Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
4357/191T8LRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ALBERTO RUÇO
Descritores: CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES
BOA FÉ
RESOLUÇÃO DO CONTRATO
INDEMNIZAÇÃO
INTERESSE CONTRATUAL POSITIVO E NEGATIVO
Data do Acordão: 11/09/2022
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE LEIRIA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE POR UNANIMIDADE
Legislação Nacional: ARTIGOS 762.º, 801.º E 808.º, N.º 1, TODOS DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: I -  Tendo a Autora contratado com a Ré o fornecimento de uma linha de produção de tubo corrugado, incluindo a montagem da respetiva maquinaria em ..., a prestação da Ré cumprir-se-ia quando tivesse colocado a linha de produção a produzir tubo corrugado.

II - Estando previsto um prazo entre 10 a 15 dias para realizar a montagem da linha de produção e não tendo a Ré logrado colocar a linha a produzir tubo, tendo os funcionários da Ré regressado a Portugal no dia previamente marcado para a viagem de regresso, com bilhete de avião antecipadamente adquirido, a boa fé demandava que a Ré regressasse mais tarde a ... para completar a prestação.

III - Não tendo a Ré respondido entre 23 de julho e 3 de setembro aos pedidos da Autora para aquela regressar a ... e finalizar a prestação, foi válida a resolução do contrato por parte da Autora, para o dia 15 de setembro, com fundamento em incumprimento do contrato.

IV- A Autora tem direito a ser indemnizada pelos danos sofridos no âmbito do interesse contratual negativo (danos que o contraente não teria tido, caso não tivesse celebrado o contrato) e eventualmente por danos relativos ao interesse contratual positivo – os valores que o credor teria conseguido se o contrato fosse válido e fosse cumprido   –, mas neste último caso, o pedido não procede se for incompatível na prática com os pedidos formulados no âmbito do interesse contratual negativo.

Decisão Texto Integral:
Relator: Alberto Ruço
Adjuntos: Vitor Amaral
Luís Cravo

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra,

(…)


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Recorrente/Recorrida ………………….S...Lda., pessoa colectiva nº. ..., com sede no Parque Industrial ..., 732, em ..., ....

Recorrente/Recorrida……………………V..., Lda., contribuinte nº. ..., com sede na Rua ..., ..., ..., ... ....,


*

I. Relatório

a) O presente recurso vem interposto da sentença que julgou totalmente improcedentes quer a ação quer a reconvenção e absolveu a Ré e a Autora dos respetivos pedidos formulados.

A Autora instaurou a ação para obter do tribunal a declaração de incumprimento de um contrato por parte da Ré, o qual teve como objeto o fornecimento e instalação, em ..., por parte da Ré, de uma linha de extrusão completa para fabrico de tubo corrugado, cujo incumprimento, diz a Autora, lhe causou danos e implicou a resolução do contrato, devendo a Ré, por isso, devolver à Autora a quantia que recebeu a título de preço, no montante de €150.000,00 (ou se assim se não entender, a devolver à Autora €50.000 a título de redução do preço), a que acrescem os juros legais e pagar-lhe uma indemnização pelos danos sofridos com o incumprimento, no valor de €24.272,0752, correspondente às despesas feitas pela Autora e que a mesma não teria suportado e mais €2.000/dia calculados desde 16/08/2019 até trânsito em julgado da sentença, correspondentes aos lucros cessantes, acrescidos dos juros legais.

A Autora diz que após o período de 15 dias previsto para a montagem da máquina, a Ré abandonou as instalações da Autora sem que a mesma conseguisse colocar o equipamento em funcionamento “por não conseguir acertar com a regulação da máquina” o que sucedia “por falta de resistências adequadas, o que provocava uma errada afinação da temperatura na saída das cabeças da extrusora”, “Razão pela qual a matéria-prima introduzida na máquina não era convertida com sucesso em tubo corrugado”.

Além disso a Ré “não entregou à Autora todos os componentes do equipamento em causa”.

Alega ainda que apesar das solicitações da autora “até ao presente, não forneceu à Autora o material/componentes em falta e/ou concluiu a montagem do equipamento em questão por forma a que o mesmo ficasse a funcionar correcta e plenamente”, circunstancialismo que a levou a declarar à Ré a resolução do contrato.

Daí os pedidos formulados.

Por sua vez a Ré defendeu-se alegando o preço acordado foi de 200.000,00 €; que “a escolha do tipo/modalidade de transporte da linha de produção em causa, das instalações da ré para as instalações da autora, bem como o respetivo custo, eram da responsabilidade exclusiva da autora”; que a montagem da linha decorreu nas instalações da Autora sem que a mesma tivesse as condições adequadas à sua montagem; que a linha ficou a funcionar carecendo, unicamente de afinação e que foram os técnicos da Autora que danificaram uma resistência.

Mais alega que “até à presente data a autora ainda não indicou à ré, qual o transporte e data em que o remanescente do equipamento fornecido será enviado para as respetivas instalações”, a que corresponde “uma renda no valor diário de 50,00 €.”

A Ré replicou e na parte que foi admitida disse que «que incumbe à Ré, e não à Autora, a entrega, nas instalações desta, dos materiais/bens em falta».

Seguidamente, o tribunal definiu como temas e prova os seguintes:

«Saber qual o contrato celebrado entre autora e ré.

Saber qual a quantia acordada pela celebração do referido contrato.

Saber se assiste à autora direito à resolução contratual por incumprimento definitivo do referido contrato pela ré.

Apurar os danos causados pela ré à autora por causa do referido incumprimento contratual e apurar se a ré é responsável pelo seu ressarcimento.

Apurar se a autora causou danos à ré pelo não levantamento de parte dos materiais contratados e se a autora deve proceder ao seu levantamento e ao ressarcimento de tais danos.»

Realizado o julgamento foi proferida sentença a qual, como se começou por dize, julgou improcedente a ação, bem como a reconvenção.

b) É desta decisão que vem interposto recurso por parte da Autora e também por banda da Ré, cujas conclusões são as seguintes:

Recurso da Autora

«1) A douta sentença sob recurso julgou totalmente improcedentes a acção e a reconvenção e absolveu a Ré e a Autora dos pedidos contra si formulados.

2) A Recorrente discorda da douta sentença sob recurso na parte em que julgou a acção improcedente, sendo que, em conformidade com a prova produzida, os pontos da matéria de facto dados por provados sob os respectivos números 3., 11., 12., 13., 15., 16. e 28. e 35., e pontos da matéria de facto dados como não provados sob os respectivos números 2.1., 2.3. e 2.4. da sentença foram erradamente julgados, pelo que deve ser reapreciada a matéria de facto quanto a estas concretas questões.

3) No que respeita à questão do preço do contrato (Ponto 3 dos Factos Provados e Ponto 2.1. dos Factos Não Provados) e contrariamente ao que consta na fundamentação da sentença sobre tal questão, é de sublinhar que o corrugador da Posição 2 foi entregue pela Ré à Autora, sendo que, para além dos dois moldes pertencentes à “Posição 2”, estão também em falta a fieira para 75 mm e moldes para corrugador diâmetro 75mm, dois moldes/peças do molde para o corrugador diâmetro 90mm e a fieira e resistência para o diâmetro 200mm – todos pertencentes à chamada “Posição 1”.

4) O documento 4 junto com a p. i. e Contestação consubstancia uma mera proposta e, tal como as duas propostas que antecederam esta, está assinado pela Autora e Ré.

5) O facto de a terceira proposta estar assinada não significa, por isso, que todo o seu teor, designadamente quanto ao preço, tendo sido acordado e/ou aceite pelas partes.

6) Sobre a questão do preço, nenhuma testemunha inquirida (com excepção da testemunha AA, mas que, como se refere na douta sentença sob recurso, não mereceu qualquer credibilidade) soube referir, por não ter conhecimento directo ou pessoal, do efectivo preço final acordado entre Autora e Ré.

7) Da análise crítica dos documentos juntos aos autos (designadamente factura que titula o contrato de empreitada celebrado e comunicações datadas de 30/07/2019 e de 03/09/2019), é possível concluir, com suficiente grau de certeza, que o preço acordado foi de € 150.000,00 e não € 200.000,00.

8) Assim, deve o Ponto 3 dos Factos provados ser alterado, passando o mesmo a ter a seguinte redacção:

3. Após negociação entre as partes, em finais de Novembro/2018 – inícios de Dezembro/2018, foi entre ambas acordado que a Ré forneceria e procederia à montagem, pelo preço global de € 150.000, na fábrica da Autora sita em ..., de uma linha de extrusão completa, para fabrico de tubo corrugado com as medidas 75mm, 90mm, 110mm, 125mm, 160mm, 200mm (posição 1) e corrugador e moldes para 20, 25, (posição 2).

ou, se assim se não entender:

3. Após negociação entre as partes, em finais de Novembro/2018 – inícios de Dezembro/2018, foi entre ambas acordado que a Ré forneceria e procederia à montagem, por preço não concretamente apurado, na fábrica da Autora sita em ..., de uma linha de extrusão completa, para fabrico de tubo corrugado com as medidas 75mm, 90mm, 110mm, 125mm, 160mm, 200mm (posição 1) e corrugador e moldes para 20, 25, (posição 2).

9) No que respeita aos Pontos 11., 12., 13., 15., 16. dos Factos Provados e 2.3.   2.4 dos Factos Não Provados, entendemos que, atenta a prova testemunhal produzida em julgamento, designadamente depoimento das testemunhas BB (o qual foi prestado no dia 21/09/2021 e gravado no sistema Habilus Media Studio, com início às 1:17:54 horas e fim às 15:34:09 horas, e no dia 23/09/2021 e gravado no sistema Habilus Media Studio, com início às 10:15:50 horas e fim às 11:04:35 horas), CC (cujo depoimento foi prestado no dia 23/09/2021 e registada no sistema Habilus Media Studio, com início às 11:20:37 horas e fim às 12:13:31 horas) e DD (cujo depoimento foi prestado no dia 23/09/2021 e registada no sistema Habilus Media Studio,   com início às 12:15:37 horas e fim às 12:13:31 horas), conjugada com a prova documental, foi feita uma errada interpretação de tal prova, estando essa matéria de facto incorrectamente julgada.

10) Não existe qualquer fundamento para ter em menos consideração o depoimento da testemunha BB como sufraga o Tribunal de Primeira Instância, sendo que o facto de ser trabalhador da Autora não pode significar, como entende o Tribunal a quo, que a mesma se limitou a favorecer a sua entidade patronal, pelo que o seu depoimento deve ser relevado para efeitos de prova sem quaisquer limitações.

11) Trata-se de uma testemunha que é engenheiro químico de formação e que, à data dos factos, era o Director Industrial da Autora, tendo acompanhado       sempre a montagem do equipamento e as dificuldades com que os trabalhadores da Ré se debateram e que foi observando, tendo sido a única testemunha inquirida que acompanhou todo o processo, desde a chegada do equipamento nos contentores até ao presente.

12) Relativamente ao Ponto 11. dos Factos Provados, analisando os depoimentos das testemunhas que depuseram sobre esta matéria, e acima transcritos e que são BB, CC e DD, verificamos não ser possível apurar, com suficiente grau de certeza, em que dia concreto foram efectuadas as ligações eléctricas entre todos os equipamento da máquina, pois sobre essa matéria as testemunhas apresentaram versões diferentes entre si.

13) Assim, deve o Ponto 11 dos Factos Provados ser alterado, passando a ter a seguinte redacção:

“11. A linha de produção foi colocada na sua posição definitiva no interior das instalações da autora, e efetuadas as ligações elétricas entre todos os equipamentos da máquina, (circuito elétrico interno do equipamento).”

14) No que respeita às matérias de facto constantes dos Pontos 12. e 13. dos Factos Provados, analisando conjunta e criticamente a prova testemunha produzida em julgamento, designadamente o depoimento das testemunhas BB, CC e DD, consideramos que as mesmas, face à prova produzida e não produzida em julgamento, se encontram também incorrectamente julgadas.

15) Da prova produzida em julgamento (designadamente prova testemunhal), ficou a certeza que, nem a Ré nem ninguém presente aquando da montagem do equipamento nas instalações da Autora, conhecia qual a potência do equipamento que vendeu à Autora.

16) Desconhecendo-se qual a potência concreta de tal equipamento, não podia Tribunal ter dado como provados os factos constantes dos Pontos 12. e 13.

17) Do depoimento das testemunhas referidas em 14) não é possível concluir, com suficiente grau de certeza, que o transporte do quadro eléctrico para as instalações da Autora tenha sido efectuado no dia 24/06/2019.

18) Assim sendo, deve o Ponto 12. Dos Factos Provados ser considerado como Não Provado.

19) E deve o Ponto 13. Dos Factos Provados ser alterado, passando o mesmo a ter a seguinte redacção:

“13. Em virtude de Autora e Ré desconhecerem a real potência do equipamento descrito no Ponto 3. dos Factos Provados, no decurso da montagem do mesmo, a Autora instalou um quadro eléctrico novo nas suas instalações.

A montagem deste quadro eléctrico nas instalações da Autora, pressupunha a existência de um posto de transformação.”

20) Relativamente ao Ponto 15. dos Factos Provados, consideramos que, em virtude de as testemunhas inquiridas sobre esta matéria (BB, CC e DD) terem apresentado versões entre si divergentes quanto à questão dos dias e da quantidade de dias em que o equipamento foi testado, não resulta provado que a execução dos testes de operacionalidade da linha de produção tenha ocorrido (apenas) nos dias 29 e 30 de junho de 2019 e/ou que tais testes tenham ocorrido de forma individualizada em virtude de a energia eléctrica ali disponível não permitir o arranque total da linha de produção.

21) A Ré não logrou provar que a energia eléctrica disponível nas instalações da Autora não permitiu o arranque total da linha de produção e/ou que, no dia 01/07/2019, os técnicos da Ré aguardaram todo o dia para que fosse religada a electricidade (Ponto 16 dos Factos Provados), sendo que, sobre esta questão os depoimentos são divergentes.

22) Assim, deve a matéria de facto constante do Ponto 15. ser alterada, passando a ter a seguinte redacção:

“15. Durante vários dias, os técnicos da Ré procederam a testes de operacionalidade da linha de produção, sem todavia, lograrem colocar a mesma em funcionamento, ou seja, a produzir tubo corrugado.”

23) Mais deve o Ponto 16. ser eliminado dos Factos Provados.

