Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
166/08.1TBCLB.C2
Nº Convencional: JTRC
Relator: MARIA JOSÉ GUERRA
Descritores: HONORÁRIOS
ACÇÃO
MANDATO
LAUDO
NULIDADE DE SENTENÇA
JUROS DE MORA
Data do Acordão: 02/26/2013
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: CELORICO DA BEIRA
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTS. 804, 805, 1158 CC
Sumário: 1. Não se verifica a nulidade da sentença com base na condenação em quantidade superior ao pedido, prevista no Art. 668º Nº1 e) do CPC, quando o montante concreto da condenação se compreende no montante peticionado.

2. O laudo emitido pela Ordem dos Advogados a propósito dos honorários de advogado destina-se a esclarecer com elevado grau, da razoabilidade e adequação o valor a atribuir a título de honorários pelos serviços por aquele prestados e está sujeito à livre apreciação do tribunal.

3. Tendo havido interpelação do A. ao R., extrajudicial e judicialmente, para pagamento dos honorários, fixando em concreto o respectivo montante, os juros de mora devem ser contabilizados desde as datas dessas interpelações (extrajudicial e judicial) e não desde o trânsito em julgado da decisão.

Decisão Texto Integral: Acordam os juízes do Tribunal da Relação de Coimbra

I- RELATÓRIO

         1. O A. M (…) intentou a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo sumário contra o R. A (…), peticionando o pagamento da quantia de € 11.000,00, acrescida de IVA e de juros legais desde a data da sua citação até efectivo e integral pagamento, referente a honorários por serviços que alega ter prestado a este no âmbito do exercício da sua actividade como advogado nos autos de Proc.n.ºs 69/99, 6/99, 201/99, 105/99 e 176/99, que correram termos no Tribunal de Celorico da Beira, assim como diversas diligências extrajudiciais para resolução dos litígios que opuseram o R. à sua ex-cônjuge, mercê do divórcio de ambos.

         2. Regularmente citado o R. contestou, alegando que pagou ao A. o montante de € 2.250,00, a título de honorários e despesas, sem que lhe fosse remetido o respectivo recibo ou especificados os serviços prestados, tendo, na sua óptica, ficado integralmente pago o serviço prestado no âmbito do processo de divórcio (Proc.n.º69/99); que em 2002, entregou ao A. o montante de € 500,00 e, ainda, o valor de € 7.500,00 para reembolso de despesas, sem que lhe tenham sido apresentadas quaisquer notas de honorários, recibos de despesas ou recibo; mais alega, não obstante invocar a excepção de cumprimento, a prescrição da referida obrigação, pois, o A. prestou-lhe serviços no âmbito da sua profissão desde o ano de 1999 até finais de 2005, sendo que a presente acção deu entrada apenas em 01.09.2008, no mais, impugna o alegado na p.i. e pugna pela improcedência da presente acção.

         3. Respondeu o A., impugnando os factos alegados pelo R. esclarecendo que este se limitou a reembolsar o A. das despesas que este fez e lhe adiantou na acção de divórcio, dando-lhe quitação da quantia paga a esse título que não era de honorários mas sim de despesas cujo reembolso jamais voltou a solicitar ao R., bem sabendo este que não pagou ao A. os honorários referentes à acção de divórcio e processos correlacionados indicados na petição inicial; quanto à prescrição invocada pelo R. diz o A. que se trata de uma prescrição presuntiva, baseando-se na presunção que a dívida em causa, pela sua natureza, foi paga, presunção esta que é ilidível, sendo que o próprio R. reconhece que não pagou ao A. os honorários que lhe eram e são devidos, nomeadamente no doc. nº 1 que o mesmo junta com a contestação,  pois, ao pedir um laudo a respeito dos honorários que deveria pagar ao A., está a reconhecer de que estão em dívida os honorários em causa, interrompendo, assim, a prescrição, não tendo, por isso, fundamento as excepções invocadas. Mais alega que o R. altera a verdade de factos que muito bem conhece, o que é perfeitamente comprovado documentalmente, litigando com evidente má fé.

         Termina concluindo como na petição inicial, pela improcedência das excepções e pela condenação do R. em multa e indemnização a favor do A. a fixar nos termos do disposto no artº 457º n º1 do CPC.

        

         4. Foi elaborado despacho saneador, no qual foram apreciados, no sentido da respectiva regularidade, os pressupostos processuais e relegado o conhecimento da excepção de prescrição para a sentença final, organizando-se, ainda, a matéria assente e a base instrutória.

5. Instruída a causa, realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com observância do formalismo legal, não tendo a decisão sobre a matéria de facto sofrido reclamação.

         6. Proferida sentença veio nela a decidir-se a parcial procedência da acção e a condenação do R. A (…) a pagar ao A. M (…) a quantia de € 15.000,00 (quinze mil euros) a título de honorários, acrescida de IVA, calculado à taxa legal em vigor à data do trânsito em julgado da presente decisão, e dos quais se deduziu a quantia de € 7.750,00 já paga, e, ainda, na condenação do mesmo R. no pagamento ao autor dos juros sobre a quantia referida, desde a mesma data do trânsito e até integral cumprimento.

         7. Inconformados com o assim decidido, recorreram o R. e o A., este subordinadamente, recursos esses na apreciação dos quais veio este Tribunal da Relação de Coimbra, por acórdão proferido em 29-02-2012, a decidir a anulação da sentença e do julgamento e a determinar a repetição deste quanto à matéria dos Arts. 34º, 35º, 36º, 38º e 40.ºda B.I.

         8. Procedeu-se à repetição do julgamento nos termos determinados pelo Tribunal da Relação, não tendo a decisão da matéria de facto sofrido reclamações.

         9. Proferida sentença veio nela a decidir-se a parcial procedência da acção e a condenação do R. A (…) a pagar ao A. M (…) a quantia de € 15.000,00 (quinze mil euros) a título de honorários, aos quais acrescerá IVA, calculado à taxa legal em vigor à data do trânsito em julgado da decisão, e dos quais se deduzirá a quantia de € 5.00,00 já paga, e, ainda, na condenação do mesmo R. no pagamento ao autor dos juros sobre a quantia referida, desde a data do trânsito da sentença e até efectivo e integral apagamento, absolvendo-se o R. do demais peticionado.

