Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
18/10.5GBTNV.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ALBERTO MIRA
Descritores: DECLARAÇÕES DE CO-ARGUIDO
VALORAÇÃO
Data do Acordão: 11/16/2011
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: COMARCA DE TOMAR - CÍRCULO JUDICIAL
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: REVOGAÇÃO PARCIAL
Legislação Nacional: ART.º 345º, N.º 4, DO C. PROC. PENAL
Sumário: Não existe obstáculo legal à valoração das declarações de co-arguido, apreciadas de acordo com os critérios que devem presidir à livre apreciação da prova, plasmados no artigo 127º, do C. Proc. Penal, desde que garantido o indispensável contraditório e tendo presente que essa valoração deve ter em conta os riscos de menor credibilidade que essas declarações comportam, pelas implicações resultantes da situação de imputação de responsabilidade criminal também a esse co-arguido, circunstância que justifica e exige maior prudência e cuidado na procura de toda a corroboração possível para que a livre apreciação do julgador se fundamente em dados seguros.
Decisão Texto Integral: I. Relatório:
1. No Círculo Judicial de Tomar, em processo comum com intervenção de tribunal colectivo, foram julgados os arguidos:
- A..., casada, residente na Rua …, ...;
- B..., divorciado, residente na Rua … ...; e
- C..., solteiro, residente em Rua …, ...;
sob imputação, no âmbito das acusações públicas deduzidas no processo em epígrafe e no processo a este apensado n.º 15/10.0GBGLB, da prática, em co-autoria material, na forma consumada, de dois crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203.º, n.º 1 e 204 n.º 2, alíneas a) e e), por referência ao art. 202 alíneas a) e d), um dos ilícitos, e alíneas b) e e) todos do CP, os dois arguidos primeiros, e da prática, como cúmplice, de um dos referidos crimes, o último arguido.
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2. D..., admitida a intervir, como assistente, nos autos, deduziu pedido de indemnização civil contra A... e B..., solicitando a condenação destes no pagamento à demandante da quantia de 67 314,64 €, correspondente ao valor dos bens furtados no armazém sito na Rua … .
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3. Em acórdão de 12 de Abril de 2011, o Tribunal Colectivo proferiu decisão do seguinte teor:
Após convolação, julgou procedente por provadas as acusações e, em consequência:
a) Condenou a arguida A..., como co-autora material de dois crimes de furto qualificado p. e p. pelos arts. 203.º, n.º 1 e 204 n.º 2, als. a) e e), do CP, nas penas de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão [armazém da Rua …] e 3 (três) anos de prisão [Quinta ...] respectivamente;
b) Condenou o arguido B..., como co-autor material de dois crimes de furto qualificado p. e p. pelos arts. 203, n.º 1 e 204 n.º 2, als. a) e e), do CP, nas penas de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão [armazém da Rua …] e 3 (três) anos de prisão [Quinta ...] respectivamente;
c) Condenou o arguido C..., como co-autor material de um crime de furto qualificado p. e p. pelos arts. 203.º, n.º 1 e 204 n.º 2, als. a) e e), do CP, na pena de 3 (três) anos de prisão [Quinta ...];
d) Efectuado o cúmulo jurídico das duas penas parcelares, condenou os arguidos B... e A..., cada um deles, na pena única de 6 (seis) anos de prisão;
e) Suspendeu a pena de prisão aplicada ao arguido C... pelo período de 3 (três) anos;
f) Na procedência do pedido cível, condenou os demandados A...e C… a pagarem à demandante D...a quantia de 67.304,65 € (sessenta e sete mil, trezentos e quatro euros e sessenta e cinco cêntimos).
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4. Inconformados, os arguidos B... e A... interpuseram, separadamente, recurso do acórdão, tendo extraído da respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões:
A) Arguido B...:
1.ª - Os elementos fornecidos pelo processo impõem claramente decisão diversa daquela que foi proferida nos autos, impossível de ser destituída por qualquer outra prova.
2.ª - A prova produzida em sede de audiência de julgamento não foi correctamente julgada, impondo-se uma decisão diversa da proferida pelo tribunal a quo.
3.ª - Na verdade, não existe no processo prova bastante e inequívoca que permita concluir que tenha sido o arguido a praticar os crimes pelos quais vem acusado.
4.ª - O Tribunal a quo, decidindo como decidiu, violou o princípio estruturante do processo penal, ou seja, princípio in dubio pro reo e o princípio da presunção de inocência.
5.ª - Verifica-se claramente uma apreciação errada e inquinada da prova produzida em sede de audiência de julgamento, sendo a fundamentação do acórdão contraditória e insuficiente.
6.ª - Sem prescindir, a medida concreta da pena aplicada se mostra grosseiramente desproporcional e desajustada, atenta a moldura penal do crime em causa e a situação pessoal, profissional e social do arguido, quer quanto aos factos provados e às exigências de prevenção, especial e geral, que visa acautelar.
7.ª - Por acórdão proferido nos autos supra referidos foi o arguido condenado na pena única de 6 anos de prisão efectiva, como co-autor material, na forma consumada, pela prática de 2 crimes de furto qualificado, previstos e punidos pelos artigos 203.º n.º 1 e 204.° n.º 2, alíneas a) e e) do Código Penal.
8.ª - O acórdão recorrido violou claramente princípios fundamentais do nosso ordenamento jurídico, designadamente o princípio fundamental e basilar do direito penal como o princípio da presunção de inocência e do in dubio pro reo, consagrado desde logo no artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa, bem como o princípio da proporcionalidade e adequação da pena.
9.ª - Encontram-se incorrectamente julgados os seguintes pontos da matéria de facto constantes da sentença:
Do Processo n.º 18/10.0GBTNV
Fls. 3, ponto 1: em data não concretamente apurada mas que se situa entre as 20:00H do dia 31 de Dezembro de 2009 e as 22:00H do dia 12 de Janeiro de 2010, os arguidos A... e B..., em obediência a um plano previamente gizado, deslocaram-se a um armazém sito na Rua …, área desta comarca de ..., com o intuito, posteriormente concretizado, de subtrair os objectos de valor que aí encontrassem, fazendo-os coisas suas.
Fls. 4, ponto 2: de seguida, uma vez chegados ao local acima referido, os arguidos A...e B... quebraram o vidro da porta do citado armazém e introduziram-se no mesmo, dali retirando os seguintes objectos decorativos pertencentes à ofendida D...:
- um porta cd´s no valor de € 83,40, uma consola no valor de € 457,50, um aparador no valor de € 441,70, duas carpetes no valor de € 253,04, dez mantas no valor de € 883,50, duas estatuetas no valor de € 60,50, cinco árvores de natal no valor de € 192,00, uma gaiola no valor de € 24,90, dois conjuntos frente lareira no valor de € 138,90, 32 artigos de loiça e caixas no valor de € 196,16, uma cama no valor de € 441,00, material referente a varões completos no valor de € 16,65, um chaveiro fechado com embutidos no valor de € 28,00, seis conjuntos de material referentes a varões completos no valor de € 316,17, um banco de pés no valor de € 145,00, seis tapetes no valor de € 411,75, seis almofadas no valor de € 186,00, um colchão ortopédico no valor de € 144,00, duas cadeiras no valor de € 365,50, três conjuntos de material referentes a varões completos no valor de € 237,23, um estrado de ripas no valor de € 17,50, dois tapetes no valor de € 246,84, quatro tapetes no valor de € 724,53, três carpetes no valor de € 650,25, uma cadeira B... XV no valor de € 235,00, um cadeirão no valor de € 402,70, um candeeiro no valor de € 164,82, uma coluna de madeira no valor de € 220,30, um contador em mogno no valor de € 390,00, material referente a varões completos no valor de € 70,12, material referente a varões completos no valor de € 101,68, dois porta revistas no valor de € 106,26, uma área no valor de € 219,50, um busto no valor de € 236,20, um cabide com quatro suportes com embutido em cerejeira no valor de € 29,70, um cabide de chão com cruzeta em metal no valor de € 62,00, um cabide com cinco suportes com embutido em cerejeira no valor de € 33,00, um candeeiro no valor de € 817,50, um candeeiro no valor de € 416,40, um candeeiro no valor de € 263,90, um candeeiro no valor de € 305,60, um castiçal no valor de € 15,30, um castiçal no valor de € 192,75, um chaveiro fechado com embutidos no valor de € 28,00, um coluna em madeira no valor de € 164,90, uma coluna em madeira no valor de € 137,20, uma coluna em madeira no valor de € 123,40, um louceiro no valor de € 605,60, material referente a varões completos no valor de € 116,12, material referente a varões completos no valor de € 69,27, material referente a varões completos no valor de € 49,41, uma mesa no valor de € 415,70, uma mesa no valor de € 623,00, um pai natal no valor de € 49,75, um par de galinhas no valor de € 69,50, um pássaro em ferro no valor de € 63,75, um toucheiro em madeira no valor de € 105,95, um toucheiro em madeira no valor de € 105,95, três pianhas no valor de € 153,96, quatro cadeiras no valor de € 408,38, dois apliques com duas bolas no valor de € 304,40, duas bengalas no valor de € 25,00, dois bonecos no valor de € 22,50, dois bonecos de neve no valor de € 32,76, duas cadeiras «Oracle» no valor de € 350,80, dois candeeiros de pé no valor de € 110,00, uma embalagem de musgo no valor de € 9,50, duas embalagens de musgo no valor de € 9,50, dois conjuntos de material referente a varões, argolas e outros acessórios no valor de € 1.200,00, duas mesas redondas no valor de € 472,30, duas taças alabastro no valor de € 385,60, uma talha no valor de € 127,90, três mesas de apoio redondas no valor de € 480,00, três mesas vitrina no valor de € 720,00, três vasos em metal no valor de € 97,77, três candeeiros de mogno no valor de € 96,00, três cadeiras C... de tecido no valor de € 1.041,00, três caixas de luzes no valor de € 35,70, três caixas de flor de cheiro no valor de € 16,65, três embalagens musgo no valor de € 14,25, três plafons no valor de € 363,66, três sacos de neve no valor de € 51,63, cinco consolas no valor de € 1.500,00, cinco consolas de pau santo no valor de € 1700,00, quatro consolas de três gavetas no valor de € 1.080,00, cinco candeeiros no valor de € 315,58, quatro apliques no valor de € 78,75, quatro bowl vidro no valor de € 152,45, quatro caixas de frutos no valor de € 43,60, quatro candeeiros de mesa no valor de € 122,28, quatro candeeiros no valor de € 85,57, quatro chapeleiros no valor de € 144,00, quatro quadros no valor de € 660,00, cinco candeeiros de mesa de cabeceira no valor de € 171,75, cinco cestas no valor de € 62,50, cinco vasos no valor de € 104,70, cinco candeeiros bola no valor de € 190,00, cinco potes no valor de € 425, 20, cinco suportes de vela no valor de € 17,95, cinco tabuleiros no valor de € 130,00, cinco taças de vidro no valor de € 33,90, cinco vasos dourados no valor de € 72,65, seis cachos de uvas no valor de € 35,10, seis cachos de uvas no valor de € 35,10, seis hastes de flores no valor de € 40,80, seis puxadores com ferro no valor de € 5,28, oito candeeiros com fitas no valor de € 256,00, sete cadeiras sem braço de couro no valor de € 1.575,00, oito mesas de jogo tipo inglês no valor de € 2.400,00, sete vasos no valor de € 101,99, oito cachos de uvas no valor de € 9,76, oito conjuntos de casa de banho no valor de € 77,30, oito hastes de flores no valor de € 26,24, oito meninos no valor de € 245,44, nove molduras no valor de € 139,85, nove presépios no valor de € 667,08, dez cachos de uvas no valor de € 38,90, dez chapeleiros no valor de € 360,00, dez pés de candeeiro no valor de € 562,40, dez suportes de bíblia no valor de € 270,00, dez suportes de vela no valor de € 58,00, dez tabuleiros no valor de € 1.400,00, doze suportes de bíblia no valor de € 396,00, treze velas decorativas no valor de € 121,13, dezassete tabuleiros no valor de € 328,10, dezasseis quadros no valor de € 4.029,92, dezoito guardanapos no valor de € 64,98, vinte pés de candeeiros no valor de € 1.100,00, vinte e duas bengalas no valor de € 139,92, vinte e dois cachos de uvas no valor de € 190,96, vinte e três porta velas no valor de € 166,29, vinte e quatro figos no valor de € 39,60, trinta jarras de vidro no valor de € 1.329,90, trinta e dois pés de candeeiro no valor de € 1.655,04, trinta e três ramos de árvore no valor de € 752,73, trinta e oito jarras de vidro no valor de € 1.082,62, trinta e quatro pratos de vidro no valor de € 651,78, cinquenta e quatro pé flor no valor de € 218,70, sessenta pé rosas no valor de € 151,20, setenta e uma molduras triplas no valor de € 1.353,26, oitenta e nove velas no valor de € 129,94, oitenta e quatro pé flor no valor de € 358,68, material referente a varões completos no valor de € 70,28, material referente a varões completos no valor de € 78,11, dois espelhos no valor de € 141,53, um espelho sem bisel no valor de € 53,61, duas cómodas com moldura no valor de € 840,00, duas lanternas no valor de € 119,00, dois conjuntos de material referente a varões completos no valor de € 105,52, cinco cabides com cinco pegas no valor de € 150,00, vinte frutos decorativos no valor de € 43,44, um abajour no valor de € 29,37, um abajour no valor de € 13,58, um embalagem de musgo valor de € 4,95, uma embalagem de musgo no valor de € 5,75, um frasco de cheiro no valor de € 19,36, material referente a varões completos no valor de € 42,64, material referente a varões completos no valor de € 94,56, material referente a varões completos no valor de € 113,63, material referente a varões completos no valor de € 136,30, três mesas de refeição no valor de € 1.140,00, três abajours no valor de € 62,01, dois abajours no valor de € 29,50, dois abajours no valor de € 31,20, dois abajours no valor de € 31,20, dois cabides de parede no valor de € 66,82, dois candeeiros de pé alto no valor de € 108,00, duas cómodas «paralans fita» no valor de € 620,00, dois louceiros no valor de € 1.500,00, duas mesas redondas no valor de € 640,00, quatro cabides com três pegas no valor de € 88,00, quatro carros de chá ovais no valor de € 680,00, quatro cómodas B... XV em mogno no valor de € 1960,00, quatro cómodas curvas em mogno no valor de € 1800,00, quatro conjuntos de mesas rectangulares no valor de € 400,00, sete cabides de chão no valor de € 560,00, oito apliques no valor de € 723,60, oito candeeiros no valor de € 171,29, seis abajours no valor de € 146,26, seis jarrões no valor de € 208,50, oito conjuntos canapé no valor de € 7.944,00, dez ameixas no valor de € 11,10, dois camiseiros curvos no valor de € 460,00, duas cómodas com gavetas em pau santo no valor de € 1060,00, cinco fruteiras no valor de € 27,05, vinte frutos decorativos no valor de € 69,00, material referente a varões completos no valor de € 42,95, cinquenta frutos decorativos no valor de € 113,12, vinte e cinco folhagem de era no valor de € 66,25, cento e vinte e seis caixas, terrinas, faianças e biblots no valor de € 550,62, cento e vinte frutos decorativos no valor de € 309,40 e cento e vinte frutos decorativos no valor de € 266,35 (cfr. relação de bens junta a fls. 157 a 161).
Fls. 9, ponto 3: o valor comercial dos artigos acima elencados atinge, na sua globalidade, os € 73.936,12.
Fls. 9, ponto 4: posteriormente, e na posse dos aludidos objectos, os arguidos levaram alguns para a residência onde habitam, propriedade da progenitora da arguida A..., sita na Rua …, Entroncamento, outros para a Quinta …, ..., e os restantes para lugar não concretamente apurado.
Fls. 9, ponto 6: em momenta ulterior, e no seguimento de uma busca à residência dos arguidos, parte daqueles bens foi recuperada e entregue à ofendida no dia 18 de Março de 2010, designadamente:
- seis cadeiras brancas, dois bancos brancos, uma leiteira, dois bules, um espelho de parede, nove quadros de parede, um tecido de Camila, um tapete de Arraiolos, um tapete tipo rústico, um tecido de mesa, uma mesa de sala, quatro mesas-de-cabeceira, duas carpetes, duas flores de ornamentação, uma figura de santo, um espelho de parede dourado, um pote em madeira, uma cómoda, um tapete chenile, duas molduras, dois braços de velas, dois candeeiros, um boneco de porcelana, um prato, uma caixa decorativa, dois cortinados, um tapete e um móvel (cfr. termo de entrega de fls. 130 e 131).
Fls. 10, ponto 7: o valor dos objectos recuperados ascende à quantia de € 6.631,47, encontrando-se, por conseguinte, em falta, objectos cujo valor comercial total se cifra em € 67.304,65.
Fls. 10, ponto 8: actuando do modo descrito, a arguida A...conluiada com o arguido B... tinham o objectivo de se apropriar das coisas em causa, não obstante estarem cientes de que as mesmas não lhes pertenciam, fazendo-as coisas suas, o que, comportando-se de modo apto a tal, lograram alcançar.
10.ª - Segundo o douto Tribunal a quo, os factos assentes supra referidos tiveram por fundamento os seguintes meios de prova - fls. 11, ponto c, parágrafo 1:
Ponto 1: pelo que disseram as testemunhas G... e a demandante civil D..., entre 31 de Dezembro de 2009 e 12 de Janeiro de 2010 não foram ao armazém, sendo que o furto ocorreu dentro deste período de tempo, pois quando lá foram em 12 de Janeiro o armazém tinha sido objecto de furto; que foram os dois arguidos que ali foram, porque uma boa parte dos objectos furtados apareceram na Quinta …, e foram para aí transportados pelos arguidos A... e B... numa carrinha do F... e estes objectos deram entrada na Quinta entre finais de Dezembro de 2009 e princípios de Janeiro de 2010, conforme o declarou a testemunha F... que e a pessoa que cuida desta Quinta; a arguida A...disse que tinha comprado estes bens, depoimento nada credível, quer porque contrariado pelas testemunhas G...e D..., quer porque não tinha qualquer documento que comprovasse essa compra e se de facto os tinha comprado não se percebe porque os não retirou do armazém na presença da D..., se eram seus como diz, porque os manteve no armazém da D...e por fim se eram seus porque os retirou do armazém daquele modo;
Ponto 2: a testemunha G...disse o modo como entraram no armazém partindo o vidro de uma porta nas traseiras do armazém, facto que foi confirmado pela D...; a testemunha G...disse que a arguida A...não tinha chave do armazém, pelo que para retirar do armazém estes bens, faz todo o sentido ter partido o vidro da porta para poder aceder ao armazém; os objectos furtados e o seu valor e o que resulta da relação de fls. 157 a 161 e que foi feita com base no inventário das existências sendo que como se diz na relação de fls. 33 a 48 parte dos bens estavam no armazém e que e o que consta da relação de fls. 157 a 161 e os restantes encontravam-se na Loja do Entroncamento; o valor dos bens e o valor de factura que estava descriminado nas folhas de inventário; auto de apreensão de fls. 30 do apenso e que corresponde aos bens apreendidos na Quinta … e auto de entrega de fls. 99 que a D...reconhece estes bens como sendo sua propriedade; auto de entrega de fls. 27 do apenso onde a D...reconhece os bens que lhe pertencem; auto de apreensão de fls. 127 do processo principal e que corresponde aos objectos encontrados em casa da mãe da arguida; que os arguidos actuaram em conjunto pelo facto de ambos terem transportado os bens como o declarou o F...; o elemento subjectivo pelo que as regras da experiência permitem concluir dos factos provados, pois os arguidos são suficientemente esclarecidos para saberem que devem respeitar o que é dos outros; a situação pessoal dos arguidos pelas suas declarações.