24) Por fim, atenta a prova produzida em julgamento, designadamente da prova testemunhal conjugada com a prova documental, não nos oferece dúvidas que a Autora tenha logrado provar o por si alegado nos artigos 11º, 12º e 13º e 41º (na parte «tendo a Autora adquirido, ela própria, a 11/11/2019 e pelo preço de € 2.035,00, uma das resistências para uma cabeça e respectivos acessórios») da p. i., uma vez que, quer a testemunha BB, quer a testemunha DD declararam que o equipamento fornecido pela Ré apresentou diversos problemas, designadamente ao nível das resistências da cabeça, situação que nunca foi resolvida.

25) Ora, sem que as resistências funcionem adequadamente, não é possível regular a temperatura da cabeça da máquina e, em consequência, não é possível produzir tubo.

26) Sublinhe-se que todas as testemunhas BB, CC e DD referiram que a resistência apresentou problemas de funcionamento, ao que acresce o facto de, nos documentos juntos aos autos com a p. i. como documentos 14, 15, 16, 17  e 21 (correspondência trocada entre Autora e Ré), ser sempre mencionada a questão da reparação/substituição da resistência e/ou da inoperacionalidade da máquina e necessidade de finalização dos trabalhos de montagem, o que acaba por ser corroborado pelo facto de a Autora, a 11/11/2019, ter adquirido, ela própria, pelo preço de €2.035,00, uma das resistências para uma cabeça e respectivos acessórios (Cfr. documento 23 da p. i.).

27) Da prova produzida em julgamento, analisada no seu conjunto, resulta que a única razão pela qual o equipamento fornecido pela Ré à Autora não produziu tubo corrugado se prende com a existência de um defeito em pelo menos uma resistência, a qual se partiu aquando da montagem efectuada pela Ré.

28) E tanto é assim que a Ré, a partir de finais de Julho/2019, não mais respondeu às missivas da Autora ou contactou com esta.

29) Assim sendo, devem os pontos 2.3. e 2.4. ser eliminados dos Factos Não Provados e ser ADITADA aos Factos Provados a seguinte matéria:

“- A Ré não logrou colocar o equipamento descrito no Ponto 3. dos Factos Provados em funcionamento, por não conseguir acertar com a regulação da máquina, o que sucedia em virtude de as resistências do mesmo estarem avariadas, o que provocava uma errada afinação da temperatura na saída das cabeças da extrusora, razão pela qual a matéria-prima introduzida na máquina não era convertida com sucesso em tubo corrugado.

- a Autora, a 11/11/2019, adquiriu, ela própria, pelo preço de € 2.035,00, uma das resistências para uma cabeça e respectivos acessórios”

30) Quanto à matéria de facto constante do Ponto 28. dos Factos Provados, consideramos também que a mesma foi incorrectamente apreciada pelo Tribunal.

31) Para dar tal matéria de facto como provada, teve o Tribunal a quo teve em consideração as declarações de parte do legal representante da Autora e o documento 13 (email de 13/07/2019) junto com a Contestação.

32) Sucede que, ouvidas as declarações de parte do legal representante da Autora (Cfr. Declarações de Parte prestados no dia 21/09/2021 e gravadas no sistema Habilus Media Studio, com início às 11:25:33 horas e fim às 12:28:12 horas), não resulta a matéria de facto do Ponto 28 – muito pelo contrário.

33) Por sua vez, do email de que o Tribunal a quo também se socorre (o documento 13 junto com a Contestação), não decorre comprovada ou sequer indiciada a matéria de facto constante do Ponto 28 dos Factos Provados, tanto mais que se trata de um e-mail datado de 13/07/2019 (muito anterior às comunicações referidas nos Pontos 24. e 26. dos Factos Provados).

34) Quer dos elementos documentais, quer da prova testemunhal, resulta demonstrado que a partir da comunicação referida no Ponto 22. dos Factos Provados, a Ré não mais contactou a Autora e/ou respondeu às comunicações que se lhe seguiram: tal foi referido não só pelo legal representante da Autora, em declarações de parte, mas também pela testemunha BB.

35) O Ponto 28. dos Factos Provados está em contradição com o Ponto 24.

36) Deve o Ponto 28. dos Factos Provados ser alterado, passando o mesmo a ter a seguinte redacção:

“28. A Ré, a partir de 23/07/2019, não mais contactou a Autora, não tendo respondido, verbalmente ou por escrito, às comunicações desta identificadas  nos Pontos 24. e 26. dos Factos Provados.”

37) Por fim, e quanto ao Ponto 35. dos Factos Provados, consideramos que, atenta a efectiva prova produzida em julgamento, tal matéria de facto, cujo ónus da prova era da Ré, não foi provada: dos emails enviados pela Autora à Ré a 22/09/2019 e a 23/09/2019, verificamos que a Autora demonstrou interesse em que a Ré, com a maior urgência possível, se desloque à sede da Autora em ... para que esta coloque o equipamento em funcionamento e o mesmo comece a produzir tubo corrugado.

38) Depois da comunicação do dia 22/07/2019, a Ré não logrou provar ter contactado mais a Autora e/ou por que razão a Ré não obteve o visto, a resistência ou se deslocou a ....

39) Do depoimento da testemunha EE (depoimento prestado no dia 23/09/2021, e gravado no sistema Habilus Media Studio, com início às 14:05:36 horas e fim às 14:22:45 horas), também não decorre minimamente provado que a Ré se disponibilizou junto da Autora para prestar serviços acessórios não compreendidos no contrato celebrado (designadamente serviços de afinação), desde que a autora suportasse o custo da viagem e estadia dos técnicos da Ré: o que resulta do depoimento desta testemunha é somente que a Ré, a determinada altura, contactou a mesma sobre a possibilidade de se deslocar a ..., tendo em vista colocar o equipamento vendido à Autora em funcionamento.

40) Em momento algum, o legal representante da Autora, nas suas declarações de parte, referiu ter-se recusado a que a Ré voltasse às instalações da Autora ou que se recusou a suportar o custo da viagem e estadia dos técnicos da Ré, bem como o custo dos respectivos honorários (Cfr. declarações de parte).

41) Contrariamente ao entendimento da Ré e ao que consta do Ponto 35 Dos Factos Provados, «serviços de afinação» não são serviços acessórios não compreendidos no contrato celebrado, estando antes incluídos nesse contrato (e que é de empreitada).

42) Assim, deve a matéria de facto constante no Ponto 35. dos Factos Provados ser alterada para “NÃO PROVADO”, estando antes PROVADO a matéria de facto alegada pela Autora nos artigos 23º e 25º da p. i. e que é a seguinte:

- “A Ré, até ao presente, não concluiu os trabalhos para que foi contratada e melhor descritos no Ponto 4. dos Factos Provados, por forma a que o respectivo equipamento ficasse a funcionar correcta e plenamente”, devendo tal matéria ser ADITADA aos Factos Provados.

43) Face à prova documental e testemunhal produzida em julgamento, deveria a acção ter sido julgada procedente, tendo a Autora logrado provar os factos constitutivos do seu direito.

44) O Contrato celebrado entre as aqui partes consubstancia um Contrato de Empreitada, através do qual a Ré se obrigou em relação à Autora a realizar certa obra, mediante um preço – Artigos 1207º e ss. do Código Civil.

45) A Ré, no caso em apreço, não cumpriu as obrigações por si assumidas e decorrentes do contrato celebrado com a Autora, porquanto e até ao presente não forneceu à Autora o material/componentes em falta e/ou concluiu a montagem do equipamento em questão por forma a que o mesmo ficasse a funcionar correcta e plenamente

46) Tendo em consideração a matéria de facto alegada pela Autora e os factos provados, não estamos perante uma situação de defeitos da obra propriamente ditos (cumprimento defeituoso), mas de falta de conclusão da obra (incumprimento contratual).

47) Verificado o incumprimento do contrato por parte do devedor, assiste ao credor a faculdade da sua resolução, salvo se se tratar de mera situação de mora (artigos 432º, n.º 1 762º, n.º 1, 804º, n.º 2 e 801º, n.º 1, do Código Civil).

48) Entende o Tribunal a quo que a resolução do contrato de empreitada operado pela Ré através da sua comunicação de 03/09/2019 e com efeitos a partir de 16/09/2019 é ilícita em virtude de, nessa data, a Ré se encontrar apenas em mora.

49) Com o respeito que é devido, e que é muito, discordamos totalmente: conforme resulta da prova produzida em julgamento, quando a Ré deixou as instalações da Autora, a 02/07/2019, o equipamento não estava a funcionar correcta e plenamente (pelo menos era necessário substituir uma resistência e afinar a máquina).

50) A substituição da resistência danificada e a afinação da máquina por forma a que a mesma fique apta a produzir tubo corrugado são da responsabilidade da Ré, pois, conforme dispõe o artigo 1208º do C. C., ao empreiteiro incumbe executar a obra em conformidade com o convencionado, e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela, ou a sua aptidão para o uso ordinário.

51) O processo de afinação da máquina incumbia à Ré, pois sem que tal afinação fosse feita não era possível verificar se a mesma produzia, com sucesso, tubo corrugado e, logo, concluir a obra.

52) A Ré, quando deixa as instalações da Autora a 02/07/2019 (Cfr. Facto Provado nº. 17), por não ter deixado o equipamento a funcionar e sequer completo (com todos os componentes) fica, nesse momento, em mora.

53) Conforme decorre da prova produzida em julgamento (designadamente do depoimento das testemunhas BB, CC e DD) é patente que:

- os técnicos que viajaram para ... e enviados pela Ré não sabiam e/ou tiveram muitas dificuldades em montar a linha de extrusão;

- pelo menos uma das resistências que faz parte integrante de tal linha estava danificada, sendo necessária substituí-la por uma nova, o que a Ré não logrou fazer;

- a Ré não se fez acompanhar das ferramentas necessárias à montagem do equipamento.

54) Ademais, tendo a Ré, por um lado, nos dias 22/04/2019 e 24/04/2019, expedido para ... parte dos componentes da máquina melhor identificada em 3. dos Factos Provados, sem, contudo, e de forma injustificada, enviar os componentes descritos no Ponto 20., e, por outro, deixado as instalações da Autora a 02/07/2019, bem sabendo que tinha de regressar para substituir a resistência danificada, consideramos que aquela dispôs de tempo mais do que suficiente para, até 15/09/2019:

- ter viajado de novo para ... afim de substituir a resistência e/ou

- ter enviado à Autora os componentes em falta.

55) Mesmo que se entenda que a 02/07/2019 a Ré, ao deixar as instalações da Autora sem que o equipamento estivesse completo e/ou a funcionar, não se constitui em mora, certo é que tal sucedeu a 15/08/2019, na sequência da recepção pela Ré da comunicação da Autora referida no ponto 24. Dos Factos Provados.

56) O último prazo concedido pela Autora (15/09/2019) é perfeitamente   razoável, pois nada impedia a Ré de expedir os componentes em falta no prazo de 15 dias e/ou de viajar para ... também no prazo de 15 dias; ao que acresce o facto de a Autora, face à inércia da Ré e ao facto de, decorridos três meses sobre o início do processo de montagem da linha extrusora, não estarem ainda a produzir tubo corrugado, comunicar à Ré ter perdido o interesse que tinha na prestação caso a mesma não fosse realizada até 15/09/2019.

57) Contrariamente ao entendido pelo Tribunal a quo, a Ré não logrou provar que, após 22/07/2019, tenha contactado a Autora e/ou respondido às comunicações escritas por esta enviadas e por aquela recebidas.

58) O silêncio referido em 57) é revelador da intenção da Ré em não cumprir a obrigação contratual de concluir a obra, pelo que cabe ao dono da obra resolver o contrato e exigir uma indemnização – o que a Autora fez (Cfr. nº. 26. dos Factos Provados).

59) No caso em apreço, atento o supra exposto, é nosso entendimento que a Ré, pelo menos aquando do recebimento do email de 03/09/2019, se encontrava já numa situação de mora, a qual se converteu em incumprimento definitivo quando, decorrido o último prazo concedido (até 15/09/2019), a Ré, de novo, nada fez, designadamente diligenciando pela entrega dos equipamentos em falta e/ou pela substituição da resistência danificada.

60) E não tendo a Ré cumprido a obrigação que lhe incumbia, era lícito à Autora resolver o Contrato de Empreitada, exigindo a restituição do preço pago (artigo 432º e ss. do Código Civil); mais sendo a Ré responsável pelo pagamento à Autora de indemnização, a qual deve compreender não só os prejuízos causados, como os benefícios que a Autora deixou de obter em consequência da lesão – Artigos 798º e 564º do Código Civil,

61) Ainda que se considere inexistir fundamento para alterar a matéria de facto provada e não provada nos termos supra alegados, e se entenda, como defende o Tribunal a quo, que o equipamento ficou a funcionar (o que apenas por dever de patrocínio se admite), dir-se-á que sempre deveria a acção ter sido julgada totalmente procedente, tendo o Mmº. Juiz a quo feito uma errónea subsunção dos factos dados como provados ao Direito.

62) Na verdade, é indiscutível e resulta dos Factos Provados (Nº. 20.) que a Ré não entregou à Autora todos os componentes do equipamento em causa.

63) A Ré, ao não expedir, nos dias 22/04/2019 e 24/04/2019, todos os componentes que fazem parte do equipamento em causa, constituiu-se, nesse momento, em mora, pelo que, ao não proceder à entrega dos mesmos até ao dia 15/08/2019 e, depois, até ao dia 15/09/2019, conforme comunicações da Autora referidas nos pontos 24. e 26. dos Factos Provados, incumpriu definitivamente tal contrato de empreitada, tendo a Autora direito a resolver o mesmo, conforme previsto no artigo 432º do Código Civil.

64) Desconhecendo o Julgador o que a Ré respondeu à Autora na sequência das comunicações escritas referidas nos Pontos 23., 24. e 26 dos Factos Provados (Cfr. Ponto 28 dos Factos Provados), do mero conhecimento da existência dessas respostas não poderão retirar-se quaisquer consequências jurídicas, sendo tal matéria de facto inócua à decisão da causa.

65) A resolução operada pela Autora através da sua comunicação referida no Ponto 26. dos Factos Provados e com efeitos a partir do dia 16/09/2019 (quase cinco meses depois após a constituição em mora da Ré), com fundamento também na falta de entrega de alguns dos componentes do corrugador da extrusora é, assim, perfeitamente lícita.

66) O regime da resolução dos contratos está previsto nos artigos 432º e ss. do Código Civil, estipulando o artigo 433º que a resolução se equipara, quanto aos seus efeitos, à nulidade ou anulabilidade do negócio jurídico.