10. De novo irresignados recorreram o R. e o A. este subordinadamente, encerrando o R. o recurso de apelação interposto com as seguintes conclusões:

         “ 1ª A decisão de que se recorre é nula porque o tribunal “ a quo “ decidiu “ ultra-petita “, ou seja, em montante superior ao constante no Pedido formulado na Petição Inicial, e com isso violou as disposições conjugadas dos Artºs nºs 264º nº1, 268º e 661º nº1 do C.P.C.. e isso é proibido à luz do Direito Processual Civil.

         2ª Por ter condenado o Apelante em montante superior ao constante no Pedido da petição Inicial, à sentença “ sub judice “ deve ser aplicado o Artº 668º alínea e) do C.P.C., ser declarada nula e em consequência proceder-se de acordo com o que a Lei de Processo prescreve neste caso.

         3ª O Parecer da Ordem dos Advogados, por se declarar expressamente como não Laudo, não deveria ser atendido como elemento de prova enquanto a factualidade sobre que se baseou não viesse a ser provada em sede de julgamento.

         4ª Não obstante a conclusão anterior, ainda que fosse atendido como elemento de prova não vinculativo o Parecer da AO não deverá ser atendido por não estarem provados os seus pressupostos de facto, por não pode servir como orientador dos valores a atribuir a título de honorários pelos serviços prestados.

         5ª A utilidade processual e probatória do referido Parecer da OA fica irremediavelmente prejudicada pela circunstância de o Autor não ter feito prova da extensa lista de serviços que alegou ter realizado enquanto mandatário do ora Apelante, e por conseguinte não pode ser atendido, nem como elemento orientador ou auxiliar do Tribunal “ a quo “.

         6ª A matéria constante do Artº 40º da BI não deve ser dada como não provada, pelo que a resposta dada a este artigo deve ser corrigida e atendidos os depoimentos prestados pelas testemunhas inquiridas ao referido artigo, declarando se como PROVADO;

         7ª Não podendo ser aproveitado o Parecer da Ordem dos Advogados para efeitos de auxiliador na atribuição dos honorários ao Apelado, deverá ser atendido exclusivamente o montante do pedido constante da Petição Inicial – 11.000,00 euros;

         8ª Em consequência declarar-se como já pago o Apelado pelos serviços prestados uma vez que deverá ser considerado liquidado o montante de 5.000,00 euros que resultou da produção da prova nestes autos, bem como a declaração proferida pelo Apelado e confirmada pelas testemunhas que com a liquidação da quantia de 7.500 euros em 25/11/2005 nada mas havia a reclamar fosse a que título fosse“.

         Termina o R. recorrente pugnando pela declaração de nulidade da sentença recorrida ou se assim se não entender, corrigida a resposta dada ao Art. 40º da Base Instrutória, revogada em toda a sua integralidade e em consequência ser considerado procedente o recurso, absolvendo integralmente o apelante do pedido.

         11. Já o A. remata as alegações do recurso subordinado que interpôs para este Tribunal da Relação, com as seguintes conclusões:

         “ 1ª – O réu procurou o autor, em Maio de 1999, a fim de contestar e reconvencionar na acção de divórcio que lhe tinha sido instaurada por (…) e intervir noutros referidos nos autos, tendo, depois de já ter sido designada data para a audiência de julgamento, o divórcio sido convertido em divórcio por mútuo consentimento, havendo lugar à 2ª conferência no dia 2 de Novembro de 2000.

         2ª - O autor alegou que, sem provisão, fez as despesas constates de I) dos factos assentes, tendo apresentado nota de despesas no total de 100.000$00 (cerca de 500,00€).

         – O réu confirmou que entregou ao autor 500,00€, especificando que o fez em 2002 (artº 7º da contestação).

         4ª – Esta quantia paga pelo réu só se pode dizer respeito ao reembolso das despesas ao autor, tanto mais que o réu pediu ao autor para pagar os honorários devidos depois de ser levada a efeito a partilha dos bens do casal, tendo o autor aceite prorrogar o prazo de pagamento dos honorários (respostas a 2 e 3 de B.I.), tanto mais que o autor prestou serviços ao réu no âmbito da sua profissão de advogado, desde o ano de 1999 até finais de 2005 (al.S) dos factos assentes).

         – O réu entregou ao autor em 25 de Novembro 2005, a quantia de 7.500,00€ como está provado.

         – O autor, sem provisão, efectuou as despesas necessárias à partilha e mútuo com hipoteca e outras conexas, no montante de 2.5000,00€ (20,21 e 22 da BI), tendo pago, ainda, mais 1.000,00€, no total de 3.500,00€ de despesas.

         – A Caixa Geral de Depósitos, do empréstimo que fez ao réu de 100.000,00€, teve despesas e reteve 1.000,00€. – 34 da BI

         8ª – Como se verifica das als. L), M) e N) dos factos assentes, a quantia de 100.000,00€ tinha de ser paga à (…) (ex-mulher do réu) logo que obtido o crédito da Caixa Geral de Depósitos e foi essa quantia exacta de 100.000,00€ a que foi emprestada.

         – Dessa quantia a Caixa Geral de Depósitos reteve 1.000,00€ para despesas pelo que só entregou ao autor a quantia de 99.000,00€.

         10ª -- Como, o autor teve de pagar à (…) 100.000,00€, teve de repor dinheiro seu no montante de 1.000,00€ para perfazer o 100.000,00, 1.000,00€ dos quais não tinha provisão do réu.

         11ª -- Assim, dos 7.500,00€ enviados pelo réu em 25 de Novembro de 2005, 3.500,00€ foram para o reembolso de despesas de 2.500,00€ efectuadas pelo autor mais 1.000,00€ que o autor pagou para perfazer os 100.000,00€ de dívida à ex-mulher do réu, sendo o restante (4.000,00€) por conta dos honorários devidos.

         12ª -- O autor subscreveu a carta datada de 26 de Janeiro de 2006 -- Q) dos factos assentes -- em que pedia ao réu o pagamento de 21.000,00€ que correspondia aos honorários de 25.000,00€ deduzidos da quantia de 4,0000,00€ supra.