Do Processo n.º 15/10.0GBGLG
Fls. 13, ponto 1: no dia 2 de Fevereiro de 2010 pelas 03H00, os arguidos B..., A… e C... acordaram no sentido de se dirigirem à Quinta …, e dali retirarem um tractor e objectos de valor que pudessem transportar consigo, após contacto telefónico feito pelo arguido B... ao arguido C....
Fls. 13, ponto 2: No âmbito daquele telefonema, o C... disse ao B... para o acompanhar, a A... foi ter a casa da mãe de C..., sita em …, e seguiram todos até a Quinta … .
Fls. 13, ponto 3: Chegados ao local, o C... rebentou a fechadura do portão de uma garagem ali existente, com o auxílio de um pé de cabra e chamou pelos arguidos B... e A....
Fls. 14, ponto 4: Seguidamente os três arguidos entraram e retiraram do seu interior os seguintes objectos, no valor total de pelo menos 22.770,00 €, pertencentes a H...:
- um tractor agrícola no valor de 18.750€;
- um pulverizador Rocha no valor pelo menos de 3.750 €;
- uma motoserra Sthil no valor pelo menos de 150 €;
- uma rebarbadora eléctrica Black & Decker no valor pelo menos de 50 €;
- um carregador de baterias, modelo MS660, no valor pelo menos de 70 €.
Fls. 14, ponto 5: Após abandonaram o local seguindo a arguida A... ao volante do tractor e o C... ao lado desta.
Fls. 14, ponto 6: À frente do tractor ia B... ao volante do seu veículo com matrícula que se não apurou, com o objectivo de iluminar o caminho e avisar quem seguia atrás, caso avistasse agentes da autoridade.
Fls. 15, ponto 9: O tractor que se encontrava estacionado e escondido junto a um pinhal adjacente à Igreja da Olaia, ..., foi restituído a H..., em virtude de informação fornecida pelo B....
Fls. 15, ponto 10: Os arguidos A..., B... e C... agiram sempre em conjugação de esforços e na execução de um plano elaborado por todos.
11.ª - Fls. 16, alínea c): segundo o douto Tribunal a quo os factos assentes, supra referidos, tiveram por fundamento os seguintes meios de prova:
Ponto 1: pelo que disse o arguido foram os 3 arguidos buscar a tractor à Quinta … depois de o C... ter sugerido este facto e ter dito aos outros dois arguidos onde o tractor se encontrava, factos a que os arguidos A... e B... aderiram;
Ponto 2: pelo que disse o arguido C...;
Ponto 3: o C... confessou ter sido ele que rebentou com a fechadura e que o fez com um pé de cabra;
Ponto 4: os bens furtados pelo que disse a Eng. H..., que aqueles bens estavam na Quinta e desapareceram todos na mesma altura, indicou a valor dos mesmos bens por referência ao seu custo, uso, desgaste e idade;
Pontos 5, 6 e 7: pelo que disse o C....
Ponto 9: pelo que resulta da conjugação dos depoimentos de I..., disse que o arguido B... lhe ofereceu um tractor para a sucata, disse que o mesmo era proveniente de uma herança e não tinha documentos; pelo que disse a …, recebeu um telefonema do J... informando que lhe tinha sido oferecido um tractor para a sucata e pela descrição que a J... lhe fez teve como assente que se tratava do tractor da Quinta ..., dirigiu-se à sucata do J... e aí encontrou-se com o B..., tendo este dito que pela venda apenas iria receber uma comissão; alertou o Eng. H... que telefonou ao B... que lhe garantiu que o tractor iria aparecer e disse onde poderia ser encontrado, o que veio a acontecer.
12.ª - Verifica-se um erro grosseiro quanto à apreciação da prova produzida bem como quanto à sua fundamentação, constatando-se contradições insanáveis entre aquela e a respectiva fundamentação.
Proc. n.º 18/10.5GBTNV
13.ª - Não foi feita prova cabal e bastante da propriedade/existência de bens móveis que alegadamente se encontravam no armazém sito da Rua … .
14.ª - Resulta das declarações da própria assistente como das testemunhas G... e K..., a relação junta a fls. 157 a 161 mais não é que uma relação elaborada pelas próprias.
15.ª - A identificação dos bens, a sua localização e respectivo preço resulta exclusivamente da acção e vontade da assistente e da testemunha K..., que relacionaram a seu belo prazer.
16.ª - Não foi produzida qualquer prova que, cabal e indubitavelmente, ateste que aqueles bens e o valor dos respectivo bens alegadamente subtraídos do referido armazém.
17.ª - Tratando-se de bens relacionados com a actividade comercial de venda de móveis e objectos decorativos, todos aqueles bens teriam que ter suporte em facturas ou documento de valor contabilístico ou fiscal equivalente, que permitiriam identificar de forma detalhada os bens bem como o respectivo valor.
18.ª - Prova esta que não foi feita, ou será indiscutivelmente bastante a assistente e sua irmã declararem que o valor constante da relação/inventário elaborado pelas próprias é o valor de factura?
19.ª - Será igualmente bastante identificar os bens de forma genérica e tão vaga para atestar a sua existência, a sua propriedade e inclusivamente a sua localização (dado que conforme atestam as referidas testemunhas e assistente, haviam ocorrido no mesmo período outros furtos nas outras lojas)?
20.ª - No entanto, o douto Tribunal a quo entendeu tal relação ser suficiente para atestar a sua propriedade, existência e valor.
21.ª - Ainda mais quando declaradamente é patente a relação de conflito e animosidade entre a assistente, K... e G... e a arguida A....
22.ª - O douto Tribunal a quo adoptou postura oposta quanto à alegada propriedade dos bens por parte da arguida A...quando esta invocou ter adquirido os mesmos à sua irmã, G....
23.ª - Neste caso, o depoimento da arguida A...não se mostra credível atento não possuir qualquer documento que comprovasse essa compra - fls. 12 do douto acórdão.
24.ª - E apesar de tais factos terem sido também confirmados pelo arguido, que atestou a proveniência, localização e transporte, tal não foi valorado, nem mesmo objecto de quaisquer considerações por parte do Tribunal a quo.
25.ª - Aliás, e ainda quanto a esta ausência de credibilidade atribuída ao depoimento da arguida A..., sempre se dirá também que o Tribunal a quo parte mais uma vez daquele pressuposto errado que todos os bens constantes da relação junta pela assistente se encontravam de facto no referido armazém e pertenciam àquela.
26.ª - Porquanto, e contrariamente ao fundamentado pelo douto Tribunal a quo, a arguida A...não retirou os bens que alega serem seus daquele armazém mas antes da casa da mãe desta, tendo posteriormente os levado para a Quinta …, local onde os tinha guardado aquando da mudança do apartamento no Entroncamento para casa da mãe.
27.ª - O que constitui erro notório e grosseiro quanto à apreciação da prova e principalmente uma dualidade de critérios, ilegal e infundada, quanto à prova de factos em tudo semelhantes.
28.ª - Não operando aqui o critério da livre apreciação de prova, porquanto se trata de factos de igual natureza (propriedade de bens móveis) cuja prova deverá ser a mesma.
29.ª - Não se mostra, por isso, produzida prova cabal e indiscutível da existência dos bens relacionados a fls. 357 a 361 e que foram alegadamente furtados e o seu valor comercial.
30.ª - Cuja prova se faria exclusivamente pela apresentação das respectivas facturas ou documento com valor contabilístico ou fiscal equivalente, que serão exigíveis atenta a actividade comercial da assistente, e onde são detalhadamente identificados os bens e o seu valor.
31.ª - Por sua vez, entende o Tribunal a quo que entre o dia 31/12/2009 e as 22 horas do dia 12/01/2010, o arguido e a arguida A..., em obediência a um plano previamente gizado, deslocaram-se a um armazém, sito na Rua … e quebrando o vidro da porta, introduziram-se e retiraram os objectos relacionados a fls. 157 a 161.
32.ª - Nenhuma prova, pericial, documental ou testemunhal foi produzida em julgamento que ateste este douto entendimento, e aliás as declarações da testemunha G... evidenciam exactamente o contrário.
33.ª - Aliás, daquela relação de bens apenas uma parcela pouco significativa foi apreendida e reconhecida pela assistente, desconhecendo o paradeiro dos alegados outros bens relacionados pela assistente.
34.ª - O armazém sito na Rua …, fora, muito pouco tempo antes, vítima de um incêndio, que destruiu grande parte, senão a totalidade, dos objectos existentes no mesmo.
35.ª - É infundado o douto entendimento do Tribunal a quo que, por mera dedução, conclui que foram os arguidos quem furtaram os bens existentes no armazém sito na Rua … pelo simples facto de parte dos mesmos terem sido encontrados na Quinta …- fls. 11 alínea c) do douto acórdão, sem que, contudo, em momento algum tenha sido posta em causa a veracidade do “inventário”.
36.ª - De facto, os próprios arguidos e a testemunha F... confirmam que parte dos bens móveis pertencentes à arguida foram transportados da casa da mãe desta, sita na Rua …, para a Quinta ..., por intermédio de uma carrinha pertencente a F..., tendo outros tantos permanecido naquela morada.
37.ª - Este circunstancialismo, que aliás foi corroborado pelos arguidos, apesar de não haver qualquer ligação ao armazém sito na Rua … , foi suficiente para o Tribunal a quo subsumir a autoria dos arguidos e a sua actuação como tendo sido em conjunto, em obediência a um plano previamente gizado - fls. 13 do douto acórdão.
Processo n.º 15/10.5GBGLG
38.ª - No que respeita aos factos provados, constata-se que a fundamentação do douto Tribunal a quo assenta maioritariamente nas declarações prestadas pelo arguido C..., alegadamente confessória.
39.ª - No entanto, é facilmente perceptível que as suas declarações por vezes não são espontâneas, muito pelo contrário e muitas das vezes as mesmas são influenciadas, conduzidas e evidentemente condicionadas pelo sentido das perguntas e comentários do douto tribunal a quo.
40.ª - Inicialmente começa por referir que vai ter com o arguido B..., que está sozinho.
41.ª - Que terá sido o arguido C... a ter a ideia de irem buscar o tractor, ideia que teria sido partilhada com o arguido B... dias antes, no entanto, quando recebe o telefonema deste não sabia a que ia.
42.ª - Em que parte das declarações do arguido C... o Tribunal a quo se baseia para atestar e dar por assente que a arguida A... foi ter a casa da mãe do arguido C..., bem como para concluir que o arguido B... ia no veículo à frente do tractor com o objectivo de avisar quem seguia atrás, caso avistasse agentes da autoridade?
43.ª - Refere ainda o arguido C... que indicou a localização dos bens furtados a um GNR com receio de sofrer um processo.
44.ª - O depoimento do arguido é contraditório, pouco seguro e nitidamente comprometido.
45.ª - O que, sendo a única prova produzida quanto à autoria dos factos, é dúbia a intervenção da arguida neste circunstancialismo.
46.ª - Verificando-se nos dois circunstancialismos expostos ausência de prova ou mesmo prova contraditória quanto à autoria dos mesmos pelo arguido, o douto tribunal a quo deveria ter primado pela aplicação de princípios fundamentais e basilares do direito penal como o princípio da presunção de inocência e do in dubio pro reo, consagrado desde logo no artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa.
47.ª - Pelo que, e salvo o devido respeito, o arguido B... deveria ter sido absolvido dos crimes por que vem condenado.
48.ª - O arguido vem condenado por dois crimes de furtos qualificado, que são punidos com pena de prisão de 2 a 8 anos.
49.ª - Atento o exposto no artigo 71.º, n.º l do CP, “a determinação da medida da pena, dentro dos limites na lei, é feita em função da culpa do agente e das finalidades de prevenção” e “em homenagem à salvaguarda da dignidade humana do condenado” - Ac. STJ, de 12 de Fevereiro de 2004, in CJ, Ano XII, tomo I, 2004, página 202.
50.ª - Ora, o arguido é um cidadão que se encontra pessoal, profissional e socialmente integrado. É pessoa interessada e preocupada, encontrando-se inclusivamente a concluir a sua formação.
51.ª - Apesar deste circunstancialismo de vida do arguido, o Tribunal a quo condenou o arguido na pena de 4 anos e 6 meses de prisão e 3 anos de prisão respectivamente.
52.ª - As necessidades de prevenção geral e especial são neste caso, e contrariamente ao fundamentado pelo douto Tribunal a quo, reduzidas.
53.ª - E mesmo que a admitir-se que o arguido fosse o autor dos crimes pelos quais vem acusado, sempre se diria também que a pena aplicada é infundadamente desmedida, atenta a sua conduta responsável e cumpridora e a sua absoluta integração social, factos que só por si impõem reduzidas necessidades de prevenção geral e mesmo especial.
54.ª - O douto acórdão, que fixou, em cúmulo jurídico, a pena única de 6 anos de prisão efectiva, mostra-se desproporcional e totalmente desajustada, atenta a prova produzida e os incorrectos juízos de valor atendidos.
55.ª - A única fundamentação dada pelo Tribunal a quo para a injustificada pena é o valor exagerado dos bens alegadamente furtados bem como o facto dos arguidos terem feito uma “limpeza” ao armazém - fls. 26, parágrafo 2 do douto acórdão, factos estes que não foram provados em julgamento.
56.ª - E mesmo que de facto o arguido fosse o autor dos crimes pelos quais vem acusado, se diria também que a pena aplicada é desmedida, atento que a conduta responsável e cumpridora do arguido, até então, impõe reduzidas necessidades de prevenção geral e mesmo especial.
57.ª - Atento o que atrás já ficou exposto, designadamente quanto à ausência de prova cabal que ateste quais os bens existentes no referenciado armazém bem como o seu valor, o que apenas por meio das devidas facturas ou documento contabilístico ou fiscal equivalente tais factos se atestariam, o valor fixado a título de indemnização mais não é que o valor constante da relação de bens e valores junto aos autos, elaborados pela assistente.
58.ª - O Tribunal a quo limitou-se a aceitar um documento particular elaborado por quem tem total interesse na causa e no seu resultado para atestar existências e valores que apenas se certificam por meio de documento próprio, com valor contabilístico ou fiscal.
59.ª - Ora, o ónus em provar que aqueles bens relacionados existiam de facto, aos quais correspondia aquele valor, recaía sobre o Ministério Público e na assistente.
60.ª - Essa prova não foi cabalmente produzida, não sendo suficiente para este efeito, atento o teor dos factos a provar, o mero documento particular junto aos autos.
61.ª - Pelo que inexiste prova do valor dos bens alegadamente furtados, mostrando-se infundado o pedido de indemnização civil peticionado e aplicado pelo Tribunal a quo, aliás douto, pelo que deveria ter sido o arguido também absolvido do pedido de indemnização civil peticionado e fixado.
Nestes termos e nos melhores de direito, que Vossas Excelências doutamente suprirão, deve o presente recurso proceder e ser revogada a decisão recorrida, com as legais consequências.
Porém, Vossas Excelências farão a costumada justiça.
*
B) Arguida A...:
1.ª - Os elementos fornecidos pelo processo impõem claramente decisão diversa daquela que foi proferida nos autos, impossível de ser destituída por qualquer outra prova.
2.ª - A prova produzida em sede de audiência de julgamento não foi correctamente julgada, impondo-se uma decisão diversa da proferida pelo tribunal a quo.
3.ª - Na verdade, não existe no processo prova bastante e inequívoca que permita concluir que tenha sido a arguida a praticar os crimes pelos quais vem acusada.
4.ª - O Tribunal a quo, decidindo como decidiu, violou o princípio estruturante do processo penal, ou seja, princípio in dubio pro reo e o princípio da presunção de inocência.
5.ª - Verifica-se claramente uma apreciação errada e inquinada da prova produzida em sede de audiência de julgamento, sendo a fundamentação do acórdão contraditória e insuficiente.
6.ª - Sem prescindir, a medida concreta da pena aplicada se mostra grosseiramente desproporcional e desajustada, atenta a moldura penal do crime em causa e a sua situação pessoal, profissional e social, quer quanto aos factos provados e as exigências de prevenção, especial e geral, que visa acautelar.
7.ª - Por acórdão proferido nos autos supra referidos foi a arguida condenado na pena única de 6 anos de prisão efectiva, como co-autora material, na forma consumada, pela prática de 2 crimes de furto qualificado, previstos e punidos pelos artigos 203.º n.º 1 e 204.° n.º 2, alíneas a) e e) do Código Penal.
8.ª - O acórdão recorrido violou claramente princípios fundamentais do nosso ordenamento jurídico, designadamente o princípio fundamental e basilar do direito penal como o princípio da presunção de inocência e do in dubio pro reo, consagrado desde logo no artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa, bem como o princípio da proporcionalidade e adequação da pena.
9.ª - Encontram-se incorrectamente julgados os seguintes pontos da matéria de facto constantes da sentença:
Do Processo n.º 18/10.0GBTNV
Fls. 3, ponto 1: em data não concretamente apurada mas que se situa entre as 20:00H do dia 31 de Dezembro de 2009 e as 22:00H do dia 12 de Janeiro de 2010, os arguidos A... e B..., em obediência a um plano previamente gizado, deslocaram-se a um armazém sito na Rua …, área desta comarca de ..., com o intuito, posteriormente concretizado, de subtrair os objectos de valor que aí encontrassem, fazendo-os coisas suas.
