra-alegações.

II – FUNDAMENTAÇÃO

         2.1. - Problematiza-se no recurso a determinação da competência em razão do território para conhecer da presente acção, se o Tribunal Judicial da Comarca de Portimão (despacho recorrido) ou o Tribunal Judicial da Comarca de Torres Novas (tese da Apelante).

O despacho recorrido justificou com a aplicação dos critérios estabelecidos nos arts. 73º, 86º e 87º, nº 1 do CPC.

Argumentou-se, em síntese:

         A causa de pedir funda-se na propriedade horizontal, derivando a pretensão da Autora da alegada invalidade das deliberações tomadas em assembleia geral de condóminos.

         O prédio situa-se em Portimão, pelo que o tribunal territorialmente competente é tribunal da área da comarca correspondente, por força do art. 73º, nº1 CPC.

         Ainda que se seja de aplicar a regra do art. 86º CPC, tratando-se de uma pluralidade de réus, também por esta via sempre será competente o tribunal da comarca de Portimão.

         Objecta a Apelante, com a excepção do caso julgado (a competência fixada no procedimento cautelar) e com o critério do art. 86º CPC, por ser em Torres novas a sede da sociedade administradora.

2.2. - A competência, enquanto medida de jurisdição de cada tribunal que o legitima para conhecer de determinado litígio, como pressuposto processual, afere-se nos termos em que a acção é proposta (pedido e causa de pedir), ou seja pela relação jurídica tal como o autor a configura.

         A competência territorial (arts. 73 e segs.CPC) é uma competência subjectiva de cada tribunal em concreto, sendo estabelecida por lei ou pela vontade das partes.

         A competência estabelecida por lei (competência legal) é a que resulta dos factores de conexão fixados legislativamente, cuja escolha é determinada por “critérios de justiça e de razoabilidade”, noutros por comodidade das partes ou ainda por interesse da boa administração da justiça (cf. Antunes Varela, Manual de Processo Civil, pág.209).

         Para a fixação da competência territorial, o Código de Processo Civil instituiu um modelo assente em critérios territoriais especiais (arts.73º a 84º e 89º) e um critério geral, domicílio do demandado (arts.85º, nº1 e 86º, nº2 ) ou dos demandados (art. 87º, nº1).Isto significa que o critério geral só tem aplicação quando não exista critério especial adequado à situação.

         A pretensão da Autora consubstancia-se na anulação de deliberações sociais (tomadas na assembleia geral de condóminos em 12 de Janeiro de 2013) e dirige-se contra uma pluralidade de réus – a sociedade administradora do condomínio (1ª Ré) e os condóminos do Prédio denominado … em Portimão (2ºs Réus).

         Dada a natureza e efeitos da acção de anulação de deliberações sociais, não tem aqui aplicação o critério do foro da situação do bem (prédio constituído em propriedade horizontal), pois o litígio não se reporta a direitos reais, logo está afastado o factor de conexão plasmado no art.73º do CPC.

         Inexistindo critério territorial especial, funciona o critério geral do foro do domicílio do réu (art. 85º, nº1 CPC).

         Mas na acção foram demandados vários réus, uma sociedade (C…, com sede em Torres Novas) e os condóminos do prédio … “que votaram a favor das deliberações de que se pede a suspensão, que agora não pode identificar, por não lhe ter sido entregue nem enviada a acta da assembleia geral, mas que, logo que tal documento seja junto aos autos, identificará” (cf. intróito da petição inicial).

         Verifica-se que a Autora não procedeu à identificação de cada um dos condóminos, em conformidade com o estatuído no art. 467º, nº1, a) CPC, designando, além do mais, os respectivos nomes e domicílios.

         Havendo sido demandada a ré sociedade C…, com sede em Torres Novas, o foro competente é o do lugar da sede (art.86º, nº2 CPC), adaptando, assim, o critério geral do domicílio.

         Por sua vez, o art.87º, nº1 CPC prescreve o critério no caso de pluralidade de réus e aplica-se quando sendo a acção proposta contra mais do que um réu (haja ou não pluralidade de pedidos) for relevante, em relação a todos, para efeitos de determinação da competência territorial, o respectivo domicílio (cf., por ex., Ac STJ de 8/1/2009, proc. nº 08B2183, em www dgsi.pt).

         Por conseguinte, o tribunal territorialmente competente para a acção de anulação de deliberações sociais de assembleia de condóminos é aferido em função do critério do domicílio do réu ou dos réus, estabelecido nos arts. 85º e 87º do CPC (cf., por ex., Moitinho de Almeida, Anulação e Suspensão de Deliberações Sociais, pág. 165).

         A lei (art. 87º, nº1 CPC) determina que “havendo mais de um réu na mesma causa, devem ser todos demandados no tribunal do domicílio do maior número; se for igual o número nos diferentes domicílios, pode o autor escolher o de qualquer deles”.

         Sucede que a Autora não identificou sequer cada um dos condóminos e muito menos os respectivos domicílios.

         O despacho recorrido, para operar o critério do art. 87º, nº1 CPC, refere que os condóminos demandados têm domicílio no prédio denominado …, só que este elemento de facto não foi sequer alegado na petição, nem resulta dos documentos juntos.

         No entanto, para efeitos da aplicação do art. 87º, nº1 do CPC só relevam os réus certos, com domicílio em parte certa (cf. Alberto dos Reis, Comentário, I, pág. 258).

Ora, esta carência de elementos é analogamente equiparável às situações de ausência em parte incerta ou aos réus incertos, pelo que não estando determinado (alegado) o domicílio dos 2ºs Réus, releva tão somente a sede da 1ª Ré, sendo, por isso, competente o tribunal judicial da Comarca de Torres Novas.

2.3. - Síntese conclusiva:

1.- O tribunal territorialmente competente para a acção de anulação de deliberações sociais de assembleia de condóminos é aferido em função do critério do domicílio do réu ou dos réus, estabelecido nos arts. 85º e 87º CPC.

         2. Para efeitos da aplicação do art. 87º, nº1 do CPC só relevam os réus certos, com domicílio em parte certa.

III – DECISÃO

         Pelo exposto, decidem:

1)

         Julgar procedente a apelação e, revogando a decisão recorrida, declarar territorialmente competente para conhecer da acção o Tribunal Judicial da Comarca de Torres Novas.

         Sem custas.

         Coimbra, 15 de Outubro de 2013.

( Jorge Arcanjo - Relator )

( Teles Pereira )

( Manuel Capelo )