         13ª – Face ao laudo pedido pelo réu à Ordem dos Advogados e uma vez que se provaram, nestes autos, todos os pressupostos que lavaram a emitir o laudo de 15.000,0€, o autor reduziu os seus honorários para este montante a que subtraiu os 4.000,00€ já pagos, tendo comunicado ao réu este valor, conforme carta de 25 de Junho de 2008.

         14ª – Pelo menos a partir da data da citação, o réu ficou ciente do total em dívida, valor este que foi de 11.000,00€ mais IVA e juros legais (compensatórios), que constitui o pedido na acção.

         15ª -- Na sua contestação o réu manifestou o seu desacordo. no entanto, a circunstância das partes estarem em desacordo quanto ao valor em dívida não é bastante para conferir à obrigação um carácter ilíquido.

         16ª -- A partir do momento em que o réu foi citado e não diligenciou pagar, colocou-se em mora e, como tal, deve ser condenado a pagar os juros legais sobre a quantia em dívida, desde a data da sua citação até efectivo e integral pagamento, sendo claro o atraso do pagamento por culpa do réu.

         17ª -- Ao decidir-se com se decidiu, na parte recorrida, violou-se, nomeadamente o disposto nos arts. 804º, 805º nº 3, 1157º e segs. e 1167º e segs. do Cód.Civil.

         18ª – Deve dar-se provimento ao recurso, revogando-se a sentença na parte recorrida, com a consequente condenação do réu a pagar ao autor a quantia pedida de 11.000,00€, acrescida do IVA à taxa em vigor na data do seu pagamento sobre a importância dos honorários bem como dos juros, à taxa legal, sobre a quantia em dívida, desde a data da sua citação até efectivo e integral pagamento. “

         12. Não foram apresentadas contra-alegações.

         13. No despacho que apreciou a nulidade da sentença prevista na alínea e) do Nº º1 do Art. 668º do CPC, o Mmo. Juiz a quo decidiu-se pelo indeferimento da mesma.

Dispensados os vistos, cumpre apreciar e decidir.


*

II – ÂMBITO DO RECURSO

Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso ( Arts. 684º, nº 3, 685º-A e 660º, nº 2, do CPC ), são as seguintes as questões a decidir:

- Do recurso principal interposto pelo R.:

I- saber se a sentença recorrida padece da nulidade prevista no Art. 668º Nº1 e) do CPC por ter condenado em montante superior ao peticionado;

II- saber se não poderia ser valorado como elemento de prova o Parecer da Ordem dos Advogados nem como orientador ou auxiliar do tribunal “ a quo “.

III- saber se a matéria constante do  Art. 40º da B.I. deve ser considerada provada.

IV- saber se devem os honorários do A. ser fixados em 11.000,00 euros; e

V- saber se devem ser considerados liquidados os montantes de 5.000,00 e de 7.500,00 e se, em consequência disso, nada mais pode o A. reclamar do R.

- Do recurso subordinado interposto pelo A.:

         I- saber se o R. deve ser condenado a pagar ao A. a título e honorários a quantia de € 11.000,00; e

         II- saber se o R. ao ser citado para pagar se constituiu em mora e se, por isso, deve ser condenado a pagar os juros legais sobre a quantia em dívida, desde a data da sua citação até efectivo e integral pagamento.

III – FUNDAMENTAÇÃO

A) De facto

Da 1ª instância chegam-nos assentes os seguintes factos ( os quais agora se elencam apenas provisoriamente, tendo em conta que pelo menos um deles foi objecto de impugnação ):

         1. O A. exerce a profissão de Advogado como atividade remunerada – [Facto assente sob A)];

         2. No exercício da sua atividade, em Maio de 1999, foi o A. contactado pelo R. a fim de contestar e apresentar reconvenção no âmbito da ação de divórcio com o n.º69/99 à qual os presentes autos se encontram apensos e que tinha sido instaurada por (…) – [Facto assente em B)];

         3. Antes do início da ação aludida supra em 2), já a referida (…) residia em Portugal, sendo que em 17.02.1999, intentou a ação de divórcio referida contra o ora R. – [Facto assente sob C)]

         4. Na data aludida em 3), o R. encontrava-se ora em Portugal ora em França até que, por volta de 2000, se fixou em Portugal, passando a trabalhar em Celorico da Beira – [Facto assente sob D)];

         5. No âmbito da ação aludida em 2) peticionava-se a regulação provisória do poder paternal em relação aos filhos menores e a atribuição da casa de morada de família – [Facto assente sob E)];

         6. No âmbito de tal ação, foi apresentada contestação e deduzida reconvenção, tendo havido réplica, sendo que foi proferido despacho saneador com 72 (setenta e dois) quesitos, foi indicado rol de testemunhas e designada data para a realização da audiência de julgamento – [Facto assente sob F)];

         7. A ação aludida em 2) terminou por acordo, convertendo-se o divórcio litigioso em divórcio por mútuo consentimento, passando a ter o n º 176/99, tendo em sede de segunda conferência – a qual teve lugar em 2 de Novembro de 2000 – sido homologados os acordos apresentados, nos termos constantes de fls. 106/107 dos autos de divórcio a que os presentes autos se encontram apensos e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e, em consequência, foi decretado o divórcio entre o réu e (…) – [Facto assente sob G)];

         8. Na sequência do referido em 7) e, designadamente, das conversações para a conversão do divórcio em mútuo consentimento, o autor, com o acordo do réu, logrou alcançar a desistência de todos os processos crime e queixas existentes entre o réu e (…)  [Facto assente sob H)];

         9. No âmbito do processo aludido em 2) foram efectuadas despesas de: € 1,62, com selos para procuração; € 74,82 com taxa de justiça inicial; € 303,27 com preparo para despesas; e € 27,93 com taxa de justiça devida a final – [Facto assente sob I)];

         10. (…), após o divórcio com o réu, saiu de Celorico da Beira e refez a sua vida familiar - artigo 9.º;

         11. O autor levou a cabo várias tentativas para realização da partilha dos bens comuns do casal, todas elas sem resultado – artigos 6.º e 7.º;

         12. Em virtude das dificuldades financeiras do réu, para aquisição da meação de (…), a partilha foi-se prorrogando, sendo que, o réu tinha uma das casas do casal em seu poder – artigos 10.º e 11.º;