67) Pelo que, e também pelos fundamentos supra expostos, mal andou o Tribunal em julgar improcedente a presente acção, devendo assim tal decisão ser revogada e substituída por outra que julgue a acção totalmente procedente.

68) A douta sentença sob recurso violou, por erro de interpretação e/ou de aplicação, os Artºs. 432º, 762º, 763º, 798º, 799º, 808º, 1208º todos do Código Civil e o artigo 607º do C. P. C..

Termos em que, e no muito que V. Exas. se dignarão suprir, deve a douta sentença sob recurso ser revogada e substituída por outra que, dando provimento ao recurso, julgue a acção totalmente procedente.


*

A Ré contra-alegou e concluiu:

«A. A matéria dada como assente em sede de douta sentença proferida pelo Tribunal a quo não merece qualquer reparo ou censura, face à prova testemunhal e documental produzida.

B. A recorrente discorda dos pontos da matéria de facto dados por provados sob os respetivos números 3., 11., 12., 13., 15., 16. e 28. e 35., e pontos da matéria de facto dados como não provados sob os respetivos números 2.1., 2.3. e 2.4. da douta sentença.

C. Desde logo, resulta da matéria de facto dada como provada no ponto 3 da douta sentença, contrariamente ao alegado pelo autor, que a referida proposta que se reconhece ter sido prestado, foi efetivamente o preço acordado, mais concretamente pelo valor de 200.000,00 €

D. Facto que está documentalmente comprovado, e da prova testemunhal produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, nomeadamente através dos testemunhos do Sr. BB e do Sr. AA.

E. Foi ainda transportado pelos próprios funcionários da ré no dia 24.06.2019, desde as instalações do fornecedor da autora e até às instalações da Autora um quadro elétrico, movendo aqueles todos os esforços possíveis para que se encontrassem reunidas as condições para o arranque do equipamento fornecido.

F. No dia 01.07.2019, os técnicos da Ré aguardaram todo o dia para que fosse religada a eletricidade, o que não sucedeu como comprova o testemunho do Sr. AA em sede de audiência de julgamento.

G. Sendo que, o mesmo se verificou até ao dia 02.07.2019, data em que os colaboradores da Ré tinham viagem de regresso marcada, tal como inicialmente programado e acordado com a autora.

H. A ré respondeu à Autora prontamente com contactos telefónicos, que foram vários no período que mediou ente finais de julho de 2019 e até aos presentes autos, factos corroborados pelo testemunho do Sr. AA e o depoimento do Sr. FF.

I. Acresce que, a Ré disponibilizou-se para prestar serviços acessórios que não estavam compreendidos no contrato celebrado, designadamente serviços de afinação.

J. A linha de produção em causa, após testagem, trabalhou sem quaisquer reservas, limitações, deficiências ou irregularidades, nas instalações da Ré.

K. Face ao que deve a douta sentença recorrida ser mantida no que tange aos pontos da matéria de facto assente e matéria não provada, suscitados no recurso da autora, com as devidas e legais consequências, o que se requer a V/ Exªs e com o que se fará a costumada JUSTIÇA!


*

Recurso da Ré

«A. A prova documental e testemunhal produzida nos autos, impõe que se adicionem à matéria de facto assente, factos que devem ter-se como provados, e que indevidamente foram levados à categoria de factos não provados, ou que sequer foram considerados numa ou outra categoria de factos.

B. Assim, à matéria de facto assente e em função da prova documental e testemunhal produzida nos autos, devem ser adicionados os seguintes factos:

C. Deve adicionar-se o seguinte facto aos factos dados como provados no    ponto 4) – “…e com a indicação de que o transporte e respetivas despesas eram da responsabilidade exclusiva da Autora.” Pois,

D. Face ao conjunto global dos factos dados como assentes, deve concluir-se que a Autora se obrigou para com a Ré e para além do mais, a pagar o preço total de 200.000,00 € pelo fornecimento de uma linha de produção, bem como a definir e custear o transporte no qual a totalidade da referida linha de                               produção seria remetida para as instalações da autora, sitas em ....

E. Assim, deve a Autora ser condenada a recolher das instalações da ré, os referidos materiais, sob pena de não o fazendo ser condenada a pagar á ré uma renda no valor diário de 50,00 € (cinquenta euros), por cada dia que o referido material ali permaneça, desde a data da notificação á mesma do articulado da contestação e até integral cumprimento da referida obrigação.

F. Termos em que devem proceder na íntegra todos os pedidos da Ré, com as devidas e legais consequências, o que se requer e roga a V/ Exªs, com o que se fará a costumada JUSTIÇA!»


*

A Autora contra-alegou concluindo pela improcedência do recurso da Ré, devendo ser mantida a decisão recorrida quanto ao pedido reconvencional.

II. Objeto do recurso.

(I) A primeira questão respeita à impugnação da matéria de facto.

Estão em causa os factos provados n.º 3 e não provado «2.1» (Questão do preço), 11, 12, 13, 15, 16 (inadequação das instalações da Autora ao tipo de máquina a instalar nelas; falta de potência da energia elétrica em relação à potência exigida pelo funcionamento da máquina; novo quadro elétrico; existência de um posto de transformação), 28.º (e contradição com o facto provado 24) e 35.º.

Bem como os factos não provados 2.3. «Que a ré não tenha logrado colocar o equipamento em funcionamento, por não conseguir acertar com a regulação da máquina.» e «2.4. A falta de resistências adequadas provocava uma errada afinação da temperatura na saída das cabeças da extrusora, razão pela qual a matéria-prima introduzida na máquina não era convertida com sucesso em tubo corrugado.»

Pretendendo a Ré que se acrescente aos factos provados no ponto 4), o segmento: «…e com a indicação de que o transporte e respetivas despesas eram da responsabilidade exclusiva da Autora.»

(II) Face à matéria de facto provada:

Verificar se o pedido formulado pela Autora procede, isto é, se ocorreu resolução válida do contrato, motivada por incumprimento do contrato por parte da Ré e apuramento dos prejuízos invocados.

E se procede o pedido reconvencional.

III. Fundamentação

a) Impugnação da matéria de facto

(I) Questão do preço. O tribunal declarou provado que o preço acordado foi de 200 mil euros e não 150 mil euros como pretendido pela Autora.

A Autora pretende que seja declarado provado que o preço foi este de 150 mil euros.

Não assiste razão à Autora, pelos motivos referidos na sentença.

A proposta final está assinada por ambas as partes e consta da mesma a importância de 200 mil euros para dois tipos de equipamentos, ou seja:

«Posição 1», correspondente a uma «Linha completa de extursão de tubo…»; e

«Posição 2» relativa a um «Corrugador e moldes para 20, 25».

Diz-se na proposta contratual: «Valor da posição 1 e da posição 2 é de 200.000,00€…»

Da fatura «...4» consta o valor de 150 mil euros, mas esta fatura só identifica, só respeita, à maquinaria referida na «Posição 2» (contém uma referência a tubos de rega, mas segundo a testemunha AA isso ficou a dever-se a um pedido do Sr. FF, o gerente da Autora, para esta última não ser alvo de impostos em ... e para ser mais célere a receção da maquinaria - minuto 02:43, da 2.ª gravação).

Verifica-se que a dita fatura (montante de 150 mil euros) não contém o material do «Posição 2».

Por conseguinte, a fatura em questão não pode ser considerada como contendo o preço total do contrato, isto é, os 150 mil euros referidos na fatura em questão.

O preço contratual é, por isso, o que se encontra na última proposta contratual, mutuamente aceite e assinada.

É certo que as outras propostas anteriores também foram assinadas por ambas as partes, como argumenta a Autora e é verdade, mas também é certo que foi a proposta de 200 mil euros aquela que se tornou definitiva, a última, pois não há notícia de qualquer outra proposta temporalmente mais recente.

A Autora sublinha que nas cartas que remeteu à Ré, em 30 de julho de 2019 e 3 de setembro de 2019, aludiu ao preço de 150 mil euros para todo o equipamento e que a Ré não desmentiu tal indicação de preço.

Este argumento não invalida o que fica dito.

Com efeito, nessas cartas, além da referência ao preço como sendo de 150 mil euros, são feitas diversas imputações de incumprimento por parte da Ré e esta também nada disse sobre tais incumprimentos, ou seja, a Ré não disse nada, não respondeu.

Esta posição da Ré, de silêncio, num momento em que já existia conflito entre ambas as partes contratantes, não significa, por isso, aceitação do preço.

Improcede, por isso, a pretensão da Autora, mantendo-se o facto 3 como provado e o «2.1» dos não provados como não provado.

Facto Provado 11 - «A linha de produção foi colocada na sua posição definitiva no interior das instalações da autora, e efetuadas as ligações elétricas entre todos os equipamentos da máquina, (circuito elétrico interno do equipamento) em 21.06.2019.»

A Autora só discorda da data «…em 21.06.2019» - Cfr. fls. 18 das alegações e conclusão n.º 13.

Há fundamento para alterar o facto provado 11 quanto à data «…em 21.06.2019», mas sem a suprimir, mas dilatando-a apenas.

A testemunha CC, então funcionário da Ré, referiu que chegou a ... no dia 16 de junho (um domingo); que demoraram uns 3 a 5 dias a retirar o material dos contentores – minuto 03:43 – e que montaram a máquina em 3 ou 4 dias – minutos 11:40, 12:23.

Os restantes depoimentos não diferem substancialmente deste. Ou seja, mais dia, menos dia, demoraram cerca de 8 dias úteis até montarem a linha de produção, o que dá o dia 25 de junho (3.ª feira), sendo este o período mais consentâneo com a situação relatada.

Decide-se, por isso, alterar a data em conformidade com o exposto:

«…e efetuadas as ligações elétricas entre todos os equipamentos da máquina, (circuito elétrico interno do equipamento) o mais tardar até ao dia 25.06.2019.»

Facto provado 12 - «A potência instalada nas instalações da autora era inferior à potência necessária ao funcionamento da linha de produção fornecida, conjuntamente com os equipamentos que já se encontravam colocados nas instalações da autora.»

A Autora pretende que o facto seja declarado não provado.

Mas não tem razão.

Todas as pessoas ouvidas referiram que foi instalado um novo quadro elétrico e um novo transformador para assegurar uma maior potência.

Parece óbvio, sob pena de não se compreender a racionalidade da alteração feita pela Autora, ou seja, que a dita alteração só foi feita porque a capacidade existente não satisfazia as necessidades.

A testemunha BB (funcionário da Autora e com responsabilidade na gestão das instalações) referiu isto claramente – minuto 45:18 da 4.ª gravação – quando disse que a potência instalada não assegurava o funcionamento ao mesmo tempo da nova maquinaria e da maquinaria já existente, mas ao mesmo tempo sublinhou que a capacidade instalada chegava para ensaiar a nova máquina.

Por conseguinte, este facto mantém-se como está.

Facto provado 13 - «O quadro/armário elétrico necessário para o arranque do equipamento fornecido, foi transportado pelos próprios funcionários da ré no dia 24.06.2019, desde as instalações do fornecedor da autora e até às instalações desta.

A montagem deste quadro elétrico nas instalações da autora, pressuponha necessariamente a existência de um posto de transformação.»

A Autora pretende esta redação:

«13. Em virtude de Autora e Ré desconhecerem a real potência do equipamento descrito no Ponto 3. dos Factos Provados, no decurso da montagem do mesmo, a Autora instalou um quadro eléctrico novo nas suas instalações.

A montagem deste quadro eléctrico nas instalações da Autora, pressupunha a existência de um posto de transformação.»

Vejamos.

É certo que o representante legal da Autora (Sr. FF) referiu – minuto 18: 31 – que os funcionários da Ré só o informaram da potência necessária, que era de 400 (?) quando chegaram a ....

Porém, estas declarações de parte não se afiguram credíveis, porquanto não é adequado às regras de experiência que uma empresa contrate com outra a instalação de uma máquina industrial e nenhuma dessas empresas procure saber qual a potência utlizada pela máquina a instalar e não falem entre si dessa potência, desde logo para saberem se as instalações existentes são adequadas a receber a máquina ou carecem de alguma adaptação.

E, de facto, as partes falaram sobre o assunto porque a Autora procedeu, e quanto a isto não há discórdia, à instalação de um novo transformador (PT) e um novo quadro elétrico, material que chegou e foi montado durante os 15 dias de estadia dos funcionários da Ré em ....

Ora, não se afigura viável que neste período de 15 dias a Autora tenha tido conhecimento de que não tinha potência suficiente nas suas instalações para a nova máquina e para as que lá estavam, para trabalharem em simultâneo, se necessário, e que só nesse momento tenha decidido adquirir e procurado só nessa altura um novo PT e um novo quadro elétrico e que tenha conseguido decidir, adquirir e montar esse material nesse curto espaço de tempo.

É muito mais provável a hipótese de já estarem previamente encomendados, como referiu a testemunha AA – minuto 09:07 da 2.ª gravação –, a qual referiu que disse ao senhor FF qual era potência necessária além da potência instalada, tanto que ele comprou, disse, em janeiro/fevereiro, um PT novo e que quando chegaram a ... o transformador estava encomendado.

Aliás, a testemunha BB (funcionário da Autora) referiu que não houve necessidade de um quadro elétrico só para a máquina – minuto 28.17 da 5.ª gravação; que o quadro foi feito para as máquinas que já lá estavam trabalharem ao mesmo tempo com a nova e que – minuto 31:20 5.ª gravação –  o mesmo se passou com o novo PT, necessário para a nova máquina e as outras, acrescentando – minuto 31:50 5.ª gravação – que quando a Ré chegou a ... o PT já lá estava na empresa.

Improcede, por conseguinte, a pretensão da Autora, mas altera-se parcialmente a redação do facto, tendo também em consideração o que mais abaixo será referido a propósito da potência elétrica instalada: «O quadro/armário elétrico necessário para o arranque do equipamento existente e do fornecido chegou às instalações da Autora quando os funcionários da Ré já lá estavam.

A montagem deste quadro elétrico nas instalações da autora, pressuponha necessariamente a existência de um posto de transformação.»

Facto provado 15: «Os técnicos da ora ré, durante os dias 29 e 30 de junho de 2019, procederam a testes de operacionalidade da linha de produção, procedendo ao teste individualizado de cada um dos elementos que compõem a linha de produção, atendendo a que a energia elétrica ali disponível não permitia, o arranque total da linha de produção.

A Autora pretende esta redação:

«15. Durante vários dias, os técnicos da Ré procederam a testes de operacionalidade da linha de produção, sem, todavia, lograrem colocar a mesma em funcionamento, ou seja, produzir tubo corrugado.»