Fls. 4, ponto 2: de seguida, uma vez chegados ao local acima referido, os arguidos A...e B... quebraram o vidro da porta do citado armazém e introduziram-se no mesmo, dali retirando os seguintes objectos decorativos pertencentes à ofendida D...:
- um porta cd´s no valor de € 83,40, uma consola no valor de € 457,50, um aparador no valor de € 441,70, duas carpetes no valor de € 253,04, dez mantas no valor de € 883,50, duas estatuetas no valor de € 60,50, cinco árvores de natal no valor de € 192,00, uma gaiola no valor de € 24,90, dois conjuntos frente lareira no valor de € 138,90, 32 artigos de loiça e caixas no valor de € 196,16, uma cama no valor de € 441,00, material referente a varões completos no valor de € 16,65, um chaveiro fechado com embutidos no valor de € 28,00, seis conjuntos de material referentes a varões completos no valor de € 316,17, um banco de pés no valor de € 145,00, seis tapetes no valor de € 411,75, seis almofadas no valor de € 186,00, um colchão ortopédico no valor de € 144,00, duas cadeiras no valor de € 365,50, três conjuntos de material referentes a varões completos no valor de € 237,23, um estrado de ripas no valor de € 17,50, dois tapetes no valor de € 246,84, quatro tapetes no valor de € 724,53, três carpetes no valor de € 650,25, uma cadeira B... XV no valor de € 235,00, um cadeirão no valor de € 402,70, um candeeiro no valor de € 164,82, uma coluna de madeira no valor de € 220,30, um contador em mogno no valor de € 390,00, material referente a varões completos no valor de € 70,12, material referente a varões completos no valor de € 101,68, dois porta revistas no valor de € 106,26, uma área no valor de € 219,50, um busto no valor de € 236,20, um cabide com quatro suportes com embutido em cerejeira no valor de € 29,70, um cabide de chão com cruzeta em metal no valor de € 62,00, um cabide com cinco suportes com embutido em cerejeira no valor de € 33,00, um candeeiro no valor de € 817,50, um candeeiro no valor de € 416,40, um candeeiro no valor de € 263,90, um candeeiro no valor de € 305,60, um castiçal no valor de € 15,30, um castiçal no valor de € 192,75, um chaveiro fechado com embutidos no valor de € 28,00, um coluna em madeira no valor de € 164,90, uma coluna em madeira no valor de € 137,20, uma coluna em madeira no valor de € 123,40, um louceiro no valor de € 605,60, material referente a varões completos no valor de € 116,12, material referente a varões completos no valor de € 69,27, material referente a varões completos no valor de € 49,41, uma mesa no valor de € 415,70, uma mesa no valor de € 623,00, um pai natal no valor de € 49,75, um par de galinhas no valor de € 69,50, um pássaro em ferro no valor de € 63,75, um toucheiro em madeira no valor de € 105,95, um toucheiro em madeira no valor de € 105,95, três pianhas no valor de € 153,96, quatro cadeiras no valor de € 408,38, dois apliques com duas bolas no valor de € 304,40, duas bengalas no valor de € 25,00, dois bonecos no valor de € 22,50, dois bonecos de neve no valor de € 32,76, duas cadeiras «Oracle» no valor de € 350,80, dois candeeiros de pé no valor de € 110,00, uma embalagem de musgo no valor de € 9,50, duas embalagens de musgo no valor de € 9,50, dois conjuntos de material referente a varões, argolas e outros acessórios no valor de € 1.200,00, duas mesas redondas no valor de € 472,30, duas taças alabastro no valor de € 385,60, uma talha no valor de € 127,90, três mesas de apoio redondas no valor de € 480,00, três mesas vitrina no valor de € 720,00, três vasos em metal no valor de € 97,77, três candeeiros de mogno no valor de € 96,00, três cadeiras C... de tecido no valor de € 1.041,00, três caixas de luzes no valor de € 35,70, três caixas de flor de cheiro no valor de € 16,65, três embalagens musgo no valor de € 14,25, três plafons no valor de € 363,66, três sacos de neve no valor de € 51,63, cinco consolas no valor de € 1.500,00, cinco consolas de pau santo no valor de € 1700,00, quatro consolas de três gavetas no valor de € 1.080,00, cinco candeeiros no valor de € 315,58, quatro apliques no valor de € 78,75, quatro bowl vidro no valor de € 152,45, quatro caixas de frutos no valor de € 43,60, quatro candeeiros de mesa no valor de € 122,28, quatro candeeiros no valor de € 85,57, quatro chapeleiros no valor de € 144,00, quatro quadros no valor de € 660,00, cinco candeeiros de mesa de cabeceira no valor de € 171,75, cinco cestas no valor de € 62,50, cinco vasos no valor de € 104,70, cinco candeeiros bola no valor de € 190,00, cinco potes no valor de € 425, 20, cinco suportes de vela no valor de € 17,95, cinco tabuleiros no valor de € 130,00, cinco taças de vidro no valor de € 33,90, cinco vasos dourados no valor de € 72,65, seis cachos de uvas no valor de € 35,10, seis cachos de uvas no valor de € 35,10, seis hastes de flores no valor de € 40,80, seis puxadores com ferro no valor de € 5,28, oito candeeiros com fitas no valor de € 256,00, sete cadeiras sem braço de couro no valor de € 1.575,00, oito mesas de jogo tipo inglês no valor de € 2.400,00, sete vasos no valor de € 101,99, oito cachos de uvas no valor de € 9,76, oito conjuntos de casa de banho no valor de € 77,30, oito hastes de flores no valor de € 26,24, oito meninos no valor de € 245,44, nove molduras no valor de € 139,85, nove presépios no valor de € 667,08, dez cachos de uvas no valor de € 38,90, dez chapeleiros no valor de € 360,00, dez pés de candeeiro no valor de € 562,40, dez suportes de bíblia no valor de € 270,00, dez suportes de vela no valor de € 58,00, dez tabuleiros no valor de € 1.400,00, doze suportes de bíblia no valor de € 396,00, treze velas decorativas no valor de € 121,13, dezassete tabuleiros no valor de € 328,10, dezasseis quadros no valor de € 4.029,92, dezoito guardanapos no valor de € 64,98, vinte pés de candeeiros no valor de € 1.100,00, vinte e duas bengalas no valor de € 139,92, vinte e dois cachos de uvas no valor de € 190,96, vinte e três porta velas no valor de € 166,29, vinte e quatro figos no valor de € 39,60, trinta jarras de vidro no valor de € 1.329,90, trinta e dois pés de candeeiro no valor de € 1.655,04, trinta e três ramos de árvore no valor de € 752,73, trinta e oito jarras de vidro no valor de € 1.082,62, trinta e quatro pratos de vidro no valor de € 651,78, cinquenta e quatro pé flor no valor de € 218,70, sessenta pé rosas no valor de € 151,20, setenta e uma molduras triplas no valor de € 1.353,26, oitenta e nove velas no valor de € 129,94, oitenta e quatro pé flor no valor de € 358,68, material referente a varões completos no valor de € 70,28, material referente a varões completos no valor de € 78,11, dois espelhos no valor de € 141,53, um espelho sem bisel no valor de € 53,61, duas cómodas com moldura no valor de € 840,00, duas lanternas no valor de € 119,00, dois conjuntos de material referente a varões completos no valor de € 105,52, cinco cabides com cinco pegas no valor de € 150,00, vinte frutos decorativos no valor de € 43,44, um abajour no valor de € 29,37, um abajour no valor de € 13,58, um embalagem de musgo valor de € 4,95, uma embalagem de musgo no valor de € 5,75, um frasco de cheiro no valor de € 19,36, material referente a varões completos no valor de € 42,64, material referente a varões completos no valor de € 94,56, material referente a varões completos no valor de € 113,63, material referente a varões completos no valor de € 136,30, três mesas de refeição no valor de € 1.140,00, três abajours no valor de € 62,01, dois abajours no valor de € 29,50, dois abajours no valor de € 31,20, dois abajours no valor de € 31,20, dois cabides de parede no valor de € 66,82, dois candeeiros de pé alto no valor de € 108,00, duas cómodas «paralans fita» no valor de € 620,00, dois louceiros no valor de € 1.500,00, duas mesas redondas no valor de € 640,00, quatro cabides com três pegas no valor de € 88,00, quatro carros de chá ovais no valor de € 680,00, quatro cómodas B... XV em mogno no valor de € 1960,00, quatro cómodas curvas em mogno no valor de € 1800,00, quatro conjuntos de mesas rectangulares no valor de € 400,00, sete cabides de chão no valor de € 560,00, oito apliques no valor de € 723,60, oito candeeiros no valor de € 171,29, seis abajours no valor de € 146,26, seis jarrões no valor de € 208,50, oito conjuntos canapé no valor de € 7.944,00, dez ameixas no valor de € 11,10, dois camiseiros curvos no valor de € 460,00, duas cómodas com gavetas em pau santo no valor de € 1060,00, cinco fruteiras no valor de € 27,05, vinte frutos decorativos no valor de € 69,00, material referente a varões completos no valor de € 42,95, cinquenta frutos decorativos no valor de € 113,12, vinte e cinco folhagem de era no valor de € 66,25, cento e vinte e seis caixas, terrinas, faianças e biblots no valor de € 550,62, cento e vinte frutos decorativos no valor de € 309,40 e cento e vinte frutos decorativos no valor de € 266,35 (cfr. relação de bens junta a fls. 157 a 161).
Fls. 9, ponto 3: o valor comercial dos artigos acima elencados atinge, na sua globalidade, os € 73.936,12.
Fls. 9, ponto 4: posteriormente, e na posse dos aludidos objectos, os arguidos levaram alguns para a residência onde habitam, propriedade da progenitora da arguida A..., sita na Rua …., Entroncamento, outros para a Quinta ..., e os restantes para lugar não concretamente apurado.
Fls. 9, ponto 6: em momenta ulterior, e no seguimento de uma busca à residência dos arguidos, parte daqueles bens foi recuperada e entregue à ofendida no dia 18 de Março de 2010, designadamente:
- seis cadeiras brancas, dois bancos brancos, uma leiteira, dois bules, um espelho de parede, nove quadros de parede, um tecido de Camila, um tapete de Arraiolos, um tapete tipo rústico, um tecido de mesa, uma mesa de sala, quatro mesas-de-cabeceira, duas carpetes, duas flores de ornamentação, uma figura de santo, um espelho de parede dourada, um pote em madeira, uma cómoda, um tapete chenile, duas molduras, dois braços de velas, dois candeeiros, um boneco de porcelana, um prato, uma caixa decorativa, dois cortinados, um tapete e um móvel (cfr. termo de entrega de fls. 130 e 131).
Fls. 10, ponto 7: o valor dos objectos recuperados ascende à quantia de € 6.631,47, encontrando-se, por conseguinte, em falta, objectos cujo valor comercial total se cifra em € 67.304,65.
Fls. 10, ponto 8: actuando do modo descrito, a arguida A...conluiada com o arguido B... tinham o objectivo de se apropriar das coisas em causa, não obstante estarem cientes de que as mesmas não lhes pertenciam, fazendo-as coisas suas, o que, comportando-se de modo apto a tal, lograram alcançar.
Fls. 10, ponto 10: a arguida é delinquente primária.
10.ª - Segundo o douto Tribunal a quo, os factos assentes supra referidos tiveram por fundamento os seguintes meios de prova - fls. 11, ponto c, parágrafo 1:
Ponto 1: pelo que disseram as testemunhas G... e a demandante civil D..., entre 31 de Dezembro de 2009 e 12 de Janeiro de 2010 não foram ao armazém, sendo que o furto ocorreu dentro deste período de tempo, pois quando lá foram em 12 de Janeiro o armazém tinha sido objecto de furto; que foram os dois arguidos que ali foram, porque uma boa parte dos objectos furtados apareceram na Quinta ..., e foram para aí transportados pelos arguidos A... e B... numa carrinha do F... e estes objectos deram entrada na Quinta entre finais de Dezembro de 2009 e princípios de Janeiro de 2010, conforme o declarou a testemunha F... que é a pessoa que cuida desta Quinta; a arguida A...disse que tinha comprado estes bens, depoimento nada credível, quer porque contrariado pelas testemunhas G...e D..., quer porque não tinha qualquer documento que comprovasse essa compra e se de facto os tinha comprado não se percebe porque os não retirou do armazém na presença da D..., se eram seus como diz, porque os manteve no armazém da D...e por fim se eram seus porque os retirou do armazém daquele modo;
Ponto 2: a testemunha G...disse o modo como entraram no armazém partindo o vidro de uma porta nas traseiras do armazém, facto que foi confirmado pela D...; a testemunha G...disse que a arguida A...não tinha chave do armazém, pelo que para retirar do armazém estes bens, faz todo o sentido ter partido o vidro da porta para poder aceder ao armazém; os objectos furtados e o seu valor é o que resulta da relação de fls. 157 a 161 e que foi feita com base no inventario das existências sendo que como se diz na relação de fls. 33 a 48 parte dos bens estavam no armazém e que o que consta da relação de fls. 157 a 161 e os restantes encontravam-se na Loja do Entroncamento; o valor dos bens e o valor de factura que estava descriminado nas folhas de inventário; auto de apreensão de fls. 30 do apenso e que corresponde aos bens apreendidos na Quinta ... e auto de entrega de fls. 99 que a D...reconhece estes bens como sendo sua propriedade; auto de entrega de fls. 27 do apenso onde a D...reconhece os bens que lhe pertencem; auto de apreensão de fls. 127 do processo principal e que corresponde aos objectos encontrados em casa da mãe da arguida; que os arguidos actuaram em conjunto pelo facto de ambos terem transportado os bens como o declarou o F...; o elemento subjectivo pelo que as regras da experiência permitem concluir dos factos provados, pois os arguidos são suficientemente esclarecidos para saberem que devem respeitar o que é dos outros; a situação pessoal dos arguidos pelas suas declarações; foi ainda elemento de prova o RC de fls. 253 e 293..
Do Processo n.º 15/10.OGBGLG
Fls. 13, ponto 1: no dia 2 de Fevereiro de 2010 pelas 03H00, os arguidos B..., A... e C... acordaram, no sentido de se dirigirem à Quinta ..., e dali retirarem um tractor e objectos de valor que pudessem transportar consigo, após contacto telefónico feito pelo arguido B... ao arguido C....
Fls. 13, ponto 2: No âmbito daquele telefonema, o C... disse ao B... para o acompanhar, a A... foi ter a casa da mãe de C..., e seguiram todos até à Quinta ....
Fls. 13, ponto 3: Chegados ao local, o C... rebentou a fechadura do portão de uma garagem ali existente, com o auxílio de um pé de cabra e chamou pelos arguidos B... e A....
Fls. 14, ponto 4: Seguidamente os três arguidos entraram e retiraram do seu interior os seguintes objectos, no valor total de pelo menos 22.770,00 €, pertencentes a H...:
- um tractor agrícola no valor de 18.750€;
- um pulverizador Rocha no valor pelo menos de 3.750 €;
- uma motoserra Sthil no valor pelo menos de 150 €;
- uma rebarbadora eléctrica Black & Decker no valor pelo menos de 50 €;
- um carregador de baterias, modelo MS660, no valor pelo menos de 70 €.
Fls. 14, ponto 5: Após abandonaram o local seguindo a arguida A... ao volante do tractor e o C... ao lado desta.
Fls. 14, ponto 6: À frente do tractor ia B... ao volante do seu veículo com matrícula que se não apurou, com o objectivo de iluminar o caminho e avisar quem seguia atrás, caso avistasse agentes da autoridade.
Fls. 15, ponto 9: O tractor que se encontrava estacionado e escondido junto a um pinhal adjacente à Igreja da Olaia, ..., foi restituído a H..., em virtude de informação fornecida pelo B....
Fls. 15, ponto 10: Os arguidos A..., B... e C... agiram sempre em conjugação de esforços e na execução de um plano elaborado por todos.
11.ª - Fls. 16, alínea c): segundo o douto Tribunal a quo os factos assentes, supra referidos, tiveram por fundamento os seguintes meios de prova:
Ponto 1: pelo que disse o arguido foram os 3 arguidos buscar a tractor à Quinta … depois de o C... ter sugerido este facto e ter dito aos outros dois arguidos onde o tractor se encontrava, factos a que os arguidos A... e B... aderiram;
Ponto 2: pelo que disse o arguido C...;
Ponto 3: o C... confessou ter sido ele que rebentou com a fechadura e que o fez com um pé de cabra;
Ponto 4: os bens furtados pelo que disse o Eng. H..., que aqueles bens estavam na Quinta e desapareceram todos na mesma altura, indicou a valor dos mesmos bens por referência ao seu custo, uso, desgaste e idade;
Pontos 5, 6 e 7: pelo que disse o C...;
Ponto 9: pelo que resulta da conjugação dos depoimentos de I..., disse que o arguido B... lhe ofereceu um tractor para a sucata, disse que o mesmo era proveniente de uma herança e não tinha documentos; pelo que disse a …, recebeu um telefonema do J... informando que lhe tinha sido oferecido um tractor para a sucata e pela descrição que a J... lhe fez teve como assente que se tratava do tractor da Quinta ..., dirigiu-se à sucata do J... e aí encontrou-se com o B..., tendo este dito que pela venda apenas iria receber uma comissão; alertou o Eng. H... que telefonou ao B... que lhe garantiu que o tractor iria aparecer e disse onde poderia ser encontrado, o que veio a acontecer.
12.ª - Verifica-se um erro grosseiro quanto à apreciação da prova produzida bem como quanto à sua fundamentação, constatando-se contradições insanáveis entre aquela e a respectiva fundamentação.
Proc. n.º 18/10.5GBTNV
13.ª - Não foi feita prova cabal e bastante da propriedade/existência de bens móveis que alegadamente se encontravam no armazém sito da Rua … .
14.ª - Resulta das declarações da própria assistente como das testemunhas G... e K..., a relação junta a fls. 157 a 161 mais não é que uma relação elaborada pelas próprias.
15.ª - A identificação dos bens, a sua localização e respectivo preço resulta exclusivamente da acção e vontade da assistente e da testemunha K..., que relacionaram a seu belo prazer.
16.ª - Não foi produzida qualquer prova que, cabal e indubitavelmente, ateste que aqueles bens e o valor dos respectivo bens alegadamente subtraídos do referido armazém.
17.ª - Tratando-se de bens relacionados com a actividade comercial de venda de móveis e objectos decorativos, todos aqueles bens teriam que ter suporte em facturas ou documento de valor contabilístico ou fiscal equivalente, que permitiriam identificar de forma detalhada os bens bem como o respectivo valor.
18.ª - Prova esta que não foi feita, ou será indiscutivelmente bastante a assistente e sua irmã declararem que o valor constante da relação/inventário elaborado pelas próprias é o valor de factura?
19.ª - Será igualmente bastante identificar os bens de forma genérica e tão vaga para atestar a sua existência, a sua propriedade e inclusivamente a sua localização (dado que conforme atestam as referidas testemunhas e assistente, haviam ocorrido no mesmo período outros furtos nas outras lojas)?
20.ª - No entanto, o douto Tribunal a quo entendeu tal relação ser suficiente para atestar a sua propriedade, existência e valor.
21.ª - Ainda mais quando declaradamente é patente a relação de conflito e animosidade entre a assistente, K... e G... e a arguida A....
22.ª - O douto Tribunal a quo adoptou postura oposta quanto à alegada propriedade dos bens por parte da arguida A...quando esta invocou ter adquirido os mesmos à sua irmã, G....
23.ª - Neste caso, o depoimento da arguida A...não se mostra credível atento não possuir qualquer documento que comprovasse essa compra - fls. 12 do douto acórdão.