         13. Na sequência dessas dificuldades financeiras, o réu regressou a França, tendo o autor continuado a encetar negociações com o mandatário de (…), com o propósito de resolver a situação – artigos 12.º e 13.º;

         14. O réu alegando a existência de dificuldades financeiras, pediu ao autor para pagar os honorários devidos depois de levada a efeito a partilha dos bens do casal, tendo o autor aceitado prorrogar o prazo para o pagamento dos honorários – artigos 2.º e 3.º;

         15. Em 04/04/2002, foi requerida pelo réu patrocinado pelo aqui autor a alteração regulação do poder paternal que correu por apenso à acção aludida em 2) e a que os presentes autos se encontram apensos – [Facto assente sob J)];

         16. Quando (…) impôs a resolução judicial ou extra-judicial das partilhas, o réu, com vista à partilha dos bens comuns do casal, o réu deu ao aqui autor instruções para negociar com (….) dentro dos valores mais baixos possíveis – [Facto assente em K) e artigo 15.º];

         17. Na sequência do aludido em K), a menor proposta conseguida pelo autor e aceite pelo réu, no primeiro semestre de 2005 foi a de € 100.000,00 (cem mil euros), com a condição de ser paga logo que obtivesse o crédito daquela quantia através da Caixa Geral de Depósitos, o que logrou alcançar mas, na sequência desse crédito, a Caixa teve despesas em virtude das quais reteve a quantia de € 1.000,00 para esse efeito – [Facto assente em L) e artigo 26.º];

         18. Tal valor, englobava a casa nova, a denominada casa velha, dentro da vila de Celorico da Beira, e o recheio de ambas as casas, designadamente, os móveis, electrodomésticos, equipamentos, televisores, máquinas, tudo o que existia em casa e carro, e tinha como condição que o réu pagasse todas as despesas de legalização dos bens – artigos 17.º, 18.º e 19.º;

         19. Até à partilha dos bens comuns o único bem que o réu manteve na sua posse foi a casa nova – artigo 39.º;

         20. O autor, em ordem a proceder à legalização aludida de todos os bens que em partilha calharam ao réu e sem lhe ter sido dada qualquer provisão pelo réu, em virtude da confiança que nele depositava, efetuou todas as despesas necessárias à realização da escritura de partilha e de mútuo com hipoteca, designadamente, as relativas aos serviços no registo na Conservatória da Registo Predial de ambos os prédios urbanos e ao registo provisório da hipoteca à Caixa em virtude do crédito aludido em 17, sendo que as despesas totais com documentação e registos, e demais documentação, faxes enviados, telefonemas para França, e fotocópias importaram no montante de € 2.500,00 – artigos 20.º, 21.º, 22.º e 23.º;

         21. O réu informou o autor que podia levantar dinheiro para as despesas e depois para os honorários devidos – artigo 24.º;

         22. Foi enviada pelo réu ao autor, procuração por ele outorgada, a qual foi pelo autor recebida por volta do dia 13/14 de Novembro de 2005, com poderes para as escrituras respetivas, registos e proceder ao levantamento de quaisquer quantias na Caixa Geral de Depósitos, mas o autor foi informado naquela instituição que, não havia saldo algum, pois o crédito era de € 100.000,00 que era a quantia a entregar a (…), pelo que, nessa sequência, o autor comunicou ao réu para lhe enviar a quantia de € 7.500,00 para pagamento das despesas efectuadas – [Factos assentes sob M) e N) e artigo 25.º];

         23. Pela 2ª Secção de Laudos do Conselho Superior da Ordem dos Advogados, foi emitido o acórdão cuja cópia se mostra junta aos autos de fls. 15 a 22 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, o qual foi proferido em 2 de Maio de 2008, no âmbito do processo L – 140/07, em que é requerente (…) e requerido, o autor M (…), e do qual consta além do mais que “(…) sou de parecer em não conceder laudo sendo que o concederia por € 15.000,00” – [Facto assente sob O) dos factos assente];

         24. O réu entregou ao autor a quantia de PTE 100.000$00 (atualmente € 498,80) e de € 7.500,00 (sete mil e quinhentos euros), esta última entregue em 25 de Novembro de 2005 – [Facto assente sob P) dos factos assentes];

         25. O autor subscreveu e enviou ao réu a carta datada de 30 de Janeiro de 2006, constante de fls.52 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzida, endereçada ao réu da qual consta “(…) Em relação ao dinheiro enviado - € 7.500,00 - € 1.000,00 foram para pagar à sua ex-mulher, uma vez que a Caixa dos € 100.000,00 emprestados reteve € 1.000,00. (…) Em escrituras, documentos e registos gastámos € 2.5000,00. Assim, dos € 7.500,00 enviados, restam € 4.000,00. De todo o meu trabalho ao longo destes anos no sentido de se conseguir a partilha e das negociações-conversações nesse sentido, bem como de tratar de toda a documentação quer para as escrituras de partilha, em que intervim como seu procurador, quer da hipoteca e depois do registo e regularização de tudo junto do Serviço de Finanças, de todo este meu serviço, são € 25.000,00. Como tenho € 4.000,00 deve-me € 21.000,00” – [Facto assente sob Q) e artigo 31.º];

         26. O autor subscreveu a carta datada de 25 de Junho de 2008, constante de fls. 24 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, endereçada ao réu – [Facto assente sob R)];

         27. O autor prestou serviços ao réu, no âmbito da sua profissão aludida em 1) desde o ano de 1999 até finais de 2005 – [Facto assente sob S)];

         28. A presente ação deu entrada neste Tribunal em 1 de Setembro de 2008 – [Facto assente em T)];

         29. Pelo réu, foi dirigida à Ordem dos Advogados a carta registada com aviso de receção constante de fls. 50/51 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, da qual consta, além do mais, que “ (…) Resido em França já para vários anos e a minha esposa residia em Portugal requereu o divórcio em Portugal e para me representar dei procuração ao Dr. M (…) (…) para me tratar do divórcio entreguei-lhe a quantia em dinheiro de 600 contos (…)” – [Facto assente sob U)];

         30. O autor não informou o réu que as quantias que dele recebeu se destinavam unicamente ao reembolso de despesas – artigo 37.º;

         31. O autor nunca apresentou ao réu uma discriminação, tanto dos serviços prestados, como do tempo dispendido, do valor hora praticado e das despesas efetivamente pagas e documentadas – artigo 41.º.