Pretende que se declare provada a matéria de facto por si alegada nos artigos 23º e 25º da p. i., ou seja:

«A Ré, até ao presente, não concluiu os trabalhos para que foi contratada e melhor descritos no Ponto 4. dos Factos Provados, por forma a que o respectivo equipamento ficasse a funcionar correcta e plenamente».

A parte factual é apenas esta «A Ré, até ao presente, não pôs o equipamento a funcionar».

O resto é matéria de direito.

Esta matéria já consta de outros factos provados e vem referida no facto provado n.º 15 que agora está em apreciação, sendo aqui também analisada.

Vejamos então.

Ouvida a prova produzida, a ideia que fica é que nunca existiram condições apropriadas ao nível do fornecimento de energia elétrica para ensaiar a linha completa de extrusão de tubo corrugado, mas não se consegue saber em que consistiram exatamente os problemas.

Por outro lado, forma-se a convicção de que foi possível testar individualmente as máquinas e que não foi possível testar a linha completa em funcionamento (extrusora, corrugadora, furadora, corte e enrolamento).

Com efeito, se fosse possível testar a linha completa não havia razões para proceder ao teste individual.

Mas tudo indica que foi possível colocar a extrusora e corrugadora a funcionarem ao mesmo tempo (sem considerar as máquinas de corte, furação e enrolamento).

Além disso, é de concluir que não esteve presente um técnico especializado em extrusão que soubesse afinar as diversas variáveis que permitem fabricar tubo corrugado sem defeitos.

A testemunha DD (esteve em ... ao serviço da Ré, mas já não era funcionário quando prestou o depoimento) referiu – minuto 29:46/30:00 –, que não conseguiram pôr a máquina a funcionar porque não tinham potência elétrica necessária para o fazer.

E a testemunha CC (esteve em ... ao serviço da Ré, mas já não era funcionário quando prestou o depoimento) referiu o mesmo – minuto 21:59; que tentaram ligar a máquina, mas o quadro elétrico disparava porque não tinha potência; e que – minuto 22:16 – foi necessário mudar para um gerador ou PT com mais potência; que montaram a máquina em 3 ou 4 dias – minutos 11:40, 12:23.

Porém, mais tarde a  testemunha DD referiu – minuto 48:22 – que a máquina não foi testada na totalidade porque «…não havia ali um técnico que percebesse das temperaturas para avançar para as outras máquinas, se eu não estou a tirar uma coisa boa daquela parte da fabricação não possa avançar para a próxima (componente)»; que –  minuto 48:55 –   Era uma questão de afinação da máquina e que – minuto 49:15 – a máquina não fabricou o material não por deficiência dela, porque o material saía, mas por uma questão de afinação; e que – minuto 51:47 – «o material sempre saiu, o nosso problema era regular a saída do material com o andamento dos moldes.»

A mesma testemunha referiu – minuto 22:00/26:00 – que foi instalado um transformador novo e um quadro elétrico novo, mas que nunca chegaram a produzir tubo – minuto 24:10 –, segundo a testemunha por não se encontrar presente alguém que soubesse fazer as afinações necessárias na maquinaria – minuto 25:30.

Afinal, face a estes testemunhos, havia potência elétrica para colocar as máquinas em funcionamento, pelo menos a extrusora e a corrugadora ao mesmo tempo.

Já a testemunha CC disse – minuto 9:00 – que não foi possível colocar a máquina a funcionar porque não havia transformador com potência para a máquina; que – minuto 11:36 – quando chegaram disseram que não tinham potência suficiente; o transformador chegou a meio das duas semanas; que – minuto 12:18 –  tiveram que preparar o chão para colocar o transformador e que  -  minuto 12:35 – o transformador ficou pronto a funcionar 3 a 4 dias antes de virmos embora, mas que – minuto 13:44 – não lhes disponibilizaram potência (referiu-se à rede elétrica moçambicana) até virem embora e que – minuto 14:09 – só conseguiram trabalhar parcialmente com ela; que conseguiram testar algumas coisas.

Conseguiram trabalhar parcialmente, como foi referido pela testemunha DD.

Existe aparente contradição entre estes depoimentos no que respeita à potência elétrica disponível, pois a testemunha DD refere claramente que a máquina não funcionou por não estar presente quem soubesse trabalhar com ela (mas também referiu – minuto 29:46/30:00 –, contraditoriamente, que não conseguiram pôr a máquina a funcionar porque não tinham potência necessária para o fazer).

Já a testemunha BB (funcionário da Autora) sempre referiu que não existiu um problema de potência elétrica, que a potência instalada permitia testar a maquinaria fornecida, se estivesse só ela a funcionar – (minuto 45.18 da 4.ª gravação).

No entanto, cumpre ter em consideração que esta testemunha como funcionário da Autora e envolvida no processo de fiscalização da montagem da máquina não tem a mesma credibilidade das outras duas, devido a este vínculo laboral, que suscita, em regra, desconfiança no sentido de narrar o que é favorável á respetiva entidade patronal.

Como se tratou de um processo dinâmico que durou vários dias, tal contradição entre aqueles depoimentos é sanável se se considerar que não havia potência suficiente para arrancar com a linha de produção completa, mas que as máquinas podiam ser testadas individualmente ao até a extrusora e a corrugadora ao mesmo tempo, mas não toda a linha, e isso foi feito com a potência disponível.

A testemunha CC – funcionário da Ré que esteve em ... a montar a linha – referiu também que o insucesso não dependeu apenas deste fator, mas também porque não conseguiram regular a saída do plástico porque se tinha partido uma resistência (ou uma sonda) – minutos 26:14 a 27:00 – a qual foi reparada, mas mesmo assim não conseguiram produzir tubo «uniforme» – minuto 27:53 –, situação esta que ocorreu no final da estadia e pouco antes de regressarem a Portugal – minuto 28:57.

Este depoimento mostra-se harmonioso com a fotografia de fls. 25, junta com a petição inicial, que mostra a formação de tubo corrugado, mas defeituoso; e com os e-mails de «23 de julho de 2019 09:14» e «23 de julho de 2019 07:47» – fls. 29 verso e 30, respetivamente –, onde se alude à dita «resistência», que estava em falta.

Aí de diz na «Nota» final do e-mail de «23 de julho de 2019 07:47», remetido pela testemunha BB, funcionária da Autora: «Poderíamos lançar a linha com o diâmetro 110», o que dá a entender, em correspondência com o que vem sendo dito, que a máquina funcionava.

Afinal, parece que havia potência elétrica.

Mas, como se disse, a testemunha DD referiu que não colocaram a linha a funcionar em ... porque não dispuseram da potência elétrica necessária até ao dia em que regressaram a Portugal – minuto 29:46.

Vê-se que este conjunto de meios de provas apresenta contradições no que respeita à capacidade da potência elétrica existente.

Por um lado, afirma-se, quando se ligavam as máquinas o quadro desligava, mas, por outro, diz-se que era possível testá-las e não há dúvida que individualmente as máquinas foram testadas.

Nestas condições forma-se a dúvida, por exemplo, sobre se o quadro desligava quando se ligava a linha completa ou apenas quando se ligava parte dela, por exemplo; se isso ocorria ou não ocorria se fossem ligadas ao mesmo tempo a máquina extrusora e a corrugadora; assim como se coloca a dúvida sobre se era viável ensaiar a máquina corrugadora sem estar em funcionamento a extrusora.

E perante a fotografia junta com a petição, que mostra ter funcionado a corrugadora, adensa-se a dúvida sobre se a potência instalada permitia ou não permitia o funcionamento da extrusora e corrugadora ao mesmo tempo.

É certo que foi substituído o quadro elétrico e o PT e isso implicou corte de energia e impossibilidade de fazer ensaios durante esse tempo (como já se disse, sem esta mudança as máquinas existentes e as que iam ser instaladas não podiam funcionar ao mesmo tempo por falta de potência elétrica).

Afigura-se, porém, que a contradição, como se disse, pode ser superada.

Que foi instalado um novo quadro elétrico e colocado um novo transformador, é consensual.

Como se tratou de um processo dinâmico, que durou vários dias, tal contradição entre aqueles depoimentos é sanável, como já se disse, se se considerar que não havia potência suficiente para arrancar com a linha de produção completa, mas que as máquinas podiam ser testadas individualmente e inclusive a extrusora e a corrugadora ao mesmo tempo, mas não toda a linha, e isso foi feito com a potência disponível.

Continuando.

Estes depoimentos destas duas testemunhas, que estiveram ao serviço da Ré, merecem credibilidade, apesar das aparentes contradições, porquanto as pessoas em questão já não estão ligadas por contrato de trabalho à Ré e, por outro lado, resultou de todos os depoimentos que não basta montar as máquinas para que estas fiquem aptas a produzir tubo corrugado, torna-se necessário saber trabalhar com elas.

Isso mesmo foi dito também pela testemunha BB – minutos 46:39/49:23 da 4.ª gravação –, quando se referiu ao conhecimento sobre o tipo de matéria-prima utilizada, sua densidade, velocidade de rotação da extrusora e do corrugador.

Esta testemunha também referiu que a montagem das máquinas não exigia a participação de três pessoas – minuto 43:05 da 4.ª gravação –, como correu neste caso, o que mostra que a tarefa da montagem não era complexa, desde que as pessoas soubessem realizar o trabalho e neste campo apenas esta testemunha referiu que os trabalhadores da Ré não se mostraram competentes – minutos 13:37/14:55 –, porquanto, segundo a testemunha, não sabiam nada de extrusão.

Forma-se, pois, a convicção, nesta parte relativa à potência, no sentido de que as máquinas foram efetivamente montadas e os funcionários da Ré tentaram produzir tubo, o que implica terem ligado a extrusora e a corrugadora com a potência existente, mas a potência instalada não permitia o funcionamento de toda a linha montada.

Por conseguinte o facto 15 fica com esta redação:

«Os técnicos da ora ré, durante os dias 29 e 30 de junho de 2019, procederam a testes de operacionalidade procedendo ao teste individualizado de cada um dos elementos que compõem a linha de produção, atendendo a que a energia elétrica ali disponível não permitia o arranque total da linha de produção, sem todavia, lograrem produzir tubo corrugado»

«Suprimiu-se «linha de produção» no início do texto para não suscitar dúvidas, pois a linha de produção com todas as máquinas a funcionar de facto não foi testada.

Facto provado 16. No dia 01-07-2019, os técnicos da Ré aguardaram todo o dia para que fosse religada a eletricidade, o que não sucedeu.

A Autora pretende que este facto seja declarado não provado.

Não tem razão.

Como se disse, resultou do depoimento da testemunha CC – minuto 9:00 – que não foi possível colocar a linha a funcionar porque não havia transformador com potência para a maquinaria e – minuto 13:44 – não lhes disponibilizaram potência até virem embora.

Este depoimento é credível porquanto permite explicar a razão que levou os funcionários da Autora a insistirem com os funcionários da Ré para não regressarem a Portugal no dia em que tinham o voo de regresso.

Se a Autora pretendeu, como pretendeu de facto, e quanto a isso não há dúvidas, que os funcionários da Ré não regressassem a Portugal nessa data é porque se lhe afigurou viável que com o novo quadro elétrico e transformador em funcionamento a máquina produzisse efetivamente o tubo corrugado.

Mas se já existisse a potência inerente a esta nova instalação elétrica (quadro e transformador), a linha completa teria sido testada e a Autora já teria concluído se era viável ou não era viável a produção do tubo corrugado e se não fosse viável a Autora certamente teria concluído que o problema não era da potência elétrica.

Daí que a insistência pela permanência dos funcionários da Ré se compreenda se essa potência ainda não tivesse sido fornecida pela empresa fornecedora de eletricidade de ....

Mantém-se, por isso, o facto tal como está redigido.

Factos não provados 2.3. «Que a ré não tenha logrado colocar o equipamento em funcionamento, por não conseguir acertar com a regulação da máquina» e 2.4. «A falta de resistências adequadas provocava uma errada afinação da temperatura na saída das cabeças da extrusora, razão pela qual a matéria-prima introduzida na máquina não era convertida com sucesso em tubo corrugado»

Vejamos.

Das declarações da testemunha AA resultou que – minuto 04:37 da 2.ª gravação – que uma linha de fabrico de tubo é composta obrigatoriamente pela máquina extrusora e por uma cabeça corrugadora e a seguir pode ser colocada uma máquina furadora, seguida de uma máquina-serra e um bobinador. Porem, disse, o fabricante não fabrica esta linha completa.

Mais referiu – minuto 13:26, 2.ª gravação – que colocou a extrusora a trabalhar e saiu tubo e só não fizeram tubo, digamos «bem feito», porque não estava presente um técnico de tubo e que, além disso, a feitura perfeita de tubo – minuto 14:06 da 2.ª gravação - tem a ver com a matéria-prima, a velocidade e temperatura, e cada técnico é que sabe o que tem de fazer, consoante o tipo de tubo que quer produzir.

Esta testemunha referiu ainda – minuto 14:28 da 2.ª gravação – que «…basta ver a matéria-prima a sair da boca da extrusora, pela fieira da cabeça, por baixo e por cima, desde que saia em simultâneo está a sair plástico a partir dali tudo está a funcionar…», referindo que a produção do tubo (sem defeitos) depende depois do trabalho do técnico que opera a linha.

Disse ainda – minuto 14:56 da 2.ª gravação – que a máquina permitia afinação, dar mais ou menos velocidade, ajustar o calibrador, etc., mas que – minuto 20:23 da 2.ª gravação –, na S...Lda (a Autora) não havia quem soubesse de extrusão.

Estas declarações sobre o funcionamento da linha de extrusão para tubo corrugado não foram contrariadas por quaisquer outros meios de prova e, por isso, pode dar-se como assente que a linha pode estar corretamente montada e, no entanto, não produzir tubo «bem feito», porque para sair tubo «bem feito» é necessário que a linha seja operada por técnicos que saibam regular os diversos parâmetros de que depende a produção, como tipo de matéria prima, respetiva temperatura de fusão, temperatura apropriada aos diversos componentes da linha, velocidade, calibrar os moldes, etc.

Por conseguinte, da prova produzida ficou a convicção que a máquina podia estar corretamente montada, sem que isso implicasse necessariamente ficar apta a produzir tubo, porque isso já dependia da sua programação por parte dos seus operadores.

Mas, claro está, partindo do princípio que a maquinaria não tinha qualquer defeito que a impedisse de produzir.

Como era necessário estar presente um técnico, e não estava, esta circunstância adensa a dúvida sobre qual a causa determinante do insucesso.