24.ª - Aliás, e ainda quanto a esta ausência de credibilidade atribuída ao depoimento da arguida, sempre se dirá também que o Tribunal a quo parte mais uma vez daquele pressuposto errado que todos os bens constantes da relação junta pela assistente se encontravam de facto no referido armazém e pertenciam àquela.
25.ª - Porquanto, e contrariamente ao fundamentado pelo douto Tribunal a quo, a arguida não retirou os bens que alega serem seus daquele armazém mas antes da casa da sua mãe, local onde os tinha guardado aquando da mudança do apartamento no Entroncamento para casa da sua mãe, tendo posteriormente os levado para a Quinta … .
26.ª - O que constitui erro notório e grosseiro quanto à apreciação da prova e principalmente uma dualidade de critérios, ilegal e infundada, quanto à prova de factos em tudo semelhantes.
27.ª - Não operando aqui o critério da livre apreciação de prova, porquanto se trata de factos de igual natureza (propriedade de bens móveis) cuja prova deverá ser a mesma.
28.ª - Não se mostra, por isso, produzida prova cabal e indiscutível da existência dos bens relacionados a fls. 357 a 361 e que foram alegadamente furtados e o seu valor comercial.
29.ª - Cuja prova se faria exclusivamente pela apresentação das respectivas facturas ou documento com valor contabilístico ou fiscal equivalente, que serão exigíveis atenta a actividade comercial da assistente, e onde são detalhadamente identificados os bens e o seu valor.
30.ª - Por sua vez, entende o Tribunal a quo que entre o dia 31/12/2009 e as 22 horas do dia 12/01/2010, a arguida e o arguido B..., em obediência a um plano previamente gizado, deslocaram-se a um armazém, sito na Rua … e quebrando o vidro da porta, introduziram-se e retiraram os objectos relacionados a fls. 157 a 161.
31.ª - Nenhuma prova, pericial, documental ou testemunhal foi produzida em julgamento que ateste este douto entendimento, e aliás as declarações da testemunha G... evidenciam exactamente o contrário.
32.ª - Aliás, daquela relação de bens apenas uma parcela pouco significativa foi apreendida e reconhecida pela assistente, desconhecendo o paradeiro dos alegados outros bens relacionados pela assistente.
33.ª - O armazém sito na Rua …, fora, muito pouco tempo antes, vítima de um incêndio, que destruiu grande parte, senão a totalidade, dos objectos existentes no mesmo.
34.ª - É infundado o douto entendimento do Tribunal a quo que, por mera dedução, conclui que foram os arguidos quem furtaram os bens existentes no armazém sito na Rua … pelo simples facto de parte dos mesmos terem sido encontrados na Quinta …- fls. 11 alínea c) do douto acórdão, sem que, contudo, em momento algum tenha sido posta em causa a veracidade do “inventário”.
35.ª - De facto, os próprios arguidos e a testemunha F..., confirmam que parte dos bens móveis pertencentes à arguida foram transportados da casa da mãe desta, sita na Rua …, para a Quinta ..., por intermédio de uma carrinha pertencente a F..., tendo outros tantos permanecido naquela morada.
36.ª - Este circunstancialismo, que aliás foi corroborado pelos arguidos, apesar de não haver qualquer ligação ao armazém sito na Rua …, foi suficiente para o Tribunal a quo subsumir a autoria dos arguidos e a sua actuação como tendo sido em conjunto, em obediência a um plano previamente gizado - fls. 13 do douto acórdão.
Processo n.º 15/10.5GBGLG
37.ª - No que respeita aos factos provados, constata-se que a fundamentação do douto Tribunal a quo assenta maioritariamente nas declarações prestadas pelo arguido C..., alegadamente confessória.
38.ª - No entanto, é facilmente perceptível que as suas declarações por vezes não são espontâneas, muito pelo contrário e muitas das vezes as mesmas são influenciadas, conduzidas e evidentemente condicionadas pelo sentido das perguntas e comentários do douto tribunal a quo.
39.ª - Inicialmente começa por referir que vai ter com o arguido B..., que está sozinho.
40.ª - Que terá sido o arguido C... a ter a ideia de irem buscar o tractor, ideia que teria sido partilhada com o arguido B... dias antes, no entanto, quando recebe o telefonema deste não sabia a que ia.
41.ª- No entanto, após insistência do douto colectivo, em referir persistentemente o nome da arguida, o arguido C... passa a incluí-la nas suas declarações.
42.ª - Em que parte das declarações do arguido C... o Tribunal a quo se baseia para atestar e dar por assente que a arguida A... foi ter a casa da mãe do arguido C..., bem como para concluir que o arguido B... ia no veículo à frente do tractor com o objectivo de avisar quem seguia atrás, caso avistasse agentes da autoridade?
43.ª - Refere ainda o arguido C... que indicou a localização dos bens furtados a um GNR com receio de sofrer um processo.
44.ª - O depoimento do arguido é contraditório, pouco seguro e nitidamente comprometido.
45.ª - O que, sendo a única prova produzida quanto à autoria dos factos, é dúbia a intervenção da arguida neste circunstancialismo.
46.ª - Verificando-se nos dois circunstancialismos expostos ausência de prova ou mesmo prova contraditória quanto à autoria dos mesmos pela arguida A..., o douto tribunal a quo deveria ter primado pela aplicação de princípios fundamentais e basilares do direito penal como o princípio da presunção de inocência e do in dubio pro reo, consagrado desde logo no artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa.
47.ª - Pelo que, e salvo o devido respeito, a arguida A... deveria ter sido absolvida dos crimes por que vem condenada.
48.ª - A arguida vem condenada por dois crimes de furtos qualificado, que são punidos com pena de prisão de 2 a 8 anos.
49.ª - Atento o exposto no artigo 71.º, n.º l do CP, “a determinação da medida da pena, dentro dos limites na lei, é feita em função da culpa do agente e das finalidades de prevenção” e “em homenagem à salvaguarda da dignidade humana do condenado” - Ac. STJ, de 12 de Fevereiro de 2004, in CJ, Ano XII, tomo I, 2004, página 202.
50.ª - Ora, a arguida, com quase meio século de vida, sempre foi uma cidadã trabalhadora, cumpridora, respeitadora e responsável, está socialmente integrada e, conforme resulta dos factos provados, não tem antecedentes criminais.
51.ª - Apesar deste circunstancialismo de vida da arguida, o Tribunal a quo condenou a arguida na pena de 4 anos e 6 meses de prisão e 3 anos de prisão respectivamente.
52.ª - As necessidades de prevenção geral e especial são neste caso, e contrariamente ao fundamentado pelo douto Tribunal a quo, reduzidas.
53.ª - A admitir-se a autoria da arguida naqueles factos, o que só academicamente se admite, verifica-se que se trata de situações isoladas, limitadas a um período muito reduzido, onde se confundem razões e conflitos familiares recíprocos que, aliás, são patentes.
54.ª - O douto acórdão, que fixou, em cúmulo jurídico, a pena única de 6 anos de prisão efectiva, mostra-se desproporcional e totalmente desajustada, atenta a prova produzida e os incorrectos juízos de valor atendidos.
55.ª - A única fundamentação dada pelo Tribunal a quo para a injustificada pena é o valor exagerado dos bens alegadamente furtados bem como o facto dos arguidos terem feito uma “limpeza” ao armazém - fls. 26, parágrafo 2 do douto acórdão, factos estes que não foram provados em julgamento.
56.ª - E mesmo que de facto a arguida fosse a autora dos crimes pelos quais vem acusada, se diria também que a pena aplicada é desmedida, atento que a conduta responsável e cumpridora da arguida, até então, impõe reduzidas necessidades de prevenção geral e mesmo especial.
57.ª - Atento o que atrás já ficou exposto, designadamente quanto à ausência de prova cabal que ateste quais os bens existente no referenciado armazém bem como o seu valor, o que apenas por meio das devidas facturas ou documento contabilístico ou fiscal equivalente tais factos se atestariam, o valor fixado a título de indemnização mais não é que o valor constante da relação de bens e valores junto aos autos, elaborados pela assistente.
58.ª - O Tribunal a quo limitou-se a aceitar um documento particular elaborado por quem tem total interesse na causa e no seu resultado para atestar existências e valores que apenas se certificam por meio de documento próprio, com valor contabilístico ou fiscal.
59.ª - Ora, o ónus em provar que aqueles bens relacionados existiam de facto, aos quais correspondia aquele valor, recaía sobre o Ministério Público e na assistente.
60.ª - Essa prova não foi cabalmente produzida, não sendo suficiente para este efeito, atento o teor dos factos a provar, o mero documento particular junto aos autos.
61.ª - Pelo que inexiste prova do valor dos bens alegadamente furtados, mostrando-se infundado o pedido de indemnização civil peticionado e aplicado pelo Tribunal a quo, aliás douto, pelo que deveria ter sido a arguida também absolvida do pedido de indemnização civil peticionado e fixado.
Nestes termos e nos melhores de direito, que Vossas Excelências doutamente suprirão, deve o presente recurso proceder e ser revogada a decisão recorrida, com as legais consequências.
Porém, Vossas Excelências farão a costumada justiça.
*
5. O Ministério Público, o arguido C... e a assistente/demandante civil D... remataram as suas respostas aos recursos nos termos infra transcritos.
A) Ministério Público:
1. Consta dos factos dados como provados que, em data não concretamente apurada mas que se situa entre as 20H00 do dia 31 de Dezembro de 2009 e as 22H00 do dia 12 de Janeiro de 2010, os arguidos e recorrentes, B... e A..., quebrando o vidro da porta, introduziram-se no armazém da Rua …, pertencente à ofendida e assistente, D....
2. Onde se encontravam, além do mais, todos os móveis, objectos e artigos decorativos a que se reporta a listagem de fls. 157 a 161 dos autos, elaborada pela ofendida e que assinala não só os números das facturas e das vendas a dinheiro mas também os fabricantes/vendedores e respectivos valores de aquisição.
3. Os Autos de Apreensão de fls. 51 a 57, efectuado num barracão da Quinta ..., e de fls. 81 a 82, na R. …, no Entroncamento, conjugados com os Termos de Entrega de fls. 83 a 88 e 99 a 100, confirmam a listagem-inventariação de fls. 157 a 161 que patenteia com exactidão as existências em armazém.
4. Sem qualquer necessidade, como afirmam os recorrentes, das facturas ou documento de valor contabilístico ou fiscal equivalente para identificar de forma detalhada os bens e o respectivo valor.
5. Dentro da panóplia de objectos subtraídos e que os arguidos tinham obrigação de restituir mas de que apenas se localizaram e recuperaram os referidos no Termo de Entrega de fls. 83 a 88 e 99 a 100, não se encontra nem tem sentido vir alegar a existência de critérios distintos para valorar os depoimentos da assistente e da arguida.
6. Muito menos se percebe, perante a apreensão de parte significativa das existências do armazém (objectos novos e escondidos), donde retiram os arguidos que é infundado o entendimento do Tribunal ao concluir, pelas regras da experiência, que foram os arguidos quem furtaram os bens existentes no armazém silo na Rua … .
7. Perante tais regras, o que seria deveras estranho era concluir o contrário: mesmo sem conhecer o destino que deram aos restantes que compõem a listagem apresentada pela assistente e não foram localizados.
8. Assim, embora se desconheça o destino que deram à maior parte, o que assumiram foi o transporte (dos objectos subtraídos) na carrinha da testemunha F..., para a Quinta ... quer para a casa da mãe da arguida A..., na Rua … .
9. A testemunha H..., que apenas tomava conta da Quinta ..., confirmou a cedência do citado meio de transporte e, a pedido dos arguidos, sem que se apure que conhecia a proveniência dos bens, veio confirmar que lhes deu autorização para os guardarem, como guardaram num barracão da mencionada Quinta, onde acabaram por ser apreendidos pelos órgãos de polícia criminal.
10. No atinente aos factos ocorridos na noite de 2 para 3 de Fevereiro de 2010, cerca das 03H00, na Quinta ..., os recorrentes atravessam sem mais e como se fosse o único elemento de prova, o transmitido ao Tribunal pelo arguido C....
11. Enviesando todo o sentido da prova produzida em sede de audiência de julgamento, lançam sobre o Tribunal a suspeição de uma prova orientada e com perguntas sugestivas, indutoras de respostas parciais ou condizentes com qualquer pré-juízo de qualquer um dos membros do Colectivo.
12. Ignorando o depoimento das testemunhas, onde se incluíam os agentes da autoridade e do ofendido, H..., id.º a fls. 135, que, graças à colaboração do próprio arguido C..., lograram localizar e recuperar, percebendo as circunstâncias e por quem foi subtraído não só o tractor e o pulverizador acoplado mas também um motosserra, marca “STHIL”, uma rebarbadora, marca “Black & Decker” e um carregador de baterias, modelo “MS660”, entretanto recuperados.
13. Não se percebe qualquer arrimo para a aplicação dos princípios da presunção de inocência e do “in dubio pro reo”, consagrado desde logo no art. 32.º da CRP.
14. Muito menos se compreende, perante todo o exposto, qualquer fundamento legal ou princípio que conduzisse à absolvição dos arguidos.
15. Não se questiona que, como afirmam os recorrentes, aos crimes de furto qualificado por que foram condenados corresponde em abstracto a pena de dois a oito anos de prisão e que, nos termos do art. 71.º do Código Penal, a determinação da medida da pena “ ....é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção”.
16. Mas, é imperioso destacar, como bem considerou a decisão recorrida, não só a gravidade das condutas, espelhada no limite máximo da pena de prisão abstractamente aplicável a qualquer um dos crimes por que foram julgados e condenados mas também os valores muito elevados dos objectos subtraídos; a “limpeza” que os arguidos fizeram ao armazém e o desaparecimento da maior parte das respectivas existências, correspondentes a cerca de 70.000,00 €.
17. Campeando, ao abrigo da noite e sem olhar a meios, bastará ler a decisão recorrida para perceber não só a extrema gravidade dos crimes por que foram condenados mas também a total indiferença pelas regras de vivência em sociedade.
18. Sem manifestarem a mínima preocupação de reparação dos males que provocaram.
19. Bem ponderou a decisão recorrida, entre os factores de risco, as personalidades deficitárias e desconformes com os valores essenciais à vida em comunidade.
20. O cúmulo jurídico operado na decisão recorrida, ao contrário do afirmado pelo recorrente, permite a apreensão da situação de facto concretamente julgada e a compreensão da decisão de direito.
21. Não se apura qualquer violação do disposto pelo art. 410.º do CPP nem dos arts. 71.º e 72.º, ambos do Código Penal, ou de qualquer outro preceito legal.
22. Não se vê qualquer erro, obscuridade ou contradição em toda a matéria de facto dada como provada, tal como inexiste qualquer falta de fundamentação geradora de nulidades.
23. O grau de culpa dos arguidos é muito elevado e as exigências de prevenção, quer geral quer especial, são candentes.
24. Assim, perante a gravidade dos factos e da culpa do agente, bem andou o tribunal ao condenar cada um dos arguidos, em cúmulo jurídico, como autores materiais, em concurso real, pela prática de:
- dois crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203.º, n.º l e 204.º , n.º 2 , als. a) e e), ambos do Código Penal, na pena de, respectivamente, quatro anos e seis meses de prisão (armazém da R. …) e três anos de prisão (Quinta ...).
Em cúmulo jurídico de tais penas, na pena única de seis anos de prisão efectiva.
25. Que se mostra bem doseada e equilibrada.
26. Merece inteira confirmação o acórdão recorrido.
*
B) Arguido C...:
1. A... foi condenada, como co-autora material de dois crimes de furto qualificado, p. p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, als. a) e e), do Código Penal, nas penas de quatro anos e seis meses de prisão e três anos de prisão, respectivamente; efectuado o cúmulo jurídico das penas aplicadas, aplicou o douto Tribunal a pena única de seis anos de prisão efectiva;
2. B... foi condenado, como co-autor material de dois crimes de furto qualificado p. p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, als. a) e e), do Código Penal, nas penas de quatro anos e seis meses de prisão e três anos de prisão, respectivamente; efectuado o cúmulo jurídico das penas aplicadas, aplicou o douto Tribunal a pena única de seis anos de prisão efectiva; e
3. C... foi condenado, como co-autor material de um crime de furto qualificado p. p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, als. a) e e), do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão, suspensa pelo período de 3 (três) anos.
4. Nada tem o ora arguido C... a apontar quanto à douta decisão do Tribunal “a quo”.
5. Na verdade quanto ao arguido C... a douta decisão do Tribunal “a quo” entendeu: “No caso concreto, atendendo à idade do arguido, ao facto de não ter antecedentes criminais, ao facto de a maior parte dos bens terem sido recuperados, à sua confissão o que demonstra uma interiorização do mal praticado, sendo assim de acreditar que a simples censura do facto e a ameaça da prisão bastarão para o afastar da prática de novos crimes e satisfazer as necessidades de reprovação e prevenção do crime, sendo que a suspensão da pena não atenta contra as exigências mínimas de prevenção geral, ..., pelo que, ponderado tudo, se decide suspender a execução da pena imposta ao arguido pelo período de 3 (três) anos”.
6. O douto acórdão proferido pelo Tribunal “a quo” encontra-se devidamente fundamentado de acordo com toda a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, nada havendo a apontar, considerando que o mesmo em nada falhou ou errou na apreciação da prova, pelo que desde já pugna que se mantenha a douta decisão recorrida.
Termos em que, nos melhores de Direito e sempre com o mui douto suprimento de Vossas Excelências, deve manter-se a douta decisão proferida pelo Tribunal “a quo”, com o que Vossas Excelências farão a tão costumada justiça.
*
C) Demandante D... :
1. O Tribunal “a quo” julgou criteriosa e prudentemente os arguidos ora Recorrentes e face à prova produzida em audiência de discussão e julgamento só poderia ter concluído pela condenação de ambos, como fez, e bem.
2. Lido e relido o douto Acórdão recorrido, nele encontramos a fundamentação lógica e escorreita mais do que necessária e suficiente para acompanhar o raciocínio dos Meritíssimos Juízes do Tribunal “a quo”...
3. Por tal razão, e bem, mostra-se a prova bem elencada, correctamente apreciada, devidamente fundamentada e criticamente examinada, subordinada ao sempre dever de concisão.
4. Toda a prova produzida em sede de audiência de julgamento, conjugada com os factores de risco, as personalidades desconexas com a vida normal em sociedade, e conjugada com as disposições penais existentes, só poderia determinar por parte do Tribunal “a quo” a condenação justa e equilibradíssima que foi aplicada aos arguidos ora Recorrentes.
5. Pelo que, operado o competente cúmulo jurídico de ambas as penas a que os arguidos foram condenados, a condenação de cada um dos arguidos ora Recorrentes na pena única de 6 anos de prisão efectiva é correcto tendo em vista a finalidade da pena, como muito bem é referido no acórdão recorrido, “finalidade de tranquilizar o tecido social” e de “restabelecer a confiança colectiva na validade da norma jurídica face à prática dos crimes que intencionalmente os Recorrentes quiseram praticar”.