         B) De Direito

         I- Do recurso principal interposto pelo R. A (…)

1. Iniciaremos a apreciação das questões suscitadas pelo recorrente A (…) nas conclusões do recurso por este interposto pela apreciação da nulidade da sentença prevista no Art. 668º Nº1 e) do CPC invocada pelo R. recorrente com base em que foi condenado em montante superior ao peticionado.

         Preceitua-se no citado Art. 668º Nº1 e) do CPC que a sentença é nula quando condene em quantidade superior à do pedido.

         Na presente acção, o A. peticiona a condenação do R. no pagamento da quantia de € 11.000,00, acrescida de IVA e de juros legais desde a data da sua citação até efectivo e integral pagamento, e na sentença recorrida o tribunal recorrido decidiu-se pela condenação do R. no pagamento da quantia de € 15.000,00 (quinze mil Euros), a título de honorários, acrescida de IVA, calculado à taxa legal em vigor à data do trânsito em julgado desta decisão, deduzida da quantia já paga de € 5.000,00, e, ainda, no pagamento dos juros sobre a quantia mencionada supra, desde a data do trânsito da presente decisão e até efectivo e integral pagamento.

         Do cotejo do peticionado pelo A. e dos termos em que foi decidida na sentença recorrida a condenação do R., é manifesta a falta de razão do recorrente António Rebelo ao pretender que a sua condenação foi além do pedido, porquanto, como resulta bem evidente da condenação que lhe foi imposta na sentença recorrida, o montante global dessa condenação compreende-se no montante que vem peticionado pelo A. nos autos.

         Improcedendo, por isso, a invocada nulidade da sentença com o fundamento de que a condenação foi além do pedido.

         2. (…)

3. Vejamos, agora, se no caso em vertente poderia ser valorado como elemento orientador ou auxiliar do tribunal “ a quo “ o Parecer da Ordem dos Advogados e se os honorários deviam ser fixados no montante de € 11.000,00.

A propósito do montante a arbitrar a título de honorários ao A. discorreu-se na sentença recorrida que os honorários de Advogado devem corresponder a uma compensação económica adequada pelos serviços efectivamente prestados, que deve ser saldada em dinheiro e que pode assumir a forma de retribuição fixa” – art.º100.º, n.º1 do EOA (Lei n.º105/2005, de 26 de Janeiro ), e que de acordo com o n.º2 deste normativo  “ na falta de convenção prévia reduzida a escrito, o Advogado apresenta ao cliente a respectiva conta de honorários com discriminação dos serviços prestados”, devendo o Advogado, na sua fixação, “atender à importância dos serviços prestados, à dificuldade e urgência do assunto, ao grau de criatividade intelectual da sua prestação, ao resultado obtido, ao tempo despendido, às responsabilidades por ele assumidas e aos demais usos profissionais” – n.º3 da norma.

Aludindo-se ainda na mesma sentença ao preceituado o n.º2 do art.º1158.º do Código Civil, segundo o qual “ se o mandato for oneroso, a medida da retribuição, não havendo ajuste entre as partes, é determinada pelas tarifas profissionais; na falta destas, pelos usos; e, na falta de umas e outros, por juízos de equidade.”

Vem posto em causa pelo recorrente A (…) a valoração dada pelo tribunal recorrido ao Parecer da Ordem dos Advogados junto aos autos a fls. 16-23 por nele, segundo pretende, ter sido emitido um não laudo e não um laudo.

Do quadro normativo referido resulta que a fixação de honorários implica a emissão de um juízo discricionário, “não no sentido que se dá à palavra no contencioso administrativo (cf. Freitas do Amaral, in Direito Administrativo, II, 105 e segs.), antes no sentido civilístico que muito tem a ver com a boa fé que impregna toda a relação contratual e com os inevitáveis poderes do juiz no procedimento das normas contendo conceitos indeterminados pois, para além da ponderação dos factores aludidos no Estatuto da Ordem dos Advogados, impõe que se atente no laudo da Ordem, se o houver, e se considerem juízos de equidade” – neste sentido, vide Acórdão do STJ de 02-10-2008, disponível in www.dgsi.pt.

Na verdade, a lei não estabelece qualquer método decisório ou critério legal, antes consagra critérios ou parâmetros referenciais de carácter deontológico/estatutário a serem observados pelos advogados na fixação dos honorários respectivos – a este propósito, vide Ac do STJ de 1-3-2007, disponível in www.dgsi.pt.

Deve, assim, considerar-se a especificidade do trabalho desenvolvido, o tempo despendido, o grau de exigência e dificuldade técnica concretizados em cada caso. Mas, para além disso, devem ser considerados, em termos de decisão equitativa, os custos fixos de um escritório. Menor relevância terá o «resultado obtido», uma vez que a obrigação a que se encontra adstrito o advogado é, essencialmente, uma obrigação de meios e não de resultado – cfr. Moitinho de Almeida, in Responsabilidade Civil dos Advogados, 1985, pág. 23.

Na acção de honorários, é usual solicitar-se um “laudo” à Ordem dos Advogados, o qual reveste a natureza de “parecer”, destinado a esclarecer o julgador e que, como tal, se encontra sujeito à sua livre apreciação (v., neste sentido, entre muitos outros, o Ac do STJ de 20/1/2010 - P. 2173/06.0TVPRT.P1.S1).

Não obstante, sendo elaborados por profissionais do foro, é manifesto que não se lhes pode negar a autoridade de quem tem um conhecimento específico sobre a matéria, susceptível de aferir, com elevado grau, da razoabilidade e adequação do valor constante da nota de honorários

         Na sentença recorrida aduziu-se que de modo a aferir da justeza de tal fixação se torna necessário que o Tribunal busque apoio em diversos meios probatórios, dentre os quais assume particular importância, porquanto exprime o parecer da própria ordem profissional que rege os profissionais do foro, como o é o A., os laudos do Conselho Superior da O.A. que, embora não sendo vinculativos, sempre são importantes, na medida em que se tratam de contributos que permitem ultrapassar o natural distanciamento do julgador quanto à matéria de fixação de honorários e, em geral, de qualquer retribuição por actividade intelectual ministrada por um profissional do foro. 