A necessidade do técnico resulta do depoimento da testemunha AA, pois referiu – minuto 33: 09 da 2.ª gravação: «Eu disse ao Sr. FF que em função daquela situação também tínhamos compromissos assumidos e que não estávamos em condições de… e estou à espera das cartas de chamada ,.. mandei ao Sr. BB perguntar … é preciso mandar cartas de chamada para irmos, …disse-lhe qual era a altura … disse-lhe que tinha mandado fazer as resistências e que já tinha um técnico de extrusão…»

Deste conjunto de provas, resulta que a falta de êxito da Ré não se ficou a dever apenas aos problemas da resistência danificada, mas também à conjugação de vários fatores: mudança de quadro elétrico e transformador, corte de corrente elétrica, avaria e reparação da resistência e alguém experiente em fabrico de tubo corrugado.

Mas, note-se, esta convicção não permite retirar a conclusão de que não foi produzido tudo só por estas razões.

É que, não estando reunidas todas as condições para ensaiar a linha, não se poderia saber se a máquina, que já não era nova, estava apta ou não estava a produzir tudo.

Isto é, podia ter defeitos que inviabilizassem a produção, o que só poderia saber-se ensaiando-a na presença de um técnico.

Mas não se pode excluir a hipótese da maquinaria não ter produzido tubo «bem feito» devido a defeitos que tinha.

Por conseguinte, se a maquinaria tinha ou não tinha defeitos, não se sabe, mas também é certo que sem estarem reunidas todas as condições para ensaiar a maquinaria não se pode dar por adquirido que a máquina era apta a produzir tubo.

Continuando.

Cumpre concluir que a linha completa não chegou a ser ensaiada, pelo que os factos não provados «2.3» e 2.4» continuarão como não provados.

Mas procede em parte a pretensão da Autora, acrescentando-se a seguinte matéria factual com o n.º «17-A»:

«A Ré não logrou colocar em funcionamento o equipamento descrito no ponto 3. dos factos provados, de modo a produzir tubo corrugado sem defeitos.

E como facto «17-B» o seguinte:

«Durante o período temporal em que a Ré procedeu à montagem das máquinas procedeu-se à mudança do quadro elétrico e do transformador e ao corte de corrente elétrica; ocorreu também uma avaria e reparação de uma resistência; não se encontrava presente alguém com experiência no fabrico de tubo corrugado».

Facto provado 28 - «Sendo que a qualquer uma das referidas comunicações escritas a ré respondeu com contactos telefónicos, que foram vários no período que mediou ente finais de julho de 2019 e a presente data.

A Ré pretende que este facto seja alterado, passando o mesmo a ter a seguinte redação:

«A Ré, a partir de 23/07/2019, não mais contactou a Autora, não tendo respondido, verbalmente ou por escrito, às comunicações desta identificadas nos Pontos 24. e 26. dos Factos Provados.”

Tem razão, em parte.

Face à prova produzida pode concluir-se que a Ré não contatou a Autora por escrito, salvo o que consta do facto provado 22, pois se tivessem existido contatos deste tipo estariam documentados nos autos e não estão.

Se não houve contatos por escrito, poderá supor-se que esse comportamento se estendeu também aos contatos verbais, mas não é certo que tal tenha ocorrido.

Se existiram contatos telefónicos alguns promovidos pela Ré, não se pode afirmar, porque a prova produzida não permite tal conclusão.

Por conseguinte, o que é certo é o seguinte:

«A Ré não respondeu por escrito às comunicações desta identificadas nos Pontos 24. e 26. dos Factos Provados, ignorando-se se o fez verbalmente.»

O facto provado 28 ficara com esta redação.

Facto provado 35 - «A ré disponibilizou-se para prestar serviços acessórios não compreendidos no contrato celebrado (designadamente serviços de afinação), desde que a autora suportasse o custo da viagem e estadia dos técnicos da ré, bem como o custo dos respetivos honorários, sendo que a autora sempre se recusou a tal.

A Ré pretende que este facto seja eliminado.

Tem razão.

A questão dos «… serviços acessórios não compreendidos no contrato celebrado (designadamente serviços de afinação) …»  é matéria jurídica.

Será eliminado.

Contradição entre os factos provados 24 e 28

A Autora afirma que o ponto 28. dos factos provados está em contradição com o ponto 24.

Não há contradição.

O ponto 28 deve entender-se em conjugação com o ponto 24 de modo a considerar que o 28 alude a outros contatos, mas sem se referir à comunicação identificada no ponto 24.

Aditamento ao facto provado 4 - A Ré pretende que se declare provado e se adicione ao ponto provado 4, o seguinte: «…e com a indicação de que o transporte e respetivas despesas eram da responsabilidade exclusiva da Autora.»

Afigura-se que esta matéria é consensual entre as partes e já consta do facto provado n.º 4, mas a adição proposta clarifica a situação, pelo que se procede a esse acrescento.

Facto novo: «A Autora, a 11/11/2019, adquiriu, ela própria, pelo preço de €2.035,00, uma das resistências para uma cabeça e respectivos acessórios.»

Procede. Com efeito, as testemunhas inquiridas referiram-se a problemas com uma resistência e a sua reparação precária, pelo que a aquisição de uma resistência nova era algo necessário, não existindo razões para duvidar da respetiva aquisição à empresa L... Lda.

Esta matéria será acrescentada sob o n.º 36.

b) 1. Matéria de facto – Factos provados

1- A Autora é uma sociedade comercial, constituída e com sede em ..., com o capital social de 21.600.000,00 meticais moçambicanos (em Euros 306.301,24€) e cujo objeto social consiste no fabrico de tubos e acessórios plásticos.

2. Por sua vez, a Ré é uma sociedade comercial por quotas, que se dedica, entre outros, ao fabrico e montagem de máquinas industriais.

3. Após negociação entre as partes, em finais de Novembro/2018 – inícios de Dezembro/2018, foi entre ambas acordado que a Ré forneceria e procederia à montagem, pelo preço global de €200.000, na fábrica da Autora sita em ..., de uma linha de extrusão completa, para fabrico de tubo corrugado com as medidas 75mm, 90mm, 110mm, 125mm, 160mm, 200mm (posição 1) e corrugador e moldes para 20, 25, (posição 2).

4. Entre autora e ré foi acordado que:

a ré se obrigou a fornecer à autora os seguintes equipamentos (Posição 1):

a) 1 Extrusora Plastic Diâmetro 90 - ano 2006;

b) 1 Extrusora Plastic Diâmetro 60 - ano 2006;

c) 1 Cabeça de união de extrusoras;

d) 1 Corrugador refrigerado a água;

e) Moldes para tubo corrugado de dupla parede nas dimensões;

f) 1 Conjunto Diâmetro 75;

g) 1 Conjunto Diâmetro 90;

h) 1 Conjunto Diâmetro 110;

i) 1 Conjunto Diâmetro 125;

j) 1 Conjunto Diâmetro 160;

k) 1 Conjunto Diâmetro 200;

l) Máquina para transformar o tubo corrugado em corrugado de drenagem;

m) Serra planetária;

n) Enrolador;

e ((posição 2)

Corrugador

Moldes para corrugador diâmetro 25

Moldes para corrugador diâmetro

Mais acordaram que:

A linha em questão era usada e seria retrofitada nas instalações da ré, com equipamentos tecnologicamente mais avançados tais como variadores de frequência, motores de corrente alterna e equipamentos de controlo.

Os preços não incluem estadia, alimentação e transporte durante o período de montagem em ....

Os preços mencionados não incluem viagens entre Portugal e ... para três técnicos da V..., Lda.

O prazo de execução dos trabalhos é de cinco meses após adjudicação.

Arranque da linha em Portugal na presença de um técnico de ....

O transporte e respetivas despesas eram da responsabilidade exclusiva da Autora.

5. O envio da linha de produção em causa, foi efetuado através de transporte marítimo, fracionado em dois contentores marítimos de “40 pés”, sendo que tal envio ocorreu em dois momentos distintos, a saber:

O 1.º contentor foi enviado no dia 22-4-2019; e

O 2.º contentor foi enviado em 24-4-2019.

6. A linha de produção em causa, que saiu das instalações da ré, nas datas de 22.04.2019 e 24.04.2019, chegou às instalações da autora cerca de um mês e meio após as referidas datas.

7. A documentação necessária ao embarque dos técnicos da ré, das instalações desta para as instalações da autora, chegou à posse da ré nas seguintes datas:

- a carta de chamada destinada à emissão dos respetivos vistos foi enviada pela autora à ré na data de 10-05-2019, e

- os bilhetes de avião a 03-06-2019, com data de embarque a 16-06-2019 e regresso a 02-07-2019.

8. Os técnicos da ré chegaram às instalações da autora na data de 17-06-2019, sendo que apenas nesta data se iniciou a retirada dos equipamentos dos contentores em que foram expedidos, sendo que tal retirada ficou totalmente concluída no dia 20.06.2019.

9. O equipamento adquirido pela Autora à Ré começou a ser por esta montado nas instalações da Autora, em ... - ....

10. Sendo que tais equipamentos (linha de produção fornecida) foram colocados nas suas posições finais, cerca de dois dias depois.

11. A linha de produção foi colocada na sua posição definitiva no interior das instalações da autora, e efetuadas as ligações elétricas entre todos os equipamentos da máquina, (circuito elétrico interno do equipamento) o mais tardar até ao dia 25.06.2019.

12. A potência instalada nas instalações da autora era inferior à potência necessária ao funcionamento da linha de produção fornecida conjuntamente com os equipamentos que já se encontravam colocados nas instalações da autora.

13. O quadro/armário elétrico necessário para o arranque do equipamento existente e do fornecido chegou às instalações da Autora quando os funcionários da Ré já lá estavam.

A montagem deste quadro elétrico nas instalações da autora, pressuponha necessariamente a existência de um posto de transformação.

14. A autora adquiriu um posto de transformação, tendo os funcionários da ré auxiliado na sua colocação, tendo para o efeito que ser efetuado um buraco na parede das instalações da autora, a fim de conseguir criar uma passagem para que o posto de transformação pudesse ser transportado até ao local onde iria ser instalado.

15. Os técnicos da ora ré, durante os dias 29 e 30 de junho de 2019, procederam a testes de operacionalidade procedendo ao teste individualizado de cada um dos elementos que compõem a linha de produção, atendendo a que a energia elétrica ali disponível não permitia o arranque total da linha de produção.

16. No dia 01-07-2019, os técnicos da Ré aguardaram todo o dia para que fosse religada a eletricidade, o que não sucedeu.

17. No dia 02.07.2019 os técnicos da ré tal como inicialmente programado regressaram a Portugal.

17-A. A Ré não logrou colocar em funcionamento o equipamento descrito no ponto 3. dos factos provados de modo a produzir tubo corrugado sem defeitos.

17-B. Durante o período temporal em que a Ré procedeu à montagem das máquinas procedeu-se à mudança do quadro elétrico e do transformador e ao corte de corrente elétrica; ocorreu também uma avaria e reparação de uma resistência e não se encontrava presente alguém com experiência no fabrico de tubo corrugado.

18. Aquando do início dos trabalhos de montagem, já a Autora havia pago, junto da Ré, €150.000 e a Ré esteve cerca de 15 dias nas instalações da Autora a efetuar a montagem do equipamento.

19. A Ré não mais voltou às instalações da Autora.

20. A Ré não entregou à Autora os seguintes componentes do equipamento em causa:

- fieira para 75mm e moldes para corrugador diâmetro 75mm;

- moldes para corrugador diâmetro 20mm e 25mm;

- 2 moldes/peças do molde para o corrugador diâmetro 90mm (ao invés das 72 contratadas, apenas foram enviadas 70);

- fieira e resistência para o diâmetro 200mm.

21. Por e-mail remetido pela Autora à Ré a 22 de julho de 2019, aquela solicitou a esta que informasse quando regressaria a ..., à fábrica da Autora, tanto mais que começava «já a ter uma data de encomendas pendentes e sem previsão de fornecimento, uma vez que estamos parados e sem produzir.»

22. Tendo a Ré, no mesmo dia, respondido que se encontrava a aguardar pelos vistos a emitir pelo Consulado, assim como pelas resistências para as cabeças da extrusora.

23. Por e-mail datado de 23/07/2019, a Autora informou ainda a Ré que:

“1. A proposta enviada pela V..., Lda, apresenta uma lista de equipamentos da qual consta uma fieira para 75 e moldes para corrugador diâmetro 75, porém não encontramos nem a fieira, nem os moldes nem o calibrador para diâmetro 75.

2. Ainda da mesma proposta consta que a V..., Lda forneceria moldes para corrugador diâmetro 20 e 25 mas, também, não recebemos tais moldes.

3. Os moldes para corrugador diâmetro 90 estão incompletos. Uma vez que deveriam ser um total de 72 moldes, pois na caixa só tem 70 moldes, faltando, neste caso, um par de moldes, ou seja, 2 moldes.

4. A cabeça para fabricar os diâmetros 160 e 200 (a que está guardada de lado), já vem montada com a resistência e fieira para diâmetro 160 (salvo o erro). Assim sendo, perguntamos se a mesma resistência e fieira servirão para fabricar os tubos com diâmetro 200. Caso não, estará e falta a fieira e a resistência para o diâmetro 200.

Por enquanto é tudo que constatamos uma vez que ainda não foram testados outros equipamentos nomeadamente Máquina de Perfuração de Tubos, Serra Planetária, Enrolador.

Aguardamos seu parecer e resposta o mais breve possível.

NOTA: Para o Sr. AA não ficar muito tempo à espera da resistência, poderia embarcar sem ela, visto que, através do Portador Diário, poderemos recebe-la na mesma, Poderíamos lançar a linha com o diâmetro 110.”

24. A Ré não respondeu a esta missiva, razão pela qual a Autora, por carta registada com A. R., enviada à Ré a 30/07/2019, comunicou-lhe o seguinte:

“Exmos. Senhores, Como é do v/ conhecimento, em finais de Novembro/2018 – inícios de Dezembro/2018, foi acordada com a v/ empresa a aquisição, fornecimento e montagem de uma linha de extrusão completa usada para fabrico de tubo corrugado 75, 90, 110, 125, 160, 200 e corrugador e moldes para 20, 25, pelo preço global de € 150.000,00.

Entre as partes foi acordado que a montagem de tal equipamento seria feito pela v/empresa e no prazo máximo de 5 meses.

A n/ empresa procedeu ao pagamento integral do preço, antes mesmo de o equipamento em causa se encontrar montado.