Por seu lado,
6. Foi feita plena prova por parte da Assistente/Demandante de todos os bens móveis que lhe foram furtados do interior do armazém sito na Rua …, pelos Recorrentes, mediante a entrega de uma listagem/inventário de todos os bens furtados, devidamente descriminados, quantificados e valorados, bem como qual a sua fonte de aquisição (factura ou venda a dinheiro do fornecedor).
7. O Tribunal “a quo” valorou e bem, a existência de todos os bens furtados, no armazém sito na Rua …, à Assistente/Demandante, cfr. relação de bens junto aos autos de fls. 157 a 161, bens cujo valor global atingia os 73.936,12 € (setenta e três mil novecentos e trinta e seis euros e doze cêntimos).
8. Da totalidade desses bens, o Tribunal “a quo” reconhece, e bem, que posteriormente e devido a duas situações de apreensão de bens (na quinta ... e na casa da mãe da recorrente A...), foram recuperados bens que a Demandante reconheceu como seus, os quais fariam parte da listagem do furto, bem esses que totalizavam o montante de € 6.631,47 (seis mil e seiscentos e trinta e um euros e quarenta e sete cêntimos).
9. Razão pela qual o acórdão recorrido condena, e bem, atenta toda a análise critica da prova produzida em sede de audiência e julgamento, os Demandados ora Recorrentes a indemnizarem a Demandante Cível D... no valor remanescente ou seja, em 67.304,65 € (sessenta e sete mil e trezentos e quatro euros e sessenta e cinco cêntimos).
Nestes termos e pelos expostos fundamentos, conclui-se assim que, não merecendo censura a douta decisão recorrida, deverá a mesma manter-se, negando-se provimento aos recursos apresentados e, confirmando-se o acórdão recorrido.
*
6. A Exma. Sr.ª Procurador-Geral Adjunta, no seu parecer a fls. 576, pronunciou-se, de igual modo, no sentido da improcedência do recurso.
*
7. Cumprido o disposto no art. 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, apenas o arguido C... exerceu o seu direito de resposta, reiterando, em síntese, a posição anteriormente expressa.
*
8. Colhidos os vistos, foram os autos à conferência, cumprindo apreciar e decidir.
***
II. Fundamentação:
1. Poderes cognitivos do tribunal ad quem e delimitação do objecto do recurso:
Conforme Jurisprudência constante e pacífica dos nossos tribunais superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente a partir da respectiva motivação que delimitam e fixam o objecto do recurso que lhe é submetido para conhecimento.
Assim, no caso sub judice, o recurso doa arguido a demanda para apreciação as seguintes questões:
A) Alterabilidade da matéria de facto provada;
B) Se o acórdão padece do vício elencado na alínea c) do n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal
C) Se foi violado o princípio in dubio pro reo;
D) Se alterada a matéria de facto, segundo os desígnios dos recorrentes, estes devem ser absolvidos dos dois crimes de furto qualificado que lhes estão imputados;
E) Medida concreta das penas parcelares e única;
F) Se modificada a matéria de facto, como preconizam os recorrentes/demandados cíveis, devem os mesmos ser ainda absolvidos do pedido de indemnização civil.
*
2. No acórdão recorrido, foram dados como provados os seguintes factos:
Do processo comum colectivo nº 18/10.5GBTNV:
1) Em data não concretamente apurada mas que se situa entre as 20:00H do dia 31 de Dezembro de 2009 e as 22:00H do dia 12 de Janeiro de 2010, os arguidos A... e B..., em obediência a um plano previamente gizado, deslocaram-se a um armazém sito na Rua …, área desta comarca de ..., com o intuito, posteriormente concretizado, de subtrair os objectos de valor que aí encontrassem, fazendo-os coisas suas.
2) De seguida, uma vez chegados ao local acima referido, os arguidos A...e B..., quebraram o vidro da porta do citado armazém e introduziram-se no mesmo, dali retirando os seguintes objectos decorativos pertencentes à ofendida D...:
- um porta cd’s no valor de € 83,40, uma consola no valor de € 457,50, um aparador no valor de € 441,70, duas carpetes no valor de € 253,04, dez mantas no valor de € 883,50, duas estatuetas no valor de € 60,50, cinco árvores de natal no valor de € 192,00, uma gaiola no valor de € 24,90, dois conjuntos frente lareira no valor de € 138,90, 32 artigos de loiça e caixas no valor de € 196,16, uma cama no valor de € 441,00, material referente a varões completos no valor de € 16,65, um chaveiro fechado com embutidos no valor de € 28,00, seis conjuntos de material referentes a varões completos no valor de € 316,17, um banco de pés no valor de € 145,00, seis tapetes no valor de € 411,75, seis almofadas no valor de € 186,00, um colchão ortopédico no valor de € 144,00, duas cadeiras no valor de € 365,50, três conjuntos de material referentes a varões completos no valor de € 237,23, um estrado de ripas no valor de € 17,50, dois tapetes no valor de € 246,84, quatro tapetes no valor de € 724,53, três carpetes no valor de € 650,25, uma cadeira B... XV no valor de € 235,00, um cadeirão no valor de € 402,70, um candeeiro no valor de € 164,82, uma coluna de madeira no valor de € 220,30, um contador em mogno no valor de € 390,00, material referente a varões completos no valor de € 70,12, material referente a varões completos no valor de € 101,68, dois porta revistas no valor de € 106,26, uma arca no valor de € 219,50, um busto no valor de € 236,20, um cabide com quatro suportes com embutido em cerejeira no valor de € 29,70, um cabide de chão com cruzeta em metal no valor de € 62,00, um cabide com cinco suportes com embutido em cerejeira no valor de € 33,00, um candeeiro no valor de € 817,50, um candeeiro no valor de € 416,40, um candeeiro no valor de € 263,90, um candeeiro no valor de € 305,60, um castiçal no valor de € 15,30, um castiçal no valor de € 192,75, um chaveiro fechado com embutidos no valor de € 28,00, um coluna em madeira no valor de € 164,90, uma coluna em madeira no valor de € 137,20, uma coluna em madeira no valor de € 123,40, um louceiro no valor de € 605,60, material referente a varões completos no valor de € 116,12, material referente a varões completos no valor de € 69,27, material referente a varões completos no valor de € 49,41, uma mesa no valor de € 415,70, uma mesa no valor de € 623,00, um pai natal no valor de € 49,75, um par de galinhas no valor de € 69,50, um pássaro em ferro no valor de € 63,75, um toucheiro em madeira no valor de € 105,95, um toucheiro em madeira no valor de € 105,95, três pianhas no valor de € 153, 96, quatro cadeiras no valor de € 408,38, dois apliques com duas bolas no valor de € 304,40, duas bengalas no valor de € 25,00, dois bonecos no valor de € 22,50, dois bonecos de neve no valor de € 32,76, duas cadeiras «Oracle» no valor de € 350,80, dois candeeiros de pé no valor de € 110,00, uma embalagem de musgo no valor de € 9,50, duas embalagens de musgo no valor de € 9,50, dois conjuntos de material referente a varões, argolas e outros acessórios no valor de € 1.200,00, duas mesas redondas no valor de € 472,30, duas taças alabastro no valor de € 385,60, uma talha no valor de € 127,90, três mesas de apoio redondas no valor de € 480,00, três mesas vitrina no valor de € 720,00, três vasos em metal no valor de € 97,77, três candeeiros de mogno no valor de € 96,00, três cadeiras C... de tecido no valor de € 1.041,00, três caixas de luzes no valor de € 35,70, três caixas de flor de cheiro no valor de € 16,65, três embalagens musgo no valor de € 14,25, três plafons no valor de € 363,66, três sacos de neve no valor de € 51,63, cinco consolas no valor de € 1.500,00, cinco consolas de pau santo no valor de € 1700,00, quatro consolas de três gavetas no valor de € 1.080,00, cinco candeeiros no valor de € 315,58, quatro apliques no valor de € 78,75, quatro bowl vidro no valor de € 152,45, quatro caixas de frutos no valor de € 43,60, quatro candeeiros de mesa no valor de € 122,28, quatro candeeiros no valor de € 85,57, quatro chapeleiros no valor de € 144,00, quatro quadros no valor de € 660,00, cinco candeeiros de mesa de cabeceira no valor de € 171,75, cinco cestas no valor de € 62,50, cinco vasos no valor de € 104, 70, cinco candeeiros bola no valor de € 190,00, cinco potes no valor de € 425, 20, cinco suportes de vela no valor de € 17,95, cinco tabuleiros no valor de € 130,00, cinco taças de vidro no valor de € 33,90, cinco vasos dourados no valor de € 72,65, seis cachos de uvas no valor de € 35,10, seis cachos de uvas no valor de € 35,10, seis hastes de flores no valor de € 40,80, seis puxadores com ferro no valor de € 5,28, oito candeeiros com fitas no valor de € 256,00, sete cadeiras sem braço de couro no valor de € 1.575,00, oito mesas de jogo tipo inglês no valor de € 2.400,00, sete vasos no valor de € 101,99, oito cachos de uvas no valor de € 89,76, oito conjuntos de casa de banho no valor de € 77,30, oito hastes de flores no valor de € 26,24, oito meninos no valor de € 245,44, nove molduras no valor de € 139,85, nove presépios no valor de € 667,08, dez cachos de uvas no valor de € 38,90, dez chapeleiros no valor de € 360,00, dez pés de candeeiro no valor de € 562,40, dez suportes de bíblia no valor de € 270,00, dez suportes de vela no valor de € 58,00, dez tabuleiros no valor de € 1.400,00, doze suportes de bíblia no valor de € 396,00, treze velas decorativas no valor de € 121,13, dezassete tabuleiros no valor de € 328,10, dezasseis quadros no valor de € 4.029,92, dezoito guardanapos no valor de € 64,98, vinte pés de candeeiros no valor de € 1.100,00, vinte e duas bengalas no valor de € 139,92, vinte e dois cachos de uvas no valor de € 190,96, vinte e três porta velas no valor de € 166,29, vinte e quatro figos no valor de € 39,60, trinta jarras de vidro no valor de € 1.329,90, trinta e dois pés de candeeiro no valor de € 1.655,04, trinta e três ramos de árvore no valor de € 752,73, trinta e oito jarras de vidro no valor de € 1.082,62, trinta e quatro pratos de vidro no valor de € 651,78, cinquenta e quatro pé flor no valor de € 218,70, sessenta pé rosas no valor de € 151,20, setenta e uma molduras triplas no valor de € 1.353,26, oitenta e nove velas no valor de € 129,94, oitenta e quatro pé flor no valor de € 358,68, material referente a varões completos no valor de € 70,28, material referente a varões completos no valor de € 78,11, dois espelhos no valor de € 141,53, um espelho sem bisel no valor de € 53,61, duas cómodas com moldura no valor de € 840,00, duas lanternas no valor de € 119,00, dois conjuntos de material referente a varões completos no valor de € 105,52, cinco cabides com cinco pegas no valor de € 150,00, vinte frutos decorativos no valor de € 43,44, um abajour no valor de € 29,37, um abajour no valor de € 13,58, um embalagem de musgo no valor de € 4,95, uma embalagem de musgo no valor de € 5,75, um frasco de cheiro no valor de € 19,36, material referente a valores completos no valor de € 42,64, material referente a varões completos no valor de € 94,56, material referente a varões completos no valor de € 113,63, material referente a valores completos no valor de € 136,30, três mesas de refeição no valor de € 1.140,00, três abajours no valor de € 62,01, dois abajours no valor de € 29,50, dois abajours no valor de € 31,20, dois abajours no valor de € 31,20, dois cabides de parede no valor de € 66,82, dois candeeiros de pé alto no valor de € 108,00, duas cómodas «paralans fita» no valor de € 620,00, dois louceiros no valor de € 1.500,00, duas mesas redondas no valor de € 640,00, quatro cabides com três pegas no valor de € 88,00, quatro carros de chá ovais no valor de € 680,00, quatro cómodas B... XV em mogno no valor de € 1960,00, quatro cómodas curvas em mogno no valor de € 1800,00, quatro conjuntos de mesas rectangulares no valor de € 400,00, sete cabides de chão no valor de € 560,00, oito apliques no valor de € 723,60, oito candeeiros no valor de € 171,29, seis abajours no valor de € 146,26, seis jarrões no valor de € 208,50, oito conjuntos canapé no valor de € 7.944,00, dez ameixas no valor de € 11,10, dois camiseiros curvos no valor de € 460,00, duas cómodas com gavetas em pau santo no valor de € 1060,00, cinco fruteiras no valor de € 27,05, vinte frutos decorativos no valor de € 69,00, material referente a varões completos no valor de € 42,95, cinquenta frutos decorativos no valor de € 113,12, vinte e cinco folhagem de era no valor de € 66,25, cento e vinte e seis caixas, terrinas, faianças e biblots no valor de € 550,62, cento e vinte frutos decorativos no valor de € 309,40 e cento e vinte frutos decorativos no valor de € 266,35 (cfr. relação de bens junta a fls. 157 a 161 cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
3) O valor comercial dos artigos acima elencados atinge, na sua globalidade, os € 73.936,12 (setenta e três mil, novecentos e trinta e seis euros e doze cêntimos).
4) Posteriormente, e na posse dos aludidos objectos, os arguidos levaram alguns para a residência onde habitam, propriedade da progenitora da arguida A..., sita na Rua …., Entroncamento, outros para a Quinta ..., ... e os restantes para lugar não concretamente apurado.
5) No âmbito do inquérito n.º 15/10.0GBGLG foi realizada uma busca a um barracão sito na Quinta ..., tendo sido apreendidas algumas das coisas subtraídas no armazém, posteriormente reconhecidas e entregues à ofendida no dia 11 de Fevereiro de 2010 (cfr. termo de entrega de fls. 27 a 30 cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
6) Em momento ulterior, e no seguimento de uma busca à residência dos arguidos, parte daqueles bens foi recuperada e entregue à ofendida no dia 18 de Março de 2010, designadamente:
- seis cadeiras brancas, dois bancos brancos, uma leiteira, dois bules, um espelho de parede, nove quadros de parede, um tecido de Camila, um tapete de Arraiolos, um tapete tipo rústico, um tecido de mesa, uma mesa de sala, quatro mesas-de-cabeceira, duas carpetes, duas flores de ornamentação, uma figura de santo, um espelho de parede dourado, um pote em madeira, uma cómoda, um tapete chenile, duas molduras, dois braços de velas, dois candeeiros, um boneco de porcelana, um prato, uma caixa decorativa, dois cortinados, um tapete e um móvel (cfr. termo de entrega de fls. 130 e 131 cujo teor se dá por reproduzido).
7) O valor dos objectos recuperados ascende à quantia de € 6.631,47, encontrando-se, por conseguinte em falta, objectos cujo valor comercial total se cifra em € 67.304,65 (sessenta e sete mil, trezentos e quatro euros e sessenta e cinco cêntimos).
8) Actuando do modo descrito, a arguida A...conluiada com o arguido B... tinham o objectivo de se apropriar das coisas em causa, não obstante estarem cientes de que as mesmas não lhes pertenciam, fazendo-as coisas suas, o que, comportando-se de modo apto a tal, lograram alcançar.
9) Agiram de forma deliberada, livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei.
10) Mais se provou que a arguida A...não tem qualquer actividade.
Vive de uma pensão que recebe de França no valor de 800 €.
Vive na casa da sua mãe.
Tem dois filhos, ambos maiores e a viver em economias separadas da mãe.
Da sua pensão retira mensalmente 709 € para pagar dois empréstimos, um de 400 € e outro de 309 €.
Tem o equivalente ao 12.º ano de escolaridade, a que acrescem mais 4 anos de estudo.
É delinquente primária (fls. 253).
11) O arguido B... vai começar a trabalhar como vendedor de viagens de turismo.
Vai receber o equivalente ao SMN acrescido de comissões.
Tem 3 filhos com 21, 19 e 13 anos de idade respectivamente, sendo que os dois mais velhos vivem com a avó materna e o mais novo com a mãe na Alemanha.
Está a completar a sua formação, frequentando o 9.º ano nas “Novas Oportunidades”.
Vive na companhia da arguida A....
O arguido B... já foi condenado no âmbito do pcs n.º 374/08.5PATNV do 1.º Juízo por crime de ofensas à integridade física simples e ameaças agravadas, factos praticados em 25.9.08, em pena de multa (293).
Do processo comum singular n.º 15/10.0GBGLB
1) No dia 2 de Fevereiro de 2010 pelas 03H00, os arguidos B..., A... e C... acordaram, no sentido de se dirigirem à Quinta ..., e de lá retirarem um tractor e objectos de valor que pudessem transportar consigo, após contacto telefónico feito pelo arguido B... ao arguido C....
2) No âmbito daquele telefonema, o C... disse ao B... para o acompanhar, a A... foi ter a casa da mãe de C..., e seguiram todos até à Quinta ....
3) Chegados ao local, o C... rebentou a fechadura do portão de uma garagem ali existente, com o auxílio de um pé de cabra e chamou pelos arguidos B... e A....
4) Seguidamente os três arguidos entraram e retiraram do seu interior os seguintes objectos, no valor total de pelo menos 22 770,00 € pertencentes a H...:
- um tractor agrícola no valor de 18 750 €;
- um pulverizador Rocha no valor pelo menos de 3 750 €;
- uma motoserra Sthil no valor pelo menos de 150 €;
- uma rebarbadora eléctrica Black & Decker no valor pelo menos de 50 €;
- um carregador de baterias, modelo MS660 no valor pelo menos de 70 €.
5) Após abandonaram o local seguindo a arguida A... ao volante do tractor e o C... ao lado desta.
6) À frente do tractor ia B... ao volante do seu veículo com matrícula que se não apurou, com o objectivo de iluminar o caminho e avisar quem seguia atrás, caso avistasse agentes da autoridade.
7) Passaram pelas localidades pelo menos de Olaia e Árgea chegando a um local ermo, perto da Aldeia de Pé de Cão, onde estacionaram o tractor, escondendo-o.
8) No dia 9 de Fevereiro de 2010, por iniciativa do arguido C..., foram restituídos a H..., a rebarbadora, a moto-serra e o aparelho carregador de baterias e o C... guardava no interior de um barracão, anexo à residência da avó do arguido C..., sito na Rua … .
9) O tractor que se encontrava estacionado e escondido junto a um pinhal adjacente à Igreja da Olaia, ..., foi restituído a H..., em virtude de informação fornecida pelo B....
10) Os arguidos A..., B... e C... agiram sempre em conjugação de esforços e na execução de um plano elaborado por todos.
11) Agiram com o propósito concretizado de fazer seus os objectos acima identificados, bem sabendo que os mesmos lhes não pertenciam e que agiam contra a vontade do seu legítimo dono.