         Em particular sobre o Parecer da Ordem dos Advogados junto aos autos, referiu-se na sentença recorrida que “ o Conselho Superior da Ordem dos Advogados emitiu parecer e acórdão, a pedido do R. antes ainda de ser proposta a presente acção, no qual se concluiu no sentido de «não conceder laudo, sendo que o concederia por € 15.000,00», e, não obstante se tratar de um “não laudo” o facto é que o mesmo consta dos autos e, como tal integrou a factualidade assente, sendo, desse modo, incontornável enquanto mais um elemento que auxilia o julgador na tomada da decisão.

         Com efeito, do próprio teor daquele consta que «o laudo é um juízo valorativo sobre a quantificação, em termos de honorários, dos serviços prestados pelo Advogado – daí que se tenha de partir de uma base concreta, não cumprindo aqui perseguir o objetivo da prova dos serviços efetivamente prestados».

         Ora, concordamos com tal afirmação, uma vez que a prova da prática de tais atos é tarefa acometida aos Tribunais e que, conforme resulta da factualidade supra elencada e que o acórdão de fls.373 a 383v não alterou, nem saiu infirmada pelos depoimentos das duas testemunhas inquiridas conforme exarado em Ata de fls.397 a 399, se encontra provada – vide factos supra sob 2), 3), 6), 7), 8), 9), 11), 13), 14), 15), 16) e 20).

         Ademais, tendo resultado provado que os serviços prestados pelo A. ao R. o foram desde o ano de 1999 até ao ano de 2005, ou seja, pelo menos, 06 anos, possível é – e assim se faz – de concluir que o valor de € 15.000,00 (pelo qual o Conselho Superior da O.A. já concederia laudo, ao invés dos ali mencionados € 25.000,00 iniciais) se afigura como o valor sinónimo de justeza na fixação dos honorários devidos pelo R. “.

          Não vemos qualquer razão que obste a que no caso em apreço possa ser considerado como contributo válido o Parecer da Ordem dos Advogados junto aos autos, desde que apreciado e valorado nos exactos termos em que foi feito na sentença recorrida, para fixar o montante dos honorários devidos pelo R. ao A. em consequência dos serviços de advocacia prestados por este aquele.

         De tal maneira que nos permitiremos apenas tecer brevíssimas considerações a respeito de tal Parecer, reforçando, como já bem se referiu na sentença, que quando nele se refere, no ponto 22- do mesmo “ sou de parecer em não conceder laudo “ tal apenas significa que se não concorda com a fixação do montante de € 25.000,00 a título de honorários devidos pelos serviços indicados por quem pediu tal parecer e que foram objecto de apreciação no mesmo pela OA, e que quando nele se refere “ sendo que o concederia por  € 15.000,00 “ mais não é do que o entendimento da OA quanto ao valor de € 15.000,00 no sentido de reputar este como o justo valor dos honorários devido por tais serviços.

         E, se é certo que tal parecer não é vinculativo, não só porque não pode ser entendido como coercivo para o tribunal, a verdade é que é do mesmo consta um entendimento que deve merecer a máxima atenção, dada a particular qualificação profissional e experiência dos membros que integram o Conselho Superior da OA que o proferiram e as apertadas regras deontológicas que presidem à sua actividade, para além de que nele foram levados em conta e apreciados os serviços que, de acordo com o que resulta da factualidade provada, foram prestados pelo A. ao R. no âmbito da actividade profissional do primeiro.

         Assim sendo, bem andou o tribunal recorrido em ancorar-se em tal Parecer da OA para proceder à fixação dos honorários no montante de € 15.000,00 devido pelo R. ao A. em consequência dos serviços de advocacia por este prestados aquele, montante este que também no entender deste tribunal de recurso se reputa justo, tendo em conta que se compreende dentro dos parâmetros referenciais de carácter deontológico/estatutário que devem ser observados pelos advogados na fixação dos respectivos honorários, dos quais, os dados mais relevantes são o tempo gasto e a dificuldade do assunto, para além da discricionariedade que tem muito a ver com a boa fé nas relações contratuais havendo ainda que ter em conta não só os custos fixos (elevados de um escritório de advogado), mas também os riscos da profissão liberal – vide, neste sentido, Ac. do STJ, de 01.03.2007, disponível em www.dgsi.pt.

4. Por último, cumpre, ainda, apreciar se devem ser considerados liquidados pelo R. ao A. os montantes de 5.000,00 e de 7.500,00 e se, em consequência disso, nada mais é devido por aquele a este.

         Para apreciação de tal questão há que chamar à colação a factualidade provada, com especial realce para que consta elencada sob os pontos 17. 20. e 24. da mesma, do cotejo da qual, há que concluir que as quantias entregues pelo R. ao A. totalizam o montante global de € 7.998,80 ( € 498,80 + € 7.500,00 ), e não apenas, como se considerou na sentença recorrida o montante de € 7.500,00.

         Assim, visto que logrou provar-se também que o A. suportou despesas no montante de € 2.500,00, a conclusão daí a retirar é a de que apenas poderá ser abatido no montante devido a título de honorários ( que se fixou ser de € 15.000,00 ) a diferença resultante das quantias entregues pelo R. ao A. ( no total € 7.998,80 ) e do total das despesas suportadas pelo A. ( que se apurou serem no total de € 2.500,00 ), ou seja,  a diferença que se cifra em € 5.498,80, e nada mais, na medida em que não logrou o R. provar, como lhe incumbia nos termos do disposto no Art. 342º Nº2 do C.C., a entrega ao A. de montante superior aos referidos 7.998,80.

         Daí que, ao contrário do pretendido pelo R., não poderá considerar-se que o mesmo nada deve a título de honorários ao A. por se mostrar já liquidado o valor dos mesmos, antes devendo considerar-se que continua em dívida a título de honorários o montante de € 9.501,20 e não € 10.000,00 como se concluiu na sentença recorrida.