Sucede que, apenas no dia 17/06/2019, ou seja, já depois de decorridos os 5 meses acordados, o referido equipamento começou a ser montado nas n/ instalações em ... por parte de V. Exas..

Todavia, decorridos 15 dias de montagem, os v/ funcionários CC, AA e DD, que haviam sido enviados pela v/ empresa para efectuar tal montagem, alegando terem de fazer outra obra, abandonaram os trabalhos de montagem, mesmo perante a hipótese de se prolongar o visto desses trabalhadores – o que não foi aceite pela v/ empresa.

Desde então e até ao presente, o equipamento em questão continua inoperacional, não obstante as n/insistências para que V. Exas. prossigam/retomem com o trabalho de montagem.

Acresce que, e conforme já informámos por e-mail de 23/07/2019, verificamos ainda encontrarem-se em falta determinadas peças, componentes do equipamento adquirido a V. Exas., a saber:

- fieira para 75 e moldes para corrugador diâmetro 75;

- moldes para corrugador diâmetro 20 e 25;

- 2 moldes/peças do molde para o corrugador diâmetro 90 (ao invés das 72 contratadas, apenas foram enviadas 70);

- fieira e resistência para o diâmetro 200.

A falta das peças acima descritas, bem como o facto de a máquina não estar operacional, causou e causa à n/ empresa graves e enormes prejuízos, porquanto a mesma se encontra impedida de fabricar tubo corrugado, sendo certo que já havia assumido compromissos, designadamente contratação de funcionários com o respectivo pagamento de salário, celebração de contratos de fornecimento do dito tubo junto de terceiros, aluguer de espaço interior e exterior em feira de exposição Facim em ... para exposição do produto tubo corrugado, sempre tendo em consideração que, no início do mês Julho/2019, o equipamento adquirido a V. Exas. estaria, com toda a certeza, a funcionar e a produzir tubo corrugado – o que não sucedeu.

Assim, vimos, pelo presente, solicitar a V. Exas. que, no prazo máximo de 15 dias:

- forneçam o material em falta;

- concluam a montagem do equipamento em causa, ficando o mesmo plenamente a funcionar.

Mais informamos que, atento o v/ atraso e incumprimento do contrato, a n/ empresa já não se responsabilizará pelo pagamento das despesas decorrentes do envio desse material, nem do custo das deslocações dos v/ funcionários.

Decorridos 15 dias sem que as questões acima descritas se encontrem definitivamente solucionadas, passaremos a cobrar a V. Exas. uma indemnização pelos prejuízos causados pela v/ supra descrita conduta, no valor de € 2.000/dia e iremos agir judicialmente contra V. Exas..”

25. A Ré rececionou tal missiva a 31/07/2019.

26. Por e-mail enviado à Ré a 03/09/2019, a Autora comunicou a esta o seguinte:

“Exmos. Senhores,

Não obstante a n/ carta de 30/07/2019 e por V. Exas. recepcionada a 31/07/2019, certo é que, até ao presente, V. Exas. não se deslocaram à n/ fábrica para concluir a montagem e colocação em funcionamento da linha de extrusão adquirida a V. Exas., nem, tão – pouco, indicaram uma data em que tal sucederá.

Por outro lado, V. Exas. também ainda não nos entregaram as peças do referido equipamento melhor identificadas na nossa missiva de 30/07/2019 e que são:

- fieira para 75 e moldes para corrugador diâmetro 75;

- moldes para corrugador diâmetro 20 e 25;

- 2 moldes/peças do molde para o corrugador diâmetro 90 (ao invés das 72 contratadas, apenas foram enviadas 70);

- fieira e resistência para o diâmetro 200.

A situação é insustentável, tanto mais que foi por parte de V. Exas. assegurado que, em finais de Maio, princípios de Agosto de 2019, o equipamento em causa estaria totalmente montado e a funcionar plenamente.

A v/ conduta causou e causa à n/ empresa graves e enormes prejuízos, porquanto nos encontramos impedidos de fabricar tubo corrugado, sendo certo que já assumimos compromissos, designadamente contratação de funcionários com o respectivo pagamento de salário, celebração de contratos de fornecimento do dito tubo junto de terceiros, aluguer de espaço interior e exterior em feira de exposição Facim em ... para exposição do produto tubo corrugado, sempre tendo em consideração que, no início do mês Julho/2019, o Processo: 4357/19.... equipamento adquirido a V. Exas. estaria, com toda a certeza, a funcionar e a produzir tubo corrugado – o que não sucedeu.

Pelo exposto somos a informar V. Exas. que, acaso até ao próximo dia 15 de Setembro de 2019, V. Exas.:

- não concluam a montagem do equipamento em questão por forma a que o mesmo fique a funcionar correcta e plenamente,

- não procedam à entrega do material em falta e acima melhor elencado, deixaremos de ter interesse no negócio celebrado com V. Exas., razão pela qual fica, a partir dessa data, o mesmo resolvido com justa causa, devendo V. Exas. proceder à devolução do preço por nós já integralmente pago (€150.000), a que sempre acrescem €62.000 a título de indemnização pelo atraso na montagem (€ 2.000 x 31 dias).”.

27. Mais uma vez, a Ré rececionou aquele e-mail.

28. A Ré não respondeu por escrito às comunicações desta identificadas nos Pontos 24. e 26. dos Factos Provados, ignorando-se se o fez verbalmente.

29. A Autora estava dependente da montagem do equipamento identificado em 5º., para iniciar a produção deste tipo de tubo, não dispondo de outro equipamento que lho permita.

30. A Autora:

1) contratou três novos trabalhadores para fazer face ao necessário acréscimo de trabalho decorrente da produção dessa máquina, a saber:

1.1) a 01/03/2019, GG, com a categoria profissional de ..., auferindo um salário mensal ilíquido de 6.620 ... (em Euros 93,8136);

1.2) a 17/06/2019, HH, com a categoria profissional de II, auferindo um salário mensal ilíquido de 10.000 ... (em Euros 141,697);

1.3) A 01/07/2019, JJ, com a categoria profissional de Motorista, auferindo um salário mensal ilíquido de 7800,00 ... (em Euros 110,526); a quem está a pagar os respectivos salários, tendo, até 30/09/2019, despendido em salários e contribuições para a segurança social, 120.397,85 ... (em Euros 1.706,1003€).

2) adquiriu um veículo automóvel de mercadorias especificamente destinado ao transporte de tubo corrugado, no valor de 550.000,00 (em Euros 7.803,92€);

3) adquiriu, junto da Q..., Lda., manguitos de união no montante de € 5.414,40, destinados a unir o tubo corrugado depois de fabricado;

4) celebrou, junto de terceiros (Clientes), contratos de fornecimento de tubo corrugado;

5) arrendou (pagando o respectivo preço) espaço interior e exterior na Feira de Exposição “Facim” em ..., para exposição do seu produto (tubo corrugado), tendo, em virtude de ter estado presente na dita Feira, suportado despesas no montante de 379.982,04 Meticais (em Euros € 5.422,0949 €), a saber:

- arrendamento de espaço com stand modular, área descoberta/exterior e pagamento de energia eléctrica e água: 139.513,66 ...

- pagamento L..., Lda.: 48.170,33 ...

- despesas com refeições no decorrer da Feira: 50.260,00 ...

- compras diversas no Game: 28.647,00 ...

- aquisição de 8 polos da S...Lda: 4.200,00 ...

- aquisição de superwood 2440 x 1830: 1.10...

- aquisição de 4 Bunners e 1 autocolante: 14.400,00 ...

- aquisição de contraplacado e escova de pintor: 2.830,00 ...

- marquetização: 500 ...

- aquisição de cadeados, extensão, cordas e outros: 7.056,00 ...

- aquisição de uma geleira Defy dupla: 16.000,00 ...

- aquisição de diversos produtos alimentares: 8.569,00 ...

- aquisição de extensões de 3 metros: 840,00 ...

- aquisição de água para consumo no Feira: 558,00 ...

- aquisição de mesa, cola, tomadas, fichas, luvas, extensões e outros produtos conexos, todos destinados a serem colocados no stand: 25.345,00 ...

- combustível para deslocações de e para a Feira: 11.063,05 ...

- impressão de 500 folhetos destinados a serem entregues na Feira: 6500,00 ...

- hospedagem de site L..., Lda.: 7.000,00 ...

- aquisição de extensões: 1680,00 ...

- aquisição de serrote: 750,00 ...

- cartões de visita destinados a serem entregues na feira: 4000,00 ...

- serviços de táxi: 1.000,00 ....

31- A Autora participou numa Feira de Exposição, com os inerentes custos, mas não pôde aceitar encomendas de tubo corrugado feitas nessa mesma Feira.

32. Autora suportou as viagens de avião dos funcionários da ré.

O custo de tais viagens ascendeu a € 1.890,00.

33. O tubo corrugado a produzir pelo equipamento melhor identificado em 5º. destinava-se a ser vendido pela Autora aos seus Clientes, a preços de mercado.

34. se o Contrato de Empreitada celebrado com a Ré não tivesse existido, a Autora:

- não teria despendido €1.890,00 em viagens pagas aos funcionários da Ré, conforme resulta do documento junto como doc. 22

- não teria adquirido os bens/equipamentos constantes do documento 23, no valor de € 2.035,56

35. [Suprimido].

36. A Autora, em 11 de novembro de 2019, adquiriu, ela própria, pelo preço de € 2.035,00, uma das resistências para uma cabeça e respetivos acessórios.

2. Matéria de facto – Factos não provados

21. Que o preço do contrato referido em 3 fosse de 150.000,00 euros.

2.2. Que a Ré testou o arranque da linha em Portugal na presença de um técnico de ....

2.3. Que a ré não tenha logrado colocar o equipamento em funcionamento, por não conseguir acertar com a regulação da máquina.

2.4. A falta de resistências adequadas provocava uma errada afinação da temperatura na saída das cabeças da extrusora, razão pela qual a matéria-prima introduzida na máquina não era convertida com sucesso em tubo corrugado.

2.5. Por forma a que a linha de extrusão adquirida pela Autora à Ré passe a funcionar correctamente e, assim, se torne adequada ao fim que se destina (produção de tubo corrugado), aquela será obrigada a:

a) contratar e pagar a técnicos da área, que se desloquem a ... (neste país inexistem técnicos com conhecimentos para tal) e terminem os trabalhos de montagem em falta,

b) pagar as despesas de deslocação, alimentação e alojamento dos técnicos acima referidos, no mínimo, de € 5.000,00

c) adquirir três resistências para as três cabeças da extrusora, não fornecidas pela Ré com um custo de pelo menos, € 6.000,

d) adquirir os componentes em falta e melhor relacionados no artigo 17º, com um custo de aquisição para a Autora não inferior a € 15.000.

2.6. A autora até hoje não fabrica tubo corrugado.

2.7. os funcionários da Autora identificados em 49º não se encontram a laborar;

- a Autora adquiriu e pagou bens e matéria prima que ainda não pôde utilizar;

- a Autora não conseguiu cumprir os compromissos de fornecimento de material assumidos junto dos seus clientes;

2.8. Se o Contrato celebrado com a Ré não tivesse existido, a Autora:

- não teria arrendado um stand na Feira e Exposição Facim e despendido todas as quantias melhor elencadas em 49º, no montante de € 5.422,0949;

- não teria contratado mais três funcionários e, em consequência pago o respectivos salários e contribuições para a segurança social, que, à data de 30/09/2019, totalizavam 120.397,85 ... (em Euros 1.706,1003€)

- não teria adquirido um veículo automóvel de mercadorias especificamente destinado ao transporte de tubo corrugado, no valor de 550.000,00 (em Euros 7.803,92€);

- não teria adquirido, junto da Q..., Lda., manguitos de união no montante de € 5.414,40, destinados a unir o tubo corrugado depois de fabricado.

2.9. O equipamento em causa, estando operacional, tem capacidade para produzir em contínuo (24 horas por dia / 7 dias por semana) e, pelo menos, 10 metros de tubo corrugado por minuto.

Atenta a capacidade de produção de tal máquina, a Autora poderia vender, por dia, 14.400 metros de tubo corrugado.

Tendo em consideração que o preço de custo médio de tubo corrugado será para a Autora 140,475 .../metro (= € 2,00/metro),

A produção de tubo corrugado nas quantidades referidas equivaleria à comercialização de bens no valor de 3.032.303,38 .../dia (em Euros 43.200,00/dia), pois a Autora sempre comercializaria o tubo corrugado a uma média de 210,713 .../metro (=€ 3,00/metro), uma vez que a margem de lucro da Autora não é inferior a 50%.

2.10. Em meados do mês de abril a ré informa a autora que a linha de produção em causa se encontra concluída e que se encontra em condições de testar a mesma, aguardando a presença de um técnico da autora, tal como se encontrava contratualizado

2.11. Entre a data de 16.04.2019 e 20.04.2019, realizou diversos testes nas suas instalações, com a linha de produção em causa, atestando o pleno, completo e perfeito funcionamento de todas as partes componentes da referida linha de produção.

A linha de produção em causa foi testada e foi atestada a sua funcionalidade nas instalações da ré

2.12. Os moldes para corrugador diâmetro 20 mm e 25 mm, os mesmos não foram enviados nas datas de 22.04.2019 e 24.04.2019, por indicação da autora, não couberam nos contentores despachados nas datas de 22 e 24 de abril de 2019,

Em qualquer um dos referidos contactos a ré sempre manifestou à autora disponibilidade para remeter os equipamentos ainda não despachados, desde que a autora indicasse e custeasse o respetivo transporte, o que esta até à presente data não fez.

c) Apreciação da restante matéria objeto do recurso

Recurso da Autora

1. Na sentença qualificou-se o contrato como de empreitada. Não se farão considerações sobre o enquadramento jurídico geral dos factos, por estar já feito na sentença e não ter sido colocada em causa no recurso, seguindo-se diretamente para análise das questões colocadas no recurso.

2. Uma das questões essenciais deste recurso prende-se com a validade ou invalidade da declaração de resolução feita pela Autora e dirigida à Ré através da comunicação, por e-mail, enviado à Ré em 3 de setembro de 2019, no qual lhe declarou:

«… - não concluam a montagem do equipamento em questão por forma a que o mesmo fique a funcionar correcta e plenamente,

- não procedam à entrega do material em falta e acima melhor elencado, deixaremos de ter interesse no negócio celebrado com V. Exas., razão pela qual fica, a partir dessa data, o mesmo resolvido com justa causa, devendo V. Exas. proceder à devolução do preço por nós já integralmente pago (€ 150.000), a que sempre acrescem € 62.000 a título de indemnização pelo atraso na montagem (€ 2.000 x 31 dias).» - facto provado 26.