12) Ainda assim, todos os arguidos quiseram e agiram da forma acima descrita.
13) Agiram de forma voluntária, livre e consciente, cientes de que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
Mais se provou que o arguido C... não exerce qualquer profissão remunerada.
Vive na companhia de sua mãe.
Frequentou o ensino básico até aos 15 anos.
É delinquente primário.
*
3. E como não provados os seguintes factos:
Do processo comum singular n.º 15/10.0GBGLB:
Que tivesse sido a A... que rebentou a fechadura do portão, mas sim o C...; não se provou a matrícula do veículo onde seguia o B...; não se provou que o C... seguisse na viatura deste, …de cor azul; não se provou que tenham passado nas localidades de ., Meia Via, e Campos da Lamarosa; não se provou que a moto-serra e a rebarbadora, que se encontravam junto do tractor, tenham sido colocadas pelo B... no interior da sua viatura.
*
4. Relativamente à fundamentação da decisão de facto, ficou consignado:
Processo comum colectivo nº 18/10.5GBTNV:
Os factos acima provados tiveram por fundamento os seguintes meios de prova, ponto 1 pelo que disseram as testemunhas G... e a demandante civil D..., entre 31 de Dezembro de 2009 e 12 de Janeiro de 2010 não foram ao armazém, sendo que o furto ocorreu dentro deste período de tempo, pois quando lá foram em 12 de Janeiro o armazém tinha sido objecto de furto; que foram os dois arguidos que lá foram, porque uma boa parte dos objectos furtados apareceram na Quinta ..., e foram para aí transportados pelos arguidos A... e B... numa carrinha do F... e estes objectos deram entrada na Quinta entre finais de Dezembro de 2009 e princípios de Janeiro de 2010, conforme o declarou a testemunha F... que é a pessoa que cuida desta Quinta; a arguida A...disse que tinha comprado estes bens, depoimento nada credível, quer porque contrariado pelas testemunhas G...e D..., quer porque não tinha qualquer documento que comprovasse essa compra e se de facto os tinha comprado não se percebe porque os não retirou do armazém na presença da D..., se eram seus como diz, porque os manteve no armazém da D...e por fim se eram seus porque os retirou do armazém daquele modo; ponto 2 a testemunha G...disse o modo como entraram no armazém partindo o vidro de uma porta nas traseiras do armazém, facto que foi confirmado pela D...; a testemunha G...disse que a arguida A...não tinha chave do armazém, pelo que para retirar do armazém estes bens, faz todo o sentido ter partido o vidro da porta para poder aceder ao armazém; os objectos furtados e o seu valor é o que resulta da relação de fls. 157 a 161 e que foi feita com base no inventário das existências sendo que como se diz na relação de fls. 33 a 48 parte dos bens estavam no armazém e que é o que consta da relação de fls. 157 a 161 e os restantes encontravam-se na Loja do Entroncamento; o valor dos bens é o valor de factura que estava descriminado nas folhas de inventário; auto de apreensão de fls. 30 do apenso e que corresponde aos bens apreendidos na Quinta ... e auto de entrega de fls. 99 que a D...reconhece estes bens como sendo sua propriedade; auto de entrega de fls. 27 do apenso onde a D...reconhece os bens que lhe pertencem; auto de apreensão de fls. 127 do processo principal e que corresponde aos objectos encontrados em casa da mãe da arguida; que os arguidos actuaram em conjunto pelo facto de ambos terem transportado os bens como o declarou o F...; o elemento subjectivo pelo que as regras da experiência permitem concluir dos factos provados, pois os arguidos são suficientemente esclarecidos para saberem que devem respeitar o que é dos outros; a situação pessoal dos arguidos pelas suas declarações; foi ainda elemento de prova o RC de fls. 253 e 293.
Processo comum singular n.º 15/10.0GBGLB:
Os factos acima provados tiveram por fundamento os seguintes meios de prova, ponto 1 pelo que disse o arguido C..., foram os 3 arguidos buscar o tractor à Quinta da . depois de o C... ter sugerido este facto e ter dito aos outros dois arguidos onde o tractor se encontrava, factos a que os arguidos A... e B... aderiram; ponto 2 pelo que disse o arguido C...; ponto 3 o C... confessou ter sido ele que rebentou com a fechadura e que o fez com um pé de cabra; ponto 4, os bens furtados pelo que disse o Eng H..., que aqueles bens estavam na Quinta e desapareceram todos na mesma altura, indicou o valor dos mesmos bens por referência ao seu custo, uso, desgaste e idade; pontos 5, 6 e 7 pelo que disse o C...; ponto 8 pelo que disse o arguido C... e pelo que consta dos autos de entrega de fls. 15 e aditamento de fls. 11; ponto 9 pelo que resulta da conjugação dos depoimentos de I..., disse que o arguido B... lhe ofereceu um tractor para a sucata, disse que o mesmo era proveniente de uma herança e não tinha documentos; pelo que disse o António Silva, recebeu um telefonema do J... informando que lhe tinha sido oferecido um tractor para a sucata e pela descrição que o J... lhe fez teve como assente que se tratava do tractor da Quinta ..., dirigiu-se à sucata do J... e aí encontrou-se com o B..., tendo este dito que pela venda apenas iria receber uma comissão; alertou o Eng. H... que telefonou ao B... que lhe garantiu que o tractor iria aparecer e disse onde poderia ser encontrado, o que veio a acontecer; pontos 10, 11, 12 e 13 pelo que disse o C..., pelo que as regras da experiência permitem concluir dos factos provados e porque os arguidos não são pessoas destituídas que não saibam que estes factos constituem ilícito criminal e pelo RC de fls. 208.
Os não provados, por se ter provado facto contrário (caso do rebentamento da fechadura) ou porque nenhuma testemunha sobre eles se pronunciou e não haver nos autos qualquer outro elemento de prova que permita resposta diferente.
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5. Do mérito do recurso:
5.1. Alterabilidade da matéria de facto:
Os recorrentes impugnam, de forma manifestamente compreensível, os seguintes pontos de facto do acervo factológico provado, sendo sua pretensão que os mesmos sejam erigidos à condição de não provados:
- Do processo n.º 18/10.0GBTNV: 1), 2), 3), 4), 6), 7) e 8);
- Do processo n.º 15/10.0GBGLG: 1), 2), 3), 4), 5), 6), 9) e 10).
Concretizando, estão impugnados todos os factos directamente correlacionados com a comparticipação dos recorrentes na prática dos dois crimes de furto qualificado que lhes estão imputados.
Para avaliar da racionalidade e da não arbitrariedade (ou impressionismo) da convicção sobre os factos há que apreciar, de um lado, a fundamentação da decisão quanto à matéria de facto (os fundamentos da convicção), e de outro, a natureza/conteúdo das provas produzidas e dos meios, modos ou processos intelectuais, utilizados e inferidos das regras da experiência comum para a obtenção de determinada conclusão.
A base impugnatória dos recorrentes ancora-se, quanto ao processo n.º 18/10.0GBTNV, na inexistência de prova cabal e bastante de que os bens elencados no ponto 2) da matéria de facto provada se encontravam no armazém sito na Rua ..., n.º 14, em ., e bem assim que a assistente é deles proprietária.
Neste contexto, invocam os recorrentes que a relação junta a fls. 157/161, determinante do elenco na factualidade provada dos bens em causa, resulta tão só de um acto de vontade da assistente e de sua irmã K..., sem suporte em facturas ou documento de valor contabilístico ou fiscal equivalente que permitam identificar de forma detalhada os objectos e bem assim o respectivo valor, sabendo-se até, segundo acrescentam, ser patente a relação de conflito e animosidade entre a assistente, K... e G..., de um lado, e a arguida A... Paulo, de outro.
Ademais, a arguida A...invocou ter adquirido bens móveis a sua irmã, mãe da assistente e de K..., G..., sendo que os mesmos, depois de adquiridos, foram, em determinado momento, levados do seu apartamento para casa de sua mãe e, posteriormente, para a Quinta ..., local onde se encontravam guardados na altura em que foram apreendidos.
Aliás, como mais alegam os recorrentes, apenas uma parcela pouco significativa dos bens foi apreendida e reconhecida pela assistente, desconhecendo-se o paradeiro dos restantes bens relacionados pela assistente.
Por outro lado, o armazém sito na Rua …, fora, muito pouco tempo antes, vítima de um incêndio, que destruiu grande parte, senão a totalidade, dos objectos aí existentes.
No concerne aos factos impugnados relativos ao proc. n.º 15/10.0GBGLG, a tese argumentativa dos recorrentes cinge-se, em suma, à propalada debilidade probatória das declarações prestadas pelo arguido C..., as quais carecem de espontaneidade, tendo sido até influenciadas, conduzidas e, assim, condicionadas, pelo sentido das perguntas e comentários dos julgadores do Tribunal Colectivo de 1.ª instância.
Como já se deu a saber, o juízo de convicção íntima do tribunal a quo, quanto aos factos ora impugnados, teve essencialmente por base, em relação ao proc. 18/10.0GBTNV, os depoimentos das testemunhas G... e F... e as declarações da demandante civil D..., concatenados com a relação de bens de fls. 157/161, os autos de apreensão e entrega de fls. 27 e 30 do apenso, os autos de apreensão e entrega de fls. 99 e 127 dos presentes autos; no que diz respeito ao proc. 15/10.0GBGLG, o juízo de valoração do tribunal firmou-se nas declarações do arguido C..., coadjuvadas pelos depoimentos das testemunhas H..., I... e J….
Está assim em causa definir se os meios de prova produzidos nos autos, apreciados em conformidade com os critérios legais de produção e apreciação da prova, determinam decisão afirmativa sobre a discutida qualidade dos recorrentes, co-autores materiais, na prática dos imputados factos consubstancidores dos referidos crimes de furto qualificado.
Passando à análise da prova oralmente produzida em audiência de julgamento, auscultadas as declarações da arguida A..., a mesma suporta a sua defesa, em suma, nos seguintes termos:
Todos os móveis com que mobilou o apartamento por si arrendado, sito no Entroncamento, foram comprados, em 2008, a sua irmã G...;
Esta, porém, nunca lhe entregou as facturas-recibos comprovativas da aquisição e pagamento dos móveis adquiridos;
Posteriormente, foi viver para casa de sua mãe, em ., e transportou para esse local todos os bens que recheavam o referido apartamento;
Dada a existência de um conflito latente com sua irmã, originado por questões relacionadas com uma partilha judicial, e por recear que, posteriormente, em razão de vicissitudes decorrentes da partilha, aqueles bens e outros que havia trazido de Paris lhe fossem retirados, decidiu mudá-los para uma quinta, abandonada, designada Quinta ..., situada nas proximidades da casa de sua mãe;
Assim sucedeu. Através do seu companheiro, o arguido B... ., com o qual coabita, em casa de sua mãe, há cerca de dois anos, conheceu F..., pessoa a quem, de facto, a quinta estava entregue, e com este estabeleceu um acordo tendente ao acondicionamento dos seus bens, mediante o pagamento àquele da contrapartida mensal de € 100,00;
O transporte dos bens, de casa de sua mãe para a quinta, foi efectuado, em Janeiro de 2009, tendo sido utilizada, para o efeito, uma camioneta pesada conduzida por F...; na mudança, foi auxiliada pelo arguido B...;
No armazém da Rua …, só existiam coisas velhas e destruídas, sem qualquer préstimo;
Tal armazém ardeu em finais de 2007 ou princípios de 2008.
Chegou a ter consigo, por vontade de sua irmã, as chaves das lojas e do armazém.
Relativamente aos factos provados referentes ao proc. 15/10, deles não tem qualquer conhecimento, por não ter participado nos mesmos.

Por sua vez, foi referido pelo arguido B..., em alargada síntese:
Conheceu a arguida A...em princípios de 2009, com quem agora vive, em união de facto.
Em 2010, ajudou a carregar, numa carrinha de 3.500 Kg., pertencente a F..., objectos (móveis, uma mesa, muitos caixotes - 15/20 ou até mais, malas, um móvel de sala, algumas cadeiras, utensílios de cozinha, etc.) que se encontravam em casa da mãe da arguida.
A arguida invocou que, em virtude da decorrência de uma partilha judicial, tinha de guardar os seus pertences senão, no futuro, ficava sem nada.
Através de si, a arguida conheceu F.... Ajustaram, pela concessão do espaço na Quinta ..., o valor mensal de € 100, que a primeira pagou pelo menos uma vez.
O próprio e a arguida A...descarregaram o conteúdo da aludida carrinha naquela quinta e guardaram-no no interior de um barracão, no qual já existiam, colocados em paletes, outras mobílias, que supôs pertencerem a F....
O arguido C... propôs-lhe a compra de uma moto-serra e de uma rebarbadora e solicitou-lhe a venda de um tractor a terceiros, mediante a contrapartida de € 500. Mostrou-lhe fotografias do tractor. O declarante acedeu porque conhecia muita gente, incluindo sucateiros.
Andou à procura do tractor quase dois dias, com os “Srs. da oficina”, quando tomou conhecimento do furto do referido veículo.
O arguido C... depois disse-lhe, a muito custo, pressionado, onde a viatura se encontrava, no meio de um pinhal. Foi consigo numa carrinha e mostrou-lhe o respectivo local.
Quando foi com o arguido C... ver onde estava o tractor, chegados ao local, o primeiro telefonou às autoridades policiais porque o declarante lhe disse que era melhor falar, senão ia arranjar problemas.
O declarante dirigiu-se a um sucateiro com o intuito de proceder à venda do tractor. Dando a pa. ao arguido: «Ele disse-me: “Olhe que esse tractor é roubado. E depois eu colaborei com ele; fui saber e depois não me quiseram dizer onde estava a viatura. Só no fim acabaram por o referir.
Porque o arguido C... me disse que tinha ido buscar o tractor com F..., fui falar com este, que negou sempre tal facto.
O H… pediu-me para passar um chassis duma camioneta da rua para um barracão, tendo eu conhecimento de que esse chassis tinha sido cortado na quinta com uma moto-serra.
Aquele usava luvas, mesmo para tirar as correntes do portão. Achei isso estranho. Quando lá fui pôr os móveis, andava sempre com luvas. Eu tenho quase a certeza que ele costumava furtar, por coisas que ouvi falar e coisas que lá estavam na quinta. Estavam lá muitos carros».
Sucede, porém, que as declarações dos arguidos A...e B... são objectivamente contrariadas, nos aspectos fundamentais, quando aos factos do proc. n.º 18/10, pelas declarações da assistente/demandante civil D..., conjugadas com os depoimentos das testemunhas G..., K... e H..., e quanto à factualidade imputada no proc. 15/10, pelas declarações do arguido C..., conexionadas com os depoimentos prestados pelas testemunhas … .
Quer a assistente, quer sua mãe e irmã, as testemunhas G... e K..., respectivamente, narraram que nada foi vendido à arguida. Mais disseram:
- O desaparecimento dos bens do armazém sito na Rua …, ocorreu entre os dias 31de Dezembro de 2009 e o dia 12 de Janeiro de 2010.
Todas explicaram suficientemente, de forma convincente e credível, a respectiva razão de ciência. A testemunha G... … só ia ao armazém quando era necessário; no dia 31 de Dezembro de 2009 verificou que nada de anormal tinha ocorrido; no dia12 de Janeiro de 2010 constatou a falta de inúmeros objectos naquele imóvel, sendo que a porta traseira do armazém tinha o vidro partido.
- Parte dos objectos que estavam na Quinta ... e na casa de sua mãe, na qual vivia a arguida A..., os arrolados a fls. 157/161, integravam, em 31 de Dezembro de 2009, o acervo mobiliário existente no armazém;
Saliente-se, a propósito, que, como elucidaram as testemunhas G... e K... , no interior da habitação da mãe da arguida foi apreendido um mostruário de carpetes “Lusotufo”, contendo “as barras todas para que os clientes pudessem ver o efeito que as mesmas produziam”. Nesta vertente, a veracidade das declarações tem corroboração documental, ou seja, são comprovadas pelo fotograma de fls. 96. Daí que se conclua, sem margem para qualquer dúvida, que o mostruário em causa, visto o destino que possui, não poderia ter sido vendido à arguida. Assim se acentua a segura convicção de que nenhum objecto de mobiliário e decoração foi efectivamente vendido à arguida.
- A arguida nunca teve na sua posse as chaves do armazém.
Também neste aspecto, em função das regras da experiência comum - entendidas estas como sendo as que são orientadas no domínio do ensinamento empírico que o simples facto de viver nos concede em relação ao comportamento humano e que se obtém mediante a generalização no sentido de que diversos casos concretos semelhantes tendem a repetir-se -, o depoimento da testemunha G... é dotado de verosimilhança. Efectivamente, como referiram, concordantemente, a arguida e a testemunha, o relacionamento entre ambas deteriorou-se pouco tempo decorrido a partir da vinda da primeira de França, há cerca de 3 anos. Neste contexto, seria de todo irrazoável a disponibilização da referida chave à arguida A....
- O armazém sofreu um incêndio em 12 de Maio de 2010 (testemunha G...).
Também aqui há que optar pela versão da testemunha G..., tendo em atenção a credibilidade dos outras vertentes do seu depoimento, não se atribuindo qualquer credibilidade ao depoimento da arguida quando referiu que esse evento se verificou em finais de 2007 ou princípio de 2008.
Aliás, a posição da arguida, fazendo recuar esse acontecimento a período anterior ao desaparecimento dos bens, sugere fortemente uma mera tentativa de desculpabilização.
Por seu turno, H... prestou depoimento do seguinte teor, nas partes relevantes:
Através do arguido B..., chegou-lhe um pedido da arguida A..., no sentido de esta guardar alguns móveis na Quinta .... Acedeu.
Parte dos objectos foram transportados numa carrinha que estava na posse da testemunha. Foi pôr a viatura junto “à casa deles”; os quais carregaram o que entenderam.
Na Quinta ... viu os arguidos descarregarem uns caixotes mais pesados, mas não móveis.
Posteriormente, por duas ou três vezes, chegaram, na carrinha pertencente ao arguido B..., mais bens.
Ficou com a ideia de que tinham sido transportadas “coisas a mais”, porquanto a casa da mãe da arguida A… não é muito grande. Inclusive, foi levado um colchão. Por tudo isto, questionou-se sobre a origem da globalidade dos bens.
Esses transportes ocorreram ou no final de Dezembro de 2009 ou no princípio de Janeiro de 2010.
A arguida A...só contactou consigo através do arguido B....
Ficou sem receber 100 €, quantia acordada e destinada a ressarci-lo pela ajuda prestada e ao pagamento do gasóleo.
Estes excertos, pondo em causa vários aspectos da versão dos arguidos, acentuam a inteira credibilidade e verosimilhança das declarações da assistente D...e das testemunhas G... e K... .