        

         II- Do recurso subordinado do A. M (…)

         1. No recurso subordinado interposto pelo A., pretende este a condenação do R. a pagar-lhe, a título e honorários, a quantia de € 11.000,00 em vez da quantia de € 10.000,00 resultante da diferença entre o montante de € 15.000,00 que veio a ser fixado na sentença a título de honorários e o montante já recebido pelo A. do R. no montante de € 5.000,00 que na mesma sentença foi entendido como não tendo sido destinado ao pagamento de despesas suportadas pelo A.

         A discordância do A. recorrente a este propósito advém, como se extrai do seu discurso recursivo, do facto de ter sido ele a suportar, sem provisão do R., despesas no montante de € 3.500,00 e não apenas no montante de € 2.500,00 como foi entendido na sentença recorrida, residindo a diferença de tais entendimentos na circunstância de não ter sido considerado na sentença que o A. suportou, para além da quantia de € 2.500,00 a título de despesas que nela foi considerada, também a quantia de € 1.000,00, pois, a Caixa Geral de Depósitos, do empréstimo que fez ao réu de 100.000,00€, teve despesas e reteve 1.000,00€ e como a quantia de 100.000,00€ tinha de ser paga à (…) (ex-mulher do réu) logo que obtido o crédito da Caixa Geral de Depósitos e através desse crédito, como tal instituição de crédito reteve 1.000,00€ para despesas e só entregou ao autor par o efeito a quantia de 99.000,00€, o autor para poder pagar à (…) a totalidade da referida quantia de 100.000,00€ teve de repôr dinheiro seu no montante de 1.000,00€ para perfazer a mesma.

         Não cremos, porém, que o entendimento assim sufragado pelo recorrente M ... possa encontrar suporte no elenco fáctico apurado.

         Na verdade, apurando-se embora que a Caixa Geral de Depósitos concedeu crédito ao R. no montante de € 100.000,00 que possibilitou a este a aquisição, por partilha extrajudicial acordada com a sua ex-mulher, a aquisição dos bens comuns e que do referido montante de crédito concedido por tal instituição a mesma reteve para despesas a quantia de € 1.000,00, disponibilizando ao A. para este, como mandatário do R., entregar à ex-mulher do R. apenas a quantia de € 99.000,00, e que o A. entregou efectivamente à ex-mulher do R. a quantia de € 100.000,00, o certo é que, não resulta da factualidade provada que, para além do montante de € 2.500,00 relativo às despesas suportadas pelo A. aludidas no ponto 20. da factualidade provada, outras por ele tenham sido suportadas, designadamente as correspondentes ao referido montante de € 1.000,00.

         Aliás, a esse propósito, o A. alegou que para entrega no acto da escritura do total de € 100,000,00 teve ( ele A. ) de adiantar por sua conta € 1.000,00, matéria essa que foi levada á base instrutória, concretamente ao ponto 27º da mesma, e que mereceu a resposta de Não Provado.

         Assim sendo, incumbindo ao A., nos termos do disposto no Art. 342º Nº1 do C.C., a prova de que, para além do referido montante de € 2.500,00 por si suportado a título de despesas que consta do referido ponto 20. da factualidade provada, também suportou o pagamento da quantia de € 1.000,00, improcedem as conclusões 1ª a 11º do recurso do A.

         E, assim sendo, conforme ficou já decidido no recurso interposto pelo R. A (…), há que considerar que o montante em dívida pelo R. ao A. a título de honorários se cifra, após abatimento do valor das despesas suportadas pelo A. ao montante global entregue pelo R. ao A., no montante de € 9.501,20, a que acresce IVA nos termos decididos na sentença recorrida que, nessa parte, não foi objecto de recurso por nenhuma das partes.

        

         2. Pretende ainda o A. recorrente que os juros legais sobre o montante em dívida a título de honorários são devidos pelo R. desde a data da sua citação até efectivo e integral pagamento, pelo facto do R. se ter constituído em mora desde esse momento, discordando, assim, do decidido na sentença recorrida, na qual se considerou que tais juros são apenas devidos desde o do trânsito em julgado dessa decisão e não desde a citação, conforme peticionado.

         Aduz para tanto o A. que reduziu o montante dos seus honorários para o montante que veio a ser decidido no laudo pedido pelo réu à Ordem dos Advogados, ao qual subtraiu os 4.000,00€ já pagos, tendo comunicado ao réu este valor, conforme carta de 25 de Junho de 2008, pelo que, pelo menos a partir da data da citação, o réu ficou ciente do total em dívida, valor este que foi de 11.000,00€ mais IVA e juros legais (compensatórios), que constitui o pedido na acção; apesar do desacordo manifestado pelo R. na contestação que apresentou nos autos tal não constitui razão bastante para conferir à obrigação um carácter ilíquido, pelo que, a partir do momento em que o réu foi citado e não diligenciou pagar, colocou-se em mora e, como tal, deve ser condenado a pagar os juros legais sobre a quantia em dívida, desde a data da sua citação até efectivo e integral pagamento, sendo claro o atraso do pagamento por culpa do réu.

         Sobre a questão assim equacionada, há que dizer que a jurisprudência se tem dividido.  

         Existem decisões do Supremo Tribunal que assumem posição idêntica à tomada na decisão recorrida (entre outros, Acs. de 20.6.2002 relator Cons. Joaquim de Matos e de 19.2.2002 relator Cons. Oliveira Barros). Mas existem outros arestos que defendem idêntica posição à do recorrente (entre outros, Acs. de 17.2.2005 relator Cons. Pires da Rosa todos acessíveis através de www.dgsi.pt/jstj.nsf) e de 27.4.2006 relator Cons. Afonso Correia in Col. Jurisprudência 2006, Tomo II, pág. 59 e sgs.).

         Vejamos:

         Estabelece o Art. 804º, nº 1 do C.C. que “a simples mora constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor”, entendendo-se que aquele se encontra em mora quando, por causa que lhe for imputável, a prestação, ainda possível, não for efectuada no tempo devido (nº 2). De harmonia com o Art. 805º o devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir (nº 1). Mas, de harmonia com o nº 3, parte inicial, se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor.

         Nos termos do nº 2 do Art. 804º a mora do devedor (mora debitoris) pressupõe culpa do devedor no retardamento da prestação. Por outro lado, em caso de crédito ilíquido, não há mora enquanto não se concretizar a liquidez, a não ser que a ilíquidez seja imputável ao devedor.

         O A. sustenta que o valor de € 15.000,00 que veio a ser fixado na sentença a título de honorários foi por si reclamado do R., por carta de 25 de Junho de 2008, pelo que, pelo menos a partir da data da citação, o réu ficou ciente do total em dívida e que, apesar do desacordo manifestado pelo R. na contestação que apresentou nos autos, tal não constitui razão bastante para conferir à obrigação um carácter ilíquido, pelo que, a partir do momento em que o réu foi citado e não diligenciou pagar, colocou-se em mora e, como tal, deve ser condenado a pagar os juros legais sobre a quantia em dívida, desde a data da sua citação até efectivo e integral pagamento, sendo claro o atraso do pagamento por culpa do réu.

         No caso em apreço como os factos provados demonstram, o R. foi interpelado extrajudicialmente para cumprir e foi citado para a presente acção.

         Por isso, logo numa primeira abordagem à questão, nos termos do nº 1 do Art. 805º, ter-se-ia constituído em mora a partir desses momentos. Mas se considerar não existir culpa do RR. no retardamento da obrigação, então a mora não ocorrerá.

         Por outro lado, considerando-se o crédito como ilíquido, então não haverá mora enquanto não se concretizar a liquidez, a não ser que a ilíquidez seja imputável ao R.

         De acordo com os ensinamentos do Prof. Antunes Varela, in Das Obrigações em Geral, Vol. II, 7ª edição, págs. 115 e 116 em nota de rodapé, “diz-se ilíquida a obrigação cuja existência é certa, mas cujo montante não está ainda fixado (juros não contados; encontros de créditos e débitos que ainda não se fez, como no caso da gestão, do mandato etc; danos cujo valor ainda se não determinou, na obrigação de indemnização”.

         O A., no caso, interpelou o R. a cumprir, liquidando a obrigação, isto é, fixando, em concreto, os honorários e despesas que, no seu prisma, eram devidas.

         Por seu turno o R., não colocando directamente em causa o valor do honorários peticionados pelo A. defende-se dizendo que se mostram liquidados em face das entregas em dinheiro por si efectuadas ao A.

         Ora, tal circunstância não torna, a nosso ver, o crédito ilíquido. Poderá não existir ou ser inferior e portanto, no todo ou em parte, não devido, mas não ilíquido.

         Reconhecendo-se, assim, a liquidez do crédito em que o R. foi condenado, nos termos das disposições citadas, os juros moratórios deverão ser contabilizados a partir das interpelações, a última das quais ocorreu com a citação para a presente acção e a partir da qual o A. peticiona na presente acção os juros legais.

         Perfilhamos, assim o entendimento sufragado pelo Ac. do STJ, de : 16.09.2008, disponível in www.dgsi.pt, segundo o qual “ De resto esta é a posição mais justa e equilibrada, conciliando os interesses em confronto visto que o A., não podendo receber, desde logo, a quantia de que foi reconhecido credor, poderá contar com os juros moratórios que o compensará pelo atraso. Por sua vez, os devedores, pagarão apenas o afirmado como devido, mas terão que indemnizar o credor pelo retardamento do pagamento, na medida em que não tiverem razão.

         A não se considerar assim, abrir-se-ia as portas a contestações impróprias com o fito apenas de evitar o pagamento tempestivo. A injustificada litigância, a considerar-se a mora a partir do trânsito em julgado da sentença, acabaria por beneficiar o prevaricador, o que não é aceitável. “

         Aliás, sobre tal questão, já no supra citado Ac. do STJ de 27.4.2006 se defendia que: “Ponderando os interesses em confronto, concluímos que nem todo o crédito contestado é crédito ilíquido, só o sendo na medida na medida em que o devedor obtenha ganho de causa. No restante o crédito é líquido ou como tal se deve considerar desde a interpelação. Só assim se garante a seriedade da contestação do crédito reclamado e se conciliam os interesses de credor e devedor, aquele a reclamar pronto pagamento ou indemnização pela mora, este a só pagar o devido, livre de pressões ilegítimas mas obrigado a indemnizar na medida em que não tiver razão”.

         Assim sendo, há que reconhecer razão nesta parte ao A. recorrente, decidindo-se em relação ao juros legais que os mesmos são devidos desde a citação do R. na acção, conforme por aquele peticionado nos autos.

        

         IV-SUMÁRIO

         1. Não se verifica a nulidade da sentença com base na condenação em quantidade superior ao pedido, prevista no Art. 668º Nº1 e) do CPC, quando o montante concreto da condenação se compreende no montante peticionado.

         2. O laudo emitido pela Ordem dos Advogados a propósito dos honorários de advogado destina-se a esclarecer com elevado grau, da razoabilidade e adequação o valor a atribuir a título de honorários pelos serviços por aquele prestados e está sujeito à livre apreciação do tribunal.

         3. Tendo havido interpelação do A. ao R., extrajudicial e judicialmente, para pagamento dos honorários, fixando em concreto o respectivo montante, os juros de mora devem ser contabilizados desde as datas dessas interpelações (extrajudicial e judicial) e não desde o trânsito em julgado da decisão.

V- DECISÃO

Nos termos e pelos fundamentos expostos julgam-se parcialmente procedentes os recursos principal e subordinado interpostos pelo R. e pelo A, respectivamente, e, em consequência, revoga-se parcialmente a sentença recorrida, substituindo-se por outra que, julgando a acção parcialmente procedente, condena o R. no pagamento ao A. da quantia de € 15.000,00 (quinze mil euros) a título de honorários, acrescida de IVA calculado à taxa legal em vigor à data da citação, à qual deverá ser deduzida a quantia já paga de € 5.498,80 e, ainda, na condenação do R. nos juros moratórios sobre a quantia residual, desde a citação e até efectivo e integral pagamento, absolvendo-se o R. do demais peticionado.
         Custas pelos apelantes, na proporção dos respectivos decaimentos.

                    

                  

                                                        Maria José Guerra ( Relatora)

                                                        Albertina Pedroso

                                                        Virgílio Mateus