A Ré recebeu esta comunicação, não respondeu por escrito, desconhecendo-se se o fez verbalmente, e não mais voltou às instalações da Ré em ... – facto provado 19.

Resumindo, verifica-se que a Ré esteve em ... a instalar a linha de produção, mas não conseguiu colocar a maquinaria a produzir tubo corrugado e os respetivos funcionários regressaram a Portugal no dia em que tinham designada a viagem de regresso para Portugal, já marcada antecipadamente.

Ou seja, quando os funcionários da Ré regressaram, a prestação da Ré não estava totalmente realizada.

Para a prestação ter sido realizada de modo completo era necessário que a linha de produção ficasse montada e a produzir tubo.

A prestação não foi completa porque a obrigação assumida pela Ré foi uma obrigação de resultado.
Como referiu o Prof. Antunes Varela, «Quando A vende a B certa coisa, obriga-se naturalmente a transferir para o comprador o domínio da coisa vendida (a conseguir que a propriedade se transfira para a titularidade deste): é obrigação de resultado. O mesmo se diga quando o devedor se obriga a limpar um fato, a reparar um veículo ou a realizar uma obra.
Quando, porém, o médico se obriga a tratar do enfermo ou o advogado a patrocinar certa causa, nem o médico se compromete a curar o cliente nem o advogado a ganhar a questão: um e outro se obrigam apenas a empregar a diligência requerida para obter a cura do doente ou defender os legítimos interesses do mandante, à semelhança do que sucede com o depositário relativamente à guarda e conservação da coisa depositada. São obrigações típicas de meios» - Das Obrigações em Geral, Vol. I, 3.ª edição, pág. 75, nota 1. Cfr. Prof. M.J. Almeida Costa, Direito das Obrigações, 4.ª ed., pág. 733.

Com efeito, a Autora adquiriu à Ré uma linha de produção de tubo corrugado que a Ré forneceria incluindo a montagem em ....

Ora, por «montagem da linha» tem de se entender, na ausência de estipulação em contrário, e segundo a boa fé, que se trata de uma «montagem» que fica apta a produzir, mas para se saber se está apta a produzir tem de ser experimentada, tem de produzir.

E isto nunca foi feito pela Ré.

Como já se referiu acima (na impugnação da matéria de facto) só depois de ensaiar a linha de produção é que se poderia saber se a maquinaria, que já não era nova, estava apta ou não estava apta a produzir o tudo, se ostentava ou não algum defeito, se o mesmo era corrigível ou não era, etc.

Na sentença recorrida considerou-se que a Ré ficou desonerada definitivamente de ensaiar a linha de produção porque a Autora não disponibilizou todas as condições para isso no prazo combinado para a montagem, sendo este lapso de tempo o que decorreu entre a data da viagem de ida e a data da viagem de regresso, eta última antecipadamente designada.

Não se concorda com esta solução.

Com efeito, nos termos do artigo 762.º do Código Civil, «1. O devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado» e «No cumprimento da obrigação, assim como no exercício do direito correspondente, devem as partes proceder de boa fé.»

A boa fé deve ser entendida no contexto de cada comunidade jurídica culturalmente situada, como o vetor que determina um «…comportamento honesto, correcto, leal, nomeadamente no exercício dos direitos e deveres, não defraudando a legítima confiança ou expectativa dos outros» - Coutinho de Abreu, Do Abuso de Direito. Coimbra: Almedina/1983, pág. 55.

Agir com boa fé significa, pois, agir de uma forma tal que os interesses contratuais do próprio agente e os interesses contratuais da contraparte, são tutelados pelo agente, no seu agir, como tendo a mesma importância.

Ora, no caso dos autos, muito embora já estivesse prevista para os funcionários da Ré uma data de regresso a Portugal, a boa fé na execução do contrato implicava que caso a Ré não pudesse dilatar a estadia dos seus funcionários em ..., estes voltassem a este país em data a combinar com a Autora.

Desde logo porque esse prazo de montagem não era perentório, nem contratualmente, nem factualmente.

Cumpre ter em atenção que não estamos face a uma prestação que se pode fracionar e permitir um cumprimento parcial.

No caso presente a prestação só seria cumprida depois de montada a máquina e de ser ensaiada mostrando que estava apta para a finalidade a que se destinava e que estava isenta de defeitos (tratava-se de uma maquina já usada).

Por isso, não estando finalizada a prestação da Ré, esta só se poderia desobrigar se tivesse fundamento bastante para isso.

E não tinha.

É certo que se provou que a Ré quando chegou a ... não pôde trabalhar plenamente durante o tempo previsto – de 17 de junho a 2 de julho –  porque nesse período a Ré procedeu à instalação de um quadro elétrico novo e de um novo posto de transformação e não teve oportunidade de ligar as máquinas a esta nova instalação elétrica.

Existiu aqui uma indisponibilidade de meios imputável à Autora, pois era a esta que incumbia assegurá-los.

Porém, esta indisponibilidade foi temporária e como foi temporária a Ré tinha o dever de voltar a ... mais tarde, suportando a Autora, as respetivas despesas dessa deslocação, como estava previsto no contrato, e indemnizando a Ré de eventuais prejuízos que sofresse.

Sob pena de, não regressando a ..., a Ré entrar em mora (atraso na prestação).

Daí que se considere que a declaração de resolução do contrato feita pela Autora, ou seja, a conversão da mora da Ré em incumprimento definitivo, seja válida.

Vejamos a sequências dos factos.

Por e-mail remetido à Ré a 22 de julho de 2019, a Autora solicitou-lhe que informasse quando regressaria a ..., dizendo-lhe que já tinha encomendas pendentes – facto provado 21.

A Ré respondeu a dizer que estava à espera dos vistos a emitir pelo Consulado, assim como pelas resistências para as cabeças da extrusora – facto provado 22.

Depois, a Ré não respondeu a um e-mail da Autora e esta por carta registada com A. R., enviada à Ré em 30 de julho, que a Ré recebeu, comunicou-lhe:

«…solicitar a V. Exas. que, no prazo máximo de 15 dias:

- forneçam o material em falta;

- concluam a montagem do equipamento em causa, ficando o mesmo plenamente a funcionar.

Mais informamos que, atento o v/ atraso e incumprimento do contrato, a n/ empresa já não se responsabilizará pelo pagamento das despesas decorrentes do envio desse material, nem do custo das deslocações dos v/ funcionários.

Decorridos 15 dias sem que as questões acima descritas se encontrem definitivamente solucionadas, passaremos a cobrar a V. Exas. uma indemnização pelos prejuízos causados pela v/ supra descrita conduta, no valor de € 2.000/dia e iremos agir judicialmente contra V. Exas» - Factos provados 24 e 25

Depois, por e-mail enviado à Ré no dia 3 de setembro de 2019, a Autora comunicou a esta o seguinte:

«Exmos. Senhores, (…)

Pelo exposto somos a informar V. Exas. que, acaso até ao próximo dia 15 de Setembro de 2019, V. Exas.:

- não concluam a montagem do equipamento em questão por forma a que o mesmo fique a funcionar correcta e plenamente,

- não procedam à entrega do material em falta e acima melhor elencado, deixaremos de ter interesse no negócio celebrado com V. Exas., razão pela qual fica, a partir dessa data, o mesmo resolvido com justa causa, devendo V. Exas. proceder à devolução do preço por nós já integralmente pago (€ 150.000), a que sempre acrescem € 62.000 a título de indemnização pelo atraso na montagem (€ 2.000 x 31 dias)» - Facto provado 26.

Verifica-se face a estes factos que a partir do enviou, em 30 de julho, da carta registada com A. R., dirigida à Ré, na qual a Autora exigia a finalização dos trabalhos no prazo de 15 dias, passados cerca de 30 dias após a sua interrupção, era imperioso para a Autora que a Ré se deslocasse a ....

Ora, a Ré não se deslocou a ... e não respondeu por escrito a esta carta e não se sabe se o fez oralmente.

Trata-se de um comportamento contrário ao que é ditado pela mencionada boa fé, que impunha à Ré uma resposta também por escrito ou o comparecimento em ....

Por conseguinte, decorrido um mês, ficou claro para a Autora, ou para outrem colocado na sua posição (objetivamente), que a Ré não estava determinada a cumprir.

Ora, quando tal sucede, a lei concede ao credor a possibilidade de intimar o devedor a cumprir, sob pena de se considerar o contrato não cumprido definitivamente.

Este direito vem estabelecido no n.º 1 do artigo 808.º do Código Civil, nestes termos: se a prestação «… não for realizada dentro do prazo que razoavelmente for fixado pelo credor, considera-se para todos os efeitos não cumprida a obrigação.»

A razão de ser desta norma reside na constatação de que não «… seria legítimo obrigar o credor a esperar indefinidamente pelo cumprimento. Não seria justo manter o credor indefinidamente vinculado ao contrato (inibindo-o designadamente de fazer uma compra de cobertura ou de qualquer outro modo prover à satisfação da necessidade que o levou a contratar) visto que ele, embora com direito ao ressarcimento dos danos moratórios, ficaria sempre sujeito a ter de cumprir por seu lado – bem como a ter de receber a prestação retardada» - João Baptista Machado, Pressupostos da Resolução por Incumprimento, em Obra Dispersa I, Scientia Iuridica, Braga, 1991, págs. 163; cfr. também Prof.  Antunes Varela. Das Obrigações em Geral, Vol. II, 7.ª Edição. Coimbra, Almedina, 1999, pág. 114-115.

Não tendo a Ré respondido durante cerca de 40 dias aos pedidos da Autora, para aquela regressar a ... e finalizar a prestação, conclui-se pela validade da declaração de resolução do contrato com fundamento em incumprimento do contrato (artigo 808.º, n.º 1, do Código Civil).

3. Vejamos agora as consequências da resolução.

Como se determina no n.º 1 do artigo 808.º do Código Civil, se a prestação não for realizada dentro do prazo fixado pelo credor, considera-se para todos os efeitos não cumprida a obrigação.

O artigo 801.º, n.º 2 do mesmo código dispõe que «Tendo a obrigação por fonte um contrato bilateral, o credor, independentemente do direito à indemnização, pode resolver o contrato e, se já tiver realizado a sua prestação, exigir a restituição dela por inteiro.»

A Autora pede a restituição da quantia que recebeu a título de preço, no montante de € 150.000,00 (ou se assim se não entender, a devolver à Autora € 50.000 a título de redução do preço), mais juros legais calculados à taxa prevista no artigo 102º do Cód. Comercial, que se vencerem, desde a data da citação.

Face ao disposto na norma acabada de citar, a Autora tem direito a exigir a restituição da prestação que realizou, no caso, a reaver os 150 mil euros que entregou à Ré e a ser indemnizada pelos prejuízos sofridos.
Com efeito, como referiu Vaz Serra, «…se o contrato é resolvido, significa que ficam sem causa as prestações feitas e devem, portanto, ser restituídas» - Revista de Legislação e de Jurisprudência, n.º 104.º, pág. 206/207.

Quanto aos juros, a questão será apreciada mais abaixo.

Além do direito a reaver a sua prestação, o n.º 2 do artigo 801.º do Código Civil, diz que o credor tem direito a ser indemnizado.

Antes de analisar os pedidos formulados a este respeito, cumpre identificar que danos indemnizáveis são estes.

Como referiu Vaz Serra, «Por vezes a anulação do contrato deixa de pé certos danos, que ela não pode atingir. É o que sucede quando o prejudicado, por ter celebrado o contrato usurário, sofreu danos, que a anulação só por si não elimina (v. g., despesas feitas contando com a eficácia do contrato; dano resultantes do facto de não ter celebrado outro contrato vantajoso).

Este dano é o chamado dano contratual negativo ou de confiança, isto é, aquele que o contraente não teria tido, caso não tivesse feito o contrato.

Porém, a doutrina e a jurisprudência dividem-se acerca da indemnização dos danos resultantes do designado interesse contratual positivo, ou seja, os valores que o credor teria conseguido se o contrato fosse válido (e cumprido)» - A Mora do Devedor, em Boletim do Ministério da Justiça, n.º 48, maio - 1955, pág. 182.

Quanto ao dano resultante do interesse contratual negativo não se suscitam dúvidas quanto à sua efetivação.

Já não ocorre o mesmo com outras consequências tidas como danosas e subjacentes ao denominado interesse contratual positivo.

Continuando com Vaz Serra, este autor referiu que «Nas relações contratuais podem ter-se em conta duas espécies de danos:

a) O chamado interesse positivo ou interesse do cumprimento (ou dano de não cumprimento), quer dizer, o dano que ao credor é causado com o não-cumprimento ou com o cumprimento defeituoso ou tardio da obrigação, representando, portanto aquilo que o credor teria se o negócio tivesse sido cumprido com exactidão. No caso da nulidade do negócio, o interesse positivo consiste naquilo que o credor teria se o negócio fosse válido.

b) O chamado interesse negativo ou da confiança, quer dizer, o dano sofrido pelo credor em consequência de ter acreditado na validade do negócio e que não teria, por isso, tido se tivesse sabido que ele não era válido. Ou melhor talvez: o dano resultante da celebração do negócio.

(…) O interesse negativo pode compreender, entre outros, os seguintes danos: despesas com o contrato, despesas com o cumprimento, danos sofridos com a prestação já feita ou preparada (como se a coisa é apropriada para cumprimento do contrato e se deteriora), danos resultantes de se não ter celebrado outro contrato por se confiar na validade do primeiro (como se A, que teria podido comprar por 10 a coisa comprada ineficazmente, só pode agora comprar por 15)» - Obrigação de Indemnização. Boletim do Ministério da Justiça, n.º 84 – março – 1959, pág. 15/16.

Os danos imputáveis ao interesse contratual positivo consistem nos valores que o credor teria obtido se o contrato (anulado) fosse válido e lograsse ser cumprido.

Ora, como se disse, a doutrina e a jurisprudência encontram-se divididas acerca da extensão da indemnização relativa aos danos.