Afinal, não existiu apenas um transporte. Foram três/quatro. O arguido nunca contactou com a arguida A..., tal como esta relatou. Nenhuma contrapartida foi estipulada pela concessão do espaço onde ficaram arrecadados os inúmeros bens. Os transportes ocorreram em finais de Dezembro de 2009/princípios de 2010 e não, como disse a arguida, em Janeiro de 2009.
Mas a base impugnatória dos arguidos assenta fundamentalmente, segundo referem, na não comprovada existência dos bens que a relação de fls. 33/49 e 157/161 consagram, porque desacompanhadas de facturas ou de outro elemento credível.
Consabidamente, constituem objecto (específico) de prova, em processo penal, todos os factos juridicamente relevantes para a existência ou inexistência do crime, a punibilidade ou não punibilidade do arguido e a determinação da pena ou da medida de segurança aplicáveis (artigo 124.º, n.º 1 do CPP), sendo admissíveis todas as provas que não forem proibidas por lei (artigo 125.º do mesmo diploma legal).
Consagrou o legislador o princípio geral de recolha de provas, no sentido de serem admissíveis todos os meios de prova admitidos em direito (tipificados ou não na lei), com ressalva, tão só, por conseguinte, dos que a lei processual penal tem por proibidos.
Produzida toda a prova em sede de julgamento, o Tribunal Colectivo não teve como indispensável a junção aos autos da base documental referida pelos arguidos.
Também partilhamos essa posição.
A primeira daquelas duas relações especifica, por referência a cada um dos bens, os que estavam na loja e no armazém, pertencentes à assistente, e descreve os números das facturas relativas às aquisições, o nome/firma do fornecedor, a quantidade e o valor.
A par, a assistente/demandante civil e a testemunha K... explicaram sobejamente o método que presidiu à elaboração das relações.
Pela sua racionalidade e concludência, reproduzimos as declarações da segunda, licenciada em gestão:
«Para facilitar e termos as coisas organizadas, tínhamos uma escrita diferenciada. Tínhamos os balanços e os inventários diferenciados por aquilo que tínhamos na loja e por aquilo que tínhamos no armazém. Tentávamos ter as coisas o mais actualizadas possível, de maneira a que, quando havia coisas que eram transportadas da loja para o armazém ou o inverso, termos as existências, num lado e noutro, actualizadas».
Quando ocorreram furtos na loja e no armazém, «fizemos uma contagem, peça a peça, das existências» e, «a partir de uma base já organizada, conseguimos saber o que faltava no armazém e na loja».
*
No que respeita ao imputado crime de furto perpetrado na Quinta ..., como vimos, os arguidos negaram terem participado nele.
Todavia, também neste contexto as suas declarações são infirmadas pelas declarações do arguido C... e pelos depoimentos das testemunhas acima indicadas.
O arguido C..., embora evidenciando um discurso por vezes de difícil compreensão, a que não é alheia a sua inferior capacidade de comunicação (tendo andado até aos 15 anos na escola, não apreendeu a ler e escrever), não deixou, ainda assim, de expressar, sem margem para dúvidas, a comparticipação, do próprio e dos arguidos A...e B... na subtracção do tractor e dos demais objectos descritos na ponto 4), relativo ao proc. n.º 15/10, da matéria de facto provada, na sequência de plano prévio gizado pelos três.
Assim, nos aspectos essenciais, descreveu os factos tal como eles se apresentam nos pontos provados 1), 2), 3), 4), 5), 6) e 7).
E não se diga, como fazem os recorrentes, que os julgadores do Tribunal Colectivo sugestionaram respostas do arguido C..., no sentido das declarações por ele proferidas. Apenas adaptaram o interrogatório à menor capacidade de entendimento que o arguido vinha registando. Inequivocamente, é o que decorre da audição do respectivo registo de gravação.
Contudo, em consonância com a doutrina e a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça Teresa Beleza, O Valor Probatório do Depoimento de Co-Arguido no Processo Penal Português, Revista do Ministério Público, Ano 19.º, Abril/Junho-1998, págs. 39 e ss., Medina Seiça, O Conhecimento Probatório do Co-Arguido, Coimbra Editora, 1999; e o Acórdãos do STJ de 22-06-2006, proc. n.º 06P1426, 12-07-2006, proc. n.º 06P1608, e 15-04-2010, proc. n.º 154/01.9JACBRC1.S1, todos publicados em www.dgsi.pt. , embora as declarações de co-arguido não constituam prova proibida, exigem-se cautelas especiais na sua valoração que, de um modo geral, se reconduzem à exigência de corroboração, o mesmo é dizer, à existência de elementos provenientes de fontes probatórias diversas das declarações que, embora não se reportem directamente ao mesmo facto narrado naquelas, permitem concluir pela sua veracidade.
Como é referido no Ac. do STJ já citado, de 12-07-2006, «as declarações de co-arguido só podem fundamentar a prova de um facto criminalmente relevante quando exista “alguma prova adicional a tornar provável que a história do co-arguido é verdadeira e que é razoavelmente seguro decidir com base nas suas declarações”. Ou, noutros termos, a exigência de corroboração significa que as declarações dos co-arguidos nunca podem, só por si, (...) suportar a prova de um facto criminalmente relevante. Exige-se para tanto que as declarações sejam confirmadas por outro autónomo contributo que “fale” no mesmo sentido, em abono daquele facto».
Deste modo, não existe obstáculo legal à valoração das declarações de co-arguido, apreciadas de acordo com os critérios que devem presidir à livre apreciação da prova, plasmados no artigo 127.º do CPP, desde que garantido o indispensável contraditório e tendo presente que essa valoração deve ter em conta os riscos de menor credibilidade que essas declarações comportam, pelas implicações resultantes da situação de imputação de responsabilidade criminal também a esse co-arguido, circunstância que justifica e exige maior prudência e cuidado na procura de toda a corroboração possível para que a livre apreciação do julgador se fundamente em dados seguros.
Todavia, as declarações do co-arguido C... têm a corroboração periférica de outros elementos de provas, quais sejam os depoimentos das testemunhas …
Narrou a primeira (Cabo da GNR):
Recebeu um telefonema do Sr. …tendo por finalidade um encontro entre dos dois, porquanto alguém tinha pretendido vender a I... um tractor que o segundo suspeitava ser o que fora furtado ao Eng.º.
Quando se encontraram, … pormenorizou que um Sr. alto, transportando-se numa carrinha branca, de marca Volkswagen, tinha ido falar com I..., tendo-lhe proposto a compra, com destino a sucata, de um tractor Jhon Deer, sem matrícula.
Pelas características físicas da pessoa em causa, logrou saber que se tratava do arguido B....
Contactou-o, via telefone, e pressionou-o no sentido de indicar o paradeiro do tractor.
O arguido B... telefonou então ao Eng.º, a quem disse o local onde a viatura se encontrava - dentro de uma silvado, num determinado pinhal.
Disse a segunda:
O dono do tractor tinha-lhe ligado a informá-lo do furto do tractor.
Recebeu um telefonema do Sr. I... (sucateiro), que lhe deu conhecimento da presença de uma pessoa que pretendia vender um tractor, já velho, pertencente a uma “herança indivisa”.
Deslocou-se ao local e apercebeu-se, pela descrição da viatura, que se tratava do tractor do Eng.º. O arguido B... disse-lhe que o tractor fazia parte do acervo patrimonial de uma herança ainda não partilhada. Chegou à conclusão que o bem havia sido furtado, facto este que comunicou ao arguido.
O arguido acabou por telefonar ao dono do tractor, comunicando-lhe onde o mesmo se encontrava.
Por fim, revelou a última:
O arguido B... contactou-o certo dia e perguntou-lhe se queria comprar um tractor.
Perguntou-lhe se a viatura estava em estado de sucata e o arguido respondeu-lhe negativamente. Mais disse que o tractor integrava um património indiviso, do qual era herdeira sua mulher. Chamou, então, o Sr. …, o qual, tendo comparecido no local, advertiu o arguido de que se tratava de objecto furtado.
Posto isto, uma resposta final fica para dar. São estes elementos aptos a provar, sem margem para qualquer dúvida razoável, a participação dos arguidos A...e B... nos actos consubstanciadores dos dois furtos?
O juízo sobre a valoração da prova tem diferentes níveis. Num primeiro aspecto trata-se da credibilidade que merecem ao tribunal os meios de prova. Num segundo nível intervêm as deduções e induções que o julgador realiza a partir dos factos probatórios, sendo que as inferências hão-se basear-se nas regras da lógica, princípios da experiência e conhecimento científicos, tudo se podendo englobar na expressão “regras da experiência”, entendidas estas como sendo orientadas no domínio do ensinamento empírico que o simples facto de viver nos concede em relação ao comportamento humano e que se obtêm mediante a generalização no sentido de que diversos casos concretos semelhantes tendem a repetir-se.
O juízo valorativo do tribunal tanto pode assentar em prova directa do facto como em prova indiciária da qual se infere o facto probando, não estando excluída a decisão do julgado, face à credibilidade que a prova mereça e as circunstâncias do caso, com recurso a prova indiciária, podendo esta por si só conduzir à convicção do julgador.
Assim, relevantes no domínio probatório, para além dos meios de prova directa, são os procedimentos lógicos para prova indirecta, de conhecimento ou dedução de um facto desconhecido a partir de um facto conhecido: as presunções.
O artigo 349.º do Código Civil prescreve que «presunções são as ilações que a lei ou o julgador tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido», sendo admitidas as presunções judiciais nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal (artigo 351.º do mesmo diploma).
É legítimo o recurso às presunções, uma vez que são admissíveis em processo penal as provas que não forem proibidas por lei (artigo 125.º do Código de Processo Penal).
No plano de análise em que nos movemos importam as chamadas presunções naturais ou hominis, que permitem ao juiz retirar de um facto conhecido ilações para adquirir um facto desconhecido.
«Ao procurar formar a sua convicção acerca dos factos relevantes para a decisão, pode o juiz utilizar a experiência da vida, da qual resulta que um facto é a consequência típica de outro; procede então mediante uma presunção ou regra da experiência (ou de uma prova de primeira aparência)» Cfr., v.g., Vaz Serra, Direito Probatório Material, BMJ, n.º 112, pág. 190..
As presunções naturais são simples meios de convicção, pois que se encontram na base de qualquer juízo. O sistema probatório alicerça-se em grande parte no raciocínio indutivo de um facto desconhecido para um facto conhecido; toda a prova indirecta se faz valer através desta espécie de presunções.
As presunções simples ou naturais são, assim, meios lógicos de apreciação das provas, são meios de convicção. Cedem perante a simples dúvida sobre a sua exactidão no caso concreto Cfr. Cavaleiro Ferreira, Curso de Processo Penal, vol. I, pág. 333 e ss..
Como é referido no Ac. do STJ de 07-01-2004 In www.dgsi.pt (proc. n.º 03P3213)., «na passagem do facto conhecido para a aquisição (ou para a prova) do facto desconhecido têm de intervir, pois, juízos de avaliação através de procedimentos lógicos e intelectuais que permitam fundadamente afirmar, segundo as regras da experiência, que determinado facto, não anteriormente conhecido nem directamente provado, é a natural consequência ou resulta com toda a probabilidade próxima da certeza, ou para além de toda a dúvida razoável, de um facto conhecido.
(…).
A ilação decorrente de uma presunção natural não pode, pois, formular-se sem exigências de relativa segurança, especialmente em matéria de prova em processo penal em que é necessária a comprovação da existência dos factos para além de toda a dúvida razoável».
Em suma, nos parâmetros expostos, a apreciação da prova engloba não apenas os factos probandos apresáveis por prova directa, mas também os factos indiciários, factos interlocutórios ou habilitantes, no sentido de factos que, por deduções e induções objectiváveis a partir deles e tendo por base as referidas regras da experiência, conduzem à prova indirecta daqueles outros factos que constituem o tema de prova. Tudo a partir de um processo lógico-racional que envolve, naturalmente, também, elementos subjectivos, inevitáveis no agir e pensar humano, que importa reconhecer, com consistência e maturidade, no sentido de prevenir a arbitrariedade e, ao contrário, permitir que actuem como instrumento de perspicácia e prudência na busca da verdade processualmente possível.
Ora, à luz das regras comuns de vida, os elementos de prova já considerados são, em razão das considerações acima efectuadas, fortemente persuasivos, superando qualquer dúvida razoável, da participação dos arguidos no furto dos objectos existentes no interior do armazém.
Afinal, em rejeito de remate, era a arguida que os possuía ilicitamente, ou seja, sem os haver adquirido, na casa onde habitava, tendo-os transportado para a Quinta ... precisamente na altura em que os mesmos desapareceram do interior do armazém.
Quanto ao arguido B..., as diligências a que procedeu no sentido da venda do tractor também indicam fortemente, sem dúvida objectiva e razoável que reste, a co-autoria material do aludido furto.
No furto deste objecto, as declarações do arguido C..., com a corroboração periférica das declarações das testemunhas cujos depoimentos já foram, em síntese, analisados, assumem foros de total credibilidade e daí que se considere, sem qualquer margem de dúvida, que os arguidos A...e B... comparticiparam na prática dos factos descritos na matéria de facto provada.
Nestes termos e em síntese conclusiva, outro juízo valorativo não restava ao tribunal a quo senão o de dar como provados os factos ora impugnados, sem qualquer razão, pelos recorrentes.
*
5.2. Sobre o invocado vício de erro notório na apreciação da prova:
Preceitua o art. 410.º, n.º 2 do CPP:
«Mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum:
a) A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada;
b) A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão;
«c) Erro notório na apreciação da prova».
Como decorre expressamente da letra da lei, qualquer um dos elencados vícios tem de dimanar da complexidade global da própria decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, sem recurso, portanto, a quaisquer elementos que à dita decisão sejam externos, designadamente declarações ou depoimentos exarados no processo durante o inquérito ou a instrução, ou até mesmo o julgamento, salientando-se também que as regras da experiência comum “não são senão as máximas da experiência que todo o homem de formação média conhece”. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Vol. III, pág. 338/339.
Ou seja: os vícios supra referidos têm de existir «internamente, dentro da própria sentença ou acórdão». Germano Marques da Silva, idem, pág. 340.
Afirma-se no Ac. do STJ de 19/12/1990:
«Como resulta expressis verbis do art. 410.º do CPP, os vícios nele referidos têm que resultar da própria decisão recorrida, na sua globalidade, mas sem recurso a quaisquer elementos que lhe sejam externos, designadamente declarações ou depoimentos exarados no processo durante o inquérito ou a instrução, ou até mesmo no julgamento» Proc. n.º 41327 - 3.ª Secção, acessível in www.dgsi.pt.
O erro notório na apreciação da prova corresponde ao erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores, ou seja, quando dos factos tidos por provados e não provados decorre uma conclusão logicamente inaceitável para o homem de média formação.
No contexto tanto da motivação como das conclusões, os recorrentes, confundindo o invocado vício com o direito de impugnação da matéria de facto, apenas põem em causa o modo como o tribunal de 1.ª instância procedeu à apreciação e valoração da prova que foi produzida em audiência de julgamento, ou, dito de outro modo, os recorrentes não se circunscrevem ao acervo factológico que o tribunal a quo consagrou na decisão da matéria de facto vertida no acórdão; antes partem da valoração que eles próprios estabeleceram da matéria de facto produzida em audiência de julgamento para, com base nessa apreciação de cariz pessoal e subjectivo, argumentar a existência do vício em causa.
De todo o modo, o alegado vício não ocorre manifestamente, porquanto não se vislumbra que o tribunal a quo tenha incorrido no alegado erro de apreciação da prova que em audiência foi produzida.
*
Na conclusão n.º 12, assinalam os recorrentes a existência de contradições insanáveis entre “a apreciação da prova” e a fundamentação da decisão de facto.
Entendemos não estar sequer invocado o vício previsto na al. b) do n.º 2 do artigo 410.º do Código Penal, onde se prevê a contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão, ou seja, os casos em que se dá como provado e não provado determinado facto, quando ao mesmo tempo se afirma ou nega a mesma coisa, quando simultaneamente de dão como assentes factos contraditórios, quando se estabelece confronto insuperável e contraditório entre a fundamentação probatória da matéria de facto ou contradição insanável entre a fundamentação e a decisão, e ainda quando a fundamentação justifica decisão oposta ou não justifica a decisão Cfr. Acórdão do STJ de 11/10/2005, Proc. n.º 898/05-5.ª, relatado pelo Conselheiro Costa Mortágua..
Na síntese proposta por Simas Santos e Leal-Henriques, «há contradição insanável da fundamentação quando, fazendo um raciocínio lógico, for de concluir que a fundamentação leva precisamente a uma decisão contrária àquela que foi tomada ou quando, de harmonia com o mesmo raciocínio, se concluir que a decisão não é esclarecedora, face à colisão entre os fundamentos invocados; há contradição entre os fundamentos e a decisão quando haja oposição entre o que ficou provado e o que é referido como fundamento da decisão tomada; e há contradição entre os factos quando os provados e os não provados se contradigam entre si ou por forma a excluírem-se mutuamente» In Recursos em Processo Penal, Editora Rei dos Livros, 6.ª Ed., pág. 71/72. .
Ora, mais uma vez, os arguidos insurgem-se tão só sobre o modo como o tribunal a quo apreciou e valorou a prova produzida em audiência de discussão e julgamento.
*
5.3. Destituída de fundamento se apresenta também a residual alusão ao princípio processual in dubio pro reo, já que, de todo, não se antolha da fundamentação da decisão de facto - supra transcrita - qualquer estado de dúvida razoável, positiva, racional sobre o comportamento dos recorrentes, impeditiva da convicção dos julgadores nos termos em que se revelou.
*
5.4. Resulta dos fundamentos do recurso, espelhados na motivação e nas conclusões, que a pretensão dos recorrentes, de serem absolvidos dos dois crimes de furto qualificado, que lhe está imputado e pelos quais foram condenados em 1.ª instância, assenta apenas na sugerida, e não aceite, alteração da matéria de facto provada.
Pelo que, mantendo-se os pressupostos de facto que determinaram a condenação dos arguidos, e verificando-se que o acervo factológico dado como provado integra, sem margem para qualquer dúvida, por duas vezes, o referenciado tipo de crime, é chegado o momento de apreciar a questão relacionada com a medida concreta das penas parcelares e única impostas aos recorrentes.
Preceitua o art. 40.º, do Código Penal: «a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade” (n.º 1), sendo que “em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa» (n.º 2).
O art. 71.º do mesmo diploma, estipula, por outro lado: «a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção» (n.º1), atendendo-se a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra ele (n.º 2, do mesmo dispositivo).
Dito de uma outra forma, a função primordial de uma pena, sem embargo dos aspectos decorrentes de uma prevenção especial positiva, consiste na prevenção dos comportamentos danosos incidentes sobre bens jurídicos penalmente protegidos.
O seu limite máximo fixar-se-á, em homenagem à salvaguarda da dignidade humana do condenado, em função da medida da culpa revelada, que assim a delimitará, por maiores que sejam as exigências de carácter preventivo que social e normativamente se imponham.
O seu limite mínimo é dado pelo quantum da pena que em concreto ainda realize eficazmente essa protecção dos bens jurídicos.
Dentro destes dois limites, situar-se-á o espaço possível para resposta às necessidades da reintegração social do agente.
Como refere Claus Roxin, em passagens escritas perfeitamente consonantes com os princípios basilares no nosso direito penal, «a pena não pode ultrapassar na sua duração a medida da culpabilidade mesmo que interesses de tratamento, de segurança ou de intimidação revelem como desenlace uma detenção mais prolongada.
A sensação de justiça, à qual corresponde um grande significado para a estabilização da consciência jurídico-penal, exige que ninguém possa ser castigado mais duramente do que aquilo que merece; e “merecida” é só uma pena de acordo com a culpabilidade.
Certamente a pena não pode ultrapassar a medida da culpabilidade, mas pode não alcançá-la sempre que isso seja permitido pelo fim preventivo. Nele radica uma diferença decisiva frente à teoria da retribuição, que também limita a pena pela medida da culpabilidade, mas que reclama em todo o caso que a dita pena àquela corresponda, com independência de toda a necessidade preventiva.
A pena serve os fins de prevenção especial e geral. Limita-se na sua magnitude pela medida da culpabilidade, mas pode fixar-se abaixo deste limite em tanto quanto o achem necessário as exigências preventivas especiais e a ele não se oponham as exigências mínimas preventivas gerais». Derecho Penal - Parte General, Tomo I, Tradução da 2.ª edição Alemã e notas por Diego-Manuel Luzón Penã, Miguel Díaz Y García Conlledo e Javier de Vicente Remesal, Civitas), págs. 99/101 e 103.
Passemos então à concretização destes enunciados, sendo certo que, para o efeito, o tribunal deverá atender “a todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele” (art. 71, n.º 2, do CP).
O crime de furto constitui hoje um dos factores que provoca acentuada perturbação social, tendo em conta a frequência com que são praticados, pondo assim em evidência a premente necessidade de salvaguarda das finalidades de prevenção positiva ou de integração, como garantia de confiança da comunidade na validade das normas que visam a protecção dos bens jurídicos relativos à previsão e punição desses ilícitos.
No caso, a ilicitude da conduta dos recorrentes é acentuada, tendo essencialmente em conta os valores dos bens subtraídos.
O dolo apresenta-se na qualificação e intensidade que é conatural à prática de furtos que os recorrentes bem sabiam proibidos e punidos com as penas, de acentuada dimensão, previstas na lei.
Os motivos determinantes da conduta dos arguidos estão ligados à obtenção de vantagem patrimonial pecuniária.
Agrava a conduta dos arguidos, no crime de furto relativo ao proc.18/10, a circunstância de os bens terem sido subtraídos a uma sobrinha da arguida A....
A arguida é primária.
Não exerce qualquer actividade.
Vive de uma pensão que recebe de França, no valor de € 800.
Vive na casa de sua mãe.
Da sua pensão retira mensalmente € 709 para pagar dois empréstimos, um de € 400 e o outro de € 309.
Tem o equivalente ao 12.º ano de escolaridade, a que acrescem mais 4 anos de estudo.
Por sua vez, o arguido B... foi condenado, pela prática, em 25-09-2008, de um crime de ofensa à integridade física simples e de um crime de ameaça agravada, em pena de multa.
Vai começar a trabalhar como vendedor de turismo.
Vai receber o equivalente ao SMN, acrescido de comissões.
Tem 3 filhos, com 21, 19 e 13 anos de idade, sendo que os dois mais velhos vivem com a avó materna e o mais novo com a mãe na Alemanha.
Está a completar a sua formação, frequentando o 9.º ano nas “Novas Oportunidades”.
Vive na companhia da arguida A....
Assim, tendo em conta o que está exposto, no encontro das finalidades visadas pela pena, temos como excessiva a que foi imposta aos arguidos relativa ao furto no armazém, afigurando-se mais justa e adequada para cada um deles a pena de 4 anos de prisão.
Afigura-se-nos que se mostra, assim, respeitado o limite máximo correspondente à medida da culpa e que essa pena reflecte a consideração equilibrada das exigências concretas de prevenção geral, ao mesmo tempo que responde adequadamente às exigências de prevenção especial ou de socialização.
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A moldura abstracta da pena do concurso tem como limite máximo a soma das penas de prisão concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos de prisão, e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos crimes em causa (art. 77.º, n.º 2 do CP).
Dentro da moldura encontrada, é determinada a pena do concurso, para a qual a lei estabelece que se considere, em conjunto, os factos e a personalidade do agente (art. 77.º, n.º 1, do CP), sem embargo, obviamente, de ter-se também em conta as exigências gerais da culpa e da prevenção a que manda atender o art. 71.º, n.º 1 do CP, bem como os factores elencados no n.º 2 deste artigo, referidos agora à globalidade dos crimes.
Essencial na formação da pena conjunta é a visão de conjunto, a eventual conexão dos factos entre si e a relação «desse bocado de vida criminosa com a personalidade». A pena conjunta deve formar-se mediante uma valoração completa da pessoa do autor e das diversas penas parcelares.
Será, deste modo, o conjunto dos factos que fornece a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique.
Na avaliação da personalidade - unitária - do agente, reproduzindo as pa.s autorizadas do Prof. Figueiredo Dias Direito Penal Português - Parte Geral II - As Consequências Jurídicas do Crime, ed. Aequitas - Editorial Notícias - 1993, § 421, págs. 291 e 292.), «revelará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma “carreira”) criminosa ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade; só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta».
No fundo, é todo um processo de socialização e de inserção, ou de repúdio, pelas normas de identificação social e de vivência em comunidade que deve ser ponderado.
Seguindo o mesmo autor, de grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização).
Um dos critérios fundamentais reportado à globalidade dos factos assenta na determinação da intensidade da ofensa e dimensão do bem jurídico ofendido, sendo inquestionável que assume um significado profundamente diferente a violação repetida de bens jurídicos de natureza pessoal ligados ao núcleo de bens essenciais em relação à ofensa de outros valores de menor dimensão ético-jurídica Cfr. acórdão do STJ de 11-02-2009, proc. n.º 08P4131, publicado em www.dgsi.pt, que de muito perto vimos seguindo..
Vistos estes postulados, no caso, é acentuada a gravidade do ilícito global, em face do específico circunstancialismo em que os crimes ocorrerem, embora não deixe de se ter em conta a unidade do bem jurídico protegido e violado.
Acresce ainda que, no contexto da personalidade unitária dos arguidos, os elementos conhecidos permitem dizer que a globalidade dos factos ainda não é reconduzível a um desvalor que radica numa personalidade manifestamente desconforme aos valores sociais que o direito penal tutela, essencialmente no domínio da protecção da propriedade e da dignidade da pessoa humana.
Pelo que fica exposto, temos como adequada e justa, para cada um dos arguidos A...e B... ., a pena de 5 (cinco) anos de prisão.
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5.5. A medida da pena única ora fixada impõe que se avalie a possibilidade da suspensão da sua execução.
Dispõe o artigo 50.º, do C. Penal:
«1. O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
2. O tribunal, se o julgar conveniente e adequado à realização das finalidades da punição, subordina a suspensão da execução da pena de prisão, nos termos dos artigos seguintes, ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta, ou determina que a suspensão seja acompanhada de regime de prova.
3. (…).
4. (…).
5. O período de suspensão tem duração igual à da pena de prisão determinada na sentença, mas nunca inferior a um ano, a contar do trânsito em julgado da decisão».
Por sua vez, prescreve o n.º 3 do artigo 53.º do mesmo diploma:
«O regime de prova é ordenado sempre que o condenado não tiver ainda completado, ao tempo do crime, 21 anos de idade ou quando a pena de prisão cuja execução for suspensa tiver sido aplicada em medida superior a três anos».
A apreciação e a decisão sobre a medida de substituição que a suspensão da execução da pena constitui é uma faculdade vinculada, necessariamente dependente do poder-dever da sua aplicação, desde que verificados os pressupostos exigidos na supra citada norma.
Para se optar pela suspensão da execução da pena exige a lei, como pressuposto formal, que ao agente deva ser concretamente aplicada pena de prisão até ao limite de 5 anos.
No que tange ao pressuposto material, o critério legal a seguir é simplesmente este: o tribunal deve preferir a pena de substituição em causa sempre que, verificados os respectivos pressupostos de aplicação, ela se revele adequada e suficiente à realização das finalidades da punição.
O que o mesmo é dizer que a suspensão da execução da pena depende tão somente de considerações de prevenção especial, sobretudo de prevenção especial de socialização, e de prevenção geral sob a forma de satisfação do «sentimento jurídico da comunidade».
«(...) O tribunal deve preferir à pena privativa de liberdade uma pena (...) de substituição sempre que, verificados os respectivos pressupostos de aplicação», a dita pena de substituição «se revele mais adequada e suficiente na realização das finalidades da punição. O que vale logo por dizer que são finalidades exclusivamente preventivas, de prevenção especial e de prevenção geral, não finalidades de compensação da culpa, que justificam (e impõem) a preferência por uma pena (...) de substituição e a sua efectiva aplicação.
Bem se compreende que assim seja: sendo a função exercida pela culpa, em todo o processo de determinação da pena, a de limite inultrapassável do quantum daquela, ela nada tem a ver com a questão da escolha da espécie da pena. Por outras pa.s: a função da culpa exerce-se no momento da determinação quer da medida da pena de prisão (necessária como pressuposto da substituição), quer da medida da pena alternativa ou de substituição; ela é eminentemente estranha, porém, às razões históricas e político-criminais que justificam as penas (...) de substituição, não tendo sido em nome de considerações de culpa, ou por força delas, que tais penas se constituíram e existem no ordenamento jurídico.
(...) Desde que impostas ao aconselhadas à luz de exigências de socialização, a pena de substituição só não será aplicada se a execução da pena de prisão se mostrar indispensável para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias» Jorge de Figueiredo Dias, As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, § 497 e 498, 499 e 500, págs. 331/333..
No tocante à finalidade penal de reintegração do agente na sociedade, não é uma qualquer certeza que está em causa, mas tão só a esperança fundada de que a socialização em liberdade possa ser obtida, devendo o tribunal encontrar-se disposto a correr um certo risco - digamos: fundado e calculado - sobre a manutenção do arguido em liberdade.
Não se vislumbram circunstâncias negativas que ensombrem as exigências de prevenção especial positiva ou de socialização.
Todavia, como já se referiu, a suspensão da execução da pena de prisão não deverá ser decretada se a ela se opuserem finalidades de prevenção geral sob a forma de exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico Figueiredo Dias, idem, § 520..
No caso dos autos, embora não seja fácil, à luz das exigências contidas na prevenção a nível geral, o justo equilíbrio entre a aplicação de uma pena de prisão e o juízo positivo sobre a suficiência da advertência contida na suspensão da execução, afigura-se-nos, ainda assim, que o circunstancialismo envolvente da prática dos crimes - embora de certa gravidade, visto o facto típico em causa –, não apresenta contornos de gravidade acrescida e especial donde se conclua pela insuficiência da pena de substituição no cumprimento das exigências mínimas e irrenunciáveis de defesa do ordenamento jurídico.
Dizendo de outro modo: tendo em conta as especificidades do caso concreto, as elevadas exigências em termos de prevenção geral ainda suportam, sem afectação, a aplicação do instituto da suspensão da execução da pena.
Assim, nos termos dos artigos 50.º e 53.º, ambos do Código Penal, decide-se pela suspensão da pena de prisão pelo período de 5 (cinco) anos, acompanhada de regime de prova, com vigilância e apoio dos Serviços de Reinserção Social.
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5.6. Decorre dos fundamentos dos recursos, como se recolhe das respectivas conclusões das motivações, que a pretensão dos recorrentes de serem absolvidos do pedido de indemnização cível assenta apenas na sugerida, e não aceite, alteração da matéria de facto provada.
Pelo que, sem mais, os recursos soçobram nesta parte.
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5.7. Estatui o artigo 54.º do Código Penal:
«1. O plano de reinserção social contém os objectivos de ressocilazação a atingir pelo condenado, as actividades que este deve desenvolver, o respectivo faseamento e as medidas de apoio e vigilância a adoptar pelos serviços de reinserção social.
2. (…).
3. O tribunal pode impor os deveres e regras de conduta referidos nos artigos 51.º e 52.º (…)».
De acordo com o disposto no artigo e 51.º, n.º 1, alínea a), do CP, o poder-dever de condicionar a suspensão da execução da pena rege-se pelo critério da conveniência e adequação à realização das finalidades da punição, sendo que, no caso de imposição de deveres, a condicionante deve ser reportada às exigências de reparação do mal do crime, e a subordinação pode consistir no pagamento, do todo ou da parte que o tribunal considerar possível, da indemnização devida ao lesado.
«Nos crimes da natureza daquele em que os arguidos foram condenados, assume particular relevância a reparação do dano (ou parte dele) como meio de obtenção da paz social, posta em causa com a conduta ilícita; por outro lado, tal reparação será de exigir como forma de os arguidos se mostrarem merecedores da confiança que o tribunal, como intérprete da comunidade social, depositou neles, ao suspender-lhes a execução da pena, pois sendo o dano reparável, uma das manifestações elementares da vontade dos arguidos em conformar o seu procedimento futuro com os padrões exigidos pelo direito - pressuposto em que assentou o juízo de prognose favorável - será ressarcir até onde lhe for possível o prejuízo causado» Cfr., Ac. do STJ de 21/12/2006, proc. 06P2040, site da dgsi..
Porém, «a decisão de suspensão da execução da pena de prisão, quando sujeita a condições, deveres ou regras de conduta, nos termos permitidos pelo artigo 50.º, n.º 2, do CP, tem de pressupor e conter um razoável equilíbrio entre a natureza das imposições à pessoa condenada, e a eficácia e integridade da medida de substituição, já que a natureza excessiva ou dificilmente praticável do dever imposto determinará, em si, necessariamente, uma posição interior de anomia, rejeição ou desinteresse, contraditaria com as finalidades e a intenção de política criminal subjacentes ao instituto da suspensão da execução» Cfr., Ac. do STJ de 11/02/2004, proc. n.º 4033/03 - 3.ª Secção..
Os deveres condicionadores da suspensão terão de obedecer, assim, a um princípio de razoabilidade (n.º 2 do artigo 51.º, do CP), ou seja, deverão poder ser satisfeitos pelo condenado de acordo com as suas normais possibilidades. Mas que traduzam um sacrifício para o visado, de modo a fazer-lhe sentir a natureza punitiva de um tal dever.
Será na conjugação destes dois vectores - reforço das finalidades da punição e normal possibilidade de cumprimento - que se hão-de definir os deveres condicionadores da suspensão da pena.
O princípio da razoabilidade «tem sido entendido pela jurisprudência como querendo significar que a imposição de deveres condicionadores da suspensão da pena deve ter na devida conta as “forças” dos destinatários (ou seja, as suas condições pessoais e patrimoniais e o nível de rendimentos de que dispõe) de modo a não frustrar à partida o efeito reeducativo e pedagógico que se pretende extrair da medida, sem contudo cair no extremo de tudo se reconduzir e submeter às possibilidades financeiras oferecidas pelos proventos certos e conhecidos do condenado, sob pena de se inviabilizar, na maioria dos casos, o propósito que lhe está subjacente, qual seja o de dar ao arguido margem de manobra suficiente para que possa desenvolver diligências que lhe permitam obter os recursos indispensáveis à satisfação da condenação» Cfr., Ac. do STJ de 19/05/2006, proc. n.º 770/05 - 5.ª Secção..
De acordo com os factos provados, os arguidos detêm, é certo, parcos recursos económicos.
Mas, paralelamente, não podemos olvidar a quantidade dos bens de que os arguidos se apropriaram - furto no armazém -, e não foram recuperados pela respectiva dona, a pressupor, segundo as regras de experiência comum, a existência no presente de bens ou valores na posse dos arguidos.
Perante o exposto, afigura-se-nos razoável condicionar a suspensão da execução da pena ao pagamento pelos arguidos, à assistente/demandante civil da quantia equivalente as valor do pedido cível, julgado inteiramente procedente, ou seja, € 67.304,65, devendo cada um dos arguidos proceder ao pagamento de metade dessa quantia.
Contudo, sob pena de o processo (e com ele, assim desincentivados, os próprios condenados) entrarem em letargia durante um período demasiado alongado (5 anos), justifica-se que se imponha aos arguidos a obrigação de, após trânsito, pagarem, cada um deles, a referida quantia, de forma faseada e dentro daquele período de tempo. Assim, no prazo de 3 (três) anos, cada um dos arguidos procederá ao pagamento de € 16.826,16; quanto à outra metade, deverá ser paga em 24 (vinte e quatro) prestações mensais, contínuas, de igual montante, pagamento a ter início no mês seguinte ao decurso do referido prazo de 3 (três) anos.
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III. Dispositivo:
Posto o que precede, concedendo parcial provimento ao recurso, os Juízes que compõem a 5.ª Secção Criminal deste Tribunal da Relação de Coimbra alteram, em parte, a decisão recorrida, nos seguintes termos:
A) Condenam cada um dos arguidos A... e B..., como co-autores materiais, de dos crimes de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, alíneas a) e e), do Código Penal, nas penas de 4 (quatro) anos - furto no armazém -, e 3 (três) anos - furto na Quinta … -, e na pena única de 5 (cinco) anos de prisão.
B) Declaram suspensas as penas de 5 (cinco) anos de prisão por igual período de tempo, com sujeição dos arguidos A...e B... a regime de prova, assente em plano individual de readaptação a elaborar pelo serviço do Instituto de Reinserção Social (IRS) da área das suas residências, com homologação e sob a orientação do tribunal, em conformidade com o preceituado nos artigos 53.º e 54.º do Código Penal e 494.º do Código de Processo Penal, e subordinação ao pagamento, por cada um dos referidos arguidos, no mesmo prazo de 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão, à assistente/demandante civil D..., da quantia de € 33.652,32 (trinta e três mil seiscentos e cinquenta e dois euros e trinta e dois cêntimos), de forma faseada, nos seguintes termos: no prazo de 3 (três) anos, cada um dos arguidos procederá ao pagamento de metade do valor da dívida (€ 16.826,16); quanto à outra metade, deverá ser paga em 24 (vinte e quatro) prestações mensais, contínuas, de igual montante, pagamento a ter início no mês seguinte ao decurso do referido prazo de 3 (três) anos.
Sem custas, na parte estritamente penal [artigo 513.º, n.º 1, do CPP (redacção do DL 34/2008, de 26-02)].
Na parte cível, custas pelos demandados.
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(Elaborado em computador e revisto pelo relator, o 1.º signatário)
Coimbra, 16 de Novembro de 2011

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(Alberto Mira)

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(Elisa Sales)