Excluindo a indemnização, por se considerar que os efeitos da resolução do contrato são incompatíveis com o direito à indemnização pelo interesse positivo, porquanto se pretende nestes casos obter, e se obtém efetivamente, a supressão dos efeitos do contrato e ao mesmo tempo pretende-se obter os benefícios que esse contrato traria ao credor, como se a resolução não tivesse existido, ou seja, como se o contrato resolvido não tivesse sido resolvido e tivesse sido cumprido, temos os seguintes autores, digamos, mais antigos: Pereira Coelho, Obrigações, sumários, pág. 230; Mota Pinto, Cessão da Posição Contratual, pág. 412, em nota; Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. II, pág. 104; J. Almeida Costa, Direito das Obrigações, 3ª Ed, pág. 763  (« A indemnização a que o credor tem direito, quando opte pela resolução do contrato, refere-se obviamente ao dano da confiança, ou seja, ao interesse contratual negativo, nomeadamente ao lucro que o credor teria tido, se não fora a celebração do contrato resolvido » - Pires de Lima/Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. II, pág. 60, 3.ª edição).

Porém, atualmente, a jurisprudência, que se afigura ser maioritária, tem admitido a indemnização por danos surgidos na órbita do interesse contratual positivo, na peugada de autores como Vaz Serra, Revista de Legislação e de Jurisprudência, n.º 104-205 e ss., nota     4; Baptista Machado, in Obra Dispersa (Pressupostos da Resolução por Incumprimento), pág.183; Brandão Proença, A resolução do Contrato no Direito Civil, pág. 183; P, Coimbra/1994. Galvão Teles (Direito das Obrigações, 7.ª ed. 463); Ana Prata. Cláusulas de Exclusão e Limitação da Responsabilidade Contratual, 479; Paulo Mota Pinto. Interesse Contratual Negativo e Interesse Contratual Positivo, Vol. II. Coimbra Editora, 2008, pág. 1702; Jorge L. A. Ribeiro de Faria. Estudos de Direito das Obrigações e Discursos Académicos (A Natureza da Indemnização no Caso de Resolução do Contrato. Novamente a Questão). Porto, U. Porto Editorial, 2009, pág. 139-199; Nuno M. Pinto Oliveira. Princípios de Direito dos Contratos. Coimbra Editora, 2011, pág. 890; Romano Martinez (Da Cessação do Contrato, Pág. 208.

Na jurisprudência podem citar-se, a título apenas exemplificativo, o Acórdão do STJ de 10 de dezembro de 2020, no processo n.º 15940/16.7T8LSB.L1.S1 (Nuno Pinto Oliveira):

«1. A resolução do contrato é cumulável com a indemnização pelo interesse contratual positivo.

2. Indemnizar pelo interesse contratual positivo, traduz-se, na prática, em aplicar o princípio geral da obrigação de indemnizar consagrado no artigo 562.º do Código Civil.

3. Em favor do cúmulo depõem ainda a Convenção das Nações Unidas sobre a venda internacional de mercadorias de 11 de Abril de 1980, aprovada para adesão em 23 de Julho de 2020, e a Directiva 2019/771/UE, de 20 de Maio de 2019» -  Sumário.

Bem como o acórdão do STJ de 28 de outubro de 2021, no processo n.º 1778/15.2T8CSC.L1.S1 (Rosa Tching):

«(…) V. A resolução do contrato é compatível com a indemnização pelo interesse contratual positivo, na medida em que vise a reparação de prejuízos resultantes do não cumprimento definitivo do contrato resolvido não cobertos pela eficácia retroativa da resolução do contrato e desde que não revele desequilíbrio grave na relação de liquidação ou se traduza em benefício injustificado para o credor, ponderado à luz do princípio da boa fé.»
Admite-se a indemnização porquanto, como referiu Vaz Serra, a indemnização apenas pelo interesse contratual negativo «…seria contrária à equidade e injusta quando o interesse contratual positivo for superior ao negativo...» - Revista de Legislação e de Jurisprudência, n. 104.º, pág. 206, nota 4.
Conclui-se, por isso, que a Autora tem direito a ser indemnizada pelos danos sofridos no âmbito do interesse contratual negativo (danos que o contraente não teria tido, caso não tivesse celebrado o contrato) e eventualmente por danos relativos ao interesse contratual positivo – os valores que o credor teria conseguido se o contrato fosse válido e fosse cumprido  (artigo 801.º, n.º 2, do Código Civil) –, mas neste último caso o pedido não procede se for incompatível na prática com os pedidos formulados no âmbito do interesse contratual negativo.

Porém, a admissibilidade da indemnização quanto a estes danos, situados na esfera do interesse contratual positivo, tem sido delimitada pelos seguintes vetores:

- A indemnização há de respeitar o equilíbrio das prestações, ou seja, não pode provocar um desequilíbrio grave na relação de liquidação.

- Deve respeitar o princípio da boa fé.

- Não se pode traduzir num benefício injustificado para o credor.

Com efeito, como se pondera no acórdão do STJ de 12 de fevereiro de 2009, no processo n.º 8B4052 (João Bernardo), «Mas, não podemos perder de vista que estes são casos de excepção, sob pena de vir a perder relevância uma figura como a resolução que a lei tem como proeminente em toda a relação contratual. Se se considerasse que o que resolve o contrato tem sempre direito a indemnização correspondente ao interesse que tinha com o cumprimento deste, estaríamos a, em termos práticos, ignorar tal figura no que a uma das partes respeita, gerando um desequilíbrio entre as partes inadmissível, ou usando a expressão de Menezes Leitão (ob. e loc. citados) transformando “o contrato de sinalagmático em unilateral, uma vez que determinaria uma sua liquidação num só sentido.”.»

4. Passando então ao caso dos autos.

(a) A Autora pede 24.272,07 euros de indemnização, correspondentes às despesas feitas pela Autora e que a mesma não teria suportado se não tivesse celebrado o contrato.

Provou-se, a este respeito, que a Autora contratou três novos trabalhadores para fazer face ao necessário acréscimo de trabalho decorrente da produção da linha de montagem de tudo corrugado a quem está a pagar os respetivos salários, tendo, até 30/09/2019, despendido em salários e contribuições para a segurança social, 1.706,10 euros (facto provado 29);

Provou-se que adquiriu um veículo automóvel de mercadorias especificamente destinado ao transporte de tubo corrugado, no valor de 7.803,92 euros (facto provado 29);

Provou-se que adquiriu, junto da Q..., Lda., manguitos de união no montante de 5.414,40 euros, destinados a unir o tubo corrugado depois de fabricado (facto provado 29);

Provou-se que arrendou um espaço interior e exterior na Feira de Exposição “Facim” em ..., para exposição do seu produto (tubo corrugado), tendo, em virtude de ter estado presente na dita Feira, suportado despesas no montante de 5.422,0949 euros (facto provado 29);

Provou-se que a Autora, em 11 de novembro de 2019, adquiriu, ela própria, pelo preço de 2.035,56 euros, uma das resistências para uma cabeça e respetivos acessórios (factos provados 34 e 36);

Provou-se que a Autora suportou as viagens de avião dos funcionários da ré e que o custo de tais viagens ascendeu a 1.890,00 euros (facto provado 32);

Todos estes danos se incluem no designado interesse contratual negativo, isto é, são despesas que a Autora fez por causa do contrato e que não teria feito se não tivesse celebrado o contrato.

Tem direito, por isso, a ser indemnizada, mas com a limitação que resulta de certas despesas terem sido efetuadas para adquirir bens que a Autora conserva, isto é, fez a despesa, mas mantém o bem e o bem em princípio contém em si o valor despendido.

Se fosse indemnizada enriqueceria sem justa causa.

É o caso do veículo automóvel de mercadorias que adquiriu; dos manguitos de união para tubo corrugado depois de fabricado, bem como da resistência para uma cabeça e respetivos acessórios.

Quanto ao veículo automóvel o mesmo pode ser utilizado pela Autora no âmbito da sua atividade ou revendido e o mesmo ocorre com os manguitos.

Quanto à resistência sendo específica para aquela máquina, na falta de factos provados em sentido contrário, não se afigura que possa ser revendida.

Por conseguinte, afigura-se que são indemnizáveis apenas:

Despesas com os três novos trabalhadores - 1.706,10 euros;

Dessa com a participação da Feira de Exposição “Facim” em ... -  5.422,09 euros.

Despesa com a aquisição da resistência - 2.035,56 euros;

 despendida com a;

Despesas com as viagens de avião dos funcionários da Ré - 1.890,00 euros.

Tudo no montante de 11.053,75 euros.

No que respeita aos danos inscritos no interesse contratual positivo, provou-se que o tubo corrugado a produzir pelo equipamento fornecido pela Ré se destinava a ser vendido pela Autora aos seus clientes, a preços de mercado (facto provado 33) e provou-se que a Autora celebrou, junto de terceiros, contratos de fornecimento de tubo corrugado (facto provado 29) e que não pôde aceitar encomendas de tubo corrugado feitas na feira realizada em ... (facto provado 31).

Pediu a este título €2.000/dia calculados desde 16/08/2019 e até trânsito em julgado da sentença, correspondente aos lucros cessantes, acrescidos dos juros legais calculados à taxa prevista no artigo 102º do Cód. Comercial, que se vencerem, desde a data da citação e até integral pagamento.
A ser concedida uma indemnização teria de ser em quantia a liquidar oportunamente.

No entanto, não se afigura procedente este pedido por se revelar incompatível com os pedidos feitos a título de indemnização pelo interesse contratual negativo.

Com efeito, este pedido parte da ideia de que o contrato seria cumprido e a Autora produziria e comercializaria tubo corrugado.

Mas neste caso, concedendo-se esta indemnização de 2.000 mil euros por dia, ou o que se viesse a liquidar, de acordo com a perda de lucro que se viesse a apurar, então a Autora não podia receber ao mesmo tempo a indemnização relativa aos 5.422,09 euros despendidos na participação da Feira de Exposição “Facim” em ...; à quantia de 2.035,56 euros despendida com a aquisição da resistência e à quantia de 1.890,00 euros suportada com as viagens de avião dos funcionários da Ré, tudo no montante de 11.053,75 euros.

Com efeito, se o contrato não tivesse sido resolvido e tivesse sido cumprido, a Autora também não poderia pedir estas quantias porque não teriam constituído para ela qualquer dano.

Do mesmo modo agora.

Se pede e obtivesse 2.000 mil euros por dia (ou outra quantia inferior) com base no interesse contratual positivo, então deixaria de existir causa (danosa) para pedir aqueles outros danos (veículo, despesas com a feira…).

Afigura-se, por isso, que ocorre uma incompatibilidade prática entre ambas as modalidades de danos: como se disse, se fossem ressarcidos os lucros cessantes esperados com a produção do tubo corrugado, como vem pedido, então o tribunal devia julgar improcedente, por incompatibilidade prática, a restituição das quantias relativas à despesa com a aquisição do veículo, com a feira e com a resistência, pois no caso do contrato ter sido cumprido não teria fundamento para as pedir, mas se pede uns danos, fecha a porta aos outros.

Por outro lado, a indemnização pedida iria provocar um desequilíbrio acentuado na relação de liquidação do contrato, na medida em que a Ré já sofre um prejuízo elevado decorrente do facto de certamente serem elevadas as despesas para recuperar a maquinaria em ....

Por conseguinte, considerando, por um lado, que estes danos relativos ao interesse contratual negativo estão determinados e que o mesmo não ocorre quanto aos danos com assento no interesse contratual positivo, que poderão em teoria ser inferiores; que há incompatibilidade entre eles e que a atribuição da indemnização pedida onera em demasia a Ré, desatende-se a pretensão da Autora quanto à quantia de «€2.000/dia calculados desde 16/08/2019 e até trânsito em julgado da sentença, correspondente aos lucros cessantes, acrescidos dos juros legais calculados à taxa prevista no artigo 102.º do Cód. Comercial, que se vencerem, desde a data da citação e até integral pagamento.»

5. Quanto a juros.

A autora pede a condenação da Ré em juros à taxa prevista no artigo 102º do Código Comercial, que se vencerem, desde a data da citação e até integral pagamento.

O artigo 102.º, § 3 do Código Comercial (obrigação de juros) estabelece que «Os juros moratórios legais e os estabelecidos sem determinação de taxa ou quantitativo, relativamente aos créditos de que sejam titulares empresas comerciais, singulares ou colectivas, são os fixados em portaria conjunta dos Ministros das Finanças e da Justiça.»

Assiste razão à Autora.

Nos termos dos n.º 1 e 1.ª parte do n.º 3, do artigo 805.º do Código Civil, «1 - O devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir» e «3. Se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor; …»

No caso, os créditos são líquidos, pelo que são devidos juros desde a citação, á taxa pedida.

Recurso da Ré

A Ré recorreu com o fim de ver a Autora condenada a pagar-lhe o remanescente do preço, ou seja, 50.000,00 euros, mais juros, e a recolher das instalações da ré os componentes da linha de montagem que não seguiram para ..., sob pena de não o fazendo ser condenada a pagar à Ré uma renda no valor diário de 50,00 (cinquenta euros), por cada dia que o referido material ali permaneça.

Considerando o que ficou atrás mencionado, isto é, que o contrato foi validamente resolvido, a reconvenção da Ré improcede na sua totalidade, porque pressupõe a validade do contrato.
Como referiu Vaz Serra, «…se o contrato é resolvido, significa que ficam sem causa as prestações feitas e devem, portanto, ser restituídas.
Esta obrigação de restituição cabe plenamente ao contraente faltoso, por lhe ser imputável a causa da resolução; quanto ao contraente que resolveu o contrato, e a quem, por isso, não é imputável a causa da resolução, parece só ser obrigado a restituir nos termos das regras sobre o enriquecimento sem causa» - Revista de Legislação e de Jurisprudência, n. 104.º, pág. 206/207.
Por conseguinte, na sequência do exposto, a Autora não tem de pagar a parte do preço que ainda não havia pago, nem tem de levantar, nas instalações a Ré, as peças que não seguiram para ....

IV. Decisão

Considerando o exposto:

1 – Julga-se o recurso da Autora parcialmente procedente, revoga-se a decisão recorrida e, em conformidade, condena-se a Ré a pagar à Autora a quantia de EUR 150.000,00 (cento e cinquenta mil) a título de devolução do preço pago, mais a quantia de EUR 11.053,75 (onze mil e cinquenta e três euros e setenta e cinco cêntimos), a titulo de danos sofridos, nos termos acima indicados, mais juros à taxa comercial sobre ambas as quantias desde a citação até pagamento.

2 – Julga-se o recurso da Ré improcedente e mantém-se nesta parte a decisão recorrida.

3 – Custas do recurso quanto à ação por Autora e Ré na proporção do vencimento e decaimento. Sendo o valor dado à ação de EUR 174.272,08 o vencimento é de 92% (EUR 161.053,75) e o decaimento de 8%.

4 – Custas do recurso quanto à reconvenção pela Ré.


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Coimbra, 9 de novembro de